EDUCAÇÃO MULTIDISCIPLINAR

Defendemos uma política educacional multidisciplinar integrando os conhecimentos científico, artístico, desportivo e técnico-profissional, capaz de identificar habilidade, talento, potencial e vocação. A Educação é uma bússola que orienta o caminho, minimiza dúvidas, reduz preocupações e fortalece a capacidade de conquistar oportunidades e autonomia, exercer cidadania e civismo e propiciar convivência social com qualidade, dignidade e segurança. O sucesso depende da autoridade da direção, do valor dado ao professor, do comprometimento da comunidade escolar e das condições oferecidas pelos gestores.

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

ROTINA DE TRÁFICO E CONSUMO DE DROGAS ENTRE ALUNOS


Colégio público tem rotina de tráfico e consumo de drogas entre alunos. Reportagem flagrou, em sete dias, alunos do Colégio Estadual Júlio de Castilhos comprando e fumando maconha em horário de aula no pátio

Por: Jeniffer Gularte
ZERO HORA 21/08/2017



Jovem vende maconha para outro estudante no pátio de tradicional escola da Capital Foto: Mário Jr./RBS TV / Agencia RBS

Um homem com capuz se aproxima de um adolescente e entrega a ele uma porção de maconha. O garoto, de boné e mochila nas costas, permanece com a mão estendida, enquanto recebe outras três frações da droga logo depois. Os dois estão cercados por um grupo de 10 adolescentes, que conversa sob a sombra das árvores. O pagamento é feito com duas notas de dinheiro, imediatamente conferidas pelo traficante. Já esmigalhando a erva, o estudante se afasta para unir-se a um segundo grupo, que o espera. Juntos, preparam o cigarro, que é aceso ali mesmo.

O flagrante de venda e consumo de drogas, comum em parques, praças e ruas de Porto Alegre, ocorreu na manhã de 17 de julho, uma segunda-feira, em horário de aula, no pátio do Colégio Estadual Júlio de Castilhos, mais tradicional escola pública do Rio Grande do Sul. O uso de droga se dava ao lado do refeitório da instituição que formou líderes e intelectuais como Leonel Brizola, Paixão Côrtes e Moacyr Scliar.

Por não serem perturbados, no interior da escola do bairro Santana, a 400 metros do Palácio da Polícia, alunos parecem estar à vontade para a compra e o consumo de entorpecentes no momento em que deveriam estar na sala de aula.


Os registros da reportagem aconteceram em sete ocasiões, nos dias 13, 14, 17, 18 e 19 de julho e 17 e 18 de agosto, entre 7h30min e 11h30min. Estudantes fumavam maconha e traficantes comercializavam entorpecentes nos fundos da instituição que até o final dos anos 1980 era chamada de ¿escola-padrão¿.


O consumo de drogas entre os estudantes se inicia nas primeiras horas da manhã e não se restringe a um momento do dia. Antes das 8h, adolescentes começam a se reunir no pátio dos fundos da escola. Ficam todo o período de aula conversando, trocando mensagens por celular e consumindo drogas. A rotina não condiz com o que prega uma das regras que consta no site da instituição: ¿O aluno deve permanecer na sala de aula, mesmo na troca de períodos.¿


Às 9h, cachimbo de garrafa pet


O comportamento dos estudantes mostra que não há temor de represália. A maioria não se esconde para o consumo. Na manhã de 19 de julho, ao lado da casa de força, quando os termômetros marcavam 5°C na Capital, três gurias e um guri preparavam um cachimbo feito de garrafa pet. Eram 9h.

Todos ajudavam: um esmigalhava a erva, outro fazia o cigarro artesanal, um terceiro preparava a garrafa e o quarto fumava após acender o fogo. Em cinco minutos, a droga estava pronta para consumo. Outros dois estudantes foram atraídos pela movimentação. Mais de uma vez, o cigarro apagou e eles voltaram a acender. Enquanto fumavam, se abraçavam e faziam selfies sem ser incomodados por nenhum professor ou responsável.

