EDUCAÇÃO MULTIDISCIPLINAR

Defendemos uma política educacional multidisciplinar integrando os conhecimentos científico, artístico, desportivo e técnico-profissional, capaz de identificar habilidade, talento, potencial e vocação. A Educação é uma bússola que orienta o caminho, minimiza dúvidas, reduz preocupações e fortalece a capacidade de conquistar oportunidades e autonomia, exercer cidadania e civismo e propiciar convivência social com qualidade, dignidade e segurança. O sucesso depende da autoridade da direção, do valor dado ao professor, do comprometimento da comunidade escolar e das condições oferecidas pelos gestores.

quinta-feira, 30 de abril de 2015

CONFRONTO NO PARANÁ É ALERTA PARA O RS



ZERO HORA 30/04/2015 | 03h37


Coluna Política+

por Rosane de Oliveira


Imagens da batalha que resultou em mais de 200 feridos no Paraná, a maioria professores em greve, devem servir de alerta para o governo do Rio Grande do Sul, às vésperas da apresentação de um conjunto de projetos para tentar estancar a crise financeira do Estado. As cenas de professores ensanguentados devem ser reproduzidas no manual do que não se deve fazer em situações idênticas.

A polícia do governador Beto Richa (PSDB) usou bombas de efeito moral e cachorros para dispersar os professores que protestavam contra um projeto de alteração do ParanaPrevidência, o fundo criado para sustentar as aposentadorias dos servidores. Pelo projeto que afinal acabou sendo aprovado, o ParanaPrev terá de pagar as aposentadorias de 33 mil inativos com mais de 73 anos, que até então recebiam de um fundo financeiro bancado pelo Tesouro.

A preocupação dos associados ao ParanaPrev é com o próprio futuro: o ingresso de 33 mil beneficiários ameaçaria a saúde financeira do fundo, colocando em risco as aposentadorias de quem aderiu ao sistema desde o início. Richa garante que não existe esse risco.

Para efeito de comparação, é como se o governo do Rio Grande do Sul resolvesse passar a aposentadoria de parte dos inativos para o Funprev, criado no governo de Tarso Genro, e que só recebe contribuições de quem entrou no serviço público depois da aprovação da lei.

Richa vive o mesmo dilema de outros governadores, que não sabem de onde tirar dinheiro para pagar as contas. A diferença do Paraná para o Rio Grande do Sul é que lá o governador fracassou na tentativa de usar os depósitos judiciais de terceiros. Richa planejava usar 30% dos depósitos judiciais (R$ 2,3 bilhões), mas a pretensão foi barrada no Conselho Nacional de Justiça. O Rio Grande do Sul utiliza 85% do saldo, com aval do Tribunal de Justiça, e pretende elevar esse percentual para 90%. Os saques feitos desde o governo Germano Rigotto já chegam a R$ 8 bilhões.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

FALTA DE TRANSPORTE ESCOLAR GERA PROTESTO ESTUDANTIL

ZERO HORA E PIONEIRO 23/04/2015 | 09h04


Depois de 9h de caminhada, alunos chegam a escola de Lajeado Grande. Eles foram recepcionados pela diretora, professores e colegas



Anderso Souza Rech e André dos Reis dos Santos percorreram 42km. O vizinho Juan da Silva Moura também participou do protesto Foto: Adriano Duarte/ Agência RBS

Exaustos e com os calçados molhados e embarrados, os estudantes que protestam contra a falta de transporte escolar em São Francisco de Paula chegaram na Escola Estadual Lajeado Grande por volta das 9h desta quinta-feira. Eles percorreram cerca de 42 quilômetros da localidade de Pedra Lisa, comunidade de Cazuza Ferreira, até o distrito de Lajeado Grande, onde participarão do primeiro dia de aula. A caminhada pela estrada de chão batido durou aproximadamente nove horas.

— Vou chegar em casa de tarde e vou até esquecer que existo. Vou dormir até não sei que horas — diz o estudante André dos Reis dos Santos, 16 anos, cansado da longa caminhada.

Santos teve como companhia Anderso Souza Rech, 15 anos, e o vizinho Juan da Silva Moura, 11 anos. Oito jovens da comunidade estão matriculados na escola de Lajeado Grande, mas nenhum deles frequentou a sala de aula por falta de transporte. Eles foram recepcionados com café da manhã pela diretora Nara Santini, professoras e colegas de turma.

— Decidi fazer essa caminhada porque estou sem estudar desde o final de 2013. Não acho justo ficar assim pelo fato de não haver ônibus para nós — diz Anderso.

Juan não estuda em Lajeado Grande, mas decidiu acompanhar os amigos representando uma outra aluna que também está sem escola. No percurso, três veículos de transporte escolar passaram pelos estudantes.

ORIENTAÇÃO VOCACIONAL

ZERO HORA 23/04/2015 | 08h05

por Guilherme Justino


Em dúvida sobre que carreira seguir? A orientação vocacional pode ajudar. Mais do que um teste, a orientação serve como aliada nessa escolha. Eficácia, porém, pode ser comprometida por alguns equívocos comuns



Entre tantas profissões, muitos estudantes se inscrevem no vestibular e no Sisu sem ter certeza de que carreira seguir Foto: Diagramação / Zero Hora

Ainda nem entramos na idade adulta quando geralmente chega a hora de responder à clássica pergunta: “o que você vai ser quando crescer?”. A decisão pode se tornar muito difícil para jovens que encontram uma miríade de oportunidades pela frente – e ainda não descobriram todas as próprias aptidões.

Para quem está na dúvida, o caminho, sem apoio, pode ser cercado de erros: escolher a “profissão do momento”, aquela em que há mais vagas abertas, a mais bem remunerada atualmente ou a que os pais recomendam nem sempre é a opção mais indicada. Nessas horas, a orientação profissional pode dar uma mãozinha.

Essa ajuda costuma cobrir de maneiras variadas as diferentes necessidades do estudante indeciso. Quem não tem ideia de que carreira seguir consegue descobrir melhor os interesses pessoais e, se autoconhecendo, saber que caminho trilhar. Já quem está em dúvida entre poucas opções pode encontrar apoio para entender melhor cada profissão – e com qual mais se identifica.


Abaixo, você vai encontrar algumas perguntas que podem ajudar a descobrir para que serve e em que casos vale a pena buscar a orientação profissional.

Teste vocacional funciona?
Sozinho, o tipo de teste que costuma ser aplicado – inclusive online – para ajudar o aluno a encontrar sua profissão não tem muito efeito. Especialistas recomendam que não se guie apenas por perguntas e respostas, mas por uma pesquisa mais extensa. O teste vocacional é válido, mas funciona melhor se inserido em um trabalho maior de orientação profissional.

– O teste, a entrevista e um conhecimento amplo sobre as profissões são a base para um bom trabalho de orientação profissional – garante a psicóloga Simone Grohs.

Pelo teste, vou encontrar a profissão certa para mim?
Não necessariamente. A decisão final cabe somente ao estudante. O que a orientação faz é ajudá- lo a entender melhor os próprios interesses e em que área conseguiria mais sucesso.

– O estudante não vai encontrar uma resposta direta. A orientação proporcionará a chance de construir com o estudante um projeto de vida, pelo qual ele possa identificar motivações, valores, habilidades, necessidades e objetivos – explica o psicólogo Hector Nievas.

Onde se informar?
Procure centros de orientação profissional, muito comuns nas faculdades de psicologia. Também há clínicas e serviços de atendimento a estudantes que oferecem o serviço, trabalhando no planejamento e no aconselhamento de carreira.

Alguns colégios particulares também contam com esse apoio, mas o serviço é oferecido como um diferencial, não faz parte da grade curricular. Nas escolas públicas, a orientação profissional não é comum e, quando existe, costuma partir da iniciativa de professores ou da direção.

Quando fazer?
O indicado é definir um rumo – ou ao menos filtrar algumas profissões – bem antes. A época ideal pode ser o segundo ano do Ensino Médio, quando muitos já fazem provas como treineiros e ainda não há a pressão pela formatura.

– A orientação profissional é um trabalho de reflexão, individualmente ou em grupo. Então, quanto mais a pessoa se conhecer, melhor. Quando já tem ideia do que gosta, a decisão fica mais fácil – diz o coordenador adjunto do Serviço de Orientação Profissional da UFRGS, Marco Teixeira.

O resultado é definitivo?
Um erro comum de quem busca orientação vocacional é acreditar que a escolha da profissão é definitiva. Há pessoas que trocam de curso ou, depois de formadas, optam por outra carreira.

– Mesmo que ele decida trocar, nada será perdido. Ele terá conquistado experiência, o que pode torná- lo um profissional melhor – avalia a orientadora de carreira Maria Luiza Caleffi Pons.

Quem pode aplicar?
Os testes vocacionais têm mais efeito quando aplicados por psicólogos, pedagogos ou psicopedagogos especializados em orientação profissional. Eles serão capazes de interpretar os resultados e contribuir para que os estudantes descubram os próprios interesses.

terça-feira, 21 de abril de 2015

A FALTA QUE A MÃE FAZ



ZERO HORA 21 de abril de 2015 | N° 18139


DAVID COIMBRA



Em todas as vezes que visitei a Fase, a antiga Febem, nunca encontrei um menino egresso de família constituída e atuante, e por atuante refiro-me a pai e mãe preocupados com a educação dos filhos. Nunca encontrei um único, nunca. Em geral, o pai era ausente, ou inexistente, ou bêbado, ou drogado, ou coisa pior. Volta e meia, a mãe também era isso tudo, principalmente coisa pior.

Pode ter sido falta de sorte minha, mas duvido – fui muitas vezes à Fase. Aposto uma nota verdinha com o retrato de Benjamin Franklin que nem 10% dos internos foram criados por pai e mãe zelosos.

Com isso estou dizendo o óbvio: que a família é o mais importante na educação de uma criança. E foi essa obviedade que disse o secretário de Segurança do Rio Grande do Sul, ontem, em entrevista à Gaúcha: era melhor, para os filhos, quando as mães ficavam em casa, cuidando deles.

Alguém pode dizer que isso não é verdade?

É claro que é.

Sendo assim, por que a antiga fórmula composta por “pai provedor” e “mãe do lar” não funciona mais na sociedade ocidental? Porque a sociedade ocidental mudou. Está sempre mudando. Dia a dia. É muito difícil fazer um retrato da sociedade, porque ela é um rio em constante movimento.

