ZERO HORA, 27 de maio de 2012
Fernando Seffner, Professor da faculdade de Educação da UFRGS
Abertura
Conforme largamente anunciado pela imprensa nos últimos dias, o Rio Grande do Sul apareceu, em estatística divulgada pelo Inep – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira –, como o campeão de repetência nacional, em especial no Ensino Médio.
Primeiro ato: o Rio Grande do Sul é o melhor
O Rio Grande do Sul possui um sistema de ensino exigente, que não se dobrou ao compromisso demagógico das aprovações em massa. Aqui os professores são severos, encaram com profissionalismo sua missão, e não se intimidam de reprovar os fracos e despreparados. O Brasil vem tentando copiar o modelo gaúcho, elevando as taxas de reprovação, mas aqui no Rio Grande do Sul elas se elevaram mais ainda, consolidando nossa liderança no Ensino Médio.
Não há motivo para drama, os dados divulgados são motivo de júbilo. Só comprovam que somos um Estado que investe com vigor em educação, preparando com qualidade as novas gerações para os desafios futuros. Há muitos anos os alunos gaúchos obtêm excelente desempenho no Enem.
Segundo ato: a educação está em crise no Rio Grande do Sul
A qualidade da nossa educação vem caindo vertiginosamente. Somos o pior salário do Brasil. Para saber da estrutura física das escolas, basta ver que na mesma semana em que os índices foram publicados um aluno morreu atingido pela queda da trave de uma goleira.
Entremos em qualquer escola pública gaúcha para olhar os mestres: professores despreparados, vazio de inovações pedagógicas, ausência evidente de vontade de ensinar, o absenteísmo como estratégia corriqueira. O aluno se desloca até a escola, e a aula não acontece. Soltar mais cedo é a regra. Faltam ideias e vontades.
Aqui tivemos a famosa “enturmação”, pela qual alunos foram mudados de local a torto e a direito, ajuntados conforme a conveniência econômica. Nossos professores têm carga horária dividida em numerosas escolas e não conseguem estreitar o vínculo com as classes de alunos. Os dados só comprovam que somos um Estado que não investe em educação, que não trata os professores com dignidade, e com isso condena as novas gerações a um desempenho medíocre no futuro.
Terceiro ato: é o Rio Grande do Sul que está em crise
Somos um Estado falido, que perdeu competitividade, população, indústrias, peso político no contexto nacional. A escola não funciona sozinha, mas articulada ao entorno social. O estímulo para progredir, obter êxito e concluir os estudos está ligado à possibilidade de sucesso no mercado de trabalho e a uma sociedade que premia os esforços do aprendizado.
Muitos alunos, de forma deliberada, se tornam desleixados nos estudos com o objetivo de reprovar. Ser estudante entre nós é considerado uma profissão. Não somos mais um Estado equilibrado. Não temos mais uma economia diversificada. Não somos mais “Primeiro Mundo” acima da média nacional. Arrumem primeiro o Estado, depois teremos uma escola de qualidade. Não existe escola de qualidade em um Estado economicamente decadente.
Epílogo
Difícil saber o que mostram as taxas de repetência. Reprovar é indicativo de qualidade ou de falência da educação? A “culpa” é dos alunos, dos professores, dos gestores, da própria população gaúcha? A resposta não está simplesmente nos índices, taxas ou números, está na compreensão que cada grupo social tem do valor da educação.
Este artigo não foi feito para achar respostas, foi feito para multiplicar perguntas. Melhor do que respostas apressadas, devemos abrir amplo debate acerca do tema. Vai encarar?