Se a droga não ultrapassa os portões da escola, os alunos a recebem pelos muros. Um pula, e na calçada, outro alcança. Isso acontece tanto pela Avenida Piratini, em frente à instituição, quanto na Avenida Laurindo, em uma das vias laterais. Mas não é preciso esforço para ter acesso às dependências do Julinho.

No último dia de aula antes das férias de julho, a reportagem entrou na escola durante o intervalo, circulou pelas dependências e pelo pátio sem ser abordada. No pátio dos fundos, vários grupos fumavam maconha. Próximos a um dos muros, embaixo de uma árvore, jovens dançavam com música alta ao lado de uma garrafa de vodca vazia. Eram 10h30min.


"A memória imediata do aluno vai para o espaço", diz especialista


O consumo de qualquer droga – incluindo o álcool – compromete a aprendizagem do adolescente e está colocando o desenvolvimento de uma geração em xeque. É o que defende a psiquiatra e coordenadora da equipe de dependência química da Fundação Mario Martins, Isabel Suano.

Segundo ela, as áreas do cérebro de fixação e memória estão em amadurecimento até os 19 anos. Com o uso de entorpecentes, o jovem aprende muito menos do que do que poderia:

– Até esta idade, o cérebro ainda não está pronto e o uso de qualquer substância desse tipo interfere no aprendizado. Para poder aprender, tem que fixar e memorizar. Se ele vai para aula sob uso de droga, a memória imediata dele vai para o espaço. O que ele poderia aprender em dez minutos simplesmente não vai ficar na cabeça dele. Isso sem contar que, nesta fase, o adolescente deveria aprender a lidar com os sentimentos, exercitar a frustração, mas, ao contrário disso, temos uma nova geração que está anestesiada.


Realidade ultrapassa portões do colégio


Para o médico psiquiatra e educador Celso Lopes de Souza, da Universidade Federal Paulista (Unifesp), a situação enfrentada pela escola, com consumo e venda de drogas nas suas dependências, deve ser ponto de partida para reinvenção.

– A escola tem de se refundar. É difícil, mas não é impossível. É preciso mostrar riscos, exemplos claros, com muita realidade e sem ficar dourando nem colocando a droga como o pior bicho do mundo. Têm de ser pensadas medidas para quem está usando e para quem ainda não usou – diz Souza.

O desafio, segundo Souza, é formar jovens preparados para entender que as frustrações são passageiras.

– Para o jovem, fazer o que seu colega está fazendo é muito importante. Porém, precisa saber que pode discordar das ideias sem discordar da pessoa. Quando o jovem percebe isso, é mais fácil dizer não às drogas – diz.

O professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) José Vicente Lima Robaina avalia que o cenário reflete a realidade que ultrapassa as portas da escola: a liberdade sem responsabilidade da qual os jovens desfrutam. Robaina acredita que a maioria dos alunos que não consome deve se fortalecer e agir por meio de campanhas, palestras e discussões.


"Adolescente é futuro novo usuário", diz delegado


Após assistir aos vídeos feitos pelo GDI, o diretor de investigações do Departamento Estadual do Narcotráfico (Denarc), delegado Mario Souza, disse que as imagens não deixam dúvida de que ocorre venda de drogas no pátio da escola.

Segundo o policial, o número de alunos fumando é considerável e, aparentemente, o uso se de maconha é feito de formas diferentes: cigarro, cachimbo e narguilé feito com garrafa pet.

– Temos de nos preocupar. As escolas precisam ser blindadas. Os traficantes vão lá porque veem o futuro do seu negócio.O objetivo do traficante é sempre o jovem, por uma questão econômica, considera o delegado. Por isso as escolas precisam de atenção especial.

