EDUCAÇÃO MULTIDISCIPLINAR

Defendemos uma política educacional multidisciplinar integrando os conhecimentos científico, artístico, desportivo e técnico-profissional, capaz de identificar habilidade, talento, potencial e vocação. A Educação é uma bússola que orienta o caminho, minimiza dúvidas, reduz preocupações e fortalece a capacidade de conquistar oportunidades e autonomia, exercer cidadania e civismo e propiciar convivência social com qualidade, dignidade e segurança. O sucesso depende da autoridade da direção, do valor dado ao professor, do comprometimento da comunidade escolar e das condições oferecidas pelos gestores.

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

VIOLÊNCIA QUE CERCA AS ESCOLAS



ZERO HORA 28 de agosto de 2015 | N° 18277


VANESSA KANNENBERG


SEGURANÇA. ENSINO COMPROMETIDO


Como faz todos os dias, na manhã de 5 de agosto, o programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, provocou os ouvintes a enviar por WhatsApp histórias sobre um tema que os apresentadores tratariam. Naquele dia, a pauta era o mau desempenho das escolas gaúchas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Entre as centenas de mensagens, um assunto se sobressaiu: a violência.

Professor espancado por familiares de aluno

O professor de Geografia Carlos Geovani Ramos Machado havia planejado, para aquele dia, uma atividade no cinema. A ideia era mostrar outra realidade para os alunos do 7º ano da Escola Municipal Presidente Vargas, em Porto Alegre. Na telona, o filme brasileiro Colegas, sobre sonhos vividos por garotos com síndrome de Down.

Um contratempo após a atividade fez com que aquele passeio tivesse um desfecho trágico. Depois de discutir com um aluno que teria participado do furto do lanche de colegas menores e de levar uma joelhada do estudante, o professor Geovani foi recebido pelos familiares do menino na escola, que o acusavam de ter batido no adolescente. Acabou espancado e humilhado pelos parentes do garoto. Teve os dentes quebrados.

– Achei que tudo estava resolvido. Eles me encheram de desaforo, tentei argumentar. Enquanto explicava, veio um tio do aluno e me deu um soco com um tijolo no rosto. Eu caí, sem reação alguma – conta Machado.


DEPRESSÃO E DIFICULDADE PARA REAGIR EM SALA


Antes de entrar na ambulância, o professor lembra ter acordado e ouvido alunos e pais gritando:

– Tem que bater, linchar.

Aquelas palavras doeram mais que as agressões físicas. Ao recordá-las, não segura as lágrimas.

– Foi muito chocante. É como se a violência não fosse suficiente.

O episódio completou um ano na última quarta-feira. Ainda hoje, o professor tem dentes provisórios, um deles apenas “colado”, visivelmente à frente dos demais.

Geovani não tem dinheiro para corrigi-lo – custaria mais R$ 7 mil. Foram seis dentes danificados. A Secretaria Municipal de Educação (Smed) informa que aprovou o orçamento de R$ 31 mil para a reconstrução da arcada dentária, já que o caso se enquadra em acidente de trabalho. A liberação depende da procuradoria-geral do município, sem previsão. O atendimento psicológico também teve de ser interrompido. Mesmo após ter trocado de escola e voltado a lecionar depois de seis meses, as crises de depressão são frequentes. Geovani conta que perdeu o poder de mediar problemas em sala de aula.

– Se alguém começa uma briga, paro tudo e chamo a direção. Simplesmente, não tenho reação – desabafa o professor, que, dividido entre o amor à profissão e o trauma, estuda para concurso.

Só no último ano, a Smed contabiliza cinco casos considerados graves de violência envolvendo professores. Em todos eles, os agressores não eram alunos, mas familiares ou amigos.

Novo colégio depois de ser esfaqueado

A sensação de insegurança não é apenas dos professores. O sentimento é compartilhado pelos alunos. E o desamparo está dentro e fora dos muros da escola. A 600 metros do Palácio da Polícia, na Avenida Ipiranga, um crime chocou Porto Alegre no mês passado e deixou marcas em Dener Schavinski Stefanello, 18 anos. Ele foi esfaqueado em 8 de julho, a uma quadra do Colégio Protásio Alves.

Dener não quer mais falar sobre o caso. Recuperado do golpe próximo ao coração e de uma hemorragia, voltou à sala de aula só nesta semana. A mãe demorou a encontrar uma escola para a qual ele quisesse voltar. O rapaz se recusava a retornar ao Protásio Alves.

– Todas as opções que apareciam, ele reclamava que são perigosas, que têm violência – conta a mãe do rapaz, Lisiane Schavinski.

O suspeito do crime permanece preso, segundo o delegado Cesar Carrion – outras vítimas também o reconheceram. Um deles é um estudante de Direito, que também foi golpeado com uma faca, mas cuja perfuração parou na jaqueta.

– São casos difíceis de resolver, porque há poucos registros policiais. E quando resolvemos, os criminosos não ficam presos – critica o delegado.

A diretora do Protásio Alves, Ana Maria de Souza, diz que seus alunos, na maioria das vezes, vão até a polícia. Segundo a escola, cerca de 50 estudantes teriam sido atacados no último ano na região. Mobilizados pelo ataque, os estudantes organizaram protestos. Um policial passou a ficar fixo na escola. Mas assaltos seguem frequentes.

– Um PM plantado aqui não resolve, é o reforço de efetivo, a inteligência, a ronda que podem fazer a diferença – afirma a diretora.

NA FALTA DE POLICIAIS, DIRETORA PRECISA AGIR


Em outras escolas, o quadro não é diferente. Na Alcebíades Azeredo dos Santos, com quatro hectares em Viamão, quase no limite com a Capital, não é diferente.

– Não tem um dia em que não entre um aluno e diga: “fui roubado” – diz a diretora da escola, Naira Allem da Veiga.

Com 36 anos de docência pública, na falta de policiamento, ela faz às vezes de policial. Já separou brigas, tirou droga da mão de aluno e expulsou invasor. Os banheiros passaram a ser trancados e para usá-los é preciso pegar a chave na direção. O videomonitoramento serve para verificar suspeitas e também intimidar.

Mesmo assim, Naira se vê impotente. Baleado em um assalto no qual era um dos autores, um aluno, hoje com 15 anos, ficou tetraplégico. Voltou à Alcebíades neste ano para reencontrar a diretora.

– Ele só queria um abraço – recorda Naira.

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