EDUCAÇÃO MULTIDISCIPLINAR

Defendemos uma política educacional multidisciplinar integrando os conhecimentos científico, artístico, desportivo e técnico-profissional, capaz de identificar habilidade, talento, potencial e vocação. A Educação é uma bússola que orienta o caminho, minimiza dúvidas, reduz preocupações e fortalece a capacidade de conquistar oportunidades e autonomia, exercer cidadania e civismo e propiciar convivência social com qualidade, dignidade e segurança. O sucesso depende da autoridade da direção, do valor dado ao professor, do comprometimento da comunidade escolar e das condições oferecidas pelos gestores.

segunda-feira, 31 de março de 2014

FALTA DE PROFESSORES E DE GESTÃO


ZERO HORA 31 de março de 2014 | N° 17749


EDITORIAIS



O confronto entre o governo e dirigentes do Cpers em torno da portaria sobre a falta de professores na rede pública expõe mais um exemplo das carências de gestão na educação. Por determinação do setor público, as escolas têm 24 horas para informar o Estado sobre a falta de professores. A medida foi adotada como parte das tentativas de racionalizar a solução de um problema crônico. Para os sindicalistas, o que a portaria expressa é uma transferência de responsabilidade da Secretaria de Educação para as direções das escolas. Diz o Cpers que as escolas já informam às autoridades quando um professor se ausenta e isso provoca transtornos no cumprimento das tarefas previstas.

É óbvio que cabe à direção de uma escola informar aos seus superiores sobre a eventual falta de profissionais, para que as providências sejam tomadas. É assim em qualquer atividade e não há por que ser diferente na área do ensino. O que o Cpers alega é que tal providência já vem sendo tomada regularmente. Afirmam os líderes da categoria que, ao publicar a portaria, o governo tenta insinuar que os diretores não costumam comunicar suas chefias. Assim, no entendimento do sindicato, a versão do governo para a não reposição de professores é a de que as direções seriam relapsas.

É constrangedor que, com tantos problemas a resolver, um sindicato e a alta cúpula da Educação prolonguem um confronto em torno de um tema aparentemente banal. Se Estado e Cpers não conseguem se entender sobre a forma de melhor gerenciar, no cotidiano das escolas, ausências no corpo docente, certamente não chegarão a um acordo sobre questões bem mais complexas. Que o conflito reafirme uma lição às partes envolvidas. A mais elementar, mas nem sempre levada a sério, é a de que gerir a educação significa bem mais do que cumprir atribuições pedagógicas. Gestores são também os que administram carências de recursos e imprevistos com sabedoria.

sábado, 29 de março de 2014

A EDUCAÇÃO E OS PONTOS DE VISTA

ZERO HORA 29 de março de 2014 | N° 17747

ARTIGOS


 por Ronald Krummenauer*




O Brasil revolucionou o acesso à educação nos últimos 50 anos. Nossos pais ou avós não encontravam escolas para estudar, e hoje, em quase todo o país, as vagas estão disponíveis e isso é muito bom. Mas, infelizmente, por enquanto, a revolução parou aí.

Na mais recente avaliação do Pisa – Programa Internacional de Avaliação de Estudantes –, o Brasil ficou em 58º em matemática, 55º em leitura e em 59º em ciências. Muito pouco para um país que vem quantitativamente abrindo vagas há mais de 50 anos. Como os números demonstram nesta e em outras avaliações, qualitativamente ainda temos um longo caminho a percorrer.

O Pisa é realizado em 65 países. É uma iniciativa internacional de avaliação comparada, aplicada a estudantes na faixa dos 15 anos, idade em que se pressupõe o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países. Esse indicador mostra como estamos. E não estamos bem.

Olhando para os responsáveis por essa educação, ou seja todos, quais são os pontos de vista? Dos pais, a satisfação de ter uma escola disponível para os filhos já é um grande alívio. Dos governos, a escassez dos orçamentos. Como pagar bem professores e ainda manter as escolas em boas condições de infraestrutura? Dos professores, a eterna luta por melhores salários. E os alunos? Como ter interesse em aulas com professores com baixa autoestima, familiares que não acompanham as tarefas de casa, escolas com problemas de gestão. E mais, quais são os objetivos em comum? Como vamos evoluir como sociedade se os diferentes pontos de vista não se encontram?

Se acreditarmos que só temos direitos e pouco ou nada de deveres e responsabilidades na sociedade, não sairemos dessas armadilhas.

Como encontrar o equilíbrio? Certamente com muitas tarefas de governos como garantia de acesso e permanência dos alunos nas escolas, avaliação da aprendizagem dos professores, valorização do magistério e, principalmente, uma gestão eficiente dos recursos públicos. Os professores podem reivindicar salários, mas também devem exigir e colaborar para uma maior qualificação do nosso ensino.

E nós, como sociedade, não podemos continuar acreditando que basta ter o prédio da escola, que o aprendizado se dará naturalmente.

Sem entender que somos todos responsáveis pela educação, o caminho não será percorrido. Pais, professores, alunos, governo e sociedade devem se unir por essa causa.

*DIRETOR-EXECUTIVO DA POLO RS – AGÊNCIA DE DESENVOLVIMENTO E DA AGENDA 2020

quarta-feira, 26 de março de 2014

EDUCAÇÃO E DESIGUALDADE DE RENDA


ZERO HORA 26 de março de 2014 | N° 17744


ARTIGOS


por Cristiano M. Costa*




Um artigo recente dos pesquisadores Naércio Menezes (Insper) e Andréa Curi (FGV) teve grande repercussão na área de educação. Em linhas gerais, os resultados do estudo mostram que os estudantes que obtêm melhores notas em português e em matemática no Ensino Médio já recebem salários maiores após apenas cinco anos depois de formados. Os ganhos estimados chegam a 4,6% para um incremento de 10% na pontuação do Enem. Este resultado é conhecido na literatura econômica.

Mas verificar que esta relação positiva entre desempenho escolar e rendimento também se aplica ao Brasil é extremamente importante para suscitar o debate sobre o tema no país.

O mercado de trabalho tem se tornado cada vez mais competitivo. Diversas profissões vêm passando por grandes mudanças e demandado cada vez mais habilidades cognitivas e não cognitivas dos trabalhadores.

Um contador moderno, por exemplo, deve entender muito de informática e conhecer normas contábeis internacionais complexas, além de entender de finanças, estatística e Direito. Foi-se o tempo em que o contador era apenas um “guarda-livros”.

Diversas profissões estão passando por esse processo de informatização, aumento da complexidade das tarefas e diversificação dos conhecimentos requeridos. A literatura recente nesta área mostra que a desigualdade na aquisição de habilidades, especialmente cognitivas e medidas nestas avaliações de larga escala, é uma das principais causas da desigualdade de renda. Essa desigualdade de habilidades tende ainda a aumentar com o passar dos anos, levando a uma maior desigualdade de renda no futuro.

Políticas de transferência de renda são importantíssimas, mas a educação é certamente um caminho importante para a redução da desigualdade social.

Se o Brasil deseja ser um país desenvolvido, é fundamental que o governo invista nos ensinos Fundamental e Médio. Somente assim poderemos pensar em um país com menor desigualdade social no futuro sem gastarmos bilhões com transferências de renda aos que não tiveram oportunidades de frequentar uma escola de qualidade.


*ECONOMISTA E PROFESSOR DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS CONTÁBEIS DA UNISINOS

terça-feira, 25 de março de 2014

POR QUE OS ALUNOS NÃO APRENDEM A LER?


ZERO HORA 25 de março de 2014 | N° 17743


ARTIGOS


 Por Suzana Schwartz



“...é preciso não se basear, como normalmente se faz, em características mais vistosas... é necessário examinar os pormenores mais negligenciáveis...” (Ginzburg, 1989:144)

No Brasil, o ensino básico está se universalizando, no entanto a qualidade das aprendizagens produzidas nas escolas ainda está deixando muito a desejar. Ler e escrever são construções sociais e a aprendizagem da leitura e da escrita é base fundamental para outras aprendizagens. Nessa aprendizagem, pode estar a síntese dos problemas de ensino e de aprendizagem no nosso país. Como a escrita é um objeto cultural e histórico, ler e escrever hoje demandam habilidades e competências muito diferentes das de antigamente. As solicitações da cultura escrita, quando a maioria dos professores alfabetizadores aprendeu a ler e a escrever, eram muito diferentes das de hoje, as funções sociais da escrita eram mais restritas e o acesso a qualquer tipo de informação, por outros meios, que não a escola, era quase inexistente. Na escola a que poucos tinham acesso e em que as demandas eram diferentes das de hoje, era coerente, por exemplo, que o ensino da letra cursiva fosse considerado prioridade e tivesse importância. Acreditava-se, então, que para aprender era preciso copiar, repetir, memorizar informações e a escrita cursiva favorecia esse processo. Com ela se copia mais e mais rápido. Hoje, esse tipo de escrita só existe na escola, os portadores de texto que estão nas ruas, na realidade, na internet, no mundo em geral não utilizam esse tipo de letra. E, está comprovado que na alfabetização essa aprendizagem tem se revelado um agente complicador, que dificulta o processo.

Nos Estados Unidos, por exemplo, acabar com letra cursiva faz parte de movimento de padronização da educação. A decisão de transformar a letra cursiva em prática do passado está inserida em um movimento que tenta padronizar, avaliar e tornar os sistemas de ensino dos Estados Unidos mais competitivos internacionalmente. A partir de 2012, as escolas americanas foram autorizadas a abandonar o ensino da letra cursiva para se concentrar em “áreas mais importantes”, como definiu o Departamento de Educação americano. Percebe-se então que o uso simples e “natural” desse tipo de escrita tem merecido atenção e desencadeado ações no sentido de acabar com ela, por não serem percebidos acréscimos qualitativos nas aprendizagens, pelo contrário.

