EDUCAÇÃO MULTIDISCIPLINAR

Defendemos uma política educacional multidisciplinar integrando os conhecimentos científico, artístico, desportivo e técnico-profissional, capaz de identificar habilidade, talento, potencial e vocação. A Educação é uma bússola que orienta o caminho, minimiza dúvidas, reduz preocupações e fortalece a capacidade de conquistar oportunidades e autonomia, exercer cidadania e civismo e propiciar convivência social com qualidade, dignidade e segurança. O sucesso depende da autoridade da direção, do valor dado ao professor, do comprometimento da comunidade escolar e das condições oferecidas pelos gestores.

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

O JULINHO E O ENSINO

ZERO HORA 30 de dezembro de 2013 | N° 17659

ARTIGOS


Paulo Brossard*



Um fato chocante e de inegável importância social foi divulgado por ZH dias antes do Natal ao retratar a alarmante deterioração de um dos mais conceituados colégios de Porto Alegre, o Julinho, como era familiarmente denominado o Julio de Castilhos. Ao tempo em que surgiam colégios de inspiração religiosa, logo consagrados pela excelência do ensino ministrado por notáveis educadores, o governo rio-grandense, de forte tintura comtiana, cuidou de formar seu colégio padrão, que viria a levar o nome do chefe republicano; cansei de ouvir referências respeitosas ao colégio laico destinado a cotejar com os católicos e evangélicos; o maior louvor suponho viesse daquele que o houvessem frequentado. O trabalho da jornalista Letícia Duarte estendeu-se pelo ano escolar, de 27 de fevereiro a 22 de novembro de 2013; registrando o colapso do que fora um colégio modelar; é impossível resumi-lo, o espaço seria insuficiente para um resumo do resumo, limito-me a dizer que, a todos os títulos, o quadro é deplorável.

É óbvio que sem professor não há escola nem ensino, no entanto, no Julinho, até sete professores por dia faltam às aulas, 89% dos alunos chegam ao final do Ensino Médio sem aprender o mínimo em matemática, 38% saem do Ensino Médio e chegam ao Superior e não sabem ler e escrever plenamente; ao fundo da sala, alunos se divertem com equipamentos eletrônicos durante as aulas; essas singelas observações esclarecem por que a classificação do Brasil entre 65 nações ocupa posição desoladora. É de notar-se que isto acontece em um colégio que durante muitos anos foi dos melhores aqui existentes e em consequência no Brasil inteiro. Esta metamorfose não se operou de repente, o mal, por conseguinte não começou ontem. O colégio que foi o melhor não se transforma no pior da noite para o dia. E o mais grave é que a degradação se infiltra a setores relevantes do país, do governo inclusive a de instituições docentes. Dir-se-á que existem, Deus seja louvado, colégios da melhor e mais justificada reputação e eu sei disso e como brasileiro por isto me felicito, mas infelizmente isto não justifica a cota de colégios de inqualificável reputação. Segundo as repercussões até agora conhecidas, verifica-se que há os que pensam que o fenômeno que deformou o Julinho tem caráter geral e há os que entendem que a falência do antigo e modelar ornamento do colégio oficial é uma exceção.

Não tenho elementos para opinar em favor de uma ou outra das interpretações, mas confesso a minha angústia cívica diante do espetáculo público do caso funesto e vexatório do Julinho, uma vez que os efeitos dele se irradiam aos demais graus do ensino; é evidente que o ensino primário contamina o Ensino Médio e este compromete o Ensino Superior; a esse respeito, louvores seriam poucos, se as numerosas universidades emergentes realmente encarnassem o que a sua denominação anuncia. Também neste caso me confesso sem condições de opinar em assunto de tal relevância, pois não conheço o real teor do ensino oferecido e, mais do que o ensino, da real formação de seus jovens frequentadores.

No entanto, há um dado idôneo que ajuda a esclarecer o problema em causa, não é segredo, foi amplamente divulgado que dos 65 países que participam do exame de avaliação internacional de alunos de 15 e 16 anos em várias áreas ficou o Brasil na 55ª posição em leitura, 58ª em matemática e 59ª em ciências. Dispensável dizer que esses dados indicam as carências do ensino no Brasil. Os dados referidos são dolorosos para não dizer humilhantes. O caso do Julinho soa como uma espécie de S.O.S. partindo da educação.

*JURISTA, MINISTRO APOSENTADO DO STF

domingo, 29 de dezembro de 2013

BRASIL REBAIXADO NA EDUCAÇÃO

Portal EBC -03.12.2013 - 17h10 | Atualizado em 03.12.2013 - 18h01


Confira o ranking dos países com melhor desempenho no Pisa


a prova de leitura, a média do país foi de 410 pontos, o que levou à 55º posição (Marcello Casal Jr/ Agência Brasil )

O Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) é uma aprova aplicada pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para medir o nível de habilidades de estudantes de diferentes países em três áreas do conhecimento: matemática, leitura e ciência. O exame ocorre a cada três anos para alunos na faixa etária dos 15 anos. Apesar de não ser um país-membro da OCDE, o Brasil participa do Pisa desde 2000. O desempenho do país evoluiu nas últimas edições, mas os alunos brasileiros ainda ocupam as últimas posições do ranking do Pisa.


Em 2012, 65 países participaram do Pisa. Em matemática, o Brasil ficou em 58º lugar no ranking, com 391 pontos. Na prova de leitura, a média do país foi de 410 pontos, o que levou à 55º posição. Em ciência, o país ocupa a 59º posição no rankig, com 405 pontos. Confira o ranking do Pisa 2012 em cada área do conhecimento


Desempenho dos países em matemática

1. Xangai (China) 613 pontos
2. Cingapura 573 pontos
3. Hong Kong (China) 561 pontos
4. República da China 560 pontos
5. Coreia 554 pontos
6. Macau (China) 538 pontos
7. Japão 536 pontos
8. Liechtenstein 535 pontos
9. Suíça 531 pontos
10. Holanda 523 pontos
11. Estônia 521 pontos
12. Finlândia 519 pontos
13. Polônia 518 pontos
14. Canadá 518 pontos
15. Bélgica 515 pontos
16. Alemanha 514 pontos
17. Vietnã 511 pontos
18. Áustria 506 pontos
19. Austrália 504 pontos
20. Irlanda 501 pontos
21. Eslovênia 501 pontos
22. Nova Zelândia 500 pontos
23. Dinamarca 500 pontos
24. República Checa 499 pontos
25. França 495 pontos
26. Reino Unido 494 pontos
27. Islândia 493 pontos
28. Letônia 491 pontos
29. Luxemburgo 490 pontos
30. Noruega 489 pontos
31. Portugal 487 pontos
32. Itália 485 pontos
33. Espanha 484 pontos
34. Rússia 482 pontos
35. Eslováquia 482 pontos
36. Estados Unidos 481 pontos
37. Lituânia 479 pontos
38. Suécia 478 pontos
39. Hungria 477 pontos
40. Croácia 471 pontos
41. Israel 466 pontos
42. Grécia 453 pontos
43. Sérvia 449 pontos
44. Turquia 448 pontos
45. Romênia 445 pontos
46. Chipre 440 pontos
47. Bulgária 439 pontos
48. Emirados Árabes 434 pontos
49. Cazaquistão 432 pontos
50. Tailândia 427 pontos
51. Chile 423 pontos
52. Malásia 421 pontos
53. México 413 pontos
54. Montenegro 410 pontos
55. Uruguai 409 pontos
56. Costa Rica 407 pontos
57. Albânia 394 pontos
58. Brasil 391 pontos
59. Argentina 388 pontos
60. Tunísia 388 pontos
61. Jordânia 386 pontos
62. Colômbia 376 pontos
63. Catar 376 pontos
64. Indonésia 375 pontos
65. Peru 368 pontos

Desempenho dos estudantes em leitura

1. Xangai(China) 570 pontos
2. Hong Kong (China) 545 pontos
3. Cingapura 542 pontos
4. Japão 538 pontos
5. Coreia 536 pontos
6. Finlândia 524 pontos
7. Canadá 523 pontos
8. República da China 523 pontos
9. Irlanda 523 pontos
10. Polônia 518 pontos
11. Estônia 516 pontos
12. Liechtenstein 516 pontos
13. Austrália 512 pontos
14. Nova Zelândia 512 pontos
15. Holanda 511 pontos
16. Macau (China) 509 pontos
17. Suíça 509 pontos
18. Bélgica 509 pontos
19. Vietnã 508 pontos
20. Alemanha 508 pontos
21. França 505 pontos
22. Noruega 504 pontos
23 Reino Unido 499 pontos
24. Estados Unidos 498 pontos
25. Dinamarca 496 pontos
26. República Checa 493 pontos
27. Áustria 490 pontos
28. Itália 490 pontos
29. Letônia 489 pontos
30. Espanha 488 pontos
31. Hungria 488 pontos
32. Luxemburgo 488 pontos
33. Portugal 488 pontos
34. Israel 486 pontos
35. Croácia 485 pontos
36. Suécia 483 pontos
37. Islândia 483 pontos
38. Eslovênia 481 pontos
39. Lituânia 477 pontos
40. Grécia 477 pontos
41. Rússia 475 pontos
42. Turquia 475 pontos
43. Eslováquia 463 pontos
44. Chipre 449 pontos
45. Sérvia 446 pontos
46. Emirados Árabes 442 pontos
47. Chile 441 pontos
48. Tailândia 441 pontos
49. Costa Rica 441 pontos
50. Romênia 438 pontos
51. Bulgária 436 pontos
52. México 424 pontos
53. Montenegro 422 pontos
54. Uruguai 411 pontos
55. Brasil 410 pontos
56. Tunísia 404 pontos
57. Colômbia 403 pontos
58. Jordânia 399 pontos
59. Malásia 398 pontos
60. Argentina 396 pontos
61. Indonésia 396 pontos
62. Albânia 394 pontos
63. Cazaquistão 393 pontos
64. Catar 388 pontos
65. Peru 384 pontos

Desempenho dos alunos em ciências

1. Xangai (China) 580 pontos
2. Hong Kong (China) 555 pontos
3. Cingapura 551 pontos
4. Japão 547 pontos
5. Finlândia 545 pontos
6. Estônia 541 pontos
7. Coreia 538 pontos
8. Vietnã 528 pontos
9. Polônia 526 pontos
10. Liechtenstein 525 pontos
11. Canadá 525 pontos
12. Alemanha 524 pontos
13. República da China 523 pontos
14. Holanda 522 pontos
15. Irlanda 522 pontos
16. Macau (China) 521 pontos
17. Austrália 521 pontos
18. Nova Zelândia 516 pontos
19. Suíça 515 pontos
20. Eslovênia 514 pontos
21. Reino Unido 514 pontos
22. República Tcheca 508 pontos
23. Áustria 506 pontos
24. Bélgica 505 pontos
25. Letônia 502 pontos
26. França 499 pontos
27. Dinamarca 498 pontos
28. Estados Unidos 497 pontos
29. Espanha 496 pontos
30. Lituânia 496 pontos
31. Noruega 495 pontos
32. Itália 494 pontos
33. Hungria 494 pontos
34. Luxemburgo 491 pontos
35. Croácia 491 pontos
36. Portugal 489 pontos
37. Rússia 486 pontos
38. Suécia 485 pontos
39. Islândia 478 pontos
40. Eslováquia 471 pontos
41. Israel 470 pontos
42. Grécia 467 pontos
43. Turquia 463 pontos
44. Emirados Árabes 448 pontos
45. Bulgária 446 pontos
46. Sérvia 445 pontos
47. Chile 445 pontos
48. Tailândia 444 pontos
49. Romênia 439 pontos
50. Chipre 438 pontos
51. Costa Rica 429 pontos
52. Cazaquistão 425 pontos
53. Malásia 420 pontos
54. Uruguai 416 pontos
55. México 415 pontos
56. Montenegro 410 pontos
57. Jordânia 409 pontos
58. Argentina 406 pontos
59. Brasil 405 pontos
60. Colômbia 399 pontos
61. Tunísia 398 pontos
62. Albânia 397 pontos
63. Catar 384 pontos
64. Indonésia 382 pontos
65. Peru 373 pontos

Direitos autorais: Creative Commons - CC BY 3.0

RESPOSTAS PARA A EDUCAÇÃO

ZERO HORA 29 de dezembro de 2013 | N° 17658


EDITORIAIS



O Brasil, que já ocupava um incômodo 53º lugar no ranking internacional da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), caiu para a 57ª colocação no comparativo entre 65 países analisados pelo Pisa, a mais abrangente avaliação do ensino global. Num gráfico, a realidade do aprendizado poderia ser representada por uma linha em queda.