A Revolução Industrial, as guerras e as crises econômicas jogaram a mulher no mercado de trabalho. O que pode ter sido bom para algumas mulheres e nem tanto para outras. Muitas queriam ficar em casa, cuidando dos filhos. Dessas, uma parte não pode, porque simplesmente tem de trabalhar. Outra parte, que pode, não quer porque, para determinada classe social, “pega mal” a mulher não ter emprego.

No Dia das Mães, que se aproxima, você vê aqueles anúncios venerando a “Super-Mulher”, que bota um tailleur para a reunião da empresa, um avental para cozinhar para os filhos e uma malha de academia para deixar o corpo enxuto como o de uma Gisele. É uma sacanagem. Como exigir isso de qualquer pessoa, mulher ou homem?

Como dizia Jesus, ninguém pode servir a dois senhores ao mesmo tempo. Uma mulher com grande responsabilidade profissional, ou com um trabalho muito estafante, não terá tempo nem energia para cuidar dos filhos como cuidaria se estivesse o dia inteiro em casa. Não há como, por melhor mãe que ela seja ou pretenda ser.

Mas a vida também é regida pela lei das compensações. As mulheres não são mais como eram, e os homens também não. À medida que as mulheres tiveram de se afastar dos filhos, os homens se aproximaram deles. Hoje, os homens são melhores pais, exatamente porque há espaço e necessidade para isso.

O problema é que não é suficiente. Pais e mães conscientes estão perdendo a disputa para a degeneração social, aliada à incúria do Estado nas suas tarefas básicas de educação e segurança pública. E é aí que entraria o secretário. Ele pode estar certo na sua análise da responsabilidade da família pela falência moral do país, mas está sendo omisso ao não admitir a própria responsabilidade. Ele não está fazendo a parte dele. E, na parte dele, há muito para fazer.

sábado, 18 de abril de 2015

O DIREITO DOS SEM ESCOLA

REVISTA ISTO É N° Edição: 2368 | 17.Abr.15


Caso de jovem que estudou em casa e obteve na Justiça a sua vaga na faculdade coloca em evidência a falta de proteção legal a quem aprende fora das instituições de ensino. E joga luz sobre um novo método de educação domiciliar, ainda mais radical


Fabíola Perez




A turismóloga Lis Maria Silvério de Oliveira, de 32 anos, decidiu tirar o filho Thor, 5 anos, da escola em 2012, quando se mudou de São Lourenço para Belo Horizonte (MG). Na capital mineira, chegou a procurar opções para matricular o filho, mas nada que estivesse de acordo com sua filosofia pessoal. “Procurei um tipo de pedagogia que respeitasse o ritmo de cada criança”, diz. Desanimada com as instituições que visitou, a turismóloga resolveu abandonar o ensino formal e praticar o unschooling, método no qual as crianças aprendem de acordo com suas aptidões. É uma alternativa ainda mais radical que o homeschooling, sistema em que os pais levam os currículos da escola para a casa. Muito praticados nos Estados Unidos (leia quadro), esses métodos voltaram à discussão na semana passada por causa da jovem Lorena Dias, de 17 anos, que conseguiu na Justiça, em decisão inédita, o direito de cursar faculdade depois de estudar em casa por quatro anos. Dados da Associação Nacional de Educação Familiar (ANED) mostram que mais de 2,5 mil famílias praticam o método alternativo atualmente. “Queremos oferecer uma educação com mais qualidade, valorizar o aprendizado de cada indivíduo e as escolas não conseguem trabalhar as dificuldades individualmente”, afirma Ricardo Dias, presidente da ANED.


LIBERDADE
Lis e os filhos Thrud e Thor: “procurei um tipo de pedagogia
alternativa e vou seguir assim até a faculdade”

Menos difundido no País, mas também em crescimento, o unschooling é entendido como uma negação ao modo de ensino das instituições. “Ao invés de ajudar, a metodologia criada pelas escolas pode engessar as crianças e o unschooling propõe que cada um aprenda conforme o seu interesse e aptidões”, diz Édison Prado de Andrade, doutor em educação domiciliar pela Universidade de São Paulo (USP). Thor, filho de Lis, está aprendendo a partir dessa prática. “Ele gosta de robótica, então não costumo cobrar matemática dele. Meu filho absorve assistindo vídeos de construção de aviões e drones, deixando a criatividade e o interesse fluir”, diz a mãe, que pretende manter o método até a faculdade.



O problema é que ambas as práticas não estão regulamentadas na legislação brasileira. O Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei de Diretrizes e Bases determinam que os pais matriculem os filhos na rede regular de ensino a partir dos seis anos. Além disso, o Código Penal configura como crime de abandono intelectual deixar de prover a instrução primária de filho em idade escolar. Mas atualmente tramita no Congresso o Projeto de Lei número 3179/12 para legalizar o homeschooling no País. “Essas famílias vivem num vácuo porque não é uma atividade proibida nem permitida”, diz Alexandre Magno, diretor Jurídico da ANED. “Hoje não há um acompanhamento de como a educação se dá em casa e a qualidade da instrução não é avaliada pelo Estado.” Outro aspecto polêmico da educação domiciliar é a socialização. “Na escola, as crianças aprendem a enfrentar problemas e desenvolver experiências de igualdade, isso nunca vai ocorrer apenas no ambiente familiar porque as relações são estáveis”, diz Telma Vinha, pedagoga, especialista em psicologia da educação pela Unicamp.


VITÓRIA
Depois de quatro anos estudando em casa, Lorena (segunda à esq.)
ganhou na Justiça o direito de ingressar na faculdade

Fotos: Leo Drumond/Nitro; Pedro Ladeira/Folhapress

sexta-feira, 17 de abril de 2015

DESCASO COM AS ESCOLAS



ZERO HORA 17 de abril de 2015 | N° 18135

EDITORIAIS


O filme é o mesmo de outros anos: falta de professores nas escolas públicas do Estado, estruturas físicas precárias e alunos prejudicados pelas improvisações. A diferença é que, neste início de governo, o secretário da Educação reconhece e critica os problemas, alguns dos quais são históricos, dispondo-se a corrigi-los com a máxima brevidade. Tem que ser rápido mesmo, pois os professores estão sobrecarregados e os estudantes registram perdas inadmissíveis, muitas das quais dificilmente serão recuperadas. A sociedade precisa ficar atenta em relação a esse compromisso.

O que não mudou em relação a outras administrações, nesse início de governo, é a insistência do poder público em explicações que não fazem sentido. Sempre há desistência, por exemplo, quando o Executivo nomeia professores concursados. Da mesma forma, aposentadorias são previsíveis e é certo que a cada início de ano é registrada falta de professores, em áreas bem conhecidas de quem lida com educação. O difícil é entender o que mais, além de falta de planejamento, contribui para essa triste reprise anual.

Em consequência, professores, normalmente já sobrecarregados, são forçados a buscar saídas para atenuar os danos aos alunos. Entre as alternativas, está a redução da carga horária. É o tipo de providência que impede os estudantes de ficarem sem aula, mas prejudica o conhecimento.

Diante dessa situação inaceitável, o secretário Vieira da Cunha, da Educação, compromete-se a impedir a repetição dos problemas em 2016. É o mínimo que estudantes, professores e pais precisam ver confirmado na prática.

PAGAMENTO IRREGULAR DE FG NA UFPEL

ZERO HORA 17/04/2015 | 04h02


UNIVERSIDADE S.A. Auditoria aponta pagamento irregular de funções gratificadas na UFPel. Repasse de R$ 578 mil a 10 servidores da instituição entre 2008 e 2012, com recursos do Ministério da Saúde, está sendo investigado

por Humberto Trezzi




Foto: Editoria de Arte


Durante quatro anos, um grupo de 10 servidores do quadro da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) recebeu gratificações por exercerem cargos de coordenação no hospital-escola da entidade — chamado Hospital da FAU (Fundação de Apoio Universitário). A verba, captada no Ministério da Saúde, serviu de complementação salarial, mas o repasse foi considerado ilegal por uma auditoria interna, à qual Zero Hora teve acesso com exclusividade.


O dinheiro buscado no ministério foi usado, entre 2008 e 2012, para pagamento de supostas funções gratificadas (FGs) de 10 funcionários — sete enfermeiros, dois auxiliares de enfermagem e uma assistente administrativa. A verba, porém, não estava prevista para essas FGs e a saída encontrada pela direção da UFPel para recompensar os servidores que exerciam função de confiança foi distribuir o recurso entre eles, em parcelas mensais na conta corrente, por meio de Recibo de Pagamento de Autônomo (RPA) ou vale-refeição.

A auditoria interna da UFPEL, assinada pelo auditor Elias Medeiros Vieira, ressalta que o valor mensal máximo para pagamento por desempenho de função, no caso desses servidores, deveria ser de R$ 777,36 (considerando a Lei 12.778/12). Um dos gratificados recebeu R$ 176 mil de FG em quatro anos, outro ganhou R$ 161 mil e um terceiro, R$ 157 mil. Ou seja, em média, cada um deles recebeu cerca de R$ 3,5 mil mensais como função gratificada, bem acima do teto legal estabelecido.

A auditoria destaca que o pagamento não poderia ser feito via RPA porque os servidores são estatutários. O auditor pede a devolução de R$ 578.197,03 (valor de 2013, que terá de ser corrigido). O caso foi apelidado de "Mensalinho da UFPel".

A auditoria critica também o fato dos pagamentos terem sido feitos sem dotação orçamentária. Os resultados da auditoria foram encaminhados à Comissão Permanente de Processo Administrativo Disciplinar (CPPAD) da universidade há mais de ano e meio. A investigação não foi repassada ao Ministério Público Federal, como recomenda o auditor. De acordo com a UFPel, o processo tramita na CPPAD, que apura possíveis irregularidades, os responsáveis e os valores. Como o processo é sigiloso, a universidade afirma que não pode dar detalhes da investigação.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

FALTAM PROFESSORES NA REDE ESTADUAL DE PORTO ALEGRE

ZERO HORA 16/04/2015 | 04h04


por Roberta Schuler


Faltam professores em uma a cada três escolas estaduais de Porto Alegre
Levantamento do Diário Gaúcho em parceria com a Rádio Gaúcha mostra a situação da rede de ensino



Para suprir ausência de mestre, turmas de Ana Maria têm apenas duas horas de aula por dia Foto: Carlos Macedo / Agencia RBS

Às vésperas de completar os dois primeiros meses do ano letivo na rede estadual de ensino, uma em cada três escolas de Porto Alegre está sem algum professor. O Diário Gaúcho, em parceria com a Rádio Gaúcha, entrou em contato, entre a segunda e a terça-feira, com as 259 instituições de ensino estaduais e constatou que faltam 141 professores em salas de aula de 87 escolas da Capital.