No Brasil, não existe legislação que obrigue o uso da letra cursiva e nem seu ensino ou aprendizagem. Nada que determine que o sujeito deva usar esse tipo de letra nem em sua assinatura. No entanto, em alguns Estados do país pessoas são impedidas de fazer documentos de identidade se não souberem assinar seu nome com letra cursiva e, acreditem: alunos são reprovados por não saber escrever com esse tipo de caligrafia! Essa aprendizagem não é obrigatória, não contribui e nem qualifica o estudo, dificulta a compreensão do que está escrito e, no entanto, dificilmente é questionada sua necessidade. Parece ser óbvia, mas não é. Nada é. Sugiro que, na busca de respostas para a educação do Brasil, seja repensada a contribuição desse tipo de escrita e que se canalize a energia despendida nela para outros aspectos muito mais importantes ao ensino e à aprendizagem da leitura e da escrita. Existem inúmeros relatos de professores que alfabetizam todos os seus alunos com intervenções coerentes com o mundo em que vivemos hoje, comprovando essa ideia.

*ProfessoraSUZANA SCHWARTZ*

domingo, 23 de março de 2014

ENSINANDO SEM SABER



ZERO HORA 23 de março de 2014 | N° 17741


EDITORIAL INTERATIVO


São chocantes os resultados da auditoria que o Tribunal de Contas da União realizou na rede pública de educação para aferir a situação do ensino no Brasil. Entre março do ano passado e fevereiro deste ano, representantes do TCU e dos tribunais estaduais visitaram 580 escolas de Ensino Médio em todo o país, com exceção de São Paulo e Roraima, que não quiseram participar da auditoria.

Foram avaliados aspectos relativos a quatro eixos: cobertura, professores, gestão e financiamento do Ensino Médio. Também fizeram parte da análise aspectos relativos à oferta de vagas, à disponibilidade e formação de professores, à gestão das redes de ensino e das escolas e à qualidade e veracidade das informações sobre o financiamento do Ensino Médio em nosso país.

O levantamento indicou a carência de 32 mil professores com formação específica nas 12 disciplinas obrigatórias. Significa que aulas de química, física e sociologia, entre outras, estão sendo ministradas por docentes que pouco sabem sobre as respectivas matérias ou, o que é pior, não estão sendo ministradas por professor algum. O estudo também revela que mais de 60 mil professores concursados estão fora da sala de aula, ocupando cargos de direção e funções administrativas ou cedidos a órgãos diversos. Cerca de 5 mil atuam em áreas que nada têm a ver com a educação.

O mais preocupante, porém, é a quantidade de professores que quebram o galho, ministrando aulas sem ter formação na disciplina para a qual foram designados. Desta forma, não há como qualificar a educação. Após a investigação, os auditores concluíram que a rede pública carece de padrões mínimos de qualidade, conforme determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. O mau gerenciamento dos recursos também aparece fortemente: declarações feitas pelos governos estaduais no Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação divergem das informações de outras fontes de dados de execução orçamentária.

Por isso o TCU já determinou ao Ministério de Educação que apresente um plano de ação definindo modelos de avaliação e padrões mínimos de qualidade, para que possa estabelecer um valor mínimo de gasto por aluno que sirva de parâmetro orientador para os Estados. Além disso, o tribunal está repassando às secretarias estaduais de Educação as conclusões sobre as principais deficiências encontradas na auditoria.

Diante de mais esse diagnóstico da educação brasileira, que continua ocupando posições constrangedoras nos rankings internacionais, mais uma vez se conclui que o problema principal está na má gestão – o ponto gerador do círculo vicioso que leva a deformações extremas, como a de professores ensinando coisas que nunca aprenderam. Diante desse diagnóstico da educação brasileira, mais uma vez se conclui que o problema principal está na má gestão do ensino.




 

FRAUDES NA UERJ EVIDENCIAM FALHAS DO SISTEMA DE COTAS

VEJA ONLINE 22/03/2014 - 18:52


Ministério Público do Rio investiga mais de 60 suspeitos de burlar mecanismo de seleção. Estudantes reclamam de falta de ação da Universidade

Pâmela Oliveira e Daniel Haidar



Vanessa Daudt foi aprovada como cotista após se declarar negra ou índia no vestibular de 2013 (Reprodução/MPRJ)

A foto de uma jovem em uma praia, publicada no Facebook, motivou o comentário de uma amiga. “Ficou morena?”, perguntou. A menina da foto, para não deixar dúvida sobre como se enxerga, respondeu com um palavrão irreproduzível: “Sou loira, p...” Desde setembro, a jovem da foto, Vanessa Daudt, frequenta o curso de enfermagem na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, a Uerj. Para a instituição, no entanto, ela apresentou uma ideia diferente sobre seu tom de pele e sua descendência. Vanessa declarou ser negra ou índia e afirmou ter baixa renda. Conseguiu, assim, ingressar na faculdade apesar de ter ocupado o 122º lugar na classificação geral, para um curso com 80 vagas.

Como cotista, Vanessa disputou 16 vagas com 34 candidatos – 2,19 interessados em cada cadeira. Na seleção normal, a corrida seria bem mais apertada: teria que brigar com 515 vestibulandos por 44 matrículas. O caso de Vanessa é um dos mais de 60 sobre as mesas dos promotores de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio. Desde 2007, denúncias anônimas e dos próprios estudantes avolumam-se em um inquérito de mais de 3.000 páginas dedicado a descobrir se o sistema de cotas na Uerj, que toma previamente 45% das vagas da instituição, é usado como atalho ilegal para estudantes que se aproveitam das fragilidades da lei estadual 5.346 – a que dispõe sobre o sistema de cotas nas universidades estaduais do Rio. Como é sabido por todos os candidatos, basta declarar-se negro ou índio e apresentar comprovantes de baixa renda para ser avaliado como cotista, com absurdas vantagens sobre os demais concorrentes. Apesar da abundância de denúncias e de a lei determinar que “cabe à universidade criar mecanismos de combate à fraude”, a direção da Uerj não está preocupada com os buracos em seu sistema.

O MP, diante do volume de denúncias, faz o que a instituição já deveria ter feito: evitar a farra que subverteu não só os critérios de meritocracia para ingresso na universidade, mas a própria lógica das cotas. Os “espertos” conseguem, com notas bem mais baixas, passar na frente de gente que estudou e recusou-se a recorrer ao caminho da fraude. O descaso da universidade consegue algo inédito, que é unir gente a favor e contra as cotas. Afinal, um sistema de cotas raciais que não barra os falsos cotistas prejudica a todos, e não somente aos que, por lei – por pior que ela seja – teriam acesso legítimo ao benefício.


Vanessa DaudtReprodução/MPRJ

Vanessa Daudt foi aprovada como cotista após se declarar negra ou índia no vestibular de 2013. Classificada na 122ª posição geral entre os vestibulandos de enfermagem, a loira de olhos azuis não teria conseguido uma das 80 vagas do curso se não tivesse concorrido às vagas destinadas a cotistas

O caminho da investigação será longo. Os promotores tentarão, no âmbito criminal, encontrar uma saída para um problema criado por uma política equivocada, que classifica pessoas segundo critérios raciais. Pesquisa do geneticista Sérgio Danilo Pena, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), identificou que 60% dos brasileiros que se julgam "brancos" têm sangue africano ou indígena nas veias. O caso do sambista Luiz Antônio Feliciano Marcondes, o Neguinho da Beija-Flor, é simbólico. Exame feito pelo laboratório de Pena identificou que ele tem 67,1% dos genes de origem na Europa e apenas 31,5% da África.

Na sexta-feira, no intervalo de uma das aulas do curso de enfermagem da Uerj, Vanessa, a estudante loira que abre este texto, defendeu seu direito ao benefício. Vanessa disse que sua documentação foi aceita, e que é “carente”. Como não existe cota para quem é branco e carente, declarou-se “negra ou índia”. “Digo que sou da cor que eu quiser”, afirmou. Ela acertou em cheio a origem do problema do sistema das políticas raciais.

Vale, para os efeitos legais, a autodeclaração da cor da pele. De acordo com a legislação brasileira, não é função do Estado determinar a raça de uma pessoa. Ou seja: é negro ou índio quem decidir assim se classificar perante a instituição. Quando a universidade tenta interferir, a confusão é imensa, como provou o caso dos gêmeos univitelinos Alex e Alan Teixeira da Cunha – o primeiro classificado como branco e, o segundo, como negro pela Universidade de Brasília (UnB). O disparate no enquadramento de pessoas geneticamente idênticas levou a UnB a modificar o ingresso dos cotistas. Em vez da simples declaração do estudante, há uma entrevista pessoal com o candidato – algo que, obviamente, não corrige uma política torta, mas afugenta quem tenta se aproveitar de brechas legais.

Para o sociólogo Demétrio Magnoli, do Grupo de Análises de Conjuntura Internacional (Gacint) da USP, são claros os sinais de que os critérios raciais são um erro, e não atendem o objetivo de promover igualdade. "Polícias raciais dividem o país em grupos e produzem atritos, o que é perigosíssimo em qualquer sociedade. É preciso abolir o princípio da autodeclaração, para o bem do funcionamento do sistema”, alerta.