Sobram explicações para a dificuldade de avanço da educação brasileira. Uma delas é que os esforços oficiais se intensificaram nos últimos anos, mas continuam faltando disciplina e persistência nas políticas públicas para a área educacional.

Em consequência dessas falhas, e mesmo com alguns ganhos registrados em matemática, poucos alunos na faixa dos 15 anos, avaliada pelo estudo da OCDE, conseguem entender as relações entre os números referidos no primeiro parágrafo deste texto, principalmente quando representadas graficamente. Poucos também têm condições de assimilar uma ideia simples como a transmitida pelo segundo parágrafo, devido às dificuldades no aprendizado do português. Os problemas se acentuam quando os jovens são solicitados a fazer relações entre um parágrafo e outro. Falta-lhes conhecimento para entender a conexão.

O fato novo e promissor é que, aos poucos, profissionais da educação, especialmente professores, começam a reagir contra as adversidades da profissão e empreendem ações individuais para elevar a qualidade do ensino. No Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, por exemplo, essa disposição ficou evidenciada na excelência dos projetos inscritos no recente Prêmio RBS de Educação. A maioria deles comprovou, na prática, que recursos financeiros são importantes, mas nada supera a motivação, o engajamento, a criatividade, a descoberta dos caminhos para chegar direto ao aluno, motivando-o a se interessar pelos conteúdos e a aprender a usá-los em situações do cotidiano.

O ponto em comum entre os países situados no extremo oposto do Brasil na lista do Pisa – os seis primeiros são todos asiáticos – é justamente o fato de contarem com educadores fascinados pela missão de transmitir conhecimento e reconhecidos pela nobreza do papel que exercem perante a sociedade. Isso não significa apenas ganhar bem – embora os salários, nesses casos, sejam incomparavelmente superiores aos pagos no Brasil, que até hoje não conseguiu sequer garantir um piso de ganhos para a categoria.

Por que, então, o país que mobiliza uma explosão de criatividade no Carnaval, que atrai multidões aos estádios de futebol e consegue reunir elevadas somas em tempo recorde para abrigar a Copa do Mundo não consegue fazer o mesmo com a educação? Simplesmente pela incapacidade de transformar o ensino numa obsessão, empreendendo esforço máximo na corrida pelo conhecimento e pela inovação.

Políticas públicas adequadas, como as que investem no aluno, como o Ciência sem Fronteiras, e as que tentam resgatar a dignidade da figura do professor para assegurar a qualidade perdida com a massificação do ensino são fundamentais. As respostas mais eficazes, porém, tendem a vir mesmo é dos próprios educadores. São eles que, bem preparados, bem pagos e reconhecidos pela sociedade, poderão levar o país a transformar a educação numa prioridade de fato e os alunos a dominar disciplinas básicas, como português e matemática, para avançar nas demais.

O quinto editorial da série de análises dos fatos do ano destaca iniciativas isoladas para qualificar a educação no país.

sábado, 28 de dezembro de 2013

UMA BÚSSOLA PARA A EDUCAÇÃO

REVISTA ISTO É N° Edição: 2302 | 27.Dez.13


Há três anos no Congresso, o Plano Nacional de Educação precisa ser aprovado para que o Brasil tenha um norte nesta área fundamental para o desenvolvimento do País

Mariana Brugger e Wilson Aquino




Um dos últimos atos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi encaminhar ao Congresso Nacional o projeto de lei do Plano Nacional de Educação (PNE) para o decênio 2011-2020. Isso foi em 15 de dezembro de 2010. O mandato de Dilma Rousseff está entrando no último ano e o PNE continua no Congresso, aguardando a apreciação dos nobres parlamentares. Antes de entrar em recesso, o Senado Federal aprovou o texto com algumas alterações, que agora retorna para nova votação na Câmara. É fundamental que os deputados deem andamento à questão com celeridade, pois o PNE é o instrumento que orienta as políticas públicas de educação do País. É um caderno de metas que têm de ser executadas pelas três esferas de governo. Sem ele, o Brasil fica como uma nau sem bússola em uma área vital para dar um salto de qualidade necessário.

O texto aprovado pelos senadores contém 14 artigos, 21 metas (o original tinha 20) e 177 estratégias (leia quadro) para colocar a educação brasileira em pé de igualdade com a dos países desenvolvidos. Alguns objetivos são audaciosos, como destinar 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para o setor, erradicar o analfabetismo e garantir que metade das crianças brasileiras esteja matriculada em creches nos próximos dez anos. Mas, como o texto ainda causa controvérsias, as discussões podem se alongar na Câmara.



Especialistas enxergam lacunas no projeto aprovado. “Acolheram 54 das 101 alterações que eu tinha proposto na Comissão de Educação, mas excluíram dispositivos importantes, como o percentual que cabe à União, Estados e municípios nos repasses para a educação e a responsabilidade dos gestores que não cumprirem as metas”, reclama o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), comparando o PNE às promessas de campanha: se não forem cumpridas, não acontece nada. “Para que o PNE funcione é preciso estabelecer os padrões que têm de ser cumpridos. Esse texto não especifica. Como vamos cobrar ou cumprir se não sabemos especificamente o que tem de ser feito?”, questiona a doutora em política educacional pela Universidade de Harvard Paula Louzano, pesquisadora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).

A fonte e a destinação dos recursos também são motivo de discussões. O senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), relator do texto no Senado, fez as contas e concluiu que, dos R$ 440 bilhões previstos para investimento na Educação ao fim dos dez anos do PNE, apenas R$ 120 bilhões estão garantidos pelos repasses do petróleo (royalties, a participação especial e o fundo social). “Podemos dedicar parte dos recursos minerais para o setor e vou trabalhar na tributação das grandes fortunas para chegar aos R­$ 440 bilhões e cumprir as metas”, diz ele. O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) considera o texto um conjunto de metas abstratas. “A única coisa concreta são os 10% do PIB, sem dizer de onde vêm os recursos nem como eles serão gastos, que é o mais grave”, diz Buarque, para quem a educação deveria ser federalizada.




Mas por ser o primeiro instrumento a estabelecer objetivos educacionais, o PNE é de suma importância. Tanto que alguns especialistas preferem que sua aprovação final na Câmara seja adiada para melhorar o texto. “Esperamos conseguir debater com os deputados para retomar os pontos que consideramos importantes”, diz a diretora-executiva do movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz, referindo-se ao compromisso de gestão eficaz, a um maior comprometimento financeiro da União e ao ensino integral. “Depois de tanta luta, não podemos jogar a toalha”, resume Priscila.

foto: Washington Alves/AE
Fonte: Senado Federal

A CONTA DO FRACASSO NA EDUCAÇÃO




Um estudo exclusivo mostra que apenas 8% dos alunos brasileiros terminam o ensino fundamental com conhecimentos adequados tanto em português quanto em matemática


CAMILA GUIMARÃES
26/12/2013 08h12 - Atualizado em 26/12/2013 08h24



O Brasil passou por mais um vexame nos resultados do Pisa, a avaliação internacional de educação feita pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A prova trianual, que avalia os conhecimentos de leitura, matemática e ciência de alunos de 15 e 16 anos, mede e compara o desempenho de 65 países. O Brasil, que participa desde 2000, ficou em 58º lugar. Não registra avanço significativo há 13 anos. Em comparação com países da América Latina, como Chile e México, perdemos em domínio das disciplinas e em equidade (alunos pobres aprendem e avançam menos que os ricos). Em relação aos países mais ricos, a diferença é gritante. Quase 70% dos alunos brasileiros não sabem o mínimo de matemática, em comparação com 8% de Cingapura, 9% da Coreia, 25% dos Estados Unidos e 24% da Espanha.



Se o resultado parece ruim, fica ainda pior quando se avalia quantos alunos sabem tanto matemática quanto português. Esse levantamento foi feito com exclusividade para ÉPOCA pela Fundação Lemann, ONG especializada em educação. O estudo mapeou mais de 5 mil municípios e avaliou quantos alunos da rede pública sabem tanto português quanto matemática em níveis adequados. Segundo o levantamento, apenas 23% de todos os alunos do 5º ano sabem o que deveriam, ao mesmo tempo, nas duas disciplinas. No 9º ano, quando estão a um passo do ensino médio, essa proporção é de apenas 8%. Apenas 35 cidades cumprem a missão de ensinar o mínimo em ambas as áreas para 70% ou mais do total de seus alunos do 5º ano. No 9º ano, nenhuma.

PRIVILEGIADOS
Alunos da rede municipal de Claraval, Minas Gerais. A cidade consegue dar educação completa para 96% dos estudantes de 5o ano (Foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)

Esse desequilíbro no ensino brasileiro também aparece na comparação internacional. Segundo a avaliação da Fundação Lemann, a partir dos dados da OCDE, apenas 8,1% do total de alunos brasileiros que fizeram o Pisa em 2012 tem aprendizado adequado nas três disciplinas avaliadas: português, matemática e ciência. É menos do que México (9,7%), Uruguai (13,5%), Chile (18%) e Turquia (27,7%). Os países considerados avançados em educação têm proporções bem diferentes: Polônia e Canadá, 57%; Coreia, 68%; Finlândia, 60,6%; e Xangai (China), 83%.

A falta de ensino adequado em ambas as disciplinas básicas (português e matemática) é nociva por dois motivos. Primeiro, rouba do aluno chances de desenvolver todas as competências necessárias para poder escolher, no futuro, o caminho que seguirá no mercado de trabalho. É o que se aprende na escola que determina esse caminho. Se o aluno é melhor em matemática, a tendência é seguir a área de exatas. Se tiver facilidade na leitura e na escrita, a área escolhida será de humanas, e o mesmo acontece com ciências. A escola tem obrigação de preparar o aluno para escolher qualquer uma dessas áreas. “Isso, sim, é poder de escolha”, afirma Ernesto Farias, coordenador de projetos da Fundação Lemann. “Se souber só matemática, ou só português, ou só ciências, ele não terá opções de verdade. Estamos tirando opções desses alunos.”

QUALIDADE
AIunos da escola Oscar Batista, de Cambuci, Rio de Janeiro. No município, 59% dos estudantes têm bom ensino (Foto: Reprodução)

Sem uma formação completa, qualquer um, independentemente da área de atuação, tem menos oportunidades na vida profissional e na pessoal. É ilusão achar que um gênio da matemática, um técnico em eletrônica ou um engenheiro não precisarão usar suas habilidades de leitura e interpretação. “Os profissionais qualificados para trabalhar na indústria precisam saber ler um manual e escrever um relatório”, afirma Rafael Luchesi, diretor de educação da Confederação Nacional da Indústria. “A escola básica não prepara esse profissional de forma global. Os que chegam da universidade demoram um ano e meio para ficar prontos para o trabalho.”