No caso dos alunos das séries iniciais do ensino fundamental, 22 turmas estão fora da sala de aula, ou vêm sendo atendidas de maneira precária porque os professores do Currículo por Atividade (Cat) ainda não chegaram.

Há ausências constatadas ainda em disciplinas como Matemática (falta de 13 docentes), Português (13), Geografia (14), entre outras.

— A falta de professor é algo gravíssimo. Não é só ele que faz a escola, mas ele é o mediador da sociedade, há muitas coisas que ele pode fazer. Não há o que substitua a relação professor-aluno — afirma o doutor em Educação e professor da Unisinos, Euclides Redin.


O secretário estadual da Educação, Vieira da Cunha, atribui a demora na reposição de recursos humanos à desistência de concursados e também à falta de planejamento do ano letivo, que deveria ser feito no exercício anterior.

— A reposição é do nosso cotidiano. Temos que ter mais agilidade no processo e planejamento para termos uma previsão. Lamento muitíssimo que isso esteja ocorrendo e me comprometo a tomar todas as providências para que isso não ocorra em 2016 — afirmou o secretário.

Turnos reduzidos para não haver dispensa


Na Escola Dolores Alcaraz Caldas, a falta de professor para uma turma do quinto ano exigiu uma redução de horários para que nenhum aluno deixasse de estudar. Antes da medida, porém, a professora Ana Maria Pedroso de Paoli bem que tentou atender
40 alunos numa sala que comporta apenas 30, mas não foi possível por mais do que três semanas. Desde então, uma turma tem aulas das 13h30min às 15h30min e outra das 15h30min às 17h30min.

— Ficou melhor, mas os alunos estão sendo prejudicados na carga horária — observa a professora.

Ninfa Martins, a vice-diretora do turno da tarde, revela que esta é a primeira vez que falta professor do Currículo por Atividade. A falta de perspectivas e o avanço do ano letivo preocupam. A direção tem procurado a 1ª Coordenadoria Regional da Educação (Cre) semanalmente. O caso esteve na iminência de ser resolvido com o remanejo de uma professora da rede para a Dolores, mas voltou à estaca zero.

Início da vida escolar prejudicado

— Minha preocupação maior é com o aprendizado do meu filho. Ele está perdido. Percebo que ele está com dificuldade.

O desabafo é da gerente administrativa Lurdes Becker Costa, 45 anos, que é mãe de um aluno do primeiro ano do ensino fundamental. Marcelo Becker Costa, seis anos, estuda na Escola Brasília, no Bairro São João, onde, desde o início do ano, a turma do primeiro ano está sem professor.

A saída que o diretor João Niederauer encontrou, com a concordância dos pais e autorização da Secretaria, foi deslocar uma estagiária para atender a turma.

— Mas pensávamos que seria por uns 15 dias. A estagiária seria para o quarto ano, e eles precisam de uma professora do primeiro — observa Lurdes.

Já na Escola Santa Luzia, no Bairro Santo Antônio, 22 alunos do primeiro ano aguardam a chegada de um professor.

— Eles estão em casa. Não tivemos mais como atender. Estamos perdendo alguns alunos por causa disso — conta a diretora, Envy Joy.

Em compasso de espera também está a direção da Escola José Garibaldi, no Parque Humaitá. Além da falta de um professor de Matemática e um de Religião, não há professor do Currículo por Atividade para atender os 25 alunos do primeiro ano do ensino fundamental.

— É uma situação bem complicada, mas estamos atender as crianças. Se deixarmos os alunos fora da escola, eles perdem a rotina. E os pais, quando matriculam os filhos, querem que eles tenham aula — afirma a diretora Veneza Dorneles.

Desistências atrasam o processo

O secretário estadual da Educação, Vieira da Cunha, afirma que a desistência de cerca de cem professores concursados — do universo de 540 nomeações autorizadas pelo governador — contribuiu para o atraso da chegada dos professores à sala de aula. Como as desistências têm de ser publicadas no Diário Oficial para que novos concursados sejam chamados, o processo se torna moroso.

Vieira cita ainda a falta de planejamento do ano letivo, que deveria ter sido feita no ano anterior. Segundo ele, do início do governo Sartori até o dia 9 deste mês, 1.516 professores pediram afastamento definitivo (entre aposentadorias, óbitos e exonerações). No caso das aposentadorias — cuja ausência de professores poderia ser prevista — são 600 docentes.

— Reconhecemos esta situação e estamos tomando providências para suprir essas ausências — afirma.

O secretário informa que, nos próximos dias, deverão ser supridas as 540 nomeações autorizadas e, posteriormente, será feito um novo pedido:

— Estamos em pleno processo de nomeação. E onde não houver banco de concursados, estaremos contratando (há um banco de 13 mil professores aptos a serem contratados emergencialmente).

terça-feira, 14 de abril de 2015

FRAUDE NAS UNIVERSIDADES

 
ZERO HORA 14 de abril de 2015 | N° 18132

EDITORIAIS


É desconcertante a constatação de que até mesmo universidades públicas, responsáveis pela formação de jovens comprometidos com a ética de suas atividades profissionais, estão às voltas com uma série de irregularidades rotineiras. Entre os problemas constatados, estão a deformação de convênios com empresas privadas, até o exercício de atividades particulares por profissionais com dedicação exclusiva. Os fatos, apontados por reportagem conjunta de cinco grandes jornais brasileiros, merecem uma abordagem que vai além da atuação no caso do Ministério Público, responsável pelas investigações, e do Judiciário.

Certamente, instituições universitárias bancadas pelo poder público não podem se transformar numa ilha, isoladas da atividade privada para as quais formam muitos de seus profissionais. Em princípio, uma e outra área só têm a ganhar quando se propõem a atuar de forma conjunta, intercambiando experiências. Esse relacionamento, porém, não pode chegar ao ponto de confundir o limite entre o que é público e o que é privado.

O que fica claro, nas denúncias, é o quanto essas deformações são resultantes, em boa parte, da falta de transparência nos procedimentos internos dessas instituições. Foi justamente a Lei de Acesso à Informação que contribuiu para a imprensa desvendá-las. A reportagem deixa claro que as fraudes desvirtuam a atividade de instituições sustentadas pelos contribuintes e comprometem o trabalho responsável da maioria dos docentes e servidores dessas instituições, que prestam inestimável serviço ao país.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Na educação, jamais poderiam exigir dos professores a dedicação exclusiva e nem pagar por ela. Conhecimento e sabedoria precisam se multiplicar para beneficiar todo e qualquer segmento que precise delas.

EDUCAÇÃO, O MELHOR QUE FOI FEITO FOI O PIOR



ZERO HORA 14 de abril de 2015 | N° 18132



DAVID COIMBRA


O melhor que foi feito foi o pior


Quando você faz coisas aparentemente boas, não significa que seguramente esteja fazendo coisas certas.


Penso isso amiúde, em relação à criação do meu filho. Estou sendo duro demais? Frouxo demais? Exigente demais? Tolerante demais?

É complexo.

A coisa certa. A coisa boa. É muito mais fácil fazer a coisa boa. Qual foi a melhor coisa que o governo do PT fez, nesses anos todos? Certamente, foi a facilitação do acesso à educação de nível superior. Isso foi uma coisa boa para muita gente.

Mas não foi a coisa certa.

Um projeto sério de educação no Brasil teria de priorizar a educação básica, os velhos primeiro e segundo graus. Alguém dirá que essa tarefa é dos Estados. Não. Não é. Essa é tarefa para todos os brasileiros, para quem pretende planejar estruturalmente o país, de baixo para cima, de dentro para fora.

Sempre estudei em escolas públicas. Nunca fiz cursinho. Quando cheguei ao vestibular, sentia-me em condições de disputar vaga com quem pagava escola particular e cursos caríssimos. Natural: havia várias escolas públicas excelentes no Rio Grande do Sul.

Com boas escolas públicas, o país não precisa de cotas, porque negros e pobres terão as mesmas chances que brancos e ricos. Com boas escolas públicas, o acesso à educação superior não precisa ser “facilitado”. Boas escolas públicas afastam as crianças da marginalidade e das drogas, e assim ajudam a melhorar a saúde e a segurança. Com boas escolas públicas, a discussão sobre a maioridade penal se torna supérflua até para a Bancada da Bala.

Todos os países que funcionam no mundo, todos, absolutamente todos, sem nenhuma exceção, estão baseados num sistema eficiente de escolas públicas.

O governo do PT fez uma coisa boa, mas errada. O governo errou ao canalizar energias e recursos para a educação superior. A melhor coisa do governo do PT foi uma das piores para o país, porque atrasou o Brasil em pelo menos uma geração.

Nesse tempo todo, com um governo inflado de popularidade, com a economia puxada para cima pelo crescimento chinês, nesse tempo todo o Brasil poderia ter tornado ereta a espinha dorsal da nação, e a espinha dorsal de qualquer nação justa é a educação das crianças.

Perdemos tempo, miseravelmente, porque o governo optou pelo caminho mais fácil. Um governo desenvolvimentista e populista, tanto quanto o foi o governo dos militares. Um governo que passou 12 anos investindo para se manter no poder e que, agora, faz o país pagar essa conta. E o pior de tudo: um governo que patrocina uma rançosa discussão ideológica e a transforma na pauta dos debates do país.

É uma grande falácia. É uma manobra diversionista sórdida. Essa balela de trabalhadores versus empresários, de pobres versus ricos, de brancos versus negros, de esquerda versus direita, de petistas versus tucanos, essa balela serve apenas para deixar o país patinando na mesmice, porque o Brasil necessita de todos, ricos, pobres, brancos, negros, empresários, trabalhadores, todos.

É preciso haver um projeto de país, e esse projeto começa e termina nas crianças. O Brasil tem de ter um sistema, e esse sistema tem de funcionar sempre. Ponto. E danem-se as ideologias. A partir daí, podem se revezar à vontade no poder. Sirvam-se. Saciem a vaidade. Encham os bolsos. Esquerda, direita, centro, PT, PSDB, PMDB, seja quem for. Não faz diferença.