O sociólogo Simon Schwartzman, um dos autores do livro Divisões Perigosas: Políticas Raciais no Brasil Contemporâneo (Editora Record/Civilização Brasileira), avalia que os critérios de cotas dificilmente serão ajustados simplesmente por um aperto no controle. O mais adequado, afirma, seria que as instituições de ensino originassem soluções para privilegiar alunos carentes, em vez de tentar uma segregação. "O sistema inteiro de cotas tem problemas. Todos os critérios são muito grosseiros. A solução não é apertar o controle, mas uma política mais inteligente de preferências, que amplie o sistema de apoio para quem realmente precisa", afirma Schwartzman.

A lei estadual fluminense que instituiu o sistema de cotas exige que pelo menos duas condições estejam atendidas. Baixa renda é o critério indispensável. A segunda condição pode ser raça (declarar-se indígena ou negro), ser filho de policiais mortos em serviço ou inválidos ou, ainda, tratar-se de pessoa com deficiência física. O problema é que o critério de renda é facilmente burlável. O candidato cotista deve comprovar renda familiar per capita bruta de até 960 reais.

Curso mais disputado da Uerj, com 135 candidatos por vaga (para não cotistas) em 2013, a graduação em medicina concentra o maior número de denúncias sobre irregularidades. A primeira denúncia do inquérito civil instaurado pelo Ministério Público é referente à fraude no concurso de 2004 para a graduação – um curso no qual cada estudante custa aos cofres públicos 54.300 reais por ano. Na lista com nove suspeitos de fraudes havia moradores de áreas nobres do Rio, como o bairro da Lagoa.

Em janeiro do ano passado, o MP recebeu outra denúncia anônima com 41 nomes de aprovados em 2013 que teriam fraudade os critérios estipulados pela lei 5.346. A denúncia foi entregue em um CD com notas e imagens dos universitários que não aparentam pertencer à raça declarada na inscrição do vestibular. Quatro dos universitários citados são estudantes de medicina: de pele clara, com cabelo liso, João Pedro Galiza Xavier é um dos apontados no material. Classificado na 542ª posição entre os vestibulandos de medicina, não teria garantido uma das 94 vagas da graduação se não tivesse disputado como cotista negro ou índio. Na internet, Galiza, que estudou no GPI (curso pré-vestibular particular no Rio de Janeiro) agradece aos professores do curso pela aprovação. “Sou eternamente grato a alguns professores. Todos são responsáveis pela minha conquista. Continuem sendo professores maravilhosos, que tornam sonhos que parecem impossíveis em realidade”. O curso GPI, frequentado por Galiza, tem mensalidade integral de 1.082,40 reais.

Na hora de comprovar a renda familiar, pode-se simplesmente omitir o rendimento de um ou mais integrantes da família. A lei 5.346 prevê um mecanismo para garantir que haja, pelo menos, algum controle sobre o que declara o candidato. O parágrafo 3º do artigo 1º estabelece que as universidades devem “criar mecanismos de combate à fraude”. De fato, existe na instituição uma Comissão de Análise Socioeconômica, formada por três servidoras públicas e 28 assistentes sociais. Após a análise da documentação, a comissão realiza, segundo a universidade, “visitas domiciliares a alguns candidatos para dirimir dúvidas”. Em 2010, foram 14 dessas visitas, segundo documento da Uerj enviado ao MP. Em 2011, foram três. Segundo declaração de Lena Medeiro de Menezes, sub-reitora de graduação, não são feitas visitas fora do Estado do Rio. Ou seja, morar fora do território fluminense é garantia de que não haverá confirmação dos dados apresentados.

Investigação – Os casos investigados agora pelo MP envolvem 15 cursos de graduação. Estudante de direito, Thatyane Alecrim Azeredo tem cabelo liso e olhos claros – no Facebook, amigos discutem se são azuis ou verdes. Classificada na 871º colocação geral do curso de direito, Thatyane estaria longe das 312 vagas disponíveis para o curso em 2013. Mas, como declarou-se negra ou indígena, em vez de disputar uma vaga com outros 28,95 vestibulandos não cotistas, concorreu com 3,67 candidatos por vaga. Na página de relacionamentos, Thatyane publicou, no dia 19 de setembro, uma foto com a turma no hall da Uerj. “Felicidade após trote”, escreveu. Outra aluna aprovada no vestibular de 2013 como cotista é Dianne Leite da Silva. Branca, com cabelos e olhos claros, ela foi classificada na 266ª posição geral para o curso de jornalismo – longe das 50 vagas oferecidas pelo curso.

Pela disputa afunilada, conquistar uma vaga em uma universidade pública é motivo de orgulho – para os estudantes e para os pais. Ao comemorar a aprovação na Uerj, muitos dos investigados publicaram no Facebook o espelho da classificação, mas com um cuidado: cortaram o trecho que explicita a inscrição como cotista. “Mais um sonho realizado e sem vocês isso não seria possível”, escreveu Vitor Pablo de Souza Gilard, aprovado no vestibular para jornalismo no ano passado. O jovem branco de cabelos escuros omitiu aos amigos da rede social que para ingressar na Uerj se declarou negro ou índio. Procurado pelo site de VEJA, Gilard se recusou a explicar a razão de ter se inscrito como cotista.

Indignação dos estudantes – Como mostra a ciência, não é possível classificar a descendência com base na cor da pele. Mas são estes – e os sinais inequívocos de condição social – os critérios que embasam denúncias dos próprios estudantes. A presença de cotistas brancos, com olhos claros, com celulares caros e aparelhos como iPads, tem revoltado universitários que precisaram estudar anos para conseguir uma vaga na Uerj. Alguns chegam a acusar a Uerj de acobertar as fraudes. O baixo número de sindicâncias instauradas é outro motivo de reclamações: foram apenas 17, até agora. “A Uerj está preenchendo vagas com pessoas que se dizem negras ou pobres sem comprovação válida. Apenas com uma declaração”, disse um dos denunciantes, em 2011.

Apesar do elevado número de denúncias, até o momento apenas um estudante foi expulso por ter burlado a reserva de vagas: Bruno Barros Marques, de 29 anos, teve a matrícula cancelada no ano passado. De acordo com investigações da Uerj e do MP, para concorrer a uma vaga de cotista em 2009, Marques se passou por estudante carente e declarou renda de 450 reais, omitindo os comprovantes de rendimento do pai, aposentado da Petrobras e proprietário de uma loja de material hidráulico e elétrico na Tijuca, na Zona Norte do Rio. Além disso, declarou ser negro. Outra investigada pela universidade é Lívia Leba, filha do delegado da Polícia Civil Carlos Augusto Neto Leba, aprovada como cotista na faculdade de medicina. O caso de Lívia corre em segredo de Justiça.

Desde a última segunda-feira, a reportagem do site de VEJA tenta ouvir o reitor da Uerj, Ricardo Vieiralves de Castro, ou um porta-voz da universidade sobre o inquérito civil 118/11, que apura se a Uerj tem um sistema eficiente para prevenir e investigar fraudes no sistema de cotas, como determina a lei, e se há improbidade de servidores públicos responsáveis pela avaliação de documentos e sindicâncias. A Uerj não apresentou nenhum porta-voz. A universidade argumenta, em um documento incluído no inquérito cicil 118/11, que a lei 5.346 estabelece que, para concorrer à vaga de cotista, o candidato pode se autodeclarar negro ou índio e que, portanto, não cabe à instituição investigar ou duvidar de tal declaração. “A Uerj não promove qualquer ‘tribunal de cor’, portanto, seu principal critério é a autodeclaração”, escreveu Vieiralves, em agosto de 2008, em resposta a um pedido do Ministério Público, ignorando que a lei 5.346 determina que as universidades criem mecanismos de combate às fraudes.

Em maio de 2013, depois de diversas cobranças do MP relacionadas à falta de fiscalização em relação às declarações dos alunos, Valdino de Azevedo, assessor do reitor, argumentou que a “autodeclaração cria enorme dificuldade para esta entidade de ensino superior”. Azevedo chega a dizer que “o sentido de pertencimento foge aos critérios objetivos de julgamento”.

No Supremo Tribunal Federal (STF), em ação apoiada pelo partido Democratas (DEM), foi questionada a legalidade da política de cotas raciais no processo seletivo da Universidade Nacional de Brasília (UnB). A legalidade foi reconhecida por unanimidade pelos 12 ministros do STF. Autora da ação, a jurista Roberta Fragoso avalia que eventuais acusações de fraude na declaração de raça dificilmente serão reconhecidas na Justiça como crime. Justamente porque não existem no país — felizmente — leis para dividir a identidade da população pela cor da pele. Procuradora do Distrito Federal e autora do livro Ações afirmativas à brasileira: necessidade ou mito? (Editora Livraria do Advogado), Roberta avalia que essa divisão legal seria um retrocesso. "Se o Ministério Público acusar alguém de não ser negro, teria de fazer um exame de DNA de ancestralidade. Não há no Brasil como definir quem é o pardo ou o mestiço. É possível que pessoas de aparência branca tenham descendência africana. Cota racial é uma falácia. Sempre dará ensejo a fraudes", diz a jurista.

terça-feira, 18 de março de 2014

EDUCAÇÃO SEM MÁGICA


ZERO HORA 18 de março de 2014 | N° 17736


EDITORIAIS


A má qualidade do ensino público no Brasil costuma ser justificada por razões tão óbvias, que ninguém mais as questiona: os professores ganham mal, os alunos têm pouco interesse pela escola e os governos não priorizam a educação como deveriam na hora de aplicar os recursos oriundos dos impostos. Este contexto de conformismo, porém, acaba encobrindo experiências educacionais bem-sucedidas como a que o programa Fantástico, da Rede Globo, mostrou no último domingo na cidade de Cocal dos Alves, no interior do Piauí, um dos Estados mais pobres da federação. A escola Augustinho Brandão acumula dezenas de medalhas em Olimpíadas de Matemática e Química, além de prêmios nacionais de astronáutica, astronomia e física. No Enem, está acima da média nacional. E em 2010 aprovou todos os alunos que fizeram o vestibular. Qual é a mágica?