As cidades brasileiras que conseguem ensinar português e matemática ao mesmo tempo não têm uma receita milagrosa. Assim como os países bem colocados no ranking do Pisa, elas fazem o básico: não deixam nenhum aluno com dificuldade para trás, investem em professores e seguem um planejamento de aulas que vai além do livro didático. A campeã do 5o ano, Claraval, em Minas Gerais, tem currículo próprio e cuidadosamente planejado, ano a ano, para as escolas municipais. Em português, a maior dificuldade dos alunos é a escrita. A maioria tropeça em concordância, coesão e clareza de textos. “Se é essa a dificuldade, então, planejamos aulas que reforcem isso e damos cursos aos professores”, diz Társia Cintra Cunha, secretária municipal de Educação. “Sempre há turmas mais fortes ou mais fracas em português ou matemática. A estratégia para lidar com isso é intervir imediatamente para recuperar o aluno. Não esperamos acabar o ano ou o bimestre.” Claraval tem 96% de seus alunos do 5o ano aptos nas duas disciplinas.


Nenhuma cidade do país consegue chegar a esse desempenho no 9º ano. O final do ensino fundamental é uma etapa problemática. Se olharmos o desempenho de português e matemática separadamente, também nenhuma rede consegue chegar aos 70%. A melhor marca é de Cambuci, no Rio de Janeiro, onde 59% do total de alunos domina as duas disciplinas. Há oito anos, a escola estadual Oscar Batista, na zona rural, registrava uma das maiores evasões do Estado e um dos piores desempenhos na avaliação nacional de alunos. Virou escola prioritária para o governo estadual e começou a arrumar a casa. Teve mutirão para buscar aluno em casa e programas para envolver as famílias, a maioria de lavradores. A escola criou um programa de leitura para os professores (que não liam o suficiente para estimular o hábito em seus alunos). Para acabar de pôr a casa em ordem, deu sentido aos projetos pedagógicos. “Existia projeto de leitura, mas o que se fazia ali não tinha relação nenhuma com o que era ensinado na sala de aula”, diz Obede Pires, diretor. Com um melhor planejamento das aulas e evasão zero, o crucial para a escola, hoje, são as aulas de reforço em português e matemática. Isso começou com os professores ajudando os alunos. “Agora os próprios alunos formam seus grupos de estudo. Não vão para casa na hora que toca o sinal”, diz Pires. O resultado? Antes, menos de 20% dos alunos da Oscar Batista optavam por fazer uma faculdade. Hoje, segundo Pires, mais de 80% optam pela universidade. É esse o caminho que o Brasil precisa seguir.


EM DEFESA DO JULINHO E DA EDUCAÇÃO PÚBLICA



ZERO HORA 28 de dezembro de 2013 | N° 17657


ARTIGOS

Cristian Nunes*


Durante o ano de 2013, o jornal Zero Hora fez uma pesquisa com os colegas da turma 11F. O objetivo era mostrar a situação da educação pública, analisando uma turma da escola mais tradicional do RS. Na reportagem publicada em 22/12, muito do que expõe a reportagem nós vivemos no dia a dia: falta de professores, evasão escolar, infraestrutura precária e graves problemas na implantação do politécnico. Até aí, está expressa uma realidade dura, mas que, unidos, temos lutado diariamente para melhorar.

No dia seguinte a essa reportagem, o secretário da Educação, Jose Clovis de Azevedo, deu uma entrevista na qual ataca nossa escola e seus professores. Ele diz que o que ocorre no Julinho é “um caso isolado”, que “não reflete a situação do Estado”. Mais adiante, afirma: “Temos hoje a maioria das escolas em processo avançado de implantação da reforma do Ensino Médio, entusiasmo de alunos e professores”. Mesmo sabendo da ampla reprovação que essa reforma tem entre os estudantes e professores, o secretário diz que há “entusiasmo” com essa política. Além disso, Jose Clovis diz que o questionamento dos professores ao politécnico é “uma fuga para não implementar o projeto”.

O governador Tarso Genro disse, com muita demagogia, que “ouviu a voz das ruas”. Porém, nós, que estivemos nas manifestações que sacudiram o país em junho, gritamos bem alto que queremos mais dinheiro para a educação. Agora seu secretário coloca a culpa dos problemas da educação nos professores, que são apenas vítimas da falta de investimento e para quem o governador não é capaz nem de pagar o piso nacional, descumprindo inclusive a lei. Temos total acordo com a declaração da presidente do Cpers, Rejane de Oliveira: “Não vamos admitir que o governo jogue sobre os ombros dos trabalhadores sua incompetência e a falta de priorização da educação. Essa escola é o reflexo do que acontece em todas as escolas, não é um caso isolado”.

Não aceitaremos que os governantes manchem a imagem do Julinho. Já saímos às ruas em 2013 exigindo mais verbas pra educação. Em 2014, vamos vir com força redobrada. Declarações absurdas como estas do secretário Jose Clovis só nos fazem ter mais vontade de sair às ruas novamente, pois temos certeza de que só assim podemos mudar a educação e o país como um todo.


*COORDENADOR DO GRÊMIO DA ESCOLA JULIO DE CASTILHOS E MEMBRO DO COLETIVO ESTUDANTIL VAMOS À LUTA

LUPA RIGOROSA



ZERO HORA 28 de dezembro de 2013 | N° 17657

ÂNGELA RAVAZZOLO



Em O Queijo e os Vermes, o italiano Carlo Ginzburg conta a história de um moleiro perseguido pela Inquisição no século 16. A partir de um personagem específico, o pesquisador reconstrói parte do cenário europeu da época. O livro é um bom exemplo do quanto um caso particular pode ampliar os horizontes de análise de um grupo ou mesmo de uma sociedade.

Há várias formas de se entender ou estudar um problema. E, quando se trata de educação, essas estratégias podem ser ainda mais difusas e divergentes. Mas a lupa colocada sobre a turma 11F na reportagem de Letícia Duarte vai além das estatísticas e das teorias: esmiúça o cotidiano de uma escola e de uma sala de aula com um detalhamento atento.

As lições escancaradas pela turma 11F reúnem características específicas daquele grupo, não há dúvida. Mas não se pode entender esse cenário como um retrato isolado, desconectado de um contexto maior. Os relatos (de pais e de professores) que chegaram à redação e à repórter nos últimos dias só reforçam aquilo que a história ensina: o “pequeno mundo” daquele grupo do Julinho integra, sim, um contexto social e histórico mais amplo, que, mesmo indiretamente, respalda erros e acertos da sala de aula.

Seria mais cômodo imaginar a reportagem como um relato pontual, mas também seria ingenuidade. Como nos mostra Ginzburg ao contar a história do moleiro Menocchio, um olhar micro, cuidadoso e rigoroso, nos aponta para o macro e nos desafia a pensar em profundidade.

COMO DESATAR OS NÓS DA EDUCAÇÃO

ZERO HORA 28 de dezembro de 2013 | N° 17657


LETÍCIA DUARTE


LIÇÕES DA TURMA 11F


A partir da reportagem Lições da Turma 11F, publicada domingo, revelando o cotidiano de uma sala de aula em uma das mais tradicionais escolas públicas no Estado, especialistas apresentam a seguir estratégias para enfrentar cinco imbróglios da educação gaúcha.

Enquanto a Secretaria da Educação considera um caso isolado o retrato descrito na reportagem Lições da Turma 11F, pesquisadores e leitores que vivenciam situações semelhantes em outras instituições do Estado identificam desafios comuns a serem superados para melhorar a qualidade do ensino gaúcho.

Cinco especialistas em educação concordam que são necessárias medidas de longo prazo, com aumento no investimento em formação de professores e uma profunda revisão no modelo educativo, para que a escola volte a fazer sentido para os estudantes.

Fruto do acompanhamento de uma turma de 1º ano do Ensino Médio no Colégio Julio de Castilhos durante o ano letivo, a reportagem narrou questões como a recorrente falta de professores e as controvérsias que envolvem a implantação do Ensino Médio Politécnico, criticado por boa parte dos docentes como uma manobra do governo para facilitar a aprovação, maquiando índices de evasão e repetência.

Apesar de admitir que existem outros focos de resistência à reforma, o secretário da Educação, Jose Clovis de Azevedo, negou que o cenário descrito na publicação reflita a situação de toda a rede estadual. Sustentando que os problemas seriam específicos do Julinho, devido à “má gestão”, determinou a abertura de uma sindicância na escola para apurar irregularidades.

O sindicato dos professores reagiu, oferecendo assessoria jurídica à escola.

– Não vamos admitir que o governo jogue sobre os ombros dos trabalhadores sua incompetência e a falta de priorização da educação. Essa escola é o reflexo do que acontece em todas as escolas – afirmou a presidente do Cpers, Rejane de Oliveira.




quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

A SEGURANÇA DAS ESCOLAS

O Estado de S.Paulo 26 de dezembro de 2013 | 2h 04


OPINIÃO



A julgar pelos resultados de investigação feita pelo Ministério Público Estadual (MPE) sobre a segurança nas escolas estaduais da capital, o poder público não aprendeu, ao contrário do que se esperava, a lição deixada por acidentes graves provocados por falta de observância das regras referentes a essa questão, a começar pelo incêndio na Boate Kiss, de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, no final de janeiro passado, que deixou um saldo de 242 mortos e chocou o País. A comparação não é despropositada, tendo em vista as características daqueles estabelecimentos e a situação em que, segundo o MPE, eles se encontram.

Das 1.153 escolas mantidas pelo Estado na capital, apenas 72 - ou 6% - têm Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB), que atesta a segurança dos locais. Ou seja, em princípio a quase totalidade desses estabelecimentos, que diariamente recebem centenas de milhares de crianças e jovens, corre sério risco de acidentes. Algo sem dúvida assustador. As principais reclamações de professores, estudantes e seus pais são a existência de fios soltos e desencapados, rachaduras e infiltrações nas paredes e a falta de extintores de incêndio.

Nem mesmo uma escola bem situada como a Caetano de Campos, na Praça Roosevelt, escapa desse perigoso desleixo, como constatou reportagem do Estado. Embora o prédio disponha de hidrantes, nenhum deles tem mangueiras, o que os torna inúteis. E o problema é antigo. Foi constatado em 2008, quando a escola foi vistoriada pela Prefeitura. As escolas "repetem uma mesma situação: falta de equipamentos de incêndio, corrimão e saídas de emergência", afirma o promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo Carlos Alberto Amin Filho.

Não admira, portanto, que, diante de uma situação como essa, da qual a Caetano de Campos é apenas um exemplo bem ilustrativo, ele tenha entrado na Justiça com uma ação civil pública para obrigar o governo do Estado, no prazo de três meses, a promover vistoria dos bombeiros em todas as suas escolas da capital. Para ele, é importante que a Justiça tome alguma decisão antes do próximo ano letivo. E, se o problema não for resolvido, acrescenta, os locais devem ser isolados: "Não podemos deixar as crianças conviverem com risco de incêndio ou desabamento".

Mas o MPE também está na obrigação de dar informações mais precisas. Não são fornecidos detalhes, na ação, sobre os riscos apontados. Como a investigação feita por ele começou em 2006, é importante esclarecer se os dados colhidos estão todos devidamente atualizados, até porque a Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), vinculada à Secretaria Estadual da Educação, contesta os números apresentados pelo MPE.

E da FDE deve-se exigir a mesma precisão. Segundo ela, as escolas estaduais seguem as normas de segurança e a Prefeitura recebe mensalmente dados atualizados sobre as intervenções nelas feitas. Ela garante que 1.021 escolas da capital já têm o Auto de Vistoria dos bombeiros, "ou estão em fase de obras, aguardando sua aprovação". A informação é vaga. É indispensável saber quantas escolas já possuem o AVCB, quantas estão realizando obras para satisfazer as exigências dos bombeiros e quando cada uma delas deverá estar concluída.

