EDITORIAL ZERO HORA 31/05/2011
O acelerado esvaziamento de escolas públicas tradicionais do Estado reafirma diagnósticos sobre as mudanças na área educacional e os impactos que desafiam permanentemente os responsáveis pela formulação de políticas públicas. As explicações, a partir da análise de dois ícones do Estado, o Colégio Júlio de Castilhos e o Instituto de Educação, vão desde a maior busca por ensino profissionalizante e pelas escolas particulares até o desinteresse por estabelecimentos antes voltados para formar futuros professores. Outros fatores levados em conta são a pulverização das matrículas pela rede pública e até a redução da população em idade escolar.
O conjunto de motivos define, com pequenas discordâncias entre os educadores e especialistas na área, um quadro que, de qualquer forma, é desalentador, pois também passa a ser enfrentado por outros educandários tradicionais do interior do Estado. É cômodo concluir que o fenômeno seria irreversível, pela mudança do perfil do ensino e da população. Mesmo que não se pretenda simplesmente resgatar a relevância dessas escolas por tudo que representaram até recentemente, é certo que a situação dos antigos colegiões, como sempre foram carinhosamente chamados, deve contribuir para a reorientação das políticas do governo estadual e também da União.
Se um dos principais fatores, como indicam as avaliações, é o esvaziamento das escolas generalistas, em decorrência da prioridade dos jovens por uma boa formação em escola técnica, a tarefa de atender a essa demanda é, principalmente, da área federal. Ressalte-se que a educação pública não pode ser vista como parte de um mercado, mas adequada às demandas concretas de quem ainda depende de escolas mantidas pelo governo. Por isso, as novas circunstâncias, determinadas também pelo novo momento econômico e pela modernização do país, exigem reformulações no perfil dos educandários, sem saudosismo e coerentes com a realidade, as expectativas e os sonhos dos que continuam confiando no ensino público.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Como é bom ler o editorial de um jornal importante como é a Zero Hora reconhecendo o que estamos defendendo a muito tempo neste espaço - o ensino multidisciplinar focado na identificação vocacional, no talento e na profissionalização. Um foco assim é motivador e instrumento de inclusão no mercado de trabalho em busca da autonomia e sobrevivência social.
Este blog mostrará as deficiências, o sucateamento, o descaso, a indisciplina, a ausência de autoridade, os baixos salários, o bullying, a insegurança e a violência que contaminam o ensino, a educação, a cultura, o civismo, a cidadania, a formação, a profissionalização e o futuro do jovem brasileiro.
EDUCAÇÃO MULTIDISCIPLINAR
Defendemos uma política educacional multidisciplinar integrando os conhecimentos científico, artístico, desportivo e técnico-profissional, capaz de identificar habilidade, talento, potencial e vocação. A Educação é uma bússola que orienta o caminho, minimiza dúvidas, reduz preocupações e fortalece a capacidade de conquistar oportunidades e autonomia, exercer cidadania e civismo e propiciar convivência social com qualidade, dignidade e segurança. O sucesso depende da autoridade da direção, do valor dado ao professor, do comprometimento da comunidade escolar e das condições oferecidas pelos gestores.
terça-feira, 31 de maio de 2011
domingo, 29 de maio de 2011
A TURMA DA BAGUNÇA
EDITORIAL ZERO HORA 29/05/2011
Estudo divulgado esta semana pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês) revela que as salas de aula brasileiras são mais indisciplinadas do que a média de 66 países avaliados. O levantamento baseou-se em dados colhidos em 2009 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a partir de entrevistas com os próprios estudantes. No Brasil, 67% dos alunos entrevistados disseram que seus professores “nunca ou quase nunca” têm que esperar um longo período até que a classe se acalme para dar prosseguimento à aula. Nos demais países, o percentual médio é de 72%. O estudo foi feito com alunos na faixa de 15 anos e mostrou que algumas nações asiáticas – reconhecidas pela cultura da disciplina – têm percentuais de satisfação entre 89% e 93%. Não surpreende, portanto, que países como o Japão e a China apareçam também na frente nas avaliações internacionais de estudantes.
Segundo o estudo, a desordem em sala de aula tem efeito direto sobre o rendimento das turmas. O relatório da OCDE indica claramente que salas de aula e escolas com mais problemas de disciplina levam a menos aprendizado, pois os professores têm de gastar mais tempo criando um ambiente ordeiro antes que os ensinamentos possam começar. A pesquisa também comprova que os estudantes com aulas constantemente interrompidas têm pior performance do que os frequentadores de aulas com menos interrupções.