A diretora Aurilene Vieira responde com singeleza: “A escola tem recebido caravanas e caravanas com estudantes e estudiosos da educação para saber o que acontece aqui. Eu digo: ‘Não precisa, não’. Basta que cada um faça o seu papel e faça isso com engajamento. Seja professor porque você quer ser professor e não porque lhe falta opção na vida. Seja gestor porque você quer conduzir aquela escola proporcionando o melhor para o aluno, e não porque você quer fugir de uma sala de aula. Seja sistema porque você tem ideias para contribuir e quebrar os paradigmas que forem necessários”. Ou seja: não há mágica, nem plano de ensino milagroso: apenas trabalho e comprometimento.

Parece difícil de acreditar, mas os resultados dos alunos nas provas internas e em concursos externos, somados aos depoimentos de pais e dos próprios estudantes, não deixam dúvida. As famílias acreditam na escola como alternativa de ascensão social para suas crianças e os estudantes demonstram prazer em aprender, gostam do ambiente escolar. “Nós chegamos a ter instantes dentro desta escola em que tínhamos que expulsar os alunos, no bom sentido. Aqui parecia que era o melhor lugar. O menino estudava de manhã, mas ele queria ficar à tarde, queria ficar à noite, queria passar a madrugada estudando, porque aqui ele se sentia bem”, conta Narjara Benício, diretora regional.

O primeiro passo para a excelência alcançada pela escola piauiense foi o engajamento dos professores. Depois, a direção e os próprios mestres trataram de convencer a comunidade de que uma escola pública pode, sim, oferecer educação de qualidade e ao mesmo tempo ser um ambiente atrativo para a garotada. “Nosso maior desafio foi fazer os alunos acreditarem nisso. Alunos filhos de pais analfabetos, da roça, que só tinham o que comer, que só dava para o sustento, a roupinha ruim. Então para fazer esses meninos viajarem nesse sonho, de que era possível, sem ter dinheiro, sem ter uma roupa boa, ir lá para Teresina, para a capital, estudar lá. Foi necessário o sonho. Acreditar no sonho. Quando a gente conseguiu fazer esse povo acreditar mesmo que era possível estudar fora, se formar e mudar de vida, pronto” – resume a diretora Aurilene Vieira.

Será tão difícil seguir um exemplo desses?

MITOS E VERDADES SOBRE A FALTA DE PROFESSORES



ZERO HORA 18 de março de 2014 | N° 17736


PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA




A cada início de ano letivo, o problema se repete no Rio Grande do Sul: faltam professores, as crianças têm de chegar mais tarde ou sair mais cedo, os pais se revoltam e o Cpers cobra do governo a nomeação de concursados. Neste ano, o secretário da Educação, Jose Clovis Azevedo, está empenhado em provar que a falta de professores é um mito e que seria irresponsabilidade fazer as nomeações reivindicadas pelo Cpers sem verificar, caso a caso, as reais necessidades das escolas.

Azevedo diz que a falta de professores é pontual e que, na maioria dos casos, decorre do desligamento repentino de contratados ou da forma como a direção das escolas encaminha os pedidos de reposição de professores.

Quando o diretor de uma escola constata que falta professor para uma determinada disciplina, não basta encaminhar o pedido de reposição. É preciso apresentar na Coordenadoria Regional de Educação o quadro de professores, turmas e alunos para que se verifique se falta mesmo professor ou se o problema é de distribuição de carga horária.

Ontem, depois de debater a situação com a presidente do Cpers, Rejane de Oliveira, no Gaúcha Atualidade, Azevedo foi atrás dos casos relatados durante o programa. Segundo ele, em uma escola de Alvorada faltava, de fato, professor de matemática, que já foi chamado, mas havia professores com carga horária sobrando em física, química, biologia, geografia e história. Em outra escola, descobriu que faltava professor de língua portuguesa porque o titular da área estava dando aula de ensino religioso.

O Cpers pressiona pela nomeação dos mais de 13 mil aprovados no último concurso, cujo edital previa 10 mil vagas. Azevedo diz que só vai nomear o estritamente necessário, porque o número de alunos vem caindo ano a ano e não se pode ter hoje o mesmo número de professores de 10 anos atrás. Entre 2005 e 2013, a rede pública estadual perdeu 400 mil alunos por conta da redução da natalidade.

Dos aprovados no concurso, 40% já têm vínculo com o Estado, ou como efetivos que querem ampliar a carga horária, ou como contratados em caráter temporário. O concurso vale até 2015, mas pode ser prorrogado até 2017, prazo fatal para a nomeação dos 10 mil previstos no edital.


Aliás

Com 13 mil professores aprovados em concurso, o Estado mantém 21 mil contratos temporários. A intenção é substituir os contratados, mas nem sempre os aprovados estão nas áreas em que existem vagas.

sábado, 15 de março de 2014

UMA NOVA EDUCAÇÃO

REVISTA ISTO É N° Edição: 2312 | 14.Mar.14


ISTOÉ revela projeto do Ministério da Educação, em parceria com o Instituto Ayrton Senna, que prevê inclusão de habilidades socioemocionais na grade curricular. Estudos mostram como elas melhoram o desempenho escolar

Camila Brandalise


A sala de aula é a mesma. Alunos em carteiras enfileiradas se esforçam para prestar atenção ao que diz a professora, estrategicamente posicionada em frente à lousa. Mas no lugar de questões envolvendo temas tradicionais, como raiz quadrada ou uso da crase, o debate entre os estudantes, adolescentes na faixa dos 13 anos, suscita outras discussões. “Como você se vê hoje?” e “O que espera da vida adulta?” são algumas das perguntas feitas durante uma aula de formação social do Colégio Pentágono, em São Paulo. Além de autoconhecimento, os jovens desenvolvem conceitos como respeito e responsabilidade. Apesar de esses não serem temas frequentes no cotidiano do ensino brasileiro, as chamadas competências não cognitivas ou socioemocionais estão no centro do debate de como melhorar a educação no País e devem transformar a forma como o ensino é ministrado nas instituições públicas e privadas do Brasil. Tanto que várias escolas as incluíram em seus projetos – seja com aulas específicas ou com propostas pedagógicas gerais. Em levantamento inédito, o Instituto Ayrton Senna (IAS) concluiu, por meio de uma avaliação aplicada a cerca de 25 mil estudantes da rede estadual de ensino do Rio de Janeiro em outubro de 2013, que o ensino dessas qualidades impacta direta e positivamente o aprendizado de língua portuguesa e de matemática. A intenção é que a ferramenta, elaborada em parceria com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), seja usada para medir o desenvolvimento dessas competências nas escolas.


CLASSE
Aula de formação social do colégio Pentágono, em São Paulo:
alunos trabalham respeito e responsabilidade

Os resultados parciais desse trabalho, ao qual ISTOÉ teve acesso com exclusividade, serão divulgados no Fórum Internacional de Políticas Públicas, realizado pelo Instituto Ayrton Senna, a OCDE e o MEC nos dias 24 e 25 de março, em São Paulo. A intenção do IAS ao elaborar um sistema de medição das chamadas habilidades socioemocionais foi fomentar o desenvolvimento dessa área, para que possam ser criadas políticas públicas específicas. A esse projeto somam-se ainda esforços do Ministério da Educação para desenvolver novas propostas sobre o tema. Uma delas, que também deve ser anunciada durante o encontro, diz respeito à formação de especialistas brasileiros com foco nessas habilidades socioemocionais. “O governo já se posicionou a favor da criação de um programa em processo de formulação, e não será difícil implementá-lo rapidamente. Pode ser, por exemplo, um braço do Ciência sem Fronteiras”, afirma Mozart Neves Ramos, membro do Conselho Nacional de Educação (CNE), que faz parte do MEC, e diretor de articulação e inovação do Instituto Ayrton Senna, referindo-se ao programa de bolsa de estudos no Exterior para alunos da graduação. “Para nos aprofundarmos no tema, precisamos de profissionais com formação específica na área, o que exige conhecimentos multidisciplinares em educação, economia e psicologia.”

Outro projeto diz respeito à comissão especial do CNE voltada para discutir a importância das habilidades socioemocionais no sucesso escolar. O conselheiro Francisco Cordão afirma que até meados deste ano haverá um parecer, a ser aprovado pelo conselho, com orientações de como trabalhar essas competências na escola. Essas diretrizes, ainda em fase de estudos, serão enviadas às instituições de ensino do País para que sejam formuladas maneiras de trabalhar as habilidades socioemocionais na educação básica (ensino infantil, fundamental e médio). “Já discutimos, por exemplo, recomendações para a formação de professores, que precisam estar alinhados a uma perspectiva mais ampla, mobilizando não apenas o aprendizado de conteúdos das disciplinas, mas habilidades, atitudes e emoções que são importantes no processo de ensino”, diz Cordão.