Até que a Secretaria esclareça esse ponto - o que não fez quando questionada pela reportagem -, não há como deixar de considerar como válidos os números apresentados pelo MPE, que ela contesta.

Embora para conceder o alvará de funcionamento a um estabelecimento a Prefeitura exija outros documentos, o AVCB é fundamental no que se refere à segurança. Em especial no caso de boates, casas de show, salões de clubes, outros locais em que se reúne grande número de pessoas, como igrejas e, evidentemente, as escolas.

É imprescindível, portanto, que, independentemente da decisão da Justiça, o governo do Estado esclareça a real situação das escolas e, se for o caso, como tudo indica, comece de imediato a tomar todas as providências que se impõem para garantir a segurança dos alunos, dos professores e dos demais funcionários.

UM RETRATO DA EDUCAÇÃO

ZERO HORA 26 de dezembro de 2013 | N° 17655

DO LEITOR

Lições da Turma 11F: Um retrato da educação



A reportagem Lições da Turma 11F, publicada em Zero Hora no domingo (22), revelou o cotidiano de uma classe no colégio Julio de Castilhos, em Porto Alegre. Segunda, questionado sobre os problemas apontados, o secretário Jose Clovis de Azevedo afirmou que a situação no Julinho é “uma exceção”, fruto de “má gestão da escola”.

A partir das declarações de Azevedo, Zero Hora perguntou em mural se você concorda com o secretário e qual a sua impressão sobre a rede pública estadual. O mural segue aberto em zhora.co/muraljulinho.

A situação do Julinho não é um fato isolado não. Minha filha está no segundo ano no Colégio Protásio Alves e desde o primeiro ano faltam professores. Os poucos professores que há estão sobrecarregados, dão 20 minutos de aula e se ausentam. Outros vivem em licença. Quando procuramos a coordenação da escola, ouvimos que nada pode fazer porque o Estado não dá condições.

Marcelo Ferreira, Porto Alegre – RS

Minha escola tem um muro baixo (que está caindo) que permite que marginais entrem e ameacem professores e alunos. Chamamos a Brigada (que também sofre com este governo) e ela nem vem mais. A Secretaria de Educação diz que o dinheiro para o muro já está garantido, mas faz três anos e não é liberado nunca.

Luciane Gomes, Pelotas – RS

Com toda a autoridade de quem vive a realidade de uma sala de aula do Estado cotidianamente, discordo em gênero e grau da afirmação do secretário de Educação, pois, além da falta de investimentos na infraestrutura, o atual sistema de ensino visa à formação de cidadãos totalmente inaptos à vida política e a uma formação científico-universitária.

Moisés Simões Moreira, Canela – RS

Basta o aluno estudar somente uma disciplina por área e está aprovado. E o aluno que abandonou o ano letivo e volta 20 dias antes de o ano acabar, esse tem direito a fazer avaliações (PPDA) e, mesmo que não seja satisfatório, terá uma nova chance em março, quando os professores iniciam o ano com mais de 50 alunos em sala. Não recebemos apoio nem sugestões de pais, eles não visitam a escola. Mas, ao final do ano, querem seus filhos aprovados, mesmo que tenham 80% de faltas.

Rosane Bohne, Tramandaí – RS

A escola Uruguai, localizada no Moinhos de Vento, está em situação precária. A escola ficou sem energia elétrica nas semanas finais do ano letivo. Há problemas de infiltração, um gerador teve que ser alugado. Alguns pais estão se mobilizando, fazendo denúncias ao Ministério Público e ao Corpo de Bombeiros, pois a situação elétrica é precária e perigosa. É revoltante o descaso, pagamos tantos impostos para quê?

Rodrigo de Araujo Rosa, Porto Alegre – RS

O Médio Politécnico só veio para prejudicar. A qualidade de ensino, que já era rara por problemas diversos, foi piorada, devido à redução da carga horária de outras disciplinas. O Seminário Integrado propõe que os alunos trabalhem em projetos de pesquisa em uma fase da vida em que ainda não têm a maturidade e a formação necessária, já que muitos ingressam no Ensino Médio com dificuldades graves de leitura e escrita.

Rodrigo Ferreira, Charqueadas – RS

Como todo político brasileiro, põe a culpa nos outros. Temos pequena chance de melhorar nosso padrão de educação se o secretário acha que só uma escola do Estado tem problemas sérios.

Luis Carlos Amon, Porto Alegre – RS

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

LIÇÕES DA TURMA 11F, UM CASO ISOLADO?

ZERO HORA 24/12/2013 e 25/12/2013 | N° 17654

Para secretário, é caso isolado. Jose Clovis afirma que situação no Julinho é exceção na rede e abre sindicância na escola


Um dia depois da publicação da reportagem Lições da Turma 11F, que revelou o cotidiano de uma sala de aula de uma das maiores e mais tradicionais escolas da rede pública do Estado, a Secretaria Estadual da Educação abriu uma sindicância para apurar supostas irregularidades no colégio Julio de Castilhos.

Negando que a narrativa represente uma realidade de desafios comuns a toda a rede, o secretário Jose Clovis de Azevedo acredita que os problemas encontrados pela reportagem sejam uma exceção, fruto de “má gestão da escola”. Sobre os conhecidos problemas estruturais da rede e das polêmicas que envolvem a reforma do ensino, diz haver “entusiasmo de alunos e de professores” com o modelo.

– O retrato da matéria é preocupante, mas ela não reflete a situação da educação no Estado. Seria muito ruim se ela refletisse, mas felizmente não reflete. Temos hoje a maioria das escolas em processo avançado de implantação da reforma do Ensino Médio, entusiasmo de alunos e professores – sustentou o secretário, que assinou na segunda-feira documentos para instituir a sindicância no Julinho.

Fruto do acompanhamento de uma turma de primeiro ano do Ensino Médio na instituição durante todo o ano letivo, a reportagem narrou questões como a recorrente falta de professores e as controversas que envolvem a implantação do Ensino Médio Politécnico, criticado por boa parte dos professores como uma manobra do governo para facilitar a aprovação, maquiando índices de evasão e repetência. Apesar de admitir que existem outros focos de resistência à reforma, Azevedo acredita que o Julinho precisa ser investigado porque não está seguindo diretrizes.

– A escola (Julinho) não funciona, não está implantando o Ensino Politécnico. Queremos saber se o que acontecia na sala de aula era na escola inteira. Não se admite possibilidade de os alunos entrarem e saírem a hora que quiserem – afirmou.

A comissão de sindicância será composta por três advogados da assessoria jurídica do gabinete da secretaria, com apoio da 1ª Coordenadoria Regional da Educação (CRE). O grupo trabalhará por pelo menos 30 dias, devendo convocar gestores da escola para esclarecimentos, mesmo durante as férias. Na manhã de ontem, uma equipe da 1ª CRE já esteve na escola para solicitar as primeiras informações.


“Vai estourar do lado mais fraco”


O diretor do Julinho, Antonio Esperança, garante que vai fornecer tudo o que for solicitado – mas avalia que o foco da secretaria está equivocado, ao tentar culpar a escola pelos problemas da educação pública:

– Vai estourar do lado mais fraco, porque é a maneira mais simples de resolver os problemas. O colégio tem muita coisa boa, mas isso não aparece, a escola só aparece pelo que ela não tem. As falhas que existem não são provocadas por nós, é toda uma rede. Em nenhum momento se fala que os professores não recebem o mínimo legal, por exemplo. Se fôssemos trabalhar pelo que recebemos, deveríamos trabalhar só a metade. Agora virou uma guerra entre a secretaria e a direção. Precisamos de ajuda, não de críticas. Querem transformar isso numa batalha, como se fosse o único colégio com problemas. Não é assim que se melhora a qualidade da educação.



ENTREVISTA:
JOSE CLOVIS DE AZEVEDO SECRETÁRIO DA EDUCAÇÃO DO RS

“A matéria não reflete a situação no Estado”


Zero Hora – A matéria mostrou um retrato preocupante de desmotivação, falta de professores... Como o senhor avalia esse cenário?

Jose Clovis de Azevedo – A escola tem problemas de gestão. A matéria não reflete a situação da educação no RS. O governador ao caminhar pelo Interior recebe de alunos e professores manifesto de apoio à implantação do politécnico, ao contrário do que acontece aqui em algumas escolas.

ZH – Pelo que temos ouvido, muito do que está na matéria reflete a realidade da educação, não uma situação só do Julinho.

Azevedo– Não nos consta outra escola com esse tipo de situação.

ZH – Isso é só no Julinho?

Azevedo – Não é que seja só no Julinho, a implantação do projeto tem dificuldades de ordens em graus diferenciados. Tem escola que avança mais, ou menos, mas isso é normal. O que não é normal é uma escola que não se estruturou e não está implantando. Se o Politécnico estivesse acontecendo, a escola não estaria assim, nem essa liberalidade total. Defendemos a disciplina. Pela tua descrição, as aulas pareciam caóticas. Não dialoga com o que deve ser uma sala de aula. E não é o que a gente presencia pelo Estado afora. Agora, a negação pura e simples, a não organização da escola, a não estruturação do currículo... até hoje a escola não tem o regimento homologado, porque não conseguiram apresentar o regimento conforme a legislação e as normas estabelecidas.

ZH – Na teoria do Politécnico se fala muito em conectar teoria e prática, mas o que observamos é que a maioria dos professores considera uma forma de maquiar números de evasão e repetência. Existe falha na implantação?

Azevedo– Não, isso é uma fuga para não implantar o projeto. Nós não forçamos nem obrigamos que nenhum aluno seja aprovado sem que tenha domínio de conhecimento, agora quando um aluno não aprende, isso ocorre por várias razões. Na maioria dos casos, quando um aluno não aprende, é porque alguém não ensina. E isso é por dificuldades, ou por incompetência, ou por omissão.

ZH– E esse tipo de situação não se repete em outras escolas?

Azevedo – Não. Onde está sendo implantado conforme as orientações da secretaria, em geral pelo menos as pessoas fazem o trabalho tradicional bem feito. Não quer dizer que não existam problemas aqui, ali. Estamos aqui há três anos e meio e essa rede estava abandonada, começamos a organizar. Mas, por exemplo, no Julinho não faltam recursos humanos. O quadro do Julinho é uma questão de gestão. E não recebemos qualquer solicitação de reposição de professores. Outra coisa muito séria que tem ali é que no dia 20 de novembro os alunos foram dispensados, pelo jeito ficaram com alguns alunos com problemas de aprendizagem, quando, na verdade, todos os alunos têm de ter 200 dias letivos e mil horas. O calendário não foi cumprido, a greve foi recuperada. Foram mais de 3 mil períodos letivos perdidos, mas eles só recuperaram 48. Tem outras escolas que vão entrar em janeiro por causa da greve, e eles não cumpriram.

ZH – Vocês não tinham percebido isso antes? Porque a escola faz um plano de recuperação e entrega para a secretaria. Isso não tinha chamado a atenção de vocês?

Azevedo – Não.

ZH – Não fica parecendo uma caça às bruxas ao Julinho, como se não existissem problemas nas outras? É possível um acompanhamento em outras escolas?

Azevedo – Normalmente, temos acompanhamento em outras escolas. Temos algumas dificuldades em Porto Alegre porque são 267 escolas e só uma coordenadoria. Mas, mesmo assim, temos um acompanhamento geral. E se soubermos de outros casos vamos investigar também.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

LIÇÕES DA TURMA 11F

ZERO HORA 22 de dezembro de 2013 | N° 17652


EDUCAÇÃO


Quando entrou para a turma 11F, Thiago*, 16 anos, havia recém começado a trabalhar em um supermercado. Antes do segundo trimestre, trocou a carteira assinada pelo tráfico.

