EDUCAÇÃO MULTIDISCIPLINAR

Defendemos uma política educacional multidisciplinar integrando os conhecimentos científico, artístico, desportivo e técnico-profissional, capaz de identificar habilidade, talento, potencial e vocação. A Educação é uma bússola que orienta o caminho, minimiza dúvidas, reduz preocupações e fortalece a capacidade de conquistar oportunidades e autonomia, exercer cidadania e civismo e propiciar convivência social com qualidade, dignidade e segurança. O sucesso depende da autoridade da direção, do valor dado ao professor, do comprometimento da comunidade escolar e das condições oferecidas pelos gestores.

domingo, 17 de abril de 2011

AMAR OU ARMAR-SE

O tom aterrador da matança naquela escola do Rio de Janeiro foi tão cruel e inexplicável, que nos fez perder o sentido do entendimento. Nada perturba tanto quanto os instantes seguintes às tragédias. O choque nos deixa apalermados: a cognição se esvai e entramos no delírio. Um delírio às avessas, que fantasia com o absurdo e cai no exótico do exótico.

Assim, já que é impossível explicar por que o rapazote de 23 anos foi à antiga escola para matar a esmo e matar-se, a “solução” surgiu como trovão na tontura. E os sábios de plantão proclamaram: se a arma matou, proíbam-se as armas e tudo se resolverá.

Lembram-se do motorista enlouquecido que jogou o carro contra centenas de ciclistas em Porto Alegre? E se, para evitar a repetição dessa loucura, proibíssemos os automóveis nas ruas da cidade?

Os sábios de plantão têm mais “soluções”: levar policiais às escolas, mesmo que pareçam quartéis ou fortalezas, com cadernos misturados a cassetetes e pistolas. Em vez de se educar pela compreensão e pelo amor, reprima-se pela ostentação do medo! Em vez de amar, armar-se.

Não se toca nas causas estruturais da violência. Ou simulam que não há causas e que a vida nada engendra. Ou que o violento nasce em geração espontânea, por fatalidade genética ou decisão do demônio e, assim, a violência está acima da capacidade humana de enfrentá-la.

Olhamos só a violência milenar, esquecendo que o modelo atual de sociedade faz do ato violento um bem de consumo que usamos e aplaudimos. A “nova música” é brusca nos acordes e vulgar nas letras. Os desenhos infantis na TV, com correrias, gritos, sons duros e cores berrantes, abrem caminho à aceitação futura da síntese disso tudo – a violência. Boa parte da publicidade comercial exibe conquista e violência como meta, em imagem ou linguagem de baixo calão. O hedonismo substitui a integração amorosa e rebaixa a beleza do erotismo ao nível de cloaca.

Surgem até novas igrejas que cultuam o poder do dinheiro, do “vencer na vida custe o que custar” e ignoram o amor cristão. Mas em nada disto se vê gênese alguma de violência!

A psique humana é inexplicável e oculta. Freud, Jung ou Lacan, a psicanálise ou a psiquiatria e os psicotrópicos, apontaram caminhos para equilibrar ou mudar comportamentos, mas não desvendaram os mecanismos da mente humana. A tomografia é capaz de fotografar ou filmar as funções cerebrais, mas não desvenda o que move os instintos e os desejos. Nem o que distingue a bondade da perversão. Sabemos, porém, que a mente se forma e a alma se constrói.

E, nisso, o rapazote assassino deixou vestígios de si. Engendrado pelo delírio, fantasiou-se de mártir e, antes de sair a matar (e matar-se) cortou a barba, deixou carta ordenando que “mãos impuras” não tocassem no seu cadáver e um vídeo de despedida atacando “os covardes que aniquilam inocentes”. Ao descrever os demais, descreveu-se a si mesmo.

Ao sentir-se desprezado em vida, apostou no post mortem: fez pontaria nas meninas e matou 10 delas. Acertou em dois meninos por acaso ou por desvio da bala. O alvo eram as pré-adolescentes, pois queria exterminar as fêmeas. Sentia-se macho absoluto no gatilho. Não no afeto.

Quem inventou o espelho envenenou a alma humana, dizia Fernando Pessoa. O rapazote assassino queria ser visível, espelhar-se nos machos do Big Brother Brasil. Sem TV, copiou os anônimos terroristas palestinos que, antes de puxar o fio da bomba guardada no corpo, despedem-se num vídeo pensando passar à História.

FLAVIO TAVARES, JORNALISTA E ESCRITOR - ZERO HORA 17/04/2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário