
Como diz um prezadíssimo amigo, o mundo anda tão virado, que vai chegar a hora em que os postes vão urinar nos cachorros.
Outra reflexão não me acode quando leio a notícia de que o Ministério da Educação adota e recomenda um livro, provavelmente de didática da linguagem, em que se admitem, nas práticas escolares, os erros habituais do vulgo inculto – os barbarismos e solecismos que sempre estiveram na mira dos melhores professores.
Das prescrições dos sábios daquele ministério nunca se pode esperar grande coisa. A burocracia centralista parece que emperra as inteligências, e a distância da corte brasiliense em relação às províncias embota a sensibilidade e a percepção. Mas às vezes, como neste caso, a inépcia exagera. A notícia menciona como expressões aceitas pela obra recomendada, os livro, e naturalmente os caderno e as professora. De resto, “nós pega o peixe” ou “os menino pega o peixe” ganham o prestígio de orações camonianas... Tudo isso pode ter franca circulação nas escolas, onde deve ser cultivada uma língua de “vale-tudo”. A ideia de correto e incorreto no uso da linguagem deve ser banida, regulando-se tudo pela adequação ou inadequação do falar. E, presumivelmente, do escrever. Segundo o parecer do MEC, as formas de expressão variam conforme as “situações da comunicação”. Teremos então gramáticas circunstanciais... Uma para fazer vestibular ou a prova do Enem; outra para a internet, a conversa doméstica e o papo entre amigos.
A deduzir da notícia desta semana, regras de grafia, gênero, número e grau deixaram de valer, concordância nominal ou verbal foi abolida. Os alunos poderão sair da escola com os mesmos vícios de linguagem que trouxeram de seus lares iletrados e dos rincões remotos onde não penetraram as normas da língua culta. É de se perguntar, neste caso, qual a necessidade de escola, de professores e de investimentos na instrução popular.
A linguagem gramatical é fator de unidade nacional, meio de comunicação seguro entre as diversas regiões do país, suporte de um mercado livreiro e jornalístico interestadual. Entre pessoas de razoável instrução, o pa- raense se entende bem com o gaúcho, com o carioca ou com o baiano. Mas entre os iletrados não acontece o mesmo. E se a comunicação se estabelece mediante uma fala de bárbaros, ficam os interlocutores ilhados e incomunicáveis.
De resto, se essa língua de “vale-tudo” ganhar o beneplácito das escolas, como quer o MEC, o português usado no Brasil se tornará tão regionalizado, que perderá o caráter de idioma nacional.
SERGIO DA COSTA FRANCO, HISTORIADOR - ZERO HORA 15/05/2011
Boa tarde
ResponderExcluirEstou de pleno acordo com seu discurso. É inaceitável tamanha irresponsabilidade com o futuro do nossos jovens. Cada vez mais se desqualifica a norma culta, o papel do professor e a importância de termos pessoas bem preparadas para atuar no mercado de trabalho, independente da profissão escolhida.
Parabéns.
Boa semana.