Sua colega, a operadora de telemarketing Andressa, 18 anos, repetia pela terceira vez o primeiro ano do Ensino Médio, confiante de que finalmente conseguiria passar. Sequer terminou o ano.

Na mesma sala, estudava o lateral esquerdo Guilherme, que veio do Interior para jogar no São José, em Porto Alegre, e assistia às aulas apostando na carreira nos gramados. Mesmo com foco no futebol, passou fácil nos exames escolares.

De todos, uma das mais concentradas era Jessica, 15 anos, beneficiária do Bolsa Família que devorava livros de literatura no intervalo das aulas e passava as tardes tocando violino. Ao lado de sua irmã gêmea, Luana, sonhava em passar no concurso Menina Fantástica.

Matriculados no primeiro ano do Ensino Médio de uma das escolas públicas mais tradicionais do Estado, o Colégio Julio de Castilhos, os quatro alunos e seus colegas tiveram a rotina acompanhada por Zero Hora desde o primeiro dia de aula, em 27 de fevereiro, até o encerramento do ano letivo, em 20 de dezembro. Para investigar o que está por trás das estatísticas da educação, a reportagem fez imersões de uma semana a cada trimestre na turma 11F, indicada pela direção da escola entre as 36 desse nível no Julinho. Dentro da sala de aula 106, nas disciplinas autorizadas pelos professores, testemunhou como fatores intra e extraclasse influenciaram o destino dos estudantes. A partir do microcosmo da turma 11F, ZH observou 10,5% do grupo abandonar os estudos – um percentual equivalente à média da rede estadual no país e inferior à gaúcha, de 11,7%. Constatou que a falta de professores é um problema recorrente mesmo quando o quadro está aparentemente completo – em uma escola em que é comum sete docentes faltarem por dia, no turno da manhã – o equivalente a 18% do total. Observou a flutuação de alunos em sala, o desafio dos professores de ensinar uma geração que passa o dia plugada em dispositivos tecnológicos. E acompanhou a controvérsia provocada pelo Ensino Médio Politécnico – visto por grande parte dos docentes como estratégia do governo para facilitar a aprovação, maquiando dados de evasão e repetência.

Nas páginas a seguir, o diário de classe da turma 11F e de seus protagonistas apresenta pistas para entender o que os números da educação pública apenas rascunham.




Aulas acabam um mês antes do fim


– Vamos lá, pessoal, hoje é o último dia – diz a professora de literatura Jaqueline de Oliveira Gonçalves, 43 anos, incentivando os alunos a concluírem o trabalho de criação de um cordel a partir da história afro-brasileira, em 22 de novembro de 2013.

Apesar de estarem a quase um mês do final oficial do ano letivo, marcado para 20 de dezembro, o clima nesta sexta-feira é de despedida no Colégio Estadual Julio de Castilhos.

Como o novo Ensino Médio instituído nas escolas públicas gaúchas desde 2011 prevê que os alunos tenham mais oportunidades de recuperação, os pré-conselhos foram antecipados para fechamento das avaliações do terceiro trimestre. Na prática, o último mês de aula serviria apenas para provas e trabalhos finais, com horários reduzidos e sem novos conteúdos.

Dos 28 alunos da turma – que chegou a ter 39 na chamada no início do ano –, 17 estão presentes quando começa a aula de literatura. Oito deles formam uma roda ao lado da mesa da professora e começam a discutir o trabalho. No fundo da sala, perto da porta, os restantes conversam sobre outros assuntos, mexem no celular, ouvem rap e funk em fones de ouvido.

– Todos fizeram juntos o cordel? – questiona a professora, olhando para a aluna Mayara de Souza Franco escrevendo solitária em meio ao grupo disperso.

– A gente fez pelo Facebook, sôra, ela só tá passando a limpo – responde o colega Fabrício Siqueira Ramos, um dos mais extrovertidos da turma.

Assim que Mayara termina a transcrição, a professora de literatura lê o trabalho do grupo. Impressionada com o vocabulário bem construído, desconfia da autoria. A aluna admite que a mãe dela ajudou, mas a explicação não satisfaz.

– Vocês sabem como eu sei que não foi vocês que escreveram? Eu conheço o vocabulário de vocês – diz a professora.

– A senhora não sabe o que é internet? A gente pesquisa “como fazer um cordel” e depois só troca as palavras – explica Fabrício, abrindo o sorriso que deixa à mostra o aparelho metálico nos dentes.

– Ah, então foi um plágio? – provoca a professora, com ar de reprovação.

Na hora de apresentar o texto para a turma, na frente da sala, representantes desse mesmo grupo travam. Não conseguem ler frases inteiras. Dizem que não entendem o que a colega Mayara escreveu na folha. Que a letra dela é incompreensível, que o “t” parece um “f”. Ao ler em voz alta o cordel que juram ter feito em conjunto sobre a história dos lanceiros negros, patinam em palavras comuns como traição e valorosos.

Ao avaliar os resultados de 2013, a professora de literatura admite frustração. Às vésperas de concluir o primeiro ano do Ensino Médio, a maioria dos alunos da turma 11F ainda não tem o domínio esperado de leitura. Nem interesse pelo aprendizado.

– Nunca vi turmas de primeiro ano tão fracas como neste ano, em rendimento, aproveitamento e desempenho. Foi um ano desgastante, os alunos não correspondem – avalia a professora, admitindo que pela primeira vez, depois de 10 anos de trabalho na rede estadual, sentiu desânimo para entrar em sala de aula.

Nem por isso os alunos vão deixar de passar – pelo contrário. Com as mudanças introduzidas no Ensino Médio – o Ensino Politécnico, apelidado pelos críticos de “politreco” –, há um consenso entre professores e alunos de que ficou mais fácil a aprovação, o que estaria levando as turmas a uma maior acomodação.

– Eles querem nos obrigar a passar os alunos a qualquer custo. Nós trabalhamos com pessoas, o governo trabalha com números. Eu temo por esses jovens que estão saindo daqui, porque eles não vão sair formados em nada – preocupa-se a professora de literatura.


“A gente não pode exigir muito”


Dois ventiladores de teto aliviam o calor de 27 de fevereiro – o primeiro dia de aula da turma 11F. Quando o sinal bate, às 7h25min, 10 alunos entram na sala verde-clara, iluminada pelo sol que atravessa três janelões que começam na altura das classes e atingem o teto na parede lateral. Outros colegas vão chegando, aproveitando a porta de metal entreaberta, e até o final da manhã somariam 27 – dos 35 listados na primeira chamada.

A professora de biologia, Ana Silva, é tolerante com os atrasos. Conhece a realidade dos estudantes. Apesar de o Julinho ser localizado em uma área central de Porto Alegre, no bairro Santana, são raros os que moram nas redondezas. Vindos de bairros da periferia, chegam a viajar mais de uma hora de ônibus até ali. Cristine Silveira, por exemplo, chacoalha uma hora e 20 minutos de ônibus desde Belém Novo. Não reclama. A aluna de 15 anos, com mechas azuis no cabelo preto, está ansiosa para estudar no Julinho porque “é um colégio grande”. Como ela, outros querem fazer parte da história da instituição de 113 anos, onde estudaram Leonel Brizola e Moacyr Scliar. Já Natiele Ramos, 14 anos, que veio do bairro São José, entra na sala apreensiva porque ouviu falar que na escola “só tem maloqueiro”. Na hora da matrícula, a aluna de olhos verdes realçados com rímel tinha colocado outras três opções preferenciais, mas, como outros colegas, acabou no Julinho por definição da Secretaria Estadual da Educação, diante da falta de vagas nas instituições desejadas.

Preocupada em impor disciplina, a professora Ana começa avisando que só vai trabalhar em sala de aula porque “não dava muito certo” a ida ao laboratório, já que os alunos “se perdiam” pelo caminho. Que também desistiu de levar as turmas à sala de informática porque “só queriam saber de rede social”. E que prefere não adotar o livro didático, porque o material “só chega às vezes”.

– Se eu colocar o conteúdo programático no quadro, vocês vão levar um susto tão grande, que vão para casa e não vão mais voltar. É muita coisa – anuncia.

A professora enche o quadro, se faz de durona diante da turma. Em voz baixa, admite preocupação com o nível dos estudantes.

– A gente não pode exigir muito... senão, na primeira prova, já tiram nota baixa e abandonam a escola – confessa a ZH na segunda semana de aula.


Primeiro dia: Choque de realidade

Antes do horário de intervalo do primeiro dia de aula, a turma é confrontada com uma lacuna histórica da rede pública estadual.

– Tavam dizendo que não tem mais aula porque não tem professor – explica um aluno, que, assim como os colegas, começa a juntar os materiais e deixar a sala.

O terceiro período seria de inglês, mas o professor não aparece, e os estudantes são liberados para o pátio. No quinto período, deveriam ter seminário de português – uma das novidades do Ensino Politécnico –, mas ainda não havia titular designado para a disciplina. Como resultado, dos seis períodos que teria, a turma 11F teve apenas quatro no primeiro dia – brechas que se repetiriam nos próximos meses.

No pátio, o funk é a senha para integrar novos e velhos alunos durante o recreio. Enquanto ouvem hits como “Ela não anda, ela desfila, Ela é top, capa de revista... Ela é mais mais, ela arrasa no look, Tira foto no espelho pra postar no Facebook” – tocada pelo Grêmio Estudantil em volume alto –, as novas tribos começam a se reconhecer.

– Passou uma menina só com um pedaço de pano... eu não vim para um baile funk – espanta-se Natiele.

Egressa de uma escola privada, Caroline Vargas, 14 anos, surpreende-se com os novos códigos. Veio para o Julinho porque o colégio particular “estava muito caro” e estranha a ausência de vigilância. Sem aula, a turma tem liberdade para tomar suas próprias decisões.

– Eu era acostumada com uma rotina diferente, com regras rígidas. Aqui, se eu quiser ir embora, eu posso ir – constata.

Na aula de história, a liberdade que surpreende os novatos vira tema do professor Milton Wainstein. Em sua acolhida, o docente que há 21 anos leciona no Julinho alerta que a grandeza da escola – uma das maiores de Ensino Médio do Estado, com 1.985 alunos – traz vantagens e desvantagens.

– Quanto mais liberdade, maior também a responsabilidade – orienta.

Ao falar sobre a História, o professor lembra que não existe “uma só realidade”, mas diferentes versões. E usa o Gre-Nal do final de semana anterior para demonstrar como cada lance pode suscitar interpretações diferentes.

– E aquele lance do Bertoglio (atacante do Grêmio) com o Juan (zagueiro colorado): foi pênalti ou não? Todo mundo viu o mesmo lance, e se fica horas discutindo. Não tem certo ou errado, são diferentes visões sobre o acontecido. E, mesmo por mais neutro que eu quisesse ser... eu sou colorado. Vejo a realidade segundo este ângulo. A realidade não está fora da gente, está dentro da nossa cabeça – ensina, chamando atenção para um relativismo que precisa ser considerado quando se analisa qualquer fato, inclusive a realidade de uma sala de aula.


Primeiro livro aos 18 anos

No final do primeiro trimestre, a aluna número 3 na chamada da turma, Andressa dos Santos Souza, alcança uma conquista inédita.

Aos 18 anos, lê o primeiro livro da sua vida. Um livro inteirinho. Do começo ao fim. Incentivada pela professora de literatura, Jaqueline, que faz prova oral sobre os livros, compartilha suas impressões sobre o romance O Rio do Meio, de Lya Luft, na manhã de 6 de maio.