A chamada bagunça em sala de aula continua sendo um desafio para os professores e para as escolas. Por motivos diversos, que vão da permissividade do ambiente escolar à falta de respaldo para os mestres, passando por deformações na educação familiar, a indisciplina pode ser apontada como um fator importante do fracasso e do mau desempenho dos estudantes brasileiros. Embora as causas sejam diversas e difusas, elas podem ser atacadas, pois a criação de um ambiente positivo para o aprendizado depende fundamentalmente da relação estabelecida entre alunos e professores. O próprio estudo da OCDE indica que, quando os alunos são levados a sério pelos mestres, eles tendem a aprender mais e a ter uma conduta melhor. Por isso, cabe ao professor, ao organizar suas atividades, combinar regras e normas que estabeleçam limites para todos. Fica muito mas fácil pedir silêncio quando a plateia entende que está infringindo um acordo.
De outra parte, quando uma regra é imposta de forma autoritária, os alunos não se sentem obrigados a cumpri-la. É diferente quando eles têm a oportunidade de conhecer as razões que deram origem à normatização. Mas adolescentes em formação precisam de normas que lhes indiquem limites, sem tolher-lhes a oportunidade de manifestar suas ideias e opiniões.
Mesmo num ambiente liberal e democrático, a autoridade do professor continua sendo indispensável para garantir a todos o direito de aprender. A liberdade e a descontração costumam ser estímulos poderosos para a criatividade, mas não podem ser confundidas com a bagunça tolerada, porque esta atrapalha, desagrega e atrasa.
Estudo divulgado esta semana pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês) revela que as salas de aula brasileiras são mais indisciplinadas do que a média de 66 países avaliados. O levantamento baseou-se em dados colhidos em 2009 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a partir de entrevistas com os próprios estudantes. No Brasil, 67% dos alunos entrevistados disseram que seus professores “nunca ou quase nunca” têm que esperar um longo período até que a classe se acalme para dar prosseguimento à aula. Nos demais países, o percentual médio é de 72%. O estudo foi feito com alunos na faixa de 15 anos e mostrou que algumas nações asiáticas – reconhecidas pela cultura da disciplina – têm percentuais de satisfação entre 89% e 93%. Não surpreende, portanto, que países como o Japão e a China apareçam também na frente nas avaliações internacionais de estudantes.
Segundo o estudo, a desordem em sala de aula tem efeito direto sobre o rendimento das turmas. O relatório da OCDE indica claramente que salas de aula e escolas com mais problemas de disciplina levam a menos aprendizado, pois os professores têm de gastar mais tempo criando um ambiente ordeiro antes que os ensinamentos possam começar. A pesquisa também comprova que os estudantes com aulas constantemente interrompidas têm pior performance do que os frequentadores de aulas com menos interrupções.
A chamada bagunça em sala de aula continua sendo um desafio para os professores e para as escolas. Por motivos diversos, que vão da permissividade do ambiente escolar à falta de respaldo para os mestres, passando por deformações na educação familiar, a indisciplina pode ser apontada como um fator importante do fracasso e do mau desempenho dos estudantes brasileiros. Embora as causas sejam diversas e difusas, elas podem ser atacadas, pois a criação de um ambiente positivo para o aprendizado depende fundamentalmente da relação estabelecida entre alunos e professores. O próprio estudo da OCDE indica que, quando os alunos são levados a sério pelos mestres, eles tendem a aprender mais e a ter uma conduta melhor. Por isso, cabe ao professor, ao organizar suas atividades, combinar regras e normas que estabeleçam limites para todos. Fica muito mas fácil pedir silêncio quando a plateia entende que está infringindo um acordo.
De outra parte, quando uma regra é imposta de forma autoritária, os alunos não se sentem obrigados a cumpri-la. É diferente quando eles têm a oportunidade de conhecer as razões que deram origem à normatização. Mas adolescentes em formação precisam de normas que lhes indiquem limites, sem tolher-lhes a oportunidade de manifestar suas ideias e opiniões.
Mesmo num ambiente liberal e democrático, a autoridade do professor continua sendo indispensável para garantir a todos o direito de aprender. A liberdade e a descontração costumam ser estímulos poderosos para a criatividade, mas não podem ser confundidas com a bagunça tolerada, porque esta atrapalha, desagrega e atrasa.
ASCENSÃO DO ENSINO PROFISSIONALIZANTE
Decadência reflete ascensão do ensino profissionalizante - ZERO HORA 29/05/2011
Uma das principais razões apontadas por especialistas para o encolhimento dos centros de excelência é o tipo de ensino oferecido. Enquanto as famílias de classe média e alta rumaram para o ensino privado, o novo público-alvo dessas instituições de formação generalista se mostra mais interessado na educação profissional com o objetivo de sair da escola não com um diploma, mas com uma profissão.