A UNIVERSIDADE SE BENEFICIA COM CONVÊNIOS EMPRESARIAIS

ZERO HORA 14/04/2015 | 05h04

por Humberto Trezzi


"A universidade se beneficia, e muito, com convênios empresariais", diz vice-reitor da UFRGS
Oppermann diz que raciocínio das horas-aulas não deve ser aplicado a docentes que ganham a mais para ter dedicação exclusiva


Para Oppermann, relação com empresas garante novos equipamentos e produção de conhecimento Foto: Lauro Alves / Agencia RBS

Por duas gestões consecutivas o reitor Alexandre Neto e o vice-reitor Rui Oppermann foram guindados ao comando da maior universidade gaúcha, a UFRGS, tendo como uma das bandeiras a interação entre meio acadêmico e empresas. Nesta entrevista, em seu gabinete, o vice-reitor defende, convicto, os convênios com a iniciativa privada, alvo de investigação do Ministério Público Federal (MPF).


Docentes recebem a mais para ter dedicação exclusiva (DE), que passa pelo número de horas dedicadas à universidade. Mas alguns têm até três convênios por ano. Se dividir o número de horas que trabalham fora, recebem bem mais que dentro da universidade.

Eles recebem 50% do salário a mais (pela DE). Mas esse raciocínio das horas-aula não se aplica aqui. A universidade pública é formada por ensino, pesquisa e extensão, esse é o valor dela. Os valores da DE incluem tudo isso, não se resumem a tempo na sala de aula. É errado pensar assim. Os grandes pesquisadores são procurados pelas empresas por terem expertise. O valor em dinheiro eles ganham para resolver um problema, não é mensurável por horas.

Mas o cálculo de quanto esses professores ganham fora da universidade, por hora, partiu de colegas deles, que são contrários a tanta atividade externa.
Esse é um julgamento pessoal de alguns, mas não condiz com a realidade. Os convênios se estabelecem porque há quem venha buscar pesquisa, e há quem faça pesquisa. E são avaliados por gente que não tem relação com os professores envolvidos. É auditoria interna, procuradoria... O reitor já assina o convênio endossado por olhares colegiados.

Pedimos dados sobre convênios feitos com empresas em 2014. Chama a atenção que a universidade ficou só com 5% dos R$ 26 milhões dos 98 convênios. Ou seja, a maior parte do dinheiro não vai para a UFRGS, vai para professores. Por quê?
Tem dinheiro que não está ali. Os 5% se referem, em geral, a taxas de custeio. É o menos relevante. O grosso do dinheiro do convênio se reverte em equipamentos, insumos (de laboratórios, por exemplo) e um saber intangível. Serve para formação e pesquisa, para propor outros projetos.

Mas os professores ficam com mais recursos que a UFRGS. Não seria aliciamento de cérebros por parte das empresas?
O investimento é em dinheiro, mas também em formação. O que a gente ganha em conhecimento num projeto desses não tem como mensurar. A universidade se beneficia, e muito, com convênios empresariais. É experiência conquistada na pesquisa. Antigamente, a gente ia na Fiergs (Federação das Indústrias do Estado), e a crítica era: cadê a pesquisa aplicada da UFRGS? Pois, nos empenhamos num parque científico-tecnológico, no empreendedorismo. Mudamos a lei para melhorar a interação universidade-empresa. Não nos beneficiamos em lucro, mas na construção de novos laboratórios e produção de conhecimento.

Há o caso de um funcionário federal que não cumpriu presença mínima em sala de aula. Mesmo assim, foi aprovado no mestrado. Qual sua opinião?
Existe regra de presença mínima de 75% na graduação. Na pós, não há regra geral. Tem de cumprir créditos. A grande maioria é presencial, mas o aluno pode ganhar créditos de outra forma. Se o meu aluno de mestrado publicar um trabalho A1, o top class dos trabalhos da Capes, ganha créditos e não precisa ir à aula. Conheço o aluno em questão, o Hêider Pinto. Ele foi diretor de atenção básica do Ministério da Saúde. O encontrei quando buscava convênios. A gente quer parcerias com o ministério. E o Hêider tem uma expertise enorme. Ele pode compensar as atividades de aluno mediante trabalhos, seminários. A pós tem essa elasticidade de assimilar as experiências dos alunos para fazer um programa melhor ainda.


Instituto de Geociências defende docentes

Diretor do Instituto de Geociências da UFRGS, André Mexias encaminhou nota a ZH na qual defende o trabalho dos docentes da sua unidade que firmam convênios externos. Ele ressalta que esses termos de cooperação só vigoram após passar por pelo menos nove instâncias de controle, no instituto e na universidade.

Ele discorda também que a atividade dos professores possa ser medida em cálculo de pagamento por horas. "Esse mecanismo não compreende a complexidade da pesquisa e a formação dos recursos humanos relacionados a ela", diz o texto. Com relação aos valores diminutos destinados pelos convênios à UFRGS, ele diz que se referem a "custos mínimos administrativos". Mexias diz que a universidade é compensada também com aquisição de equipamentos para o desenvolvimento de pesquisas e recursos para auxílio aos alunos.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

PROFESSORES DA UFSM SÃO DENUNCIADOS POR ESTELIONATO

ZERO HORA 13/04/2015 | 04h02


Professores da UFSM são denunciados por estelionato. 14 docentes que deveriam ter Dedicação Exclusiva (DE) manteriam consultórios particulares ou dariam aulas ou cursos em outras instituições de ensino sem a liberação da UFSM



Foto: Gabriel Haesbaert / Especial


A prática era comum, muitos sabiam e outros desconheciam a lei. Mas todos garantem que não houve má-fé. Essa é a síntese das justificativas dos 14 professores de Odontologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) denunciados à Justiça pelo Ministério Público Federal (MPF) em investigação por estelionato.

Os docentes, que deveriam ter Dedicação Exclusiva (DE) à instituição — e recebiam a mais pela função —, manteriam consultórios particulares ou dariam aulas ou cursos em outras instituições de ensino sem a liberação da UFSM, o que é proibido por lei, salvo algumas exceções.

O assunto veio à tona em 2012, e os docentes foram denunciados no ano passado. No entanto, uma reportagem publicada em Zero Hora, feita em conjunto em cinco Estados do país e por outros quatro veículos de comunicação, escancarou inúmeros problemas em instituições federais. Entre elas, a Federal de Santa Maria.

Os 29 professores investigados em inquéritos policiais também passaram por um processo administrativo disciplinar (PAD) que, segundo o reitor da UFSM, Paulo Burmann, já foi concluído, e o relatório, emitido ao MPF. Burmann acrescentou ainda que um dos 29 profissionais foi exonerado do cargo no ano passado por “descumprimento de contrato de trabalho”.

— A Justiça está analisando isso e, enquanto ela não tiver uma decisão, não temos o que dizer. Se tu me perguntares se eu sabia disso, eu vou te dizer: não sabia. Eu, como professor da universidade, não cuido da vida dos colegas dentro ou fora da instituição. Obviamente, eu não sabia — afirmou Burmann que, em 2012, era diretor do Centro de Ciências da Saúde (CCS), local que hospeda o curso de Odontologia. Professor da UFSM desde 1989, o reitor também foi coordenador do curso de Odontologia.

Conforme Bruno Menezes, advogado de sete dos 14 denunciados à Justiça, as atividades “extracurriculares” exercidas pelos odontólogos era de conhecimento dos chefes.

O QUE DIZEM OS DENUNCIADOS

- Carlos A. Bazaglia Escobar
- Henrique Hollweg
- Jamal Hassan Assaf
- Letícia Borges Jacques
- Manuel A. Crossetti Pimenta
- Marta D. Machado Oliveira
- Vilmar Antônio Ferrazzo

“Está mais que demonstrado que era uma conduta socialmente aceita no âmbito da universidade, conhecida pelas chefias. Nunca causou danos à atividade pública. Eles são professores que, em regra, têm uma produção científica muito acentuada. São pesquisadores, professores que levam o nome da UFSM em eventos no país e fora dele. Nenhum deles nega que tivesse consultório (junto à Dedicação Exclusiva), mas nenhum deles mantém mais consultório com a dedicação exclusiva em conjunto. Uns mantiveram o consultório e largaram e a dedicação exclusiva, outros ficaram com a Dedicação Exclusiva e largaram o consultório. Todos eles responderam processos administrativos na universidade, apresentaram justificativas, levaram testemunhas e comprovaram essa situação. Não tem outra explicação que se não uma conduta tolerada, aceita e conhecida na universidade. Isso que está sendo demonstrado no processo”, Bruno Menezes, advogado dos sete professores

- Estela Maris Jurach - A reportagem ligou cinco vezes no celular da professora na sexta-feira, mas ela não atendeu aos chamados

- Gislaine Rosa Biacchi - A reportagem tentou contato, mas não conseguiu nenhum telefone da denunciada

- Jeferson da Costa Marchiori - A reportagem tentou contato, mas não conseguiu nenhum telefone do denunciado

- Juliana Rodrigues Praetzel - Não quis se manifestar sobre o assunto

- Márcia da Silva Schmitz - A reportagem ligou três vezes, na sexta-feira, para o consultório da dentista, mas, durante todas as tentativas, ela estava atendendo pacientes. A secretária disse que ela retornaria ao chamado. Márcia não deu retorno

- Sidney Ricardo Dotto - “Não pretendo falar nada sobre a Dedicação Exclusiva até porque é um ponto bastante duvidoso. Não posso falar de alguma coisa que não tenho certeza. Não é um assunto muito simples. Até a procuradoria jurídica da UFSM tem dúvidas sobre o assunto”

- Walter Blaya Perez  - Preferiu não comentar o assunto

A DEDICAÇÃO EXCLUSIVA

- O artigo 14 do Decreto Presidencial 94.664 de 1987 estabelece que o professor da carreira do Magistério Superior submetido à Dedicação Exclusiva (DE) tem como obrigação “prestar quarenta horas semanais de trabalho em dois turnos diários completos e impedimento do exercício de outra atividade remunerada, pública ou privada”

- A Lei Federal 12.863, promulgada em setembro de 2013, permite atividade extraclasse ao detentor de DE “apenas quando eventual”. O máximo é de 240 horas anuais de trabalho externo (ou 120, quando não autorizadas pelos chefes)

- Professores com Dedicação Exclusiva têm salários maiores do que os demais docentes





ENTREVISTA: Pàula Martins Costa Schirmer, procuradora da República

"Vão repor os valores recebidos indevidamente"

Humberto Trezzi, de Zero Hora



Uma das responsáveis pela investigação que devassou as práticas dos professores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e concluiu que pelo menos 14 deles cometeram crimes, a procuradora da República Paula Martins Costa Schirmer é rigorosa ao definir Dedicação Exclusiva:

— Ela veda expressamente o exercício concomitante de outros vínculos remunerados de natureza pública ou privada por parte do professor.

