ZERO HORA 2 de fevereiro de 2015 | N° 18061
MOISÉS MENDES
Recebi por e-mail, como se fosse novidade, cópia de uma carta escrita há ano e meio por um universitário catarinense. Seus admiradores andam divulgando a carta de novo, numa cruzada anticomunista. Pelo que recebo de textos nessa linha, percebe-se a amplificação do alerta de que o comunismo anda nos rondando. Cada um com seus medos.
A carta é do estudante João Victor Gasparino da Silva, de 23 anos. Ele diz a um professor do curso de Relações Internacionais de uma universidade que não quer estudar Karl Marx.
Fui pesquisar sobre a carta na internet. Descobri que ressuscitaram um texto velho, no contexto da nova onda de medo do comunismo.
João Victor se nega a estudar Marx porque o rejeita como pensador e abomina as coisas ruins cometidas em seu nome pelo mundo. E cita as ditaduras que se ergueram na Rússia, na Coreia, em Cuba, na Romênia.
Eu também nunca quis estudar Karl Marx e só fiquei sabendo do que ele pensa pela mão dos outros. Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, nosso maior intelectual vivo, teve seus estudos acadêmicos sobre escravidão municiados fortemente pelas ideias de Marx. FH nunca foi comunista.
Li mais gibi do que coisa pesada, mas consumi teóricos do marxismo e também anticomunistas, conservadores liberais e liberais conservadores, à esquerda, à direita, ao centro e ao extremo centro.
Levo a sério a teoria segundo a qual é possível saber mais de determinada coisa lendo-se os escritos de terceiros nos quais você confia. Eles te informarão mais do que uma leitura direta. Eu, preguiçosamente, aderi a essa ideia na adolescência.
Há também quem ache válido, como pensa o estudante, que, ao se negar a ler sobre algo, alguém se protege dos males que aquilo provoca.
É um direito dele. O estudante poderia ampliar a lista citada na carta e, além de Marx e do que se chama genericamente de marxismo, se negar a estudar a inquisição, a escravidão, o nazismo, as guerras. Todos os pensadores que podem ter contribuído para algum mal deveriam ser afastados das bibliotecas escolares. E também todos os que refletiram a respeito deles.
Alguém decidiria o que é saudável, e as escolas somente recomendariam a leitura de “coisas do bem”. Seria um tédio, mas quem sabe assim estejamos finalmente livres do comunismo.
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