A ferramenta de avaliação criada pelo Instituto Ayrton Senna visa a orientar o trabalho dos gestores educacionais. A prova consiste em 62 questões para o quinto ano do ensino fundamental e 92 questões para o primeiro e terceiro ano do ensino médio e traz perguntas referentes à percepção do aluno sobre seu próprio comportamento e sobre quem ele é. Com os resultados em mãos, é feito um cruzamento relacionando desempenho escolar e situação socioeconômica. Os dados obtidos no projeto-piloto, aplicado em escolas públicas do Estado do Rio em 2013 e feito em parceria com a secretaria estadual de Educação, mostram que pelo menos três grupos de competências socioemocionais tem um impacto bastante relevante no desempenho dos estudantes em língua portuguesa e em matemática (leia quadro na pág. 54). Entre outros resultados, chama a atenção ainda o impacto negativo da extroversão no ensino de língua portuguesa. “O que notamos é que a escola não está preparada para canalizar a energia dos jovens extrovertidos para o aprendizado”, afirma Tatiana Filgueiras, coordenadora da área de avaliação e desenvolvimento do Instituto Ayrton Senna.



Outro dado interessante foi o fato de que alunos de famílias de melhor condição socioeconômica apresentaram graus mais baixos na competência conscienciosidade, que engloba responsabilidade e tem relação com o aprendizado de matemática, segundo Tatiana. Presidente do Instituto Ayrton Senna, Viviane Senna ressalta esse caráter democrático das competências socioemocionais. “Desenvolver foco, persistência, responsabilidade, curiosidade, criatividade e outras características depende mais das atitudes dos adultos que convivem com esses alunos, em casa ou na escola, do que de condições específicas e não replicáveis, como a condição socioeconômica da família”, diz. Essa é uma excelente notícia para uma estratégia de redução das desigualdades intoleráveis, por meio de ações educativas intencionais, segundo Viviane. “E o Brasil de hoje, com o desafio de dar um salto expressivo na qualidade da educação, não pode deixar passar despercebido um acelerador da qualidade tão importante quanto esse.”


MODELO
Vinicius Pereira e Juliana Gomes, ambos de 16 anos, alunos do colégio
Chico Anysio, no Rio, que passou pelo projeto-piloto do IAS

A ideia é que seja estabelecida uma agenda na área das não cognitivas. A partir desses esforços, tanto do terceiro setor quanto do governo, o objetivo é inserir essas questões no projeto pedagógico das escolas com delimitações específicas. Não é necessário criar uma disciplina para passar esses conceitos. As medidas podem ser trabalhadas de maneira transversal, em todas as aulas. Em língua portuguesa, por exemplo, em vez de pedir aos alunos que escrevam sobre as férias, o professor pode solicitar uma redação em que as crianças falem sobre um problema que conseguiram enfrentar. “Há várias possibilidades para o futuro. O primeiro grande desafio era aprender a medir. Agora o tema precisa ser desenvolvido”, afirma Daniel Santos, professor de economia da Universidade de São Paulo e especialista em desenvolvimento infantil e socioemocional na escola. No atual sistema de avaliação tradicional, diz o especialista, se uma escola não atinge bom desempenho, a conclusão é de que não há planejamento ou falta preparo dos professores. “Mas será que não é a parte não cognitiva que está influenciando esse resultado?”



No Pentágono, tanto as aulas de formação social quanto as de tutoria, ambas dadas a partir do sexto ano, trabalham conceitos relacionados às habilidades não cognitivas há cerca de cinco anos. “Não abandonamos o rigor, temos todas as aulas tradicionais. Mas nos preocupamos com a formação do indivíduo, porque a escola é um espaço de socialização”, diz Américo Francisco dos Santos, coordenador-geral do ensino fundamental 2 da rede Pentágono. No Rio de Janeiro, uma das escolas que participaram do piloto do projeto do IAS foi o Colégio Estadual Chico Anysio. “Em nossa grade, temos um projeto chamado Núcleo. Os alunos têm oito encontros de 50 minutos por semana em que trabalham autogestão, projeto de vida, autoconhecimento, entre outros temas”, diz Willmann Costa, diretor da instituição. Colégio que ficou em terceiro lugar no último Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o Elite Vale do Aço, em Ipatinga (MG), estuda incluir essas competências no projeto pedagógico. “O objetivo é acrescentar na grade curricular do ano que vem outras habilidades além das cognitivas”, afirma o diretor Átila Zanone.



Alguns educadores, porém, ainda se mostram receosos em relação a essas medidas. “A escola não pode absorver tudo. Acredito que determinada formação é responsabilidade da família”, diz Rosângela Fonseca Napoleão do Rego, coordenadora-geral pedagógica do colégio Lerote, de Teresina. “Se ensinamos conceitos no colégio e em casa a realidade é outra, não tem sentido.” Apesar de ser uma crítica comum, especialistas afirmam que não se trata de ensinar valores ou tomar o lugar dos pais. Essas competências e habilidades podem e devem ser trabalhadas no ambiente educacional. “A escola é a primeira chance de a criança se confrontar com a realidade social, é o lugar onde ela descobre outra maneira de viver com seus semelhantes. Por isso, precisamos incluir essas capacidades socioemocionais”, afirma a psicóloga infantil Ana Olmos. “Ainda existe desconhecimento sobre o tema, e incorporar isso de maneira intencional no ambiente escolar vai exigir que a instituição aprenda a apresentar aos pais como determinados projetos podem contribuir para formar cidadãos”, diz Mozart Neves, do Conselho Nacional de Educação. Uma coisa é certa: se o mundo e os jovens mudaram, o caminho natural e necessário é que a escola também mude.


quinta-feira, 13 de março de 2014

ORELHAS DA POLÊMICA


ZERO HORA 13 de março de 2014 | N° 17731


Cirurgia antibullying. Prefeitura catarinense gera controvérsia ao pagar operações plásticas em crianças hostilizadas pelo formato das orelhas



Uma iniciativa polêmica da prefeitura de São José, na região metropolitana de Florianópolis (SC), reacendeu o debate sobre como combater o bullying nas escolas. O município decidiu oferecer gratuitamente a otoplastia, cirurgia plástica para correção da chamada orelha de abano, a crianças que sofrem provocações no colégio.

Com a medida, tomada pela prefeita Adeliana Dal Pont, estudantes que apresentam atraso no rendimento escolar ou algum tipo de problema emocional causado por agressões psicológicas dos colegas podem ter a operação custeada pelo município. A prefeitura informou ter destinado verbas de saúde para realização de 14 otoplastias em 2013, mas nem todas teriam sido em crianças.

Para especialistas, resolver a questão por meio de um procedimento cirúrgico tira o foco da discussão sobre o bullying e pode até reforçar o preconceito. Débora Dalbosco Dell’Aglio, professora do Instituto de Psicologia da UFRGS, afirma que a medida não contribuirá de forma efetiva para combater a agressão e pode, em lugar disso, chamar mais atenção para esse tipo de situação.

– Há pessoas que têm problemas físicos, convivem bem com isso e não precisam de cirurgias reparadoras. Esse parece ser um projeto que não vem das necessidades do público envolvido, mas sim de uma ideia preconcebida de alguém que não tem ideia do fenômeno maior. O foco deve ser trabalhar a aceitação do diferente.

Raquel Maria de Lima, mãe de um menino de 11 anos que passou por uma otoplastia custeada pela prefeitura de São José, conta que o filho parou de sofrer com as agressões dos colegas de escola. O garoto chegava chorando em casa e dizia que os amigos o provocavam.

– Ele me diz que não faria de novo. Sofreu muito no pós-operatório. Por um lado, ele parou de sofrer na escola, mas, por outro, sofreu muito pela cirurgia – diz Raquel.

Projeto de lei prevê oferta do procedimento pelo SUS

Uma proposta para oferecer a otoplastia no Sistema Único de Saúde tramita na Câmara dos Deputados. Para o deputado federal Guilherme Campos (PSD-SP), autor do projeto de lei, não se trata de uma cirurgia estética, mas sim reparadora:

– Fui procurado sobre isso em função do bullying e do impacto psicológico na vida das crianças. O custo em clínica particular é alto (entre R$ 3 mil e R$ 6 mil), então colocamos a possibilidade de o SUS implantar essa cirurgia, que não é estética.

O texto está na Comissão Social e da Família e deve passar ainda pelas comissões de Finanças e Constituição e Justiça antes de ir ao Senado. O deputado minimiza as críticas:

– Isso é procurar chifre em cabeça de cavalo. Sempre vai ter alguma argumentação. Quem for contrário, que se manifeste. E se o Congresso entender assim, que não aprove a lei.

Dados

- 7,2% dos brasileiros de 13 a 15 anos sofrem bullying, segundo o IBGE.

- 42% dos casos relatados em oito escolas de SC são motivados por aspectos físicos.


ENTREVISTAS


“A criança precisa se sentir bem”

Entrevista com Adeliana Dal Pont, prefeita de São José (SC)


Responsável por oferecer otoplastias a vítimas de bullying, a prefeita de São José (SC), Adeliana Dal Pont, defende que a medida contribui no desempenho escolar.

Por que a senhora resolveu tomar essa iniciativa?

Adeliana Dal Pont – Na escola, a criança, além de ter um espaço com professor bem qualificado, precisa estar bem, e isso (orelhas de abano) é algo que as incomoda. Há histórias de crianças que só andavam de boné por causa da orelha, então temos de buscar alguma coisa, mesmo que seja um ato pequeno.

Especialistas defendem que incentivar o contato com as diferenças e mostrar a partir do ensino que é possível essa convivência com a diversidade seria uma solução melhor.