– Acreditamos que a diminuição nas matrículas se deve ao fato de não termos curso técnico. Não temos nenhum curso profissionalizante – afirma a diretora do Flores da Cunha, Adriana Farina Marcon.
A diretora do Julinho, Leda Oliveira Gloeden, aponta duas razões primordiais para o esvaziamento:
– Vejo que a redução na natalidade e o interesse dos jovens em trabalhar diminuíram o nosso número de alunos.
Os índices confirmam as avaliações: nos últimos 10 anos, o total de alunos da educação profissional no Estado pulou de 53,9 mil para 80,8 mil – acréscimo de 50%. Por isso, o Julinho já ensaia uma mudança de rumo educacional.
Mediante um acordo com o Serviço Nacional do Comércio (Senac) começaram a ser oferecidos cursos técnicos no turno inverso às aulas. Os estudantes podem ser encaminhados para estágio remunerado e encaminhar a busca de um emprego. A diretora afirma que, graças a esse tipo de iniciativa, neste ano o número de alunos já teria registrado uma recuperação: cerca de 350 a mais. A SEC, porém, afirma que a confirmação desse número depende da divulgação oficial do censo escolar 2011.
O secretário estadual da Educação, Jose Clovis de Azevedo, relaciona a queda no número de matrículas à diminuição da taxa de fecundidade no Rio Grande do Sul:
– Especificamente no centro de Porto Alegre, essas taxas são ainda mais radicais. Então a ociosidade das escolas começa a aparecer.
A pasta pretende colocar em prática este ano, em Porto Alegre, uma experiência-piloto de transporte de estudantes que moram em áreas pobres para bairros onde os colégios estaduais apresentam ociosidade.
Uma das principais razões apontadas por especialistas para o encolhimento dos centros de excelência é o tipo de ensino oferecido. Enquanto as famílias de classe média e alta rumaram para o ensino privado, o novo público-alvo dessas instituições de formação generalista se mostra mais interessado na educação profissional com o objetivo de sair da escola não com um diploma, mas com uma profissão.
– Acreditamos que a diminuição nas matrículas se deve ao fato de não termos curso técnico. Não temos nenhum curso profissionalizante – afirma a diretora do Flores da Cunha, Adriana Farina Marcon.
A diretora do Julinho, Leda Oliveira Gloeden, aponta duas razões primordiais para o esvaziamento:
– Vejo que a redução na natalidade e o interesse dos jovens em trabalhar diminuíram o nosso número de alunos.
Os índices confirmam as avaliações: nos últimos 10 anos, o total de alunos da educação profissional no Estado pulou de 53,9 mil para 80,8 mil – acréscimo de 50%. Por isso, o Julinho já ensaia uma mudança de rumo educacional.
Mediante um acordo com o Serviço Nacional do Comércio (Senac) começaram a ser oferecidos cursos técnicos no turno inverso às aulas. Os estudantes podem ser encaminhados para estágio remunerado e encaminhar a busca de um emprego. A diretora afirma que, graças a esse tipo de iniciativa, neste ano o número de alunos já teria registrado uma recuperação: cerca de 350 a mais. A SEC, porém, afirma que a confirmação desse número depende da divulgação oficial do censo escolar 2011.
O secretário estadual da Educação, Jose Clovis de Azevedo, relaciona a queda no número de matrículas à diminuição da taxa de fecundidade no Rio Grande do Sul:
– Especificamente no centro de Porto Alegre, essas taxas são ainda mais radicais. Então a ociosidade das escolas começa a aparecer.
A pasta pretende colocar em prática este ano, em Porto Alegre, uma experiência-piloto de transporte de estudantes que moram em áreas pobres para bairros onde os colégios estaduais apresentam ociosidade.
A DERROCADA DAS ESCOLAS PÚBLICAS
Colégios outrora símbolos da educação gaúcha e alvos de grande concorrência entre os estudantes, como o Julinho e o Instituto de Educação, amargam a perda de mais de 40% de seus alunos ao longo dos últimos 10 anos. Antigos símbolos do ensino público gaúcho hoje lutam contra a debandada de alunos. JOÃO FELIPE BRUM E MARCELO GONZATTO, zero hora 29/05/2011
Dois dos colégios estaduais de maior tradição da Capital, o Julio de Castilhos e o Centro Estadual de Formação de Professores General Flores da Cunha – mais conhecido como Instituto de Educação – perderam mais de 40% dos estudantes ao longo dos anos 2000.
O encolhimento das matrículas, que reflete fenômenos como a fuga de famílias para o sistema particular e a perda do velho prestígio, repete-se em instituições de outras cidades do Estado.