Os denunciados por Paula são docentes da Odontologia que trabalhavam em consultórios particulares. Nessa entrevista, por e-mail, ela discorre sobre as brechas na legislação que permitem essas distorções:

O que é a Dedicação Exclusiva, o que prevê?

Em síntese, é um regime especial de trabalho, no qual o servidor público deve se dedicar exclusivamente ao desempenho das funções exigidas pelo cargo público que ocupa (como, aliás, o próprio nome do regime sugere), recebendo em função disso um acréscimo pecuniário substancial em seu vencimento. As previsões acerca do exercício desse regime estão descritas na lei, que veda expressamente o exercício concomitante de outros vínculos remunerados de natureza pública ou privada, ressalvando os casos que indica, precedidos de autorização da Universidade.

Tem brechas? Se sim, quais?

Existem exceções legais expressas, que autorizam o desempenho de outras atividades pelo servidor em regime de Dedicação Exclusiva (que, pela própria leitura da lei, referem-se a casos relacionados a atividades acadêmicas, tais como congressos, bancas de concurso, publicações). Admitem também, desde que precedida de autorização específica da universidade, outras atividades de caráter eventual relacionadas à área de conhecimento. Nesse particular, é importante registrar que, nos casos relacionados à UFSM e apurados pelo Ministério Público Federal (MPF) em Santa Maria, não há, em nenhum deles, qualquer tipo de consulta, pedido, autorização, etc., para a prática de outra atividade.

Se o professor fizer uma atividade com anuência e até participação da universidade, como parceria para consultoria privada, isso legaliza a atividade?

A atividade só é legal quando estiver em acordo com as exceções previstas na lei que rege o regime de dedicação exclusiva e atendidos os requisitos ali delineados. Fora dessas hipóteses, eventual anuência ou até participação da universidade em tal atividade não tem o condão de legalizar uma situação contrária à lei. Não impedindo, em tese, a responsabilização civil e administrativa do servidor que violou o regime de DE, assim como de quem eventualmente tenha anuído com essa prática.

Como ficou a apuração da UFSM? Alguém punido ou condenado?

No âmbito das apurações disciplinares (sob a responsabilidade da UFSM), há notícia de várias condenações. Em sua maioria, os docentes foram punidos com pena de suspensão, mas para alguns foi aplicada pena de advertência e até demissão. Além disso, em todos esses casos em que se conclui pela responsabilização, houve a condenação do servidor em repor ao erário a integralidade dos valores recebidos indevidamente a título de DE, o que, invariavelmente, gira em torno de R$ 100 mil a R$ 200 mil. No âmbito do MPF, foram instaurados inquéritos civis para apurar a prática de atos de improbidade administrativa e apresentadas denúncias pela prática de estelionato majorado, que se encontram em fase de instrução.

domingo, 12 de abril de 2015

MESTRADO COM FREQUÊNCIA DUVIDOSA




zero hora 12 de abril de 2015 | N° 18130


ADRIANA IRION


UNIVERSIDADES S/A



Um aluno da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) ganhou notoriedade entre colegas. O médico Heider Aurélio Pinto virou motivo de alvoroço não tanto por ser uma autoridade do Ministério da Saúde, em Brasília – onde ocupa cargo relevante – mas porque teria conquistado o título de mestre em Saúde Coletiva sem frequentar o mínimo de aulas necessárias em Porto Alegre. Titular da secretaria que gerencia o programa Mais Médicos, Hêider defendeu dissertação em agosto de 2014.

Antes de se tornar aluno, Heider já tinha uma relação de parceria com a UFRGS, como representante do Ministério da Saúde. A universidade tem na pasta um aliado para convênios e projetos.

Comparando informações das disciplinas em que ele foi aprovado com dados do Portal Transparência do governo federal, Zero Hora constatou que, em pelo menos 42,6% dos dias de aula Hêider estava em viagens pelo país, a serviço do Ministério da Saúde. Caso tivesse ido a todas as outras aulas, ele só atingiria 57,4% de frequência geral do curso. A universidade, no entanto, exige 75% de presença em cada atividade. De 61 dias de aula, em 26 o médico não poderia estar presente porque cumpria viagens a trabalho.

O Portal Transparência não detalha em todos os casos o percurso das viagens. Mas só em quatro das 26 jornadas a capital gaúcha consta como um dos destinos de Hêider. Se considerada a possibilidade de que ele ter ido à aula em um dos dias de compromissos oficiais, o percentual de ausência, por conta de viagens a trabalho, seria de 36% – ainda assim, a presença estaria aquém da exigida para aprovação.

Outro dado curioso é que mesmo diante deste cenário, os registros no histórico de Hêider apontam 100% de frequência em sete de 13 disciplinas oferecidas em Porto Alegre. E mais: indicam que ele foi um aluno nota 10, já que passou com conceito A em todas as matérias. As informações constam do histórico escolar do aluno obtido por ZH e que tem data de 12 de março de 2014. Na última sexta-feira, a assessoria de imprensa do Ministério da Saúde informou que, no histórico, consta 100% de frequência em duas disciplinas, mas não apresentou o documento ou informou a data de emissão.

A UFRGS e a coordenação do mestrado defendem que o médico preencheu todas as exigências para conquistar o título de mestre. Também traduzem a importância que Hêider, 38 anos, tem perante a instituição.

– Ele foi diretor de atenção básica do Ministério da Saúde. Conheço ele como autoridade nacional. O encontrei quando buscava estabelecer convênios para a universidade, para a atenção básica, em cima das negociações do Hospital Odontológico. A gente quer uma parceria nesse campo, com o Ministério da Saúde. E o Hêider tem uma expertise enorme. Ele pode compensar as atividades de aluno mediante trabalhos, seminários. A pós-graduação tem essa elasticidade de assimilar as experiências dos alunos para estabelecer um programa melhor ainda – diz o vice-reitor, Rui Oppermann.

A vice coordenadora do mestrado em Saúde Coletiva, Stela Nazareth Meneghel, pondera que eventuais queixas podem ter surgido por ressentimento:

– Na pós-graduação muitas experiências, pode ser um congresso, um seminário, podem compor parte da carga horária. Isso significa que nem todos vão ter os mesmos conteúdos dentro da carga horária total. Para um aluno que ficou em sala de aula 30 horas presenciais, se o outro teve 15 horas em outro local, ele pode se sentir ressentido, sim. A gente vive numa sociedade extremamente competitiva, individualista.

Sobre o desempenho de Hêider, Stela garante ter sido o suficiente para aprovação dentro das regras:

– Posso assegurar que ele teve frequência, não 100%, mas a mínima nossa, que é 75%, para as (disciplinas) obrigatórias. Algumas foram feitas condensadas, sexta e sábado, até domingo. Ele teve frequência mínima nas obrigatórias. É um excelente profissional, nos sentimos honrados de ter entre nossos alunos profissionais do Ministério da Saúde, isso significa mais um selo de avaliação e de validação da nossa universidade e nosso mestrado.

A boa relação entre UFRGS e Ministério da Saúde é inegável. Uma das iniciativas que marcam essa parceria é a Rede Governo Colaborativo em Saúde. A coordenação nacional do projeto é feita na UFRGS, sob responsabilidade do professor Alcindo Ferla, orientador de Hêider na pós-graduação.

Hêider ingressou no Ministério da Saúde em 2011 para dirigir o Departamento de Atenção Básica. Desde abril de 2014, ocupa o cargo de secretário de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, setor que gerencia o Mais Médicos. Ferla e o professor Ricardo Burg Ceccim, coordenador do mestrado, também atuaram no ministério. Mesmo admitindo a relação anterior com os dois, Hêider refuta que tenha sido favorecido no curso:

– Atualmente, como as demais secretarias do Ministério da Saúde, posso ordenar despesas com universidades e, claro, essas cooperações são realizadas com as universidades públicas. A secretaria que dirijo se relaciona com mais de 80 universidades. Considero um absurdo tentar relacionar minha atuação pública enquanto gestor com qualquer tipo de favorecimento no programa de pós-graduação, tendo eu prestado concurso, cumprido todas as regras do programa e tendo produzido cinco artigos e um capítulo de livro, quando a média do número de artigos da maioria dos demais alunos do mesmo programa foi de um artigo submetido.

A coordenação do mestrado admite que Hêider pode não ter estado sempre presente, mas ressalta que normas permitem que alunos completem a carga horária em até 100% com atividades à distância. É o que diz o parágrafo 3º do art 43 do regimento interno do curso: “O aluno deverá ter, no mínimo, 75% de frequência na carga horária prevista em cada atividade de ensino a que se matricule, podendo a mesma ser demonstrada por diferentes atividades de aprendizado a distância, a critério do professor”. Parte deste trecho do regimento, no entanto, foi publicada somente em 26 de agosto de 2014, quando faltavam dois dias para Hêider defender sua dissertação. A regra em vigor antes não continha a parte “podendo a mesma ser demonstrada por diferentes atividades de aprendizado a distância, a critério do professor”. Gestores da universidade com os quais ZH conversou dizem estranhar a construção da norma, que deixa a avaliação para compensações a critério direto do docente.

Quanto ao prazo de validade do regimento, Ceccim garante que a norma é retroativa e tem valor para alunos matriculados a qualquer tempo.

– O fundamental é que o aluno nunca perde direitos, pode apenas adquiri-los – diz Ceccim.

ZH pediu à UFRGS uma manifestação sobre novas normas (o regimento interno de um curso) valerem retroativamente, ampliando benefícios.

Conforme a assessoria de imprensa, “não há norma sobre poder ou não retroagir (nem seria pertinente que houvesse, pois seria tão abrangente e genérica a ponto de torná-la ineficaz). Pensemos sobre a retroatividade da norma: há contextos em que pode e deve retroagir, como para corrigir distorções de outra norma, por exemplo. Uma norma sobre esse tema não seria capaz de contemplar todas as possibilidades, então não seria possível editá-la. Diante desse cenário, o que ocorre é a análise caso a caso. Sobre o regimento, é possível que ele tenha efeitos retroativos, sim, desde que essa decisão seja tomada por um colegiado, e desde que as novas normas não visem ao prejuízo dos estudantes”.