Adeliana – Como estive muito próxima de uma pessoa que tinha essa dificuldade, coloco o serviço à disposição. Tem de ver o que acham a criança e a família envolvidas. A prioridade quem dita é o número de casos.

Essas cirurgias são pagas com recursos do município. Não há outros procedimentos que poderiam ser considerados prioridade na saúde de São José?

Adeliana – Trata-se de algo que incomoda as crianças, mas não é só esse procedimento que fazemos. Temos também convênios para atender a outras necessidades. Não é para causar polêmica. É para dizer que o poder público tem preocupação, que a saúde e a educação no sistema público podem ter qualidade se tivermos essa vontade. Na posição de gestora, de mulher pública, eu tenho a obrigação de disponibilizar os serviços.


“Pode ser ruim e perigoso”

Entrevista com Carolina Lisboa, psicóloga



A psicóloga Carolina Lisboa, professora da Pontifícia Universidade Católica (PUCRS) e especialista no tema, afirma que a cirurgia não acaba com o bullying e não deve ser incentivada.

Zero Hora – Como a senhora avalia essa iniciativa?

Carolina Lisboa – Se há um movimento de cima para baixo dizendo que a criança tem de se submeter à cirurgia, isso dá a ideia de que ela está errada e existe um jeito certo de ser. Isso pode ser ruim e perigoso. Pode provocar uma necessidade e supervalorizar a questão da estética. E isso a gente não quer, principalmente entre crianças e adolescentes, que estão construindo a identidade e o autoconceito. Se ela está sofrendo, não vejo problema em fazer a cirurgia, mas não é isso que vai solucionar o bullying.

ZH – Como se pode agir para prevenir o bullying?

Carolina – Há outras formas de agir, favorecendo comportamentos como o de se colocar no lugar do outro, incentivar a solidariedade e o respeito às diferenças individuais, e não a “correção” para que todas as pessoas fiquem iguais.

ZH – Qual o papel dos pais?

Carolina– São fundamentais para evitar que as crianças façam bullying e para ajudá-las a lidar com essas situações. Eles precisam fazer uma autorreflexão: o meu filho está infeliz com a orelha de abano ou sou eu que estou? E manter o diálogo, colocar-se no lugar deles, e não fomentar em casa o preconceito que já existe na rua. O bullying não deve ser subestimado.


segunda-feira, 10 de março de 2014

SITUAÇÃO PRECÁRIA DE ESCOLAS PÚBLICAS NO BRASIL

TV GLOBO, FANTÁSTICO 10/03/2014 12h00

Fantástico mostra situação precária de escolas públicas em Alagoas, em Pernambuco e no Maranhão São escolas sem água potável, sem banheiro e até sem sala de aula. O que não falta é a força de vontade de alunos, professores e pais.



Um retrato do abandono do ensino público no Brasil. São escolas sem água potável, sem banheiro e até sem sala de aula.

Durante dois meses, os repórteres Eduardo Faustini e Luiz Cláudio Azevedo percorreram escolas públicas dos estados que tiveram as médias mais baixas no Programa de Avaliação Internacional de Estudantes (Pisa).

“O percurso deles é em torno de 20, 30 quilômetros. Muitos acordam duas, três horas da manhã, para pegar um caminhão, para que esse caminhão leve até a rodovia, para da rodovia vir de um transporte fornecido pela prefeitura do município: o ônibus escolar”, conta um morador de Joaquim Gomes, em Alagoas.



“A rua é assim desse jeito. Os meninos, a gente atravessa eles no braço, porque não quer ver eles molhado. Caderno, eles não dão”, conta uma moradora de Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco.

“Essa água não é ideal para ser tomada e, principalmente dar ela para as crianças. Isso aí tem um germe total. Eu trabalho aqui, mas dela eu também não bebo”, revela um homem.

“Tem aluno que até cai da carteira, principalmente os menores, da educação infantil”, diz uma moradora de Codó, no Maranhão.

“Quando temos a necessidade de irmos para o banheiro, nós vamos para o mato. Os alunos e a professora”, afirma uma mulher.

O que a reportagem mostra são escolas em que falta tudo, escolas que nem de longe lembram uma escola. O que não falta é a força de vontade de alunos, professores e pais que sofrem com as péssimas condições de ensino. Sofrem e ficam indignados.

“Ei, quatro anos sem receber farda, aqui, ó”, conta uma mãe. “Sem receber farda, sem ninguém dar atenção para gente”, afirma uma outra mãe. “As crianças da gente são desprezada aqui dentro”, reclama.

O Fantástico mostra a situação da entrada de uma escola municipal, em Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco.

“Quando chove, a água invade, e chegam molhados, tudo sujo. Aí a situação. Aí não tem. Um bebedor bom não tem. Papel higiênico não tem”, afirma a mãe de aluno Maria Betânia dos Santos.

Revoltada, ela diz que as professoras pedem aos pais até material de limpeza: “Elas pedem à gente uma vassoura, pedem detergente. É o que for para botar aqui. Para ajudar aqui. E tem vez que as pobrezinhas passam quase um mês sem receber. Aí como é isso?”.

Isso é a realidade de escolas públicas em Alagoas, em Pernambuco e no Maranhão.

Na mais recente pesquisa brasileira do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), esses estados estão entre os que tiveram as notas médias mais baixas. Os repórteres do Fantástico passaram dois meses registrando as condições de escolas nesses estados.

Fantástico: Que horas você sai de casa?
Williana Soares (aluna): Quatro horas.
Everton Guedes Cavalcante (aluno): A hora que eu saio de casa, o máximo é 4h10, mas me acordo 3h50.

Só tem um jeito para o Everton e para a Williana irem à escola: de caminhão.

“Tem uma base de uns 55 alunos que nós vai (sic) nesse caminhão. Só que tem a dificuldade da estrada”, explica o motorista José Fernandes de Melo.

É uma estrada de terra. Depois dessa viagem, em Joaquim Gomes, em Alagoas, é que eles pegam o ônibus escolar da prefeitura. Mas e quando chove?

“Com dia de sol, nós consegue (sic). Quando choveu, não consegue chegar aqui”, conta o motorista.

O jeito então é ir... “Andando. Fora a ladeira que tem para subir”, conta Williana.

Ou então... “É ficar em casa mesmo, sem poder ir para a escola”, admite Everton.

Já em Lagoa Grande, em Pernambuco, quem não tem caminhão vai de charrete. Seu Francisco diz que a filha, a Rosileide, se queixa quando a escola não pode funcionar.

Em Codó, no Maranhão, o André e o primo dele, o Eduardo, são vaqueiros de manhã. De tarde, caminham 35 minutos até a escola.

Por lá, falta quase tudo. Não falta carinho. “Vocês são guardado no lado esquerdo do meu coração. Então, sejam bem-vindos mais este ano que nós temos aqui para trabalhar, para melhorar, para ver os nossos acertos”, anuncia a professora.

Em Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco, se chegar a uma escola assim não é fácil, entrar também pode ser bem difícil, como foi visto no início da reportagem.

Na frente de outro colégio da mesma cidade, a situação é pior ainda: o esgoto está aberto. E ainda uma terceira escola enfrenta o mesmo problema, no mesmo município.

“Está há seis anos assim. Agora, é o que a gente diz para as mães: nós como funcionários vamos entrar. Nós somos funcionários, precisamos preservar a escola aberta para o aluno”, diz a secretária escolar Maria Vieira de Araújo.

Fantástico: Como que a senhora chegou hoje para dar aula? Qual foi a situação que a senhora encontrou na sala de aula?
Auriele Galvão (professora): A escola toda estava alagada. Não é goteira, é chuva mesmo. Eu afasto todas as cadeiras, boto todo mundo pro canto, e coloca baldes aqui. A água desce todinha pela parede. Inclusive eu já perdi trabalhos que a gente realiza trabalhos com os alunos, coloca nas paredes em exposição, mas aí desce tudo, molha tudo.

Você pode pensar que é uma cidade muito longe dos grandes centros, mas não é: Jaboatão dos Guararapes fica a cerca de seis quilômetros do metro quadrado mais caro de Recife, na praia de Boa Viagem.

Finalmente, a aula começa, inclusive na escola indígena Pajé Miguel Selestino da Silva, em Palmeira dos Índios, em Alagoas. O que falta é a própria sala de aula.

Fantástico: Há quantos anos o senhor dá aula nessa situação aqui?
Jecinaldo Xucuru Cariri (professor): Há mais de dois anos que eu venho ministrando aula debaixo da mangueira. É bastante complicado, até porque de repente vem uma chuva, então tem que todo mundo correr e abandonar a aula.

Em uma galpão, funciona outra sala. É uma situação de improviso, porque a sede original da escola não tem mais condições de uso e está interditada. No galpão, os alunos ficam espremidos. Além do desconforto, tem o perigo.

A escola municipal em Codó, no Maranhão, se chama Divina Providência e espera providências há muito tempo.

Fantástico: Há quanto tempo essa escola está assim? Do jeito que está assim hoje.
Deusdet Oliveira Matos (comerciante): Está com mais de 15 anos.

O Deusdet é um comerciante que construiu a escola há 50 anos e, do jeito que pode, continua tomando conta dela.

Deusdet Oliveira Matos: Quando está gotejando, eu vou, tiro a goteira. Agora, esse ano eu ia fazer essa parede de tijolo, mas ainda não fiz.
Fantástico: O que leva o senhor a cuidar dessa escola?
Deusdet Oliveira Matos: O espírito de humanidade, para poder auxiliar os filhos dos moradores a não se criarem analfabeto.