Desde 2011, a Polícia Civil atua com a Operação Anjos da Lei no combate ao tráfico e consumo de drogas próximo e dentro de escolas. A ação atua na prevenção, com palestras de conscientização, e na repressão, coibindo comercialização. Em seis anos, foram mais de 800 presos. Em 2017, 46 escolas da Capital foram monitoradas, incluindo o Julinho.


Falta de informação



As escolas de Porto Alegre são as únicas do Estado que não têm representante nas Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e Violência Escolar (Cipave), que discutem e orientam ações dentro das instituições.

Das 30 coordenadorias regionais de educação no Estado, apenas a 1ª, que representa as escolas da Capital, não participa do Cipave, que começou os trabalhos em julho de 2015 mas nunca conseguiu alinhar ações com educandários da metrópole. Das 2,5 mil escolas do RS, 2,4 mil já aderiram:

– As que faltam são as de Porto Alegre. Não temos dados, informações e nenhum tipo de mapeamento daqui porque as escolas não respondem nem os formulários que enviamos – afirma a coordenadora estadual do Cipave, Luciane Manfro.

Enviado em junho, um questionário sobre casos de tráfico, posse e uso de drogas foi respondido por apenas 38 das 250 escolas estaduais da Capital.

– Nesse universo, foram registrados 42 casos. Mas essa é uma amostra pequena para falar da realidade.

______________
DENUNCIE

Telefone — 0800 518 518
Site — pc.rs.gov.br
E-mail — denarc-denuncia@pc.rs.gov.br

______________
CONTRAPONTO

- O que diz a Secretaria Estadual da Educação - Em abril, a direção do Colégio Estadual Júlio de Castilhos, em Porto Alegre, esteve reunida com membros do Ministério Público para denunciar a venda de drogas nas imediações da escola. No mês seguinte, um contato foi feito com o Denarc, que ministrou palestras preventivas aos alunos — outros dois encontros do tipo vão ocorrer na escola ainda este ano. Sempre que é detectado o consumo e/ou venda de drogas no entorno da escola, é feita a comunicação às autoridades policiais.
O atual quadro de funcionários da Escola Estadual Júlio de Castilhos conta com cinco monitores, e todos têm, entre suas atribuições, a função de observar o pátio e demais dependências. A 1ª Coordenadoria Regional de Educação (1ª CRE) estuda a necessidade de aumentar a quantidade de profissionais atuando no estabelecimento.

 - O que diz a diretora do Colégio Júlio de Castilhos, Fernanda Gaieski - Diretora do Colégio Júlio de Castilhos, Fernanda Gaieski não reconhece a venda de drogas por alunos, mas admite que a escola já teve denúncias de tráfico e que o consumo de entorpecentes é, sim, uma realidade. Falta de professores e monitores para circular pelo pátio, pouco controle de quem entra e sai na escola são, segundo ela, algumas das dificuldades que a escola enfrenta.

A reportagem fez imagens de uso e venda de drogas dentro do pátio do Julinho. A escola tem conhecimento disso, já teve problemas?Não. Isso, para mim, é uma novidade. Tanto é que todas as inferências que fizemos como direção de escola, os alunos foram encaminhados — os menores para a Polícia Civil e os maiores foram feitos boletins de ocorrência e (eles) foram retirados da escola. Não vejo tráfico de drogas dentro da escola. O Denarc esteve aqui fazendo palestras e vai dar continuidade no segundo semestre. Na investigação do Denarc aqui dentro também não foi visualizada venda ou tráfico na escola. O que estava acontecendo era que alunos estavam trazendo e saíam para comprar drogas no Carandiru (condomínio próximo à instituição) e estavam usando dentro da escola. Já identificamos esses alunos e estamos tomando as providências legais que cabem à escola.

Quando isso ocorreu?Em maio, junho e julho, quando o Denarc esteve aqui. Tivemos a denúncia de que tinha alunos traficando aqui dentro, aí fizemos uma investigação como direção, identificamos os alunos e fizemos o encaminhamento. Quando recebi o delegado do Denarc, ele nos deu todas as alternativas e nos colocou a par de que os alunos pulavam o muro do colégio para comprar droga no Carandiru e voltavam pulando muro de novo, o que a gente não tem como controlar porque o Estado não nos manda monitor para o pátio. O que temos visualizado muito é o tráfico de drogas na praça em frente à escola. O tráfico aqui dentro, para mim, é uma novidade. A questão dos traficantes é muito folclore, tu vais me desculpar. Já virou folclore muito grande a imagem pública do Julinho, de que é visado por traficante. Aqui na escola, não. Isso eu garanto.

Então a senhora acredita que é folclore existir traficantes que são alunos da escola e que vendem droga dentro da escola?Não, estou dizendo que aumentam muito a história porque o Júlio de Castilhos já virou folclore. Não estou dizendo que eles não existam. Posso até ter alunos que esteja trazendo droga. Todos os casos de drogas que identificamos aqui dentro, eram alunos novos do primeiro ano que vieram de outros bairros como Restinga, Partenon e Lomba do Pinheiro.

Tendo em vista essa situação, é necessário monitoramento em tempo integral dos alunos?Estamos o tempo inteiro monitorando. A gente sabe dos grupos que têm. Mas fica difícil: ou a gente monitora alunos ou fizemos o trabalho administrativo da escola. Estamos com 2,2 mil alunos.

Os alunos ficam tempo fora da sala de aula e espalhados nos fundos da escola. É possível controlar quem está "matando" aula?Sim, controlamos e mandamos para aula. Temos esse controle, sim. Agora acabei de chegar do pátio do colégio, tu me pegou no telefone por milagre. Estamos o tempo inteiro circulando no pátio da escola. Mas é como te disse: ou eu circulo no pátio da escola ou eu faço atividade administrativa. E os alunos que identificamos em pontos que sejam locais de provável uso de droga, estamos convocando os pais.

Quantos monitores para o pátio a senhora acha que seriam necessários?Pedi um monitor de pátio. Mas eu não tenho. Nosso problema é as pessoas que pulam o muro. Antes de sairmos de férias nós identificávamos que, todos os dias, pessoas de fora pulavam para dentro da escola. Até que ponto é um aluno do Júlio de Castilho que está trazendo droga? Aqui dentro tem muitos alunos (das escolas) do Inácio Montanha, Idelfolso Gomes, Luciana de Abreu, Protásio Alves e Emílio Massot.

O acesso a escola é realmente fácil. Um dia consegui entrar na escola, pela porta da frente e ninguém perguntou quem eu era.Quem abriu a porta para ti?

A porta estava aberta.A porta não deveria estar aberta, começa por aí. Mas é bom saber. Quando entra alguém, o porteiro deve identificar essa pessoa e direcioná-la para onde ela quer ir. Existe essa falha também. Sabe como é: alguns servidores públicos em determinados momentos. Ele (porteiro) deveria ter lhe parado, aberto a porta e perguntar onde a senhora iria. E não ter deixado entrar. Não autorizamos nem que os pais subam e vão na sala de aula dos filhos.

Esse episódio dá a entender que se eu entrei, qualquer outra pessoa entra também.Com certeza.

Os alunos ficam sem um ou dois períodos de aula, não há monitores no pátio, como vocês controlam eles?A gente controla como pode controlar, também não posso fazer milagre. Não posso transformar água em vinho. Não sou Cristo.

Como os alunos reagem quando são flagrados?É muito difícil. Não posso revistar o aluno, não posso tocar nele, não posso fazer nada, senão serei processada. Nem olhar a mochila. A gente vai muito do bom senso do aluno. Os casos que peguei eu vi que eles estavam usando droga porque cheguei na hora do uso da droga e pedi que me acompanhassem até minha sala. Se não menores de idade, comunico os pais.

Vi uma garrafa de vodca sendo consumida por alunos.O que identificamos, pegamos, recolhemos. Quando vejo os alunos com copos de café, peço pra ver e cheirar o que tem dentro. Mas eles podem não me deixar cheirar. O mesmo com garrafa de chimarrão

terça-feira, 1 de agosto de 2017

PEDAGOGIA MILITAR

Resultado de imagem para ação civico social das forças armadas brasileiras nas escolas


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA -
Quem não conhece as ações cívico-sociais implementadas pelas Forças Armadas em época de PAZ, não conhece a força institucional das Forças Armadas quando ela assume seu papel de protagonismo social numa Democracia, num  Estado Democrático de Direito. Mesmo nas guerra, estas ações cívico-sociais determinam vitórias e conquista de coração e mentes pela força solidária que carrega. É falacioso e preconceituoso afirmar que militares representam o horror da guerra e que só pensam em guerra, extermínio e inimigo. Não, os militares pensam, se preparam e se estruturam para a paz de olho nas ameaças à PAZ. A disciplina, o espírito de corpo, a preparação espartana, a virtude da solidariedade, o planejamento, a busca por metas, o civismo e o patriotismo, inerentes aos militares, são matérias importantes para jovens e adultos cidadãos comprometidos com o sucesso pessoal, com a família, com os interesses da comunidade e com a nação.


ZERO HORA 29 de Julho de 2017
 


PROA. HISTORIADOR CONTESTA PROJETO DESENVOLVIDO PELO COMANDO MILITAR DO SUL E PELA SECRETARIA ESTADUAL DA EDUCAÇÃO, QUE PRETENDEM IMPLEMENTAR ATIVIDADES DAS FORÇAS ARMADAS NAS ESCOLAS GAÚCHAS



É preciso aprofundar o debate sobre o projeto Exército Vai às Escolas, lançado pela Secretaria Estadual da Educação (leia mais no quadro abaixo). Para mim, trata-se de questionar o motivo da iniciativa: que tipo de educação os militares querem levar para as escolas neste momento?

O Exército já vinha dando pistas de que algo está ocorrendo. No blog do Exército (sim, há um), o coronel Alessandro Visacro afirma que ?transformações na conduta da guerra são, antes de tudo, decorrentes de transformações sociais? e defende um ?ambiente estratégico do futuro? que permita às instituições militares ?expandir seu repertório de missões para fazer frente a complexas e difusas ameaças?. A que ameaças ele se refere?

O que ocorre é que o Exército está abandonando a concepção de guerra como conflito entre países para substituí-la pela ideia de enfrentamento das ?pequenas guerras?, contra atores armados não estatais, ?como, por exemplo, bandoleiros, salteadores, guerrilheiros, insurretos e terroristas (que) sempre fizeram parte da história?. Frente às situações de conflito interno, a entrada dos militares na escola sugere a tentativa de inculcar a mentalidade de defesa na juventude. Por essa razão, o Exército vem promovendo a criação de fóruns de debate para professores, alunos, servidores e servidores públicos sobre temas como a defesa e a segurança nacional. E fala, desde 2015, na criação de uma Universidade de Defesa Nacional.

Se a logística é o início da economia de guerra, o projeto Exército Vai às Escolas é sua pedagogia ? uma nova forma de comunicação entre civis e militares. Se, na instalação da economia de guerra, o discurso político e a economia dissolvem-se, suplantados pela estratégia, na instalação da pedagogia de guerra o discurso pedagógico se dissolve na estratégia militar.

Se logística, segundo Eisenhower, é ?o procedimento segundo o qual o potencial de uma nação é transferido para as suas forças armadas, tanto em tempos de paz como de guerra?, qual o potencial maior de uma nação do que os jovens? ?Sem o saber, já somos todos soldados civis. E alguns de nós sabem disso. O golpe de sorte, para o terrorismo da classe militar, é que ninguém o reconhece. As pessoas não reconhecem a parte militarizada de sua identidade, de sua consciência?, diz o filósofo Paul Virilio. É esse o projeto: militarizar a consciência dos jovens.

Mas isso tem um efeito colateral: o de considerar a racionalidade unicamente a partir de sua eficiência, espécie de ?inteligência desenfreada cuja ausência de limites provém da tecnologia, da ciência?, conforme Virilio. Ou seja, trata-se de outra forma de reforçar a instalação de uma mentalidade neoliberal na juventude.

Agora, a guerra não é mais a política por outros meios ? é a pedagogia por outros meios. O que é novo? O exército já enfrenta situações de guerra sem guerra com sua participação nas grandes cidades. Agora, volta sua atenção aos movimentos sociais. A impressão que dá é que os militares estão indo às escolas para evitar a guerra política, antecipar-se a ela, prevenir-se antes do surgimento de conflitos. Ainda que possam dar aulas, o problema é que, se permitirmos que os militares interfiram na escola, eles poderão fazer isso em qualquer lugar.

A iniciativa é lançada no mesmo momento em que impera a lei antiterrorismo, que dá amplo poder ao Estado na repressão dos movimentos sociais. Se muitos desses movimentos são protagonizados por jovens, é de se perguntar que tipo de Corte superior poderá impedir que o Estado faça atos de guerra sem guerra contra a juventude. Ao que parece, o acesso dos militares às salas de aula serve para colocar as novas regras do jogo para os jovens.

A colaboração do Exército com as escolas nunca é inocente. Ela expressa a mutação das condições de exercício do poder pelo Estado sobre suas instituições de guerra em situações de paz. Não são as palestras sobre a pátria que me assustam; é, isso sim, a possibilidade de nossos novos professores militares insistirem com os alunos em certa pedagogia, de que devem manter um olhar constante sobre um suposto inimigo a partir da sala de aula. Ensinaremos nossas crianças a ?ver tudo o tempo todo?? Ensinaremos o princípio do arquivamento total com a sugestão de uso de celulares para a gravação de tudo o que for considerado suspeito? Temo que a inclusão da escola responda a um processo de substituição de uma ?guerra global contra o terror? por uma ?guerra local contra o terror? ? não a guerra para sempre, mas a guerra por toda a parte, que transforma o mundo inteiro num campo de batalha, lembrando o raciocínio de Bertrand Chamayou.

Não é o que ocorre com a iniciativa do Comando Militar do Sul, de que as salas de aula são também parte da estratégia militar, e que isso só pode ser feito exercendo um poder invasivo, que a classe militar se arroga para si, de ir onde queira, passando, inclusive, por cima da soberania da escola?

Já vemos as escolas de periferia como zonas de conflito armado. Amanhã, drones estarão nessas escolas exercendo vigilância. Por que essas instituições se tornaram alvos militares? Porque as zonas de combate, para os militares, são extensíveis ao infinito. A visão oculta no projeto é de que a escola é um campo de batalha, e o futuro imaginado pelos militares é aquele no qual alunos denunciam a existência de atividades subversivas ? no grêmio estudantil, entre os professores etc. ? visando a autorizar o uso da força militar baseada na lei antiterrorismo, agora, na escola. Estudantes cooptados pela direita já não filmam aulas de professores de esquerda para denunciá-los junto ao movimento Escola Sem Partido? Não precisa ir tão longe: é só mostrar ao militar de plantão.

Os militares dizem falar em nome da paz, mas sua farda está ali para lembrar-nos do horror da guerra. Os tanques exercem sedução sobre os jovens: apresentam o militar de forma suave, como se fosse algo lúdico, alimentando-se do desejo de invulnerabilidade juvenil. Mas a escola é justamente o lugar de ensinar a esse jovem que ele precisa... ter limites.

Os militares deixaram de ir à escola para difundir o ethos militar tradicional; agora seu desejo secreto é ir à escola para exercer controle numa eventual situação de guerra interna. Não podemos esquecer que, desde 2013, são os jovens que têm ido às ruas, ocupado as avenidas e, de certa forma, constituindo-se como força subversiva. O projeto Exército Vai às Escolas é mais do que uma forma de conquista das suas consciências pelos militares: é sua luta para estabelecer as bases para um novo campo de batalha.


JORGE BARCELLOS

OS GOVERNOS ESTÃO AUSENTES NA QUESTÃO DA VIOLÊNCIA?

Resultado de imagem para Marlova Jovchelovitch Noleto

ZERO HORA 29 de Julho de 2017 . CAPA


LAURO ALVES


ENTREVISTA: Marlova Jovchelovitch Noleto, coordenadora da área de ciências humanas e sociais e representante interina do escritório da Unesco no Brasil


A Unesco tem acompanhado as situações de violência em escolas do Rio Grande do Sul?

Vi ações em governos anteriores (entre 2003 e 2011), quando tinha um comitê estadual de prevenção da violência. Fizemos o Escola Aberta, tivemos alguns programas com a prefeitura de Porto Alegre, e agora a Unesco voltou a falar com o prefeito Nelson Marchezan.

O que a Unesco entende por violência na escola?

Vai desde o entorno até a escola propriamente dita e engloba não só a violência física, mas também a psicológica, o abuso verbal, a violência sexual, o assédio, o bullying e o cyberbullying. É um tema complexo para não ser abordado nas suas múltiplas facetas. Noto ausência completa dos governos na questão da violência na escola.

Três casos recentes chamaram a atenção. Quando uma aluna de 15 anos foi assassinada, professores de uma escola de Porto Alegre disseram que nada tinham a ver com a vida dela e que os alunos estão acostumados à violência. O segundo episódio foi em escola vandalizada por alunos após episódios de violência no entorno. Professores queriam resolver o problema com cerca elétrica e vigilância. O último caso foi a morte de Marta. Como avalia o posicionamento das escolas?

Não resta dúvida, pelos três casos que acabaste de me descrever, que é fundamental trabalhar ações de políticas de prevenção à violência. Nós estamos falando de uma menina assassinada, aliás, de duas. Se tu olhares para o Brasil, esse cenário se repete em todos os Estados. Isso que estás descrevendo, que os professores parecem inertes, representa também uma banalização das situações de violência. Ninguém deve se acostumar com a violência. A escola precisa ser um lugar seguro e protegido para que a educação prospere.

Os professores estão despreparados para lidar com a violência?


Eu acho que não podemos generalizar. O que se vê é pouco investimento na capacitação. Em alguns programas que a Unesco desenvolveu em parceria com o MEC, houve investimento, inclusive em Porto Alegre. Mas não teve continuidade, e sabemos que esses programas precisam ser permanentes. Estamos trabalhando com a Secretaria de Educação Continuada (órgão ligado ao MEC) para desenhar um novo programa de prevenção, que será lançado até o final do ano.

O bullying mata. Apenas dois dias de aula no início do ano letivo bastaram para a intriga entre duas adolescentes terminar em uma tragédia que marcou a comunidade de Cachoeirinha, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Marta Avelhaneda Gonçalves, 14 anos, nova na Escola Estadual de Ensino Básico Luiz de Camões, morreu após se envolver em uma briga com outra colega mais jovem, de apenas 12 anos, dentro da sala de aula. A agressão física foi consequência das provocações verbais iniciadas na véspera.

Intimidações, humilhações e ridicularizações entre alunos são frequentes em colégios, sejam públicos ou privados. Na falta de dados recentes e detalhados sobre bullying escolar, o que serve de termômetro, nas unidades estaduais, é o trabalho da Comissão Interna de Prevenção a Acidentes e Violência Escolar (Cipave). A comissão foi criada por lei em 2012, mas só saiu do papel em 2015, quando uma professora e policial civil de carreira vislumbrou o potencial do projeto e decidiu colocá-lo em prática. Luciane Manfro implantou o programa em 2,3 mil das 2,5 mil escolas. Nomeou comissões regionais, conquistou a parceria de 30 instituições, como a Polícia Civil, o Conselho Tutelar e o Ministério Público, cujos especialistas compartilham conhecimento com os alunos, lançou um site (cipave.rs.gov.br) e desenvolveu apostilas de suporte. Um software projetado pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) será aplicado por uma empresa especializada em pesquisa até o final do ano, para qualificar a coleta de dados. Até um mascote foi criado para auxiliar na divulgação: uma centopeia que representa a união de esforços.

? Eu acredito no que faço e que é possível mudar a realidade de uma escola. Para isso, é preciso envolvimento da equipe diretiva, dos professores, dos pais e da comunidade. A escola é de todo mundo, não só de quem trabalha nela. Mas o diretor é a alma da escola, ele tem de saber a parte de pedagogia, entender de recursos humanos, financeiros e precisa de inteligência emocional para saber lidar com as diferenças, coisa que os cursos de licenciatura não estão dando. O que é preocupante ? sublinha Luciane.

Ela instituiu o levantamento de dados no ano passado. Um questionário foi respondido pelas diretoras no início de cada semestre. A pesquisa sinalizou que o bullying é a violência mais difícil de combater. Se as provocações verbais não forem interrompidas, alerta Luciane, podem culminar em agressões físicas, como ocorreu com Marta na escola de Cachoeirinha.

? Não tem como prevenir a morte em uma agressão física, o que a gente tem que fazer é evitar que se chegue na agressão. Quando a escola aprende a trabalhar isso por meio do diálogo, diminui esse tipo de conflito ? afirma.

Como nem todas as escolas responderam ao questionário nos dois semestres e a estatística é feita manualmente por Luciane, a coordenadora optou por limitar-se a uma amostragem de cem escolas aleatórias do Interior. O relatório constatou que as ocorrências de bullying cresceram 40% de um semestre para o outro (de 74 para 104). Em Porto Alegre, onde, segundo Luciane, a resistência dos diretores em participar do programa é acentuada, principalmente nas escolas mais vulneráveis, o índice aumentou 150% (de 30 para 75). O dado da Capital é um recorte de 20 das 91 unidades que estão no projeto. Não significa necessariamente um aumento nos relatos, mas, talvez, reflita o aprimoramento dos profissionais em identificar as ocorrências.

Como o bullying costuma acontecer no horário do recreio, quando as crianças e os adolescentes estão sem a supervisão de um adulto, algumas escolas já estão desenvolvendo atividades que chamem a atenção dos alunos com brincadeiras, músicas e peças de teatro. Falar sobre o assunto e mostrar que o bullying pode estar atrelado a crimes como racismo, homofobia, ameaça e difamação é outra forma de conscientizá-los.

? Professores e monitores não percebem o bullying porque os alunos, já sabendo que aquilo não é legal, o praticam de forma velada ? comenta Luciane.

A morte de Marta foi a consequência mais grave registrada recentemente em escolas do Estado. No dia em que a adolescente completaria 15 anos, em 21 de junho, uma manifestação marcada para ocorrer diante do colégio foi substituída por uma visita ao túmulo. Foi a primeira vez que a mãe, Teresinha Avelhaneda, 43 anos, voltou ao cemitério. Em seu perfil do Facebook, ela deixou uma mensagem: ?Foi dos dias mais tristes da minha vida. Poderia estar comemorando os 15 anos da minha princesa. Só que ao invés de dar o anel (de aniversário) para ela, levei flores no cemitério. Será que existe coisa mais triste do que isso para uma mãe??.