Se a carga horária de disciplinas do mestrado em Saúde Coletiva podia ser completada em até 100% fora de aula, a regra não estava clara para todos.

– Não tive conhecimento da possibilidade de alguém poder completar disciplinas com atividades externas – garante uma aluna do mestrado que conversou com ZH, pedindo preservação do nome.

A própria resolução nº 01/2013 do mestrado em Saúde Coletiva, apresentada pela coordenação para validar a informação de que os alunos podem compensar aulas com seminários, dá limites. O texto diz que obtenção de créditos por publicação científica, participação em eventos científicos e apresentação de conferências e palestras não pode ultrapassar 55% dos créditos previstos no curso. Além disso, há regras formais para a educação a distância.

Nesse quesito, a UFRGS segue a Legislação Federal. O artigo 1° do Decreto nº 5.622/2005 define a Educação a Distância como “modalidade educacional na qual a mediação didático-pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos”. Mas é preciso lembrar: o curso em questão é presencial.

O mestrado em Saúde Coletiva teve atividades desenvolvidas entre o segundo semestre de 2012 e o segundo semestre de 2014. As aulas foram ministradas em dias e horários variados, algumas, com períodos o dia inteiro, outras só pela manhã ou à tarde. Também quinzenais e aos sábados.

– O comentário sobre ele era geral, sobre não aparecer nas aulas. Mas ninguém levou adiante por temer problemas com professores – conta uma colega de Hêider no mestrado, que não se identifica por receio de represálias dentro da escola.

O mal-estar de alunos em relação à ausência de Hêider era tanto que docentes chegaram a levar informações a gestores, mas não houve apuração oficial do caso. A partir das suspeitas, Zero Hora fez uma busca para verificar se as ausências se confirmariam. Com pedido pela Lei de Acesso à Informação, obteve junto à UFRGS a grade de disciplinas e de horários oferecidos para o mestrado em Saúde Coletiva. Com o registro de disciplinas em que Hêider se matriculou a cada semestre, a partir do histórico, também foi possível cruzar informações com dados sobre viagens feitas por ele pelo Ministério da Saúde.

A coordenação do mestrado diz que as informações do histórico obtido por ZH “não correspondem” 100% ao histórico do aluno, mas se negou a informar o teor do documento, alegando sigilo. A vice-coordenadora também disse não ser possível revelar o percentual de atividades externas feito por Hêider para compor carga horária. Questionado sobre como o aproveitamento dessas atividades é demonstrado no histórico do aluno (se seria como validação, por exemplo), o coordenador do mestrado afirmou que isso “não aparece no histórico, fica expresso pelo conceito final”.

– Na pós, não há regra geral. Tem de cumprir créditos, que incluem atividades, presenciais ou não. A grande maioria é presencial, mas ele pode ganhar créditos de outra forma. Seminários, trabalhos – afirma o vice-reitor da UFRGS, Rui Oppermann.

Mas se a grande maioria do que tem de ser cumprido é presencial, Hêider realmente não teria como tê-lo feito em função dos compromissos pelo Ministério. ZH também fez levantamento a partir da grade completa de disciplinas oferecidas no curso – sem levar em conta apenas as disciplinas em que Hêider foi aprovado e que constam do histórico datado de março. Ao cruzar as datas de aulas de quatro semestres (de 2012/2 a 2014/1, com exceção de quatro disciplinas que não tinham descrição dos dias de aula) com viagens do médico, apurou que em pelo menos 35,1% dos dias ele estaria impossibilitado de estar presente em sala de aula.


 


NA UFSC, BRECHAS ABERTAS



ZERO HORA 12 de abril de 2015 | N° 18130


LUIS ANTONIO HANGAI | Diário Catarinense


UNIVERSIDADES S/A



Na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) são movimentados cerca de R$ 195,8 milhões pelas quatro principais fundações que atuam no maior campus do Estado, segundo dados do Tribunal de Contas da União (TCU). O volume é grande, mas a transparência, não: órgãos de controle apontam falhas na prestação de contas, consideradas brechas para atos irregulares.

A Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu) é a de maior volume financeiro no sul do país – em 2014 teve R$ 137,7 milhões em despesas executadas. É investigada tanto pelo Ministério Público Federal quanto pelo Ministério Público de Santa Catarina por irregularidades na aplicação de verba pública em repartições da universidade. A investigação é por suposto fornecimento de “bolsas permanentes” de pesquisa e extensão a professores com dedicação exclusiva à universidade. De acordo com a promotoria, os recursos repassados podem ter se tornado rotineiros, funcionando como uma espécie de salário fixo aos beneficiários, o que contraria a lei.

O mais recente relatório da regional catarinense da Controladoria Geral da União (CGU), referente às contas da UFSC de 2013, assinala uma série de pontos de atenção. Entre as recomendações estão o impedimento de novos contratos e convênios com entidades inadimplentes e mais transparência nas informações sobre projetos em andamento. A CGU também alerta que a UFSC descumpre hoje a legislação por não atualizar os dados no Sistema de Convênios do Governo Federal (Siconv), um sistema digital para o controle de transferências de recursos.

– Estamos caminhando para usar o Siconv, onde as notas já são inseridas pela internet. Existe uma resistência das fundações, evidentemente, porque você precisa ficar online prestando conta do processo. Temos diversas prestações de contas, cerca de 350 convênios e contratos, que estão sendo levantados pela pró-reitoria de administração – afirma o chefe de gabinete da reitoria da UFSC, Carlos Vieira.

EM SÃO PAULO, FUNDAÇÕES SÃO QUESTIONADAS



ZERO HORA 12 de abril de 2015 | N° 18130


PAULO SALDAÑA


UNIVERSIDADES S/A



Negócios paralelos, que confundem as esferas pública e privada, têm colocado as três universidades estaduais de São Paulo – USP, Unesp e Unicamp – na mira de tribunais de contas, Judiciário e Ministério Público. Intermediações de convênios federais com terceirização de serviços, aluguel de espaço público, gestão de verbas da própria universidade e cobrança de taxas de administração são algumas das irregularidades envolvendo a atuação de fundações privadas ligadas às universidades. A cobrança por cursos continua ganhando espaço.

Na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), as atribuições e a gestão de recursos de uma fundação privada se misturam com as da própria instituição. A Funcamp gerencia almoxarifados, reforma e gere hospitais (há um convênio no valor de R$ 711 mil com o Hospital das Clínicas) e cobra taxa de administração de 6%. São atividades não permitidas e distantes da finalidade da fundação. A Funcamp também recebeu recursos originários da universidade, como taxas de inscrição em vestibulares, de formaturas, comercialização de livros, publicações de periódicos, venda de camundongos, softwares, mudas, plantas e realização de eventos.

Praticamente toda atuação da Funcamp foi considerada irregular pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) no fim do ano passado – seria uma “terceirização exagerada”. O convênio feito para tocar as atividades é prorrogado desde 1987, o que por si só já viola a legislação.

Uma das principais fundações de apoio à USP, a Fusp, foi questionada pela Controladoria Geral da União (CGU) em dezembro. Ela é titular de um convênio com o Ministério da Cultura (MinC) para o projeto da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP). Além de intermediar o serviço, o que é ilegal, a Fusp ainda subcontrataria uma ONG, chamada Capina, para o projeto de economia criativa. Também cobrava um aluguel pelo uso de um dos espaços da universidade, no valor de R$ 79 mil. Depois que a CGU reprovou o convênio, de R$ 502 mil, a União congelou o repasse do MinC. A USP informou que trabalha para avançar com a proposta, argumentando que a “interrupção tem acarretado desmobilização da equipe e dos empreendimentos”.

UFPR É USADA PARA DRIBLE EM LICITAÇÕES NO DNIT E NA PETROBRAS



ZERO HORA 12 de abril de 2015 | N° 18130


FELIPPE ANÍBAL


UNIVERSIDADES S/A



A Petrobras e o Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit) vêm usando a Universidade Federal do Paraná (UFPR) para driblar licitações públicas – sobretudo em obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC). Enquanto um núcleo restrito de professores recebe bolsas polpudas para análises técnicas que deveriam ser contratadas por concorrência, mais da metade das verbas vai para as mãos de empresas e profissionais externos, subcontratados em um processo pouco transparente.

E não é pouco: 24 acordos analisados pela Gazeta do Povo movimentaram R$ 74 milhões. Só com o Dnit, os convênios passam dos R$ 58,8 milhões. São operacionalizados por um único núcleo: o Instituto Tecnológico de Transportes e Infraestrutura (ITTI), vinculado ao Departamento de Transportes da UFPR, e sediado em uma sala de aula comum do Centro Politécnico. A maioria dos serviços diz respeito a obras realizadas em estados distantes – como Mato Grosso do Sul, Bahia, Tocantins e Manaus – onde a UFPR sequer tem estrutura.

A parceria com a Petrobras mantém pelo menos 11 acordos, que somam R$ 15 milhões. Estes, por sua vez, estão pulverizados em diferentes departamentos. Outro convênio com a Companhia Paranaense de Energia (Copel) – orçado em R$ 2,2 milhões – segue os mesmos moldes.

Conforme a Lei de Licitações, o poder público é dispensado de concorrência ao fazer acordos com instituições de ensino. Mas um acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) e outra lei federal (a 8.958) proíbem subcontratar “as parcelas mais relevantes” do objeto.

A questão é que o índice de terceirizações nesses convênios tem ultrapassado com folga os 50% do volume financeiro dos projetos. É como se a UFPR tivesse atuado como uma agenciadora, repassando serviços a empresas e profissionais. Ao mesmo tempo, o grande índice de subcontratações torna difuso o benefício acadêmico na parceria. Por exemplo, a universidade recebeu do Dnit R$ 1,8 milhão para atuar no projeto conhecido como Passo do Jacaré, em Mato Grosso do Sul. Mais de 53% deste valor (R$ 983,9 mil) foi destinado a outras empresas. No convênio da BR-285, mais de 46% do convênio foi repassado à iniciativa privada.

A Procuradoria Federal e conselhos da UFPR já haviam apontado irregularidades nos convênios. Mesmo com os alertas, as parcerias foram mantidas. A universidade alega que os trabalhos são extensão universitária. No entanto, um parecer emitido pela Procuradoria Federal em outubro de 2011 – que analisava um projeto com o Dnit para avaliações nos portos de Manaus – classifica o acordo como mera “prestação de serviços” e determina que o Dnit abra licitação para o trabalho.

O reitor da UFPR, Zaki Akel Sobrinho, não vê qualquer problema nos convênios com a Petrobras ou com o Dnit. A aproximação do setor produtivo e de empresas públicas e privadas, diz ele, faz parte de uma política da instituição de atuar para além de seus próprios muros e servir à sociedade:

— Sempre defendo que a universidade deve resolver os problemas concretos da sociedade. Não temos aquela imagem da universidade como uma torre de marfim, pesquisando coisas que não têm aplicabilidade.

A UFPR entende que o alto índice de subcontratações não fere a lei. O reitor e a pró-reitora de planejamento, orçamento e finanças, Lúcia Regina Montanhini, argumentam que o núcleo dos projetos é realizado pela equipe da universidade.

– Estamos atendendo no Pará, mas não temos base lá. Não tem sentido deslocar uma equipe de professores até lá para fazer um mapeamento. Então, subcontratamos. Mas a parte de inteligência sempre fica nas mãos da universidade – exemplifica Akel Sobrinho.

PROFESSORES TERIAM LUCRADO R$ 10 MILHÕES EM CONVÊNIO COM PETROBRAS



ZERO HORA 12 de abril de 2015 | N° 18130


LAURO NETO | O Globo


UNIVERSIDADES S/A



Um contrato de R$ 17 milhões entre a Petrobras e a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) é alvo de investigação pelo Ministério Público Federal no Rio de Janeiro (MPF-RJ). Entre as irregularidades apontadas pela Controladoria Geral da União (CGU), estão o fato de que seis professores de dedicação exclusiva da universidade recebiam também como pesquisadores- bolsistas e sócios de empresas subcontratadas sem licitação, faturando quase R$ 10 milhões, segundo documentos a que o jornal O Globo teve acesso desde 2012.

Em 2008, a Unirio e a Petrobras firmaram um convênio de R$ 17,16 milhões para executar um Projeto de Desenvolvimento de Metodologia e Técnicas de Modelagem em Processos de Negócios e Administração de Dados. As obrigações junto à estatal foram, então, assumidas pela Fundação de Apoio e Pesquisa, Ensino e Assistência à Escola de Medicina e Cirurgia e ao Hospital Universitário Gaffrée Guinle (Funrio).

A partir daí, segundo a investigação, quatro empresas foram subcontratadas pela Funrio. Todas tinham, como sócios, professores da Unirio, em regime de dedicação exclusiva. As empresas faturaram cerca de R$ 2 milhões. Além disso, cada um dos seis professores envolvidos, segundo a CGU, teria recebido R$ 907.290 em bolsas como pesquisadores sêniores durante os 48 meses do projeto, totalizando R$ 5,5 milhões.

A professora Cláudia Capelli, por exemplo, acumulava o cargo de docente em dedicação exclusiva (salário de R$ 9.760,33) e as funções de coordenadora técnica do projeto, bolsista na função de pesquisadora sênior, fiscal do contrato celebrado entre a Unirio e a Funrio, além de ser sócia de duas empresas, que receberam juntas R$ 1.281.115,99.

Quatro Processos Administrativos Disciplinares (PADs) foram abertos, desde 2012, para apurar as responsabilidades dos professores. Só um foi encerrado. Presidido pelo ex-procurador da República e professor de Direito da Unirio Paulo de Bessa Antunes, o processo concluiu pela demissão dos professores Leonardo Azevedo, Cláudia Capelli, Fernanda Araújo, Flávia Santoro e Renata Mendes, além da suspensão da docente Kate Ferreira.

Todos deveriam devolver os valores recebidos pelas empresas de que faziam parte – assim como o dinheiro recebido a título de dedicação exclusiva. O PAD, porém, foi anulado pela Procuradoria Federal da Unirio por “inobservância do princípio da ampla defesa e do contraditório”.

– Fizeram isso para acomodar. Nossa comissão fez o trabalho que tinha de ser feito. Foi respeitado o devido processo legal e o amplo direito à defesa – diz Bessa.

Em abril de 2014, o Tribunal de Contas da União (TCU) publicou acórdão determinando que a Unirio informasse como ressarciria os danos ao Erário. O escritório Chediak Advogados, que representa as professoras Cláudia, Fernanda, Flávia e Renata, tentou celebrar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) como alternativa à aplicação de sanções, o que foi indeferido pelo Ministério da Educação (MEC).

Em seu último despacho à frente do inquérito civil público sobre o caso, o hoje procurador-chefe do MPF-RJ, Lauro Coelho Junior, destacou haver elementos suficientes para “evidenciar a prática de atos de improbidade administrativa e ainda dos crimes previstos no art. 312 do Código Penal e art. 89 da Lei nº 8.666/93”. Os crimes – apropriação de dinheiro ou bens por funcionário público e desrespeito à Lei de Licitações – preveem penas de multa e até detenção, que pode chegar a 12 anos no caso de desvio de verbas. Apesar disso, até o momento não foi instaurado inquérito criminal.

ESTELIONATO EM SANTA MARIA



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UNIVERSIDADES S/A




Na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), um grupo de professores da Faculdade de Odontologia – com salários maiores por terem dedicação exclusiva (DE) – foi denunciado criminalmente por manter atividades remuneradas fora da instituição. Isso contraria cláusula que determina: ao assumir o cargo com DE, o docente se compromete em desenvolver atividades ligadas apenas à universidade ou que sejam autorizadas por ela. Não era o caso, concluiu o Ministério Público Federal (MPF), após pesquisa junto a cursos de Odontologia particulares, clínicas de radiologia odontológica e planos de saúde perguntando quais dos profissionais citados haviam prestado ou pedido serviços privados.

Foram investigados 30 professores, que representam metade dos docentes da Odontologia, faculdade que forma até 35 dentistas por ano. Dos 30 investigados, 14 acabaram denunciados por estelionato (quando a pessoa obtém uma vantagem mediante fraude contra alguém), com base inclusive num termo assinado por eles, no qual asseguravam não exercer outra atividade fora da universidade. As investigações mostraram o contrário. Outros quatro ainda respondem a inquérito.

Todos os denunciados tinham assinado um documento no qual se lê:

“Declaro que tomei conhecimento das disposições constantes no Extrato da Resolução UFSM nº 004/95, bem como não possuir outra atividade remunerada pública ou privada, a partir do meu ingresso no regime de dedicação exclusiva”.

E o que diz essa resolução da UFSM? Confira:


I - “Dedicação Exclusiva, com obrigação de prestar 40 horas semanais de trabalho, em dois turnos diários completos, com impedimento do exercício de outra atividade, seja ela privada ou pública, inclusive autônoma”.

As exceções seriam contratos esporádicos que envolvam pesquisa, mas o MPF concluiu que os serviços prestados pelos professores fora das salas de aula nada tinham de esporádicos, nem de científicos. Eram mesmo atividade profissional privada e sistemática, alheia à universidade.

Conforme planilha apresentada pela UFSM, os valores recebidos por um dos denunciados, entre abril de 2007 e abril de 2012, a título de dedicação exclusiva, foram de R$ 302.259,10. Só que no mesmo período ele obteve outros R$ 583 mil atuando como dentista em consultórios privados, apurou a polícia.

O inquérito policial constatou que, no tempo em que estavam nos consultórios, os professores deixaram de estar disponíveis para os alunos, de fazer pesquisas, de estudar mais para dar aulas. E concluiu que isso trazia prejuízo para os estudantes.

A procuradora da República Paula Martins Costa Schirmer, responsável por denunciar os professores, ressalta:

– O crime consiste em perceber o que não lhe era devido, mediante fraude, em prejuízo aos cofres públicos, uma vez que sabiam que estavam impedidos por lei a tanto. E, por isso, eram melhor remunerados que os demais docentes.

Paula diz que as investigações comprovam que jamais existiram dúvidas acerca da proibição de exercício de atividade remunerada concomitante, de forma habitual e sistemática, como eles faziam nos consultórios dentários.

A defesa dos denunciados tem sustentado o contrário. Basicamente, alega que se tratava de fato “que todo mundo sabia” e por isso não haveria má-fé. E que o servidor (a grande maioria com mestrado/doutorado) não sabia que dedicação exclusiva demandava exclusividade à UFSM. Alguns sugerem a existência de dúvida quanto à abrangência da exclusividade, embora exista um decreto que regule isso. (Humberto Trezzi)

DEDICAÇÃO NEM TÃO EXCLUSIVA ASSIM






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HUMBERTO TREZZI


UNIVERSIDADES S/A



Para estimular que docentes coloquem todos os seus esforços na formação dos alunos, as universidades públicas brasileiras decidiram pagar um extra de até 50% sobre o salário-base. É a chamada dedicação exclusiva (DE). E, para garantir que não existam distorções nessa função tão nobre, uma série de regras foi criada. O artigo 14 do decreto presidencial 94.664 de 1987 estabelece, por exemplo, que o professor de carreira do Magistério Superior submetido à dedicação exclusiva tem como obrigação “prestar quarenta horas semanais de trabalho em dois turnos diários completos e impedimento do exercício de outra atividade remunerada, pública ou privada”. Já a lei federal 12.863, promulgada em setembro de 2013, permite atividade extraclasse ao detentor de DE “apenas quando eventual”. O máximo é de 120 horas anuais de trabalho externo (ou 240, quando autorizadas pelos chefes).

Nada disso consegue evitar que, em entidades de ensino superior gaúchas, boa parte do empenho dos professores aconteça longe da sala de aula. Há serviços extraclasse não tão eventuais. Em cursos da UFRGS, alguns professores que possuem DE recebem quantias substanciais realizando projetos ou serviços para grandes empresas. Na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), outros atuam em consultórios particulares.

De exclusiva, a atividade exercida por eles tem muito pouco. Por isso o Ministério Público Federal (MPF) abriu, em dezembro, uma investigação sobre parcerias firmadas pelo Instituto de Geociências da UFRGS. A lista de trabalhos externos desse instituto soma mais de 70 convênios envolvendo variados docentes do curso nos últimos anos. O levantamento é de procuradores da República, que desejam saber se os docentes envolvidos seguem a legislação da DE. Alguns professores trabalham em dois convênios por ano ou até mais: a suspeita é de que a eventualidade virou regra.