“A situação, como vocês estão vendo, desde o ano passado que a gente está desse jeito. A falta de cadeira, sentam e não tem o braço da cadeira. Eles estão com dificuldade para escrever. E eu estou utilizando a minha mesa, para que eles fiquem mais à vontade. O que eu posso fazer eu estou fazendo”, diz Juciara de Souza, professora em Petrolina, Pernambuco.

Em uma das cadeiras é possível ver parafuso para fora.

“Eu gostaria que tivesse cadeiras boas e que não fossem quebradas”, afirma uma aluna.

“Já teve caso de criança perder aula, porque não tinha cadeira”, conta a mãe de aluno Edineide Helena da Costa.

“O piso da escola não é adequado para o tipo de carteira, porque as carteiras, como é você pode ver, é um cano. Então, elas afundam no chão. E aí tem aluno que até cai. Aí chora, devido ao chão batido, que aqui não sabe se aqui é uma subida, ou ali é uma descida. É um desnível total. Porque aqui era uma casa de moradia. Era uma pessoa que morava aqui. Aí montou essa escola aqui para eles”, conta Rosa Maria Pereira Cunha, professora em Codó, no Maranhão.

As escolas visitadas pelo repórter Eduardo Faustini ficam em regiões bem quentes. Nas salas, todo mundo se queixa do calor. “É quente. No calor não tem quem suporte”, reclama a aluna Mayara Nunes de Alencar, em Petrolina, Pernambuco.

“Tem um ventilador, mas na outra sala. Um ventilador não é suficiente para os aluno. É muito aluno”, diz a zeladora Josiane Barbosa da Silva, de Lagoa Grande, Pernambuco.

Em outras escolas, um, dois ou um monte de ventiladores, nada resolveria, porque elas não têm energia elétrica.

Rosa Maria Pereira Cunha (professora em Codó, no Maranhão): Quando chove, fica escuro.
Fantástico: Não tem luz.
Rosa Maria Pereira Cunha: Tem não. Não tem luz.

Como beber água nessas condições? E como fazer a merenda?

“Para beber água, a gente pega água com a dona da terra. Pega uma garrafa de água e trago para cá, porque também está faltando filtro”, conta a professora Eliete de Araújo Lobes.

“Eu trabalho aqui, mas dela eu também não bebo, porque a gente vê a situação da água. Isso aí tem um germe total. Até lá em cima tem um pisador de cavalo e um pisador de boi. Tem uns bois que ficam aí atrás que bebem dessa água aí em cima da barragem”, José Dionísio Justino, professor em Joaquim Gomes, em Alagoas.

Celso Selestino (agente de saneamento em Palmeira dos Índios, em Alagoas): Não tem tratamento. Do jeito que ela passa aqui, ela abastece a cidade e não tem tratamento nenhum.
Fantástico: Agora tem algum sistema de filtro para proteger essa água?
Celso Selestino: Não. O filtro que tem aqui só isso aqui, não tem filtro nenhum. O pessoal é que coa a água ali e dá para as criança beber.

“A fossa é dentro da cozinha, e o suspiro é dentro da cozinha. Aonde a merenda já chega pronta e a gente tem que servir a merenda neste setor”, revela um funcionário de Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco.

“Geralmente a merenda só aparece de maio a junho. Geralmente é nesse período que a merenda aparece”, diz uma funcionária de uma escola na cidade de Codó, no Maranhão.

“Custa a chegar. E quando vem, a gente se junta lá com a vizinha aqui, que me ajuda demais, e aí a gente faz a merenda para essas criança. E, quando não, eles comem fruta da estação. Desse jeito”, conta a professora Maria do Amparo dos Anjos.

Professora de Lagoa Grande, em Pernambuco: Às vezes não tem aula porque não tem a merenda.
Fantástico: Difícil, não é?
Professora: É complicado.
Fantástico: Como é que você se sente, assim, cuidando dessas crianças nessa situação?
Professora: Assim, eu me sinto... pequena, né? Que seus alunos não tá crescendo. Você sente como se tivesse diminuindo, não tá aumentando.

E aí, se o aluno tem o que comer e faz sua refeição, é hora de escovar os dentes. Mas em que banheiro?

“A água que a gente tem para botar nas descargas. Ontem, quem fez a limpeza fomos nós, os professores. Ó, aqui não tem a torneira”, denuncia a professora Marilucia Gomes de Sá, professora em Petrolina, Pernambuco.

“O ano passado eles estudaram sem banheiro, não tinha banheiro”, conta Francisco da Silva, pai de um aluno em Lagoa Grande, Pernambuco.

Josiane Barbosa (zeladora em Lagoa Grande, Pernambuco): Ó, tem esse banheiro aqui. Não tem luz, todo esculhambado. Tão fazendo um ali fora, mas começaram e não terminaram ainda.
Fantástico: A descarga funciona?
Josiane Barbosa: Não.

Fantástico: Como é que faz o aluno quando precisa ir ao banheiro?
Funcionária: Os meninos vão para detrás da escola, e as meninas, do outro lado, assim como a professora também. Que nós não temos banheiro.
Fantástico: A senhora usa o mato quando...
Funcionária: Também.

Fim das aulas, hora de voltar para casa. Lama, viagem longa e perigosa, em mais um dia do ano letivo.

Essas escolas passam por inúmeras dificuldades. Para muitos professores, a situação é mais difícil ainda, porque eles têm que dar aulas para várias turmas ao mesmo tempo. É o chamado ensino multisseriado, bastante comum no Brasil.

Fantástico: Enquanto a senhora está dando aula para uma turma, a outra aguarda, é assim que é feito?
Professora: É. Sempre eu começo pela educação infantil, já tá aprendendo a coordenação motora. Eu passo primeiro. Aí vou para o outro que já está lá no quarto, quinto ano.

Algumas das escolas mostradas na reportagem oferecem aos alunos menos do que o mínimo do mínimo. Uma escola com infraestrutura elementar tem que ter água, banheiro, esgoto, energia elétrica e cozinha. Quase metade das escolas brasileiras é assim.

São 87 mil ou 44,5% do total de escolas no país, segundo estudo feito por pesquisadores da Universidade de Brasília e da Federal de Santa Catarina.

“Escolas com estrutura precária em geral são escolas municipais e muitas dessas escolas são rurais. Se nós pegarmos escolas que atendem alunos com um nível socioeconômico equivalente, as que têm melhor estrutura tendem a oferecer melhor resultado”, diz José Joaquim Soares Neto, pesquisador da UnB.

A escola com a infraestrutura adequada tem sala dos professores, biblioteca, laboratório de informática, quadra esportiva e parque infantil. Conta também com acesso à internet e máquina de cópias.

E a escola com infraestrutura avançada tem tudo isso e ainda laboratório de ciências e instalações para estudantes com necessidades especiais.

Das 195 mil escolas brasileiras, pouco mais de mil são avançadas. Isso representa 0.6% do total. “Em geral, essas escolas estão em regiões como Sul e Sudeste”, completa o pesquisador.

Diante disso tudo, o que é que leva todos esses brasileiros, alunos, professores e também os pais, a seguir em frente?

O professor Elias Ferreira da Silva passou por algumas dessas situações que você acabou de ver, chegou à universidade e hoje dá aula na Escola São José, em Alagoas, aquela dos alunos que precisam do caminhão para ir à aula.

“É justamente essa vontade que eles têm de um futuro melhor que fazem ele ter essa força de sair 30 quilômetros, 20 quilômetros, 15 quilômetros, para chegar até a escola”, destaca Elias Ferreira da Silva.

“Ano passado, quando cheguei aqui, estava tudo caído, aí eu me sentei e, sinceramente, eu chorei”, revela uma professora.

“Eu queria que ela fosse grande, que tivesse vários professores, apesar que eu gosto de todos os meus professores, eles me ensinam muito bem”, comenta uma aluna.

“Eu sempre digo isso, que eu acho que a gente que trabalha na Zona Rural, nós somos realmente heroínas”, afirma uma mulher.

“Apesar desses lugares mais longínquos possível, vocês são o futuro dessa nação, construindo a sua própria história, ajudando a erguer mais esse país tão grande”, afirma uma professora.

A Prefeitura de Codó, no Maranhão, diz em nota que vem melhorando a infraestrutura das escolas rurais. Afirma que, nos últimos cinco anos, foram construídas e equipadas 150 novas salas de aula. E que está prevista a construção de mais 28 escolas nos próximos 2 anos.

Veja o que os outros órgãos públicos têm a dizer:

A prefeitura de Jaboatão dos Guararapes informou na sexta-feira (7) que o trabalho de recuperação está em andamento.

“Já recuperamos 51 escolas e temos um cronograma de execução até o final do ano. As três escolas visitadas, desde a produção das imagens até o presente o momento, já resolvemos mais de 90% do que vocês filmaram”, afirma secretário de Educação de Guararapes, Francisco Amorim.

A Secretaria de Educação de Joaquim Gomes, em Alagoas, informa que tem projetos junto ao Ministério da Educação para obter recursos federais para recuperar escolas rurais e também urbanas. Novas cadeiras já estão sendo compradas e reparos estão sendo feitos nas escolas.

O secretário de Educação de Lagoa Grande, em Pernambuco, diz que o município está trabalhando na recuperação das escolas em regime de urgência.

“Encontramos o município totalmente sucateado. Fizemos um levantamento emergencial onde a gente poderia intervir de imediato”, afirma o secretário de Educação de Lagoa Grande, Daniel Torre.

A Secretaria de Educação de Alagoas afirma que a ordem de serviço para recuperação da Escola Estadual Pajé Miguel Selestino já foi assinada. Serão instalados um laboratório de informática e uma biblioteca.