– O que mais te chamou atenção? – pergunta a professora, que elegeu como meta profissional fazer com que os alunos percam o medo da leitura, por isso anda com o porta-malas sempre cheio de livros para emprestar. E se emociona com cada descoberta feita por eles.

Meio sem jeito, a aluna que repete pela terceira vez o primeiro ano do Ensino Médio, depois de dois anos de evasão e repetência, admite que não entendeu muita coisa:

– O “Rio do Meio” não tem muito a ver... eu não entendi bem... se passa num sótão...

– Não seria uma metáfora? – incentiva a professora, que dá aula na sacada enquanto funcionárias providenciam a limpeza da sala, evacuada após um dos alunos ter vomitado.

Andressa hesita, confusa. Nunca teve tempo para metáforas em sua vida. Começou a estagiar aos 14 anos, empurrada pelas necessidades da casa. Não podia se dar ao luxo de esperar pela mãe, gerente de uma boate no centro de Porto Alegre, que tinha de dar prioridade para os três irmãos menores, nem depender da avó, doméstica aposentada.

Com a dupla jornada, o tempo de estudar foi sendo feito de sobras. Quase nunca sobrava. Morando na Vila Amapá, acostumou-se a acordar às 5h30min, caminhar 20 minutos até a parada de ônibus rumo à escola. No final da aula, ia direto para o serviço na Zona Norte, uma empresa de telemarketing. Retornava para casa às 22h30min.

– O tempo de estudar... não tinha, né? – diz.

Ela acreditava que neste ano tudo seria diferente. Pelo menos até o início de maio, quando comemorava sua superação literária. Só que, como Andressa aprendeu cedo, os finais nem sempre são como se espera. Antes do segundo trimestre, tudo mudou. A aluna não aguentava mais o telemarketing. Começou a distribuir currículos e foi chamada em uma loja de roupas, na Rua Dr. Flores. Emprego de turno integral. E aí decidiu trocar a perspectiva distante de um futuro melhor pela oportunidade instantânea de um salário melhor. Interrompeu o ano letivo pela metade mais uma vez.

No novo emprego, é reconhecida pela eficiência. Em seis meses, passou a ser a recordista de vendas. Em 31 de outubro, no intervalo de almoço, sorria, orgulhosa, falando da própria desenvoltura. A expressão só mudou quando ela voltou a falar da escola. Lembrou que seu sonho era ser médica. E chorou.

– Tinha esse sonho quando era pequena, aí depois vi que a vida não é fácil. Mas isso aqui não é futuro, né? Se eu tivesse me encarnado antes nos estudos, não estaria nessa vidinha – refletia, limpando as lágrimas com as mãos.

Apesar das dificuldades, garante que ainda vai voltar a estudar. Quer se inscrever em um supletivo, terminar o Ensino Médio e, quem sabe, chegar à faculdade. Adaptando a ambição do sonho a seu cotidiano, desistiu de ser médica. A aluna que se evadiu do Ensino Médio agora pensa em ser... professora.


A professora volta, mas não termina o ano letivo

Para os alunos que continuam na turma 11F, 12 de junho é um dia histórico. Não por ser o Dia dos Namorados, mas porque, quase quatro meses depois do início do ano letivo, têm a primeira aula de seminário de matemática.

Para a nova titular, Gilcéa da Rosa Oliveira, 56 anos, a data traz uma emoção adicional. Marca a sua volta à sala de aula, após três anos em funções administrativas. Estafada pela rotina, havia entrado em depressão. Precisou de ajuda psiquiátrica para retornar. E faz questão de contar isso aos alunos, em sua estreia.

– Vocês acham que pensar dói. Fiquei afastada três anos da sala de aula e eu simplesmente não conseguia mais dar aula. Eu gosto de ser questionada. Eu não quero chegar aqui pra vocês e dizer dois mais dois é cinco, e todo mundo vai ficar quietinho – discursa.

Encostada na parede, mascando chiclete, Milena olha para o vazio enquanto a professora fala. Yohan, Diego e Maurício estão deitados sobre a classe, apoiados sobre os braços. Outros mexem no celular, ouvem música com fone de ouvidos, conferem as últimas atualizações no Facebook.

Enquanto a turma toda assiste à aula conectada em smarthphones, a professora que há 24 anos trabalha no Julinho confessa em sua apresentação ser uma analógica convicta.

– Eu juro pra vocês... eu sou alérgica a computador, sou alérgica a celular. Porque nós, que estudamos matemática, nós queremos as coisas pensadas, não queremos as coisas dadas. Eu entro em pânico, nem mensagem eu mando, porque quando eu teclo uma letrinha errada tenho que apagar tudo aquilo, me dá um desespero – conta, provocando risos na classe.

Diferenças tecnológicas à parte, a professora está otimista com o recomeço. Acredita que a aula será uma experiência diferente, o início de uma nova etapa.

O plano tem curta duração. As aulas duram menos de quatro meses. No início de outubro, a professora de seminário de matemática começa a faltar. E não volta.

– Ela não apareceu mais – sintetiza Jessica Jantsch, que, como os colegas, não recebeu qualquer explicação.

A direção informa a ZH em novembro que a docente entrou em licença médica. Em 4 de outubro, fez uma operação no joelho, por rompimento de menisco. Até o final do ano, a turma 11F fica sem aula da disciplina. Outra vez.

– Sentia uma dor que ficou insuportável, doía até deitada. Por isso tive de me afastar. Mas foi um ano muito bom, a turma era excelente, muito afetiva – conta Gilcéa, no início de dezembro, ainda em recuperação.



Thiago trocou a escola pelo tráfico


Thiago (nome fictício) nunca teve aula de seminário de matemática. Abandonou a escola no fim de maio, duas semanas antes da chegada da professora da disciplina.

Todo mundo na turma pensa que ele parou de ir à aula por causa de seu trabalho. Afinal, foi em razão do emprego em um supermercado que o adolescente entrou na turma 11F, vindo do turno da tarde, na última semana de março. Assim, podia conciliar seus horários.

Professores e colegas ignoram que foi um terceiro turno inesperado o responsável pela evasão. Dois meses depois de chegar, o aluno franzino que adorava usar boné e corrente prateada no pescoço parou de ir às aulas e ao trabalho. Aos 16 anos, virou operário do tráfico. Apanhado em flagrante com 26 pedras de crack e um revólver 38 carregado, em 30 de setembro, foi apreendido e internado na Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase) para cumprimento de medida socioeducativa.

O abandono da escola foi progressivo. No início do ano, chegava na sala cansado por causa da jornada de trabalho. Às vezes, dormia sobre a classe. Achava tudo muito chato. Só gostava da aula de sociologia, com o professor fazendo piadas, contando histórias. Aí, sim, abria um sorrisão.

Nessa época, Thiago ainda estava entusiasmado com a rotina no supermercado. Os olhos brilharam quando recebeu o primeiro salário, R$ 600. E mais ainda quando foi promovido de empacotador a caixa, logo no final do primeiro mês de trabalho, engordando em R$ 150 o contracheque. Só que, quando a empolgação inicial passou, ele começou a achar tudo puxado demais. Certo dia, um amigo apareceu perguntando se ele não queria trabalhar para o tráfico. A oferta parecia vantajosa. Ganharia até R$ 4 mil por mês vendendo droga na vizinhança, no morro Santa Tereza. O adolescente topou na hora. Até continuou a frequentar a escola por mais uma semana, mas logo viu que não conseguia acordar tão cedo para estudar depois de ter ficado até uma ou duas da manhã vendendo pedras e pó.

Livre do compromisso de acordar cedo para ir à aula, consumia boa parte do dinheiro fazendo festa, de segunda a segunda, em bailes funk pela cidade. Chegou a gastar até R$ 2,5 mil numa única noite, baixando baldinhos com bebida a preços inflacionados.

– Isso aí é cadeia, caixão ou cadeira de rodas. O dia em que tu cair preso, não conta comigo. Não admito isso – avisou o pai, quando descobriu o que Thiago fazia nas madrugadas.

Orgulhoso por sempre ter trabalhado honestamente como pintor, por ter conseguido juntar dinheiro para comprar duas casas para alugar, além do lugar onde vive, o pai não se conforma. Dos 10 filhos que gerou, em diferentes relacionamentos, já perdeu dois assassinados por ligação com o tráfico – e se ressente por Thiago ter caído na mesma armadilha.

Depois de ter sido apreendido na Fase, o adolescente garantiu estar arrependido.

– Esses R$ 4 mil agora eu rasgava e botava fogo – assegurou, em 1º de novembro.

Dizia sonhar com uma nova chance. Que iria voltar a batalhar dentro da lei, seguindo a profissão do pai. Um dos sinais da reabilitação era a volta à escola. Seguindo o programa obrigatório, Thiago acabou retomando os estudos dentro da Fase.

– Quem sabe, não volto pro Julinho depois – cogitava, entre a brincadeira e o descrédito.

Duas semanas após contar seus planos a ZH dentro da Fase, eis que a nova chance apareceu. Em 11 de novembro, teve a liberdade concedida pela Justiça. Mas não retornou para a casa do pai. Nem para a escola.

– Quando fui buscar ele, nem olhou na minha cara. Me disseram que voltou a vender drogas. Não vou correr atrás de quem não quer ajuda. Não foi essa a educação que dei para ele – indigna-se o pai.


Falta estrutura para resgatar alunos ausentes


O principal instrumento para prevenir a evasão escolar no Estado é a Ficha de Comunicação do Aluno Infrequente (Ficai), criada há 16 anos em uma parceria entre Ministério Público, secretarias Estadual e municipais de Educação e Conselhos Tutelares.

Pela regra, escolas devem comunicar aos conselhos casos de alunos faltosos, buscando resgatá-los. E, segundo a coordenadora de demanda escolar da Secretaria Estadual da Educação, Mársia Sulzacher, isso vale para todos os casos de infrequência, dos seis aos 18 anos.

Na prática, não é bem assim.

– O Conselho Tutelar já nos falou que eles não dão conta nem do Ensino Fundamental. Fui numa reunião e disseram: “Ensino Médio nem era para estar aqui, a gente não tem pessoal para ir atrás”– contou no fim de setembro a orientadora educacional Gina Marques, que atuava havia 24 anos no Julinho e se aposentou em outubro, deixando o posto vazio.

Antes de sair, era ela quem ligava para as casas dos alunos quando começavam a faltar. Não era uma tarefa fácil. A começar pelos recursos essenciais. O telefone apto a fazer ligações externas só foi instalado em sua sala em agosto – cinco meses depois do início das aulas. Após conseguir a linha, seu desafio era ser atendida pelas famílias:

– Muitos alunos colocam um telefone que não existe, ou a ligação não completa.

Coordenador do Conselho Tutelar de Porto Alegre, Leandro Barbosa admite limitações:

– A prioridade é para o Ensino Fundamental, até porque o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê isso. Mas também atendemos adolescentes. Muitos param de estudar por falta de dinheiro para a passagem de ônibus.


Sociologia com o professor Heitor: a aula mais popular


A maioria dos professores reclama que a turma 11F é bagunceira. Que os alunos não largam o celular. Que não param de conversar.

Na disciplina de sociologia, é diferente. A aula é tão popular, que alunos de outras turmas aparecem para assistir. Com suas brincadeiras, o professor Carlos Heitor Rosa da Silva magnetiza a atenção dos alunos. Um dos segredos é que a matéria não é dada a partir de conceitos. Em vez de despejar teorias, cativa os alunos contando histórias. No dia 3 de maio, a escolhida foi a da Águia e da Galinha. Depois de contar o causo de uma águia que não havia aprendido a voar por ter sido criada como galinha, o professor pede que os alunos escrevam 10 linhas dizendo se identificam-se mais com a águia ou com a galinha. Para reforçar a identificação dos alunos com a história, o próprio professor dá um depoimento pessoal.