Serão checados convênios firmados por geólogos como Juliano Kuchle, Claiton Marlon dos Santos Scherer e Paulo Alves de Souza, que desenvolvem vários projetos de forma concomitante com aulas. Cada um deles teve aprovados em 2014 pelo menos dois convênios externos. Em um convênio com a petrolífera BG (British Gas), Kuchle receberá R$ 216 mil; Scherer, R$ 135 mil; e Souza, R$ 116 mil para trabalhar entre 2014 e 2016 no projeto “Estudo Geológico Integrado da Formação Mucuri da Bacia do Espírito Santo”, vinculado à extração do pré-sal. Chamou a atenção do MP que, caso esses docentes trabalhem, cada um, as 156 horas previstas no projeto, vão receber em média R$ 1 mil por hora nesse serviço. Isso representaria cerca de 10 vezes mais que a média recebida como professores com dedicação exclusiva, que é de R$ 87 por hora de trabalho — conforme cálculo do Sindicato Nacional de Docentes de Ensino Superior (Andes-SN).

Não é um caso isolado. Juliano deve receber ainda mais R$ 72 mil por outro projeto aprovado em 2014 e Claiton Scherer, R$ 36 mil, com dezenas de horas trabalhadas, cada. A hora de trabalho deles nesses convênios também equivale a 10 vezes o padrão para a hora de dedicação exclusiva no sistema de ensino federal. Já o terceiro autor do projeto da Formação Mucuri, Paulo Alves de Souza (que vai receber R$ 116 mil por esse trabalho), também conseguiu aprovar outro projeto em 2014.

A Procuradoria da República investiga se, ao ganharem em alguns convênios mais dinheiro fora do que dentro da universidade (proporcionalmente), os professores incorrem em conflito de interesses. Na investigação será analisado se os valores são compatíveis com os serviços, se extrapolam em muito os vencimentos dos professores, se os beneficiários conseguem concluir o serviço com as horas contratadas e se há desvio de função. O currículo de Claiton Marlon Scherer, por exemplo, menciona envolvimento dele em pelo menos seis projetos com petrolíferas nos últimos quatro anos – além dos dois aprovados agora. O MPF quer saber se esse tipo de envolvimento permite cumprir as regras de dedicação exclusiva à universidade.

O presidente do Andes-SN, Paulo Rizzo (docente da Universidade Federal de Santa Catarina), vê restrições éticas na avalanche de convênios universidade-empresas. Professores que atuam muito fora da academia ensinam menos e pior quando estão desfocados, acredita. Ele não é contra que atuem fora da sala de aula eventualmente, desde que esta exceção não vire regra:

– As universidades produzem conhecimento novo, e não devem vender serviços de saberes já existentes e socializados. Ou os docentes vão competir com os profissionais que formam.

Nas reuniões para aprovação de projetos do Instituto de Geociências há debate interno sobre tamanhos e valores dos convênios. Alguns colegas dos beneficiados são contrários a esses projetos com remuneração externa. Dizem que os trabalhos não são eventuais (exigência para quem tem DE), já que certos projetos ultrapassam 20 meses cada um.

Outros questionam: como fazer as pesquisas de campo – longe da UFRGS, em viagens – e manter as aulas em dia? Os cursos fiscalizam mesmo se a consultoria externa cumpre as horas acertadas no papel? Difícil checar, já que os docentes (mesmo com dedicação exclusiva) são dispensados do controle de frequência no Plano de Carreira para a área de Ciência e Tecnologia.

A discussão sobre trabalho externo esconde um debate maior, de fundo ideológico. Uma corrente de professores na UFRGS crê que alguns colegas têm abusado de convênios, bancados por multinacionais, já que a dedicação exclusiva pela qual recebem deveria ser suficiente para abraçarem apenas a universidade. Acham que as multinacionais buscam a UFRGS, a peso de ouro, para dar respeitabilidade aos seus projetos.

Outra linha de pesquisadores quer ampliar a interação com empresas. O diretor do Instituto de Geociências, André Mexias, é um dos defensores. Ele garante que seus subordinados cumprem à risca as obrigações em sala de aula, além de trazerem recursos à UFRGS.

– Muitos trabalhos de pesquisa externa pagam melhor, mas os professores são procurados pelas empresas. Desde que não deixem de fazer suas obrigações na UFRGS, OK. Seus projetos passaram por várias instâncias de análise – pondera.

O vice-reitor da UFRGS, Rui Oppermann, defensor convicto de maior interação com empresas, afirma que os valores recebidos pelos professores nesses convênios não podem ser medidos em horas-aula. Isso porque envolvem pesquisa e resultados não mensuráveis com mera presença na universidade.

– Não se pode comparar aula dada com a pesquisa de ponta feita para uma petroleira – rebate.

Mas a interação com o meio privado não é ponto pacífico. O professor Rualdo Menegat, chefe do Departamento de Estratigrafia da Geociências (onde trabalham os professores Juliano, Claiton e Paulo), diz que o debate é grande e afirma que ele, por exemplo, não trabalha fora da UFRGS.

– Sou 100% acadêmico, 100% universidade federal – posiciona-se.



UNIVERSIDADE É QUEM MENOS LUCRA


A interação entre o mundo acadêmico e o empresarial, além de mantra dos reitores (por garantir recursos extras e prestígio à universidade pública), virou um complemento na renda de docentes. É o que mostra o levantamento dos projetos de extensão, pesquisa, cooperação e serviços prestados por professores da UFRGS para empresas públicas ou privadas.

Zero Hora analisou uma lista de 98 projetos de interação universidade-empresa realizados em 2014 pela UFRGS. O relatório foi fornecido pela própria universidade, mediante solicitação feita com base na Lei de Acesso à Informação.

Os números indicam que a interação é um bom negócio financeiro. No levantamento repassado pela UFRGS a ZH, esses projetos envolvendo empresas externas somam R$ 26 milhões ao longo de um ano. Os professores ficam com boa parte do dinheiro: R$ 4 milhões (17%). O curioso é o percentual que fica para os cofres da universidade: apenas 5%. A UFRGS recebeu R$ 1,27 milhão ao longo de 2014 nos convênios, que incluem a permissão a que seus professores exerçam atividades fora das salas de aula. Já as fundações ligadas à universidade ficaram com R$ 1,1 milhão. O vice-reitor da UFRGS, Rui Oppermann, diz que os 5% da universidade são apenas nominais.

– Esses são os repasses de custeio, mas o ganho real da UFRGS é muito maior. Ganhamos equipamentos, químicos para laboratório, temos divulgação do bom nome da universidade. Os alunos recebem banco de dados riquíssimo oriundo dos convênios, trocam experiências com profissionais em campo. Tudo isso é positivo e imensurável – pondera Oppermann.

E no que, então, foram investidos os outros R$ 18 milhões, que representam a maior parte dos convênios? Em bolsas. A maioria para alunos, mas, em muitos casos, também para professores. Ou seja, professores ganham em duas rubricas.



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UNIVERSIDADES S/A

Investigação conjunta de cinco jornais brasileiros mostra como as relações entre universidades públicas e agentes privados, necessárias para a sociedade, abriram portas para ilegalidades e conflitos éticos


Poucos questionam a necessidade de as universidades públicas se abrirem para uma relação com outras instituições e os benefícios dessa abertura, tanto para a academia quanto para a sociedade. Porém, o modelo também abre espaço para irregularidades. Proliferam negócios que resultam em mais lucros para alguns indivíduos do que para a comunidade – que deveria ser a beneficiária maior de um organismo sustentado com dinheiro público. Contratos obscuros envolvem professores que são, em alguns casos, docentes e donos das empresas beneficiadas – o que é proibido por lei. Intermediações por fundações imersas em ilegalidades ajudam a maquiar a ausência de licitações.

Reportagem realizada em conjunto em cinco Estados brasileiros pelos jornais Zero Hora, Diário Catarinense, Gazeta do Povo, O Estado de S. Paulo e O Globo fez uma imersão em instituições que são berçários do conhecimento e da pesquisa do país. E constatou que, em vários casos, as relações sofrem com falta de transparência.

Fundações acadêmicas são usadas, por exemplo, para mediar serviços de cifras milionárias e que, muitas vezes, nada têm a ver com os objetivos das universidades. É o caso de obras públicas que deveriam ser licitadas, mas cuja concorrência é burlada mediante o uso de especialistas convocados nas universidades. Já alguns professores, mesmo com regime de dedicação exclusiva à academia, multiplicam salários com trabalhos paralelos – ainda que isso signifique, em certos casos, conflito ético ou atividade irregular, caso de docentes em Santa Maria que mantêm clínicas privadas.

Tudo isso ocorre porque brechas em um sistema pouco transparente facilitam o desvio de uma função fundamental dos convênios: manter a universidade atualizada e evitar que o conhecimento produzido permaneça enclausurado na academia.

No Rio, O Globo mostra que seis professores contratados por dedicação exclusiva faturaram R$ 10 milhões a mais como pesquisadores-bolsistas e ainda são sócios de empresas subcontratadas sem licitação em serviços para a Petrobras (embora recebam para se dedicar apenas à academia). No Paraná, a Gazeta do Povo explica como a universidade é usada para driblar licitações de conserto de estradas. No Rio Grande do Sul, ZH aponta que alguns docentes são mais bem pagos por hora trabalhada fora da universidade do que dentro (algo contraditório com a dedicação exclusiva que abraçaram). Em São Paulo, O Estado de S. Paulo revela que negócios paralelos têm colocado as três universidades estaduais – USP, Unesp e Unicamp – na mira de tribunais de contas, Judiciário e Ministério Público.

Fundações, aliás, são parte fundamental da caixa-preta das universidades. Entre janeiro de 2013 e julho de 2014, elas receberam R$ 1,4 bilhão do governo federal, conforme levantamento feito pela ONG Contas Abertas. Mais de 2,5 mil fundações trabalham com o meio acadêmico brasileiro e são usadas cada vez mais na intermediação de serviços. Muitas são entidades criadas e geridas por docentes que participam da direção da universidade, com frequência em flagrante conflito de interesses.

Quem perde com tudo isso? Os alunos, quando parte do esforço da universidade pública é desviada para finalidades não acadêmicas. E o contribuinte, que sustenta o cotidiano da academia.

COMO FOI FEITO

Na investigação, os repórteres utilizaram a Lei de Acesso à Informação e também ferramentas fundamentais para o acesso a dados, como os portais de transparência federal e estaduais.

Os jornalistas ouviram 105 pessoas e pesquisaram mais de 3,2 mil páginas de documentos, entre inquéritos, processos administrativos, acórdãos, relatórios de auditorias, contratos, convênios, planilhas de pagamento e notas fiscais.