As cadeiras da escola Joaquim Francisco da Costa, em Petrolina, Pernambuco, foram substituídas cinco dias depois de o Fantástico visitar a escola.

TRANSPORTE TEMERÁRIO


ZERO HORA 10 de março de 2014 | N° 17728


EDITORIAIS



Levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS) aponta irregularidades preocupantes na área de transporte escolar no Rio Grande do Sul, que precisam ser enfrentadas de imediato. Os problemas não se restringem apenas à frota, que registrou uma redução importante na idade média em circulação, mas ainda oferece riscos inquietantes, como o fato de alguns veículos circularem sem cinto de segurança. Há também falhas na formação dos condutores, muito dos quais trabalham sem habilitação específica e tem até registros de infrações gravíssimas na carteira de motorista.

Certamente, o objetivo do relatório do TCE não é alarmar os pais ou os próprios estudantes transportados – do Ensino Infantil ao Superior, passando pela educação especial. É óbvio, porém, que um sistema responsável pelo deslocamento de 400 mil usuários por todo o Estado não pode dar margem a qualquer tipo de risco previsível, nem esperar que um problema aconteça para agir. Por isso, é preciso que o estudo contribua para ações efetivas sob o ponto de vista da prevenção, que garantam mais segurança para os usuários.

O importante é que, a cada levantamento desse tipo, fique claro que as falhas estão sendo corrigidas. A manutenção de ônibus e vans com tempo excessivo em circulação, por exemplo, acaba na prática tornando o serviço ainda mais caro para o poder público. E é preciso que as falhas, quando existentes, sejam expostas com franqueza para os munícipes, que assim poderão controlar ou mesmo pressionar para que sejam corrigidas logo.



ESCUELAS DE TIEMPO COMPLETO


ZERO HORA 10 de março de 2014 | N° 17728

ARTIGOS

JULIANA BRIZOLA

Muitos argumentam e defendem teses sobre a educação pública em nosso país. Poucos radicalizam sobre o essencial: educação é prioridade. Nos países desenvolvidos, como Finlândia, Coreia do Sul e Irlanda, para citar alguns, os estudantes passam em média nove horas na escola. Aqui, o tempo de permanência na escola pública não supera cinco horas diárias. No Uruguai, seguindo o modelo criado por Leonel Brizola e Darcy Ribeiro, o presidente Pepe Mujica adotou a proposta pedagógica denominada Escuelas de Tiempo Completo. Lá, o modelo foi implantado buscando reduzir as disparidades sociais. O projeto, iniciado em 2005, em cinco anos avançou em 14% das escolas de educação básica.

Enquanto nosso vizinho investe na educação pública enfrentando os desafios do século 21 e “asumiendo el desafío de avanzar em una educación inclusiva y de calidad para todos”, conforme as orientações de políticas educacionais do Conselho de Educação Inicial e Primária da Administração Nacional de Educação Pública, aqui patinamos em propostas e contrapropostas. O projeto inclusivo da Escola de Tempo Integral idealizado por Brizola e Darcy, há mais de três décadas, responde às expectativas sociais. E não avançou porque, ao contrário dos valentes uruguaios, projetos de igualdade social nunca foram nossa prioridade.

Embora a realidade apresentada, acredito que é através do compromisso que conseguimos avançar. Assim, depois da aprovação constitucional pela Assembleia Legislativa, em 2011, que torna a educação de tempo integral uma obrigação do Estado, abri duas frentes de trabalho: uma, para auxiliar os agentes públicos nessa tarefa que, conforme a lei regulamentadora, prevê a implantação do sistema integral em até 10 anos para 50% dos escolares gaúchos, com adaptação física das escolas, dos currículos e também a preparação dos professores; a outra, através da comissão especial direcionada ao estudo do projeto original com as necessidades de atualizações e de um diagnóstico de outros países, com nossa proposta.

Todo esse trabalho servirá de fio condutor com a história que se iniciou em 1961, quando no Ano da Escolarização foram construídas 6 mil escolas, erradicando o analfabetismo e transformando o Estado gaúcho em modelo nacional de educação. Se a educação é mesmo prioridade e não somente discurso de campanhas políticas, temos que radicalizar!


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Uma grande ideia de difícil aplicação no Brasil por falta vontade politica em investir na estrutura e nos educadores, e pela ingerência do "politicamente correto" que impede a a disciplina e o civismo na formação dos alunos. Nas escolas, defendo um ensino multidisciplinar envolvendo os conhecimentos científico, artístico, desportivo e técnico para identificar talentos, desenvolver potencial e promover uma cultura  de respeito e de disciplina para uma melhor qualidade de vida, relação social proativa e sobrevivência no mercado de trabalho

sexta-feira, 7 de março de 2014

AS FALHAS DO TRANSPORTE ESCOLAR GAÚCHO


ZERO HORA 07 de março de 2014 | N° 17725

LARA ELY


NO CAMINHO DA AULA. Relatório do TCE aponta problemas na formação de motoristas e veículos sem cintos de segurança


O transporte escolar no Rio Grande do Sul ainda tem condutores com idade avançada, infrações graves, sem cursos de formação e psicotécnicos específicos, além de apresentar veículos sem cintos de segurança. As informações foram apontadas em levantamento da situação do transporte escolar municipal no Rio Grande do Sul, realizado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS) e divulgado na manhã de ontem.

De acordo com a pesquisa, a maior parte da frota apresenta condições adequadas de transporte, mas ainda registra veículos com mais de 10 anos, condutores sem habilitação específica e motoristas com infrações graves e gravíssimas. Diretor de controle e fiscalização do TCE, Leo Richter destaca que, embora tenha caído de 13,5 para 11,4 anos a idade média dos veículos e zerado a quantidade de carteiras vencidas em relação a 2011, ainda há transportes que trafegam com grande ociosidade de vagas.

– Outros transportam alunos acima da capacidade – acrescenta.

A qualificação dos condutores e a falta de cinto, segundo ele, são problemas adicionais para a segurança:

– O número dos veículos sem cinto pode ser baixo, mas um único acidente pode ser fatal, por isso notamos que há coisas que precisam ser melhoradas para aprimorar a qualidade da prestação do serviço.

Os resultados do estudo subsidiarão os gestores públicos e as auditorias realizadas pelo tribunal. Segundo Richter, o objetivo é melhorar o serviço para os cerca de 400 mil usuários do serviço, 25% dos alunos matriculados na rede básica do ensino público:

– O estudo ajuda os gestores a melhor adequarem a estruturação orçamentária, a qualidade do transporte e a segurança dos transportados.

Recentemente, o TCE-RS enviou ofício aos prefeitos e aos presidentes de câmaras de vereadores, orientando sobre o correto registro, no orçamento de cada município, das despesas realizadas na área do transporte escolar.


terça-feira, 4 de março de 2014

O NÓ DA EDUCAÇÃO



ZERO HORA 04 de março de 2014 | N° 17722


EDITORIAIS



Recém divulgado, o Censo da Educação Básica revela alguns aspectos promissores para o país, como o aumento do número de crianças em creches e pré-escolas e uma maior quantidade de alunos em instituições de tempo integral e na educação profissional. Ao mesmo tempo, aponta uma evasão de proporções inquietantes no Ensino Médio, motivada principalmente pelo fato de muitos alunos continuarem nesse nível numa faixa de idade em que já deveriam estar na universidade. Em consequência, a estimativa mais recente, de 2012, é que o Brasil tinha 1,5 milhão de jovens entre 15 e 17 anos fora da escola, o equivalente a toda a população de Porto Alegre. O país já demonstrou que é possível universalizar o acesso ao ensino no nível fundamental. Precisa agora estender o avanço ao Ensino Médio, evitando que um contingente tão expressivo de alunos acabe deixando a sala de aula antes do tempo.

Menos mal que, nessa faixa de idade, cada vez mais adolescentes estejam se encaminhando para a Educação de Jovens Adultos (EJA) e para a educação profissional, que na mais recente edição do Censo registrou uma expansão de 6% sobre o ano anterior. Ainda assim, essa é uma etapa do ensino que precisa ser acompanhada muito de perto, pois é responsável pela formação de jovens prestes a ingressar no mercado de trabalho ou na universidade. A qualidade do ensino ministrado nessa etapa tem relação direta com o padrão dos futuros universitários e com o nível de excelência da mão de obra das empresas, mostrando-se decisiva para os ganhos de competitividade. E é preciso considerar que essas alternativas não podem ser vistas simplesmente como substitutas do Ensino Médio.

Os dados do Censo, de 2012, demonstram que 98% das crianças entre seis e 14 anos cursavam o ensino formal. Na faixa de 15 a 17 anos, porém, 15,8% não estudavam, o que exige uma ação firme da parte do poder público. Se foi possível atrair e reter a quase totalidade dos alunos do nível fundamental, o mesmo deve ocorrer na etapa posterior. O país tem que se mostrar capaz de motivar os jovens no Ensino Médio, a ponto de fazê-los se interessar pelos conteúdos e se manter em sala de aula. Nessa idade, os futuros profissionais precisam ser devidamente orientados sobre a importância de assegurarem mais qualificação para disputar o mercado de trabalho.

Alternativas como o turno integral, em ascensão no país, podem colaborar no esforço de retenção e qualificação de alunos, desde que alicerçadas em projetos pedagógicos coerentes. O nó da educação no Ensino Médio, porém, só será desfeito quando a escola contar com professores, condições materiais e conteúdos sintonizados com o que os alunos buscam nessa fase da vida.