– Por muito tempo eu fui galinha. Perdi cinco anos numa série só. Fiz EJA. Hoje dou aula aqui e em mais quatro escolas particulares... hoje sou águia! – conta o professor.

Apaixonado pela sala de aula, Heitor diz que não sai de casa se não for para se divertir. E acredita que os alunos percebem isso, sabendo diferenciar os professores que estão ali por obrigação e os que estão por convicção.

Mesmo adorando as aulas, os alunos nem sempre entendem a proposta.

– O que a gente aprende em sociologia? – pergunta um aluno para o colega Maurício.

– Ah, é tipo filosofia – responde.

– A matéria dele é frau, mas ele não é frau – completa Guilherme.



Jessica e Luana, iguais e diferentes


Em 24 de junho, a turma ganhou uma nova aluna. Mas nem parecia uma novidade, porque seu rosto era familiar.

Irmã gêmea de Jessica Jantsch (à esquerda na foto), Luana chegou à 11F transferida da turma 11I, a pedido da mãe. Como o desempenho de Luana estava abaixo da média, com o pior conceito existente (Construção Restrita de Aprendizagem), a doméstica Lili Einsenbraun, 47 anos, pediu à escola para que as duas filhas pudessem estudar juntas. A estratégia era fazer Luana ser influenciada pelo bom comportamento da irmã. Jessica gosta tanto de ler que passa os intervalos entre um período e outro entretida com obras literárias.

As duas são idênticas – com o mesmo cabelo loiro comprido, o mesmo corpo alto e esguio – e o fato de Jessica ter dois centímetros a mais, com 1m77cm, contra 1m75cm, é quase imperceptível para quem as vê juntas. São tão parecidas, que, quando estudavam na rede municipal de Viamão, chegaram a trocar um dia de sala para brincar. Mas basta uma conversa rápida para perceber que as semelhanças entre elas se restringem à aparência física. Como elas mesmas fazem questão de esclarecer.

– Ela é mais estudiosa. Ela é boa em qualquer matéria. Acho que por falta de interesse meu. A minha carreira não vai ter estudo no meio. Eu vou trabalhar em estética. Não precisa de estudo para isso – justificou Luana, em 2 de outubro, admitindo que matava aula no início do ano e “ficava na sacada, conversando com quem passasse”, por não ter paciência de ficar na sala.

– Eu... se perceberem, eu tô sempre lendo alguma coisa, porque eu gosto de ler... e o vocabulário é melhor se tu começa a ler, não só ficar ouvindo os outros. Porque os livros são diferentes do que a fala, tem uma fala diferente nos livros. E é bom também porque usa a imaginação, não fica parado, só conversando. Porque pra ler um livro tem que imaginar as cenas, o que tá acontecendo, como é o personagem. É bem legal – empolgava-se Jessica.

Órfãs de pai, vítima de um câncer de esôfago aos 49 anos, as irmãs estão entre os beneficiários do programa Bolsa Família. Três vezes por semana, frequentam juntas oficinas de pintura e esporte na Restinga – e à noite dividem um beliche em uma casa de madeira onde vivem com a mãe no bairro Planalto, em Viamão.

Apesar de percorrerem itinerários comuns, as gêmeas têm interesses distintos – numa mostra da complexidade dos perfis reunidos em uma sala de aula. Jessica, por exemplo, toca violino há três anos na Orquestra Infanto-Juvenil da ONG Ipdae (Instituto Popular de Arte e Educação), na Lomba do Pinheiro – e em outubro viajou para tocar com o grupo em Minas Gerais. Luana chegou a começar a frequentar o mesmo projeto, mas largou depois de seis meses porque achou “muito chato”. Prefere fazer faxina esporadicamente com a mãe a se render à disciplina exigida pela orquestra.

À noite, as duas brigam porque Jessica gosta de ler e praticar violino – Luana insiste para apagar a luz porque quer dormir depois de assistir à novela.

Na Feira do Livro de Porto Alegre, Jessica fez questão de participar: foi passear com seu namorado e comprou o livro O Dia da Guerra. Luana não se interessou pela programação.

– Já fui no ano passado – explicou.

Apesar de Luana dar menos valor aos estudos do que Jessica, a estratégia da mãe deu resultados. À medida que o segundo trimestre avança, a primeira começa a se recuperar. De tanto copiar a irmã, Luana acabou surpreendendo a si mesma. Semanas antes do final das aulas, começou a repensar seus planos para o futuro. Revendo a ideia de não fazer faculdade, decidiu fazer Engenharia Elétrica. Diz que pensou sozinha, depois de ver o namorado da irmã fazendo curso técnico. Chegou a tentar fazer a prova, não passou. Mas não desistiu.

– Eu já decidi a faculdade que eu vou fazer, então eu tenho que estudar, senão não dá. Antes eu pensava em ser manicure... mas manicure não dá futuro... e também é muita exploração. Então pensei em fazer faculdade de Engenharia Elétrica. Não é tão difícil. Só tem que ser muito estudiosa e inteligente – explicou, sorridente.

Fora do colégio, as duas sonham em se inscrever no concurso Menina Fantástica.

– Mas e aí, como vão escolher? As duas?

– Não, só uma. A que fala melhor... – brinca Jessica, pigarreando de propósito com “hã, hã”.

Mesmo com bons conceitos no fim do ano no boletim, Luana e Jessica concordam em um ponto: acham que o ensino é fraco.

– Eles empurram a pessoa para passar – concluem as irmãs.



Greve: dilema do diretor


Mantendo a tradição de décadas, o ano letivo de 2013 foi interrompido por greve do magistério, em 23 de agosto. Desta vez, além de protestarem contra os baixos salários, os professores bradaram contra a reforma do ensino nas três semanas em que cruzaram os braços.

De tradição combativa, o Julinho aderiu à greve – mas não integralmente. Cerca de metade dos 160 professores paralisou as atividades, segundo cálculo da direção da escola, enquanto o restante preferiu seguir trabalhando.

Grevista histórico, o diretor da escola, Antonio Esperança, que assumiu o cargo no início do ano, viu-se diante do desafio de ter que gerenciar um conflito estabelecido entre o quadro docente: de um lado, os companheiros de outras tantas lutas – que esperavam seu apoio para fechar a escola e dar respaldo ao movimento. De outro, os professores descrentes da greve como instrumento de pressão, que reivindicavam o direito de lecionar.

Desgastado com os dois grupos, o diretor eleito para um mandato de três anos já sonhava em largar o cargo para voltar à sala de aula.

– Os grevistas me acusavam de apoiar os não grevistas, os não grevistas me acusavam de apoiar os grevistas. Ninguém ficou contente. Virei vidraça para todos os lados – desabafou, em 30 de setembro.


Até sete professores faltam por dia


O desencanto com a carreira do magistério não aparece apenas nos discursos recorrentes da categoria contra os baixos salários. Materializa-se também em sintomas menos óbvios, revestidos de ausências.

Embora a escola não tenha uma estatística, o diretor do Julinho diz que é comum sete professores faltarem por dia somente no turno da manhã – amparados por uma norma do Estatuto do Magistério que dá ao docente o direito de “faltar, por motivo de força maior, até 10 dias por ano”. O estatuto fala que o professor deve fazer a “comprovação perante autoridade competente”, mas a cultura consolidada no Julinho é de que o professor simplesmente tem o direito de faltar, bastando avisar por telefone seus imprevistos. E não há controle sobre isso. A vice-diretora Daniela Gonçalves afirmou, em novembro, que a justificativa por escrito ainda não havia sido instituída porque a gestão atual ainda era recente e havia outras demandas prioritárias.


Um caso de amor


Em vez de cansaço, Imara Ungaretti, 64 anos, circulava pelos corredores do Julinho exalando orgulho no último dia letivo, em 20 de dezembro.

Professora de desenho, uma das opções oferecidas aos alunos na disciplina de artes – entre outras alternativas, como escultura e teatro –, a docente de cabelos brancos falava com empolgação sobre as criações produzidas pelos estudantes em sala de aula.

– O aluno nunca é ouvido, mas pelo menos na aula de artes ele pode escolher. É a arte que tira a miséria do mundo, a arte e o esporte. Na aula de artes, eles sonham, é uma terapia – empolgava-se, entre elogios aos talentos revelados ao longo do ano, de alunos como Stefhani Ribas Letha, a líder da turma 11F, que tinha como um dos temas preferidos os mangás, as histórias em quadrinho japonesas.

Apesar de trabalhar em outras duas escolas municipais, a professora não esconde sua preferência pelo Julio de Castilhos.

– Eu tenho um caso de amor com o Julinho. Meu aluno aqui é igual ao de outras escolas particulares, nos sonhos e nas expectativas. Aqui tem liberdade, e é de onde saem os melhores alunos – elogia.

Agitado no início do ano, o grupo de 12 alunos que reunia integrantes das turmas 11E e 11F na aula de desenho aos poucos se deixou envolver pelos contornos e sombras traçados a lápis, hipnotizados pelo bom humor misturado a um discurso firme da professora Imara.

– Como sou velha, no começo do ano ficam com pé atrás, acham que sou uma múmia. Mas, depois, eles percebem que eu sou meio louca, também falo a língua deles, e eles vão entrando no ritmo – brinca.

“Os alunos sabem que não acontece nada”

Ao chegar para o terceiro período, em 1º de outubro, o professor de inglês Werner Alves fecha a porta. Ficam só 13 alunos na sala.

– Professor, posso entrar? – insistem alunos que ficaram no corredor, atrasando-se para o retorno no intervalo.

– Não! Saiam – responde o professor.

Os estudantes que permanecem na sala riem. Exaltado, o professor se dirige em voz alta à repórter, sentada no fundo da sala:

– Não sei qual é o objetivo da tua pesquisa, mas isso tu poderias relatar, que é impossível tu fazer um bom trabalho num ambiente, que tu tá vendo como é que funciona. Eu só tenho 50 minutos. Tenho que fazer a chamada, entregar as notas, fazer correção de exercícios, continuar meu trabalho... em uma sala de aula totalmente desorganizada. A direção da escola não dá aparato nenhum, os alunos fazem isso porque sabem que realmente não acontece nada – desabafa Werner.





Ele quer dominar a bola



Faltando dois meses para o fim do ano letivo, em 3 de outubro, Guilherme Reis faz uma confissão em voz alta na sala de aula.

– Acho que a primeira vez que eu peguei o livro de história foi ontem – diz o garoto, sorridente.

– E eu não achei meu livro de história – completa Milena.

Experiente no trato com adolescentes, o professor de história prefere o deboche à crítica:

– O livro é muito pequeno, difícil de achar – ironiza, prosseguindo com a explicação sobre o Egito Antigo.

Sentado no fundo da sala, Guilherme é da turma dos “conversadores”. Está sempre rindo de alguma piada feita pelos colegas.

A concentração que falta na aula sobra no campo do time do São José, onde Guilherme joga desde o início do ano. Em um amistoso contra o time do Dom Bosco, em 30 de outubro, entra no segundo tempo, aperta na marcação, cobra atenção dos colegas e bate três faltas para o time, em direção ao gol. Apesar de ter ganho peso depois de uma cirurgia no joelho e ficado cinco meses sem jogar, é considerado promissor. Natural de Seberi, veio do Passo Fundo para atuar no São José. E ali despertou a atenção de outros times.

Na metade do ano, começou a ser sondado pela Chapecoense, depois que um olheiro o viu jogando. Empolgado com a chance de jogar em Santa Catarina, estava disposto a abandonar a escola para crescer na carreira.

– Eu na verdade dou mais prioridade para o jogo. Estudar só quando é necessário, quando tem prova. O que eu prefiro é jogar – explicou Guilherme, no fim do segundo trimestre.

Mesmo que Guilherme quisesse largar os estudos para jogar futebol, não seria tão fácil. Primeiro, porque os pais não deixariam. Segundo, porque hoje os próprios clubes exigem que os atletas continuem estudando. No São José, por exemplo, fazem controle trimestral.

– Se o aluno não está estudando, não pode jogar. E os que reprovam não viajam para os treinamentos no verão. A maioria passa arranhando, mas passa – define Giuiliano Moreira, coordenador técnico da base do São José.

Preocupados com o futuro do filho, o caminhoneiro Anildo Reis da Silva, 46 anos, e a mulher Vera, 42 anos, proprietária de uma loja de roupas, empenham-se para garantir a continuidade dos estudos. Apesar de o clube insistir desde julho para que o adolescente fosse para Chapecó, o pai negociou para só levá-lo em dezembro, após o fim das aulas.

– Ser jogador de futebol é muito difícil, vai que um dia não dê certo... tem que ter estudo. Então a gente negociou, pediu mais um mês para ele terminar a aula – contou o pai.

Embora não estivesse focado nos estudos, Guilherme terminou o ano bem. Ficou com conceito satisfatório em todas as disciplinas. Com o adiantamento do fim do ano letivo, consegue embarcar antes do que previa para Chapecó. Em 1º de dezembro, já estava em solo catarinense. De lá, recebeu a confirmação de que havia passado de ano, ao ver a lista de aprovados compartilhada por uma colega na página da turma pelo Facebook.

Três semanas depois de chegar em Santa Catarina, reviu seus planos. Disse não ter gostado da cidade e voltou para o Rio Grande do Sul. Se não mudar de ideia outra vez, voltará ao Julinho em fevereiro, para iniciar o segundo ano do Ensino Médio, e para os gramados do São José.



O ano que não terminou


No fim do terceiro trimestre, alunos que passaram o ano matando aulas começam a correr atrás do prejuízo.

– Agora a gente entra em todas as aulas. Tem que passar, né, senão o castigo pega. As professoras disseram que a gente tem chance de passar, então vamos tentar – sorri Giovana, integrante de um trio famoso pelo “turismo”.

Garantir a aprovação virou um mantra no novo currículo. O nome oficial dos exames adicionais para melhorar o desempenho dos estudantes é Plano Pedagógico Didático de Apoio (PPDA), mas na escola todos chamam de “a recuperação da recuperação”. Uma das consequências da reorganização do calendário foi a perda de conteúdos no terceiro trimestre. A história da Grécia Antiga, por exemplo, que normalmente consumiria um mês de aulas, com todo o seu legado sobre a democracia, os deuses, a organização social na pólis – acabou condensada em menos de 50 minutos de aula na turma 11F.

– Este ano foi absolutamente atípico. Mesmo com uma greve... por um milagre este é o ano que está acabando mais cedo desde que comecei. Se já era difícil vencer todo o conteúdo antes, neste ano ficou mais complicado – desabafou diante da classe o professor Milton, em 21 de novembro.

Três semanas depois, em 13 de dezembro, os professores se reúnem para os conselhos finais. O clima é de contrariedade. Professores reclamam de pressão por aprovações.

– Agora é na base da ameaça: se você não aprovar, vai ser processado – diz uma das participantes, descontente após uma divergência sobre um aluno com necessidades especiais de outra turma que foi aprovado pelo conselho.

A conselheira da 11F, Ana Xavier, garante que em relação à classe não houve maiores divergências. Dos 28 que concluíram o ano, 15 foram aprovados. Nove passaram com algum tipo de restrição e terão de fazer recuperações durante o próximo ano para progredirem. E quatro reprovaram. Um desses era famoso por não entregar trabalhos – nem os de recuperação. Outros dois eram contumazes gazeteiros. Em história, por exemplo, um dos reprovados faltou a 20 das 28 aulas. O outro só compareceu em dois dias.

– Essas reprovações são quase um abandono, uma evasão de alunos que continuam na escola – definiu o professor Milton, de história.

Mas reprovação agora não significa necessariamente repetir de ano. Pelo novo modelo de ensino, os repetentes poderão fazer atividades durante as férias – como provas ou trabalhos, conforme definido pelo professor – para buscar uma nova avaliação. Dois dias antes do recomeço das aulas em 2014, serão chamados para apresentar suas atividades e submetidos a uma “reclassificação” – a nova expressão cunhada para poder aprovar quem havia repetido.

– É uma exigência do Ensino Politécnico, que precisamos cumprir. Querem melhorar os índices de aprovação. O problema é que não estamos melhorando a qualidade do ensino para diminuir a reprovação... Só estão melhorando os índices de reprovação – preocupa-se o diretor do Julinho, Antonio Esperança.

Nem sempre foi assim. Fundada em 1900, como Gymnasio do Rio Grande do Sul, a instituição testemunhou diferentes fases do ensino. Esperança lembra com saudosismo que o Julinho já foi uma escola padrão, modelo “inclusive para as escolas particulares”, na década de 1940.

“Guria não entra, uniforme somente nas Casas Carvalho, as aulas começam às oito em ponto, depois ninguém pode entrar... A maior distinção da época era ser Juliano, tocar na banda do Colégio, carregando a bandeira na parada de Sete de Setembro”, registrou o ex-aluno Tatata Pimentel, no prefácio do livro Eu vivi esta história no Julinho (1900-2000). Os tempos mudaram, mas o diretor do Julinho acredita que a instituição se mantém como referência.

– Com todos os problemas, o que a gente faz aqui continua sendo o que norteia a educação pública no Estado – avalia o diretor, reconhecendo que o colégio hoje espelha uma crise.

Contando os dias para sua aposentadoria, depois de 22 anos no Julinho, a conselheira da 11F cumpria aliviada suas últimas tarefas, em dezembro. Poderia ter saído em setembro, mas preferiu esperar o fim das aulas para não deixar os alunos na mão. Apesar do cansaço e do salário achatado, Ana não se arrepende de ter escolhido o magistério. Diz que adora os alunos, “voltaria tudo de novo”. Mas, vendo tanto estudante fraco ser empurrado para frente, sai descrente quanto ao futuro.

– É uma hipocrisia, né... Por isso tô caindo fora – despediu-se.


CONTRAPONTO - O que diz o secretário estadual da Educação, Jose Clovis de Azevedo, sobre problemas apontados nesta reportagem

 FALTA DE PROFESSORES - “A falta de professores na escola não é falta de professores no quadro. Geralmente, ocorrem faltas quando o professor entra em licença médica ou pede demissão. Mas uma escola com boa gestão procura resolver com redirecionamento de seus profissionais. Os contratos provocam muita instabilidade. Quando alguém sai, levamos 15, 20 dias para contratar outro. Hoje são 21 mil contratos, mas já nomeamos 8 mil professores. E temos mais 13 mil aprovados em concurso.”

CRÍTICAS AO ENSINO POLITÉCNICO - “As resistências às mudanças podem ser ideologicamente mapeadas, geralmente vêm de setores ligados a partidos radicais de esquerda, ou de grupos conservadores. É um equívoco dizer que o governo quer maquiar os números, porque os índices de evasão e reprovação, mesmo tendo melhorado um pouco, ainda são muito ruins e depõem contra todos os que trabalham com educação, não só contra o governo. O objetivo do Ensino Politécnico é que o aluno aplique seus conhecimentos na vida real. E têm muitas correntes entusiasmadas.”

PRESSÃO POR APROVAÇÕES - “Não mandamos aprovar alunos que não tenham capacidade. O que orientamos é que se ofereçam oportunidades permanentes para que o aluno possa ser desafiado a aprender. Mas quem decide é o professor. A escola existe para ensinar, não para reprovar.”


O ENSINO POLITÉCNICO

- As principais reivindicações dos grevistas eram a implementação imediata do piso como básico salarial e a suspensão da reforma do Ensino Médio. O único consolo ao final do movimento foi a garantia de que não teriam corte do ponto pelos dias parados.

- A recuperação das aulas foi feita em oito sábados, com baixa adesão dos alunos.

- A partir de uma diretriz do Ministério da Educação, começou a ser implantado no Rio Grande do Sul em 2012.

- Uma das principais mudanças é a troca de notas por conceitos descritivos, que classificam o desempenho de alunos como satisfatório, parcial ou restrito.

- As disciplinas tradicionais foram reunidas em quatro grandes áreas do conhecimento (linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas), e os professores desses grupos precisam chegar a um consenso no momento de definir o conceito do estudante.

- Ao final do ano, mesmo com performance insatisfatória (restrita) em uma área, o aluno poderá passar para a série seguinte, em um regime de progressão parcial.

- Segundo a Secretaria Estadual da Educação, entre os objetivos está o desenvolvimento do aluno e a redução da evasão e da repetência no Ensino Médio. A meta é trazer aos bancos escolares cerca de 70 mil jovens que estão fora da escola.

REALIDADE DESAFIADORA

ZERO HORA 23 de dezembro de 2013 | N° 17653


EDITORIAIS


O retrato sem retoques do ano letivo da turma 11F do Colégio Julio de Castilhos, publicado ontem em oito páginas de Zero Hora, explica muito sobre as causas que colocam o ensino brasileiro no fim da fila nas avaliações internacionais. Ao acompanhar de perto a rotina de alunos e professores do primeiro ano do Ensino Médio de uma das maiores e mais tradicionais escolas públicas do Estado, os jornalistas Letícia Duarte e Félix Zucco constataram e revelaram uma realidade deprimente que as estatísticas oficiais mascaram, os governantes fingem não ver e a sociedade tolera. Mas a verdade é insofismável: enquanto esse problema não for enfrentado com coragem e inteligência, o país continuará condenado à estagnação.

São inúmeras as mazelas do ensino público no país, algumas delas também replicadas na rede privada: alunos desinteressados, professores estressados e faltosos, pais ausentes, governos lenientes, programas de aprovação automática de quem não aprende, concorrência da tecnologia e até do tráfico de drogas. A situação parece desesperadora, mas, se todos nos envolvermos na busca de soluções efetivas, pode se tornar apenas desafiadora.

Números de evasão e repetência já não comovem ninguém, até mesmo porque se tornaram inconfiáveis depois que as autoridades inventaram a progressão automática, o ensino politécnico e outras maneiras criativas de disfarçar o fracasso escolar. Percentuais de ausência de professores também passam quase despercebidos, pois a maioria dos pais de alunos da rede pública exige apenas que as crianças permaneçam na escola e recebam merenda. Mais de 70% dos pais se dizem satisfeitos com a escola dos filhos, mas poucos acompanham de perto o aprendizado.

A realidade mostrada pela reportagem não deixa margem para enganações. Registra o dia a dia de professores e alunos, suas dificuldades cotidianas para aprender e ensinar, a impotência dos pais para interferir, a negligência dos governantes, a falência de um sistema de ensino que sequer consegue transformar a tecnologia de inimigo em aliado, o acobertamento de faltas e a desilusão de docentes bem-intencionados mas incapazes de mudar o atual estado de coisas.

Tem jeito, certamente. Sempre tem jeito. Mas é preciso que todas as pessoas envolvidas no processo façam a sua parte, abandonando resistências e buscando instrumentos para preparar melhor os professores, valorizar o magistério, envolver os pais e conquistar a atenção dos alunos. A crise escancarada pela reportagem não é apenas do Julinho – é da escola pública brasileira, evidentemente com as reconhecidas exceções. Pois, se temos exceções, temos também potencial para superar qualquer crise.