Famílias como a do engenheiro mecânico Alexandre Pegoraro ajudam a entender o destino das escolas que auxiliaram a construir a história do Estado. Quando ingressou no chamado Julinho, no começo dos anos 80, a escola já não estava no ápice. Ainda assim, fervilhava de alunos a ponto de exigir a realização de um exame de admissão para selecionar candidatos.
– Fiz todo o antigo 2º Grau no Julinho e passei para Engenharia Mecânica na Universidade Federal do Rio Grande do Sul – recorda Pegoraro.
Apesar da história pessoal de sucesso, o empresário de 44 anos evitou que suas filhas estudassem no mesmo local. Mariana, 13 anos, e Eduarda, seis, foram matriculadas no colégio particular Rosário.
– Quando se procura um colégio privado, observa-se uma linha pedagógica e disciplinar bem definida. Na rede pública, não se vê mais isso – complementa Pegoraro.
Na virada dos anos 60 para os 70, a instituição chegou a abrigar 9 mil alunos, conforme registra o livro Julinho: 100 Anos de História. Por lá, passaram nomes como Moacyr Scliar, Leonel Brizola e Paixão Côrtes – que fez do estabelecimento berço do movimento tradicionalista gaúcho. No Flores da Cunha, a situação não era diferente. A instituição teve como professora de teatro ninguém menos do que Olga Reverbel. O rigor pedagógico formava as professoras mais conceituadas de todo o Estado.
A era de ouro perdeu o brilho. Apenas na década passada, o Julinho viu esvair-se quase a metade do alunado. As 3.916 matrículas registradas em 2002 caíram para 2.050 em 2010 – uma retração de 47,6%. A Secretaria Estadual da Educação (SEC) não dispõe de dados anteriores a 2002, e os números de 2011 ainda não são oficiais. No Flores da Cunha, a derrocada é semelhante ao se levar em conta apenas o Ensino Médio: os 1.504 alunos em 2002 se resumiram a 855 no ano passado, o equivalente a uma retração de 43,1%.
Proximidade de casa pesa mais
Uma das explicações é que, antes, famílias de vários bairros e até de outras cidades faziam questão de matricular seus filhos nessas escolas – o que inchava o número de matrículas.
– Essas instituições deixaram de corresponder a alguns dos anseios da sociedade, na medida em que outros fatores, como a proximidade de casa ou do local de trabalho, passaram a pesar mais em um contexto em que há a oferta de muitas outras escolas públicas – avalia a professora da Faculdade de Educação da PUCRS, Helena Sporleder Côrtes.
Parte do fenômeno pode ainda ser explicada por mudanças mais abrangentes, como a redução populacional de 9% na faixa etária entre 15 e 19 anos e a consequente diminuição geral de matrículas no Ensino Médio – 11%.
O retrocesso verificado nas instituições que ajudaram a moldar décadas de educação no Estado, porém, chega a ser quase cinco vezes superior a essas médias.
Interior também registra diminuição nas matrículas
O encolhimento de escolas consideradas outrora centros de excelência da educação gaúcha não é exclusivo da Capital. Outros colégios de renome em grandes cidades do Interior também vem despertando menor interesse entre possíveis candidatos.
O Instituto Estadual de Educação Cristóvão de Mendoza, de Caxias do Sul, por exemplo, registrou uma retração nas matrículas de quase um terço apenas nos últimos cinco anos. Na mesma cidade, o Santa Catarina perdeu 20% dos alunos em igual período.
Para o especialista em economia da educação Gustavo Ioschpe, reduções como essas são observadas em várias regiões do Brasil. Ele avalia que nem todos os jovens planejam fazer Ensino Superior atualmente.
– O currículo no país é muito acadêmico, com o objetivo de formar pessoas para a universidade. Mas muitos não pensam em ir para a faculdade e querem uma educação básica de qualidade para entrar no mercado de trabalho – afirma.
A professora da Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Elizabeth Krahe avalia, ainda, que muitos estudantes não se sentem estimulados a cursar os três anos do Ensino Médio e optam pela facilidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA), o antigo supletivo, ou dão preferência a cursos técnicos.
– Em qualquer país europeu, vemos que existe uma faixa de pessoas com formação técnica de excelente qualidade e um bom padrão de vida. O bacharelismo é coisa brasileira – afirma Elizabeth.
Dois dos colégios estaduais de maior tradição da Capital, o Julio de Castilhos e o Centro Estadual de Formação de Professores General Flores da Cunha – mais conhecido como Instituto de Educação – perderam mais de 40% dos estudantes ao longo dos anos 2000.
O encolhimento das matrículas, que reflete fenômenos como a fuga de famílias para o sistema particular e a perda do velho prestígio, repete-se em instituições de outras cidades do Estado.
Famílias como a do engenheiro mecânico Alexandre Pegoraro ajudam a entender o destino das escolas que auxiliaram a construir a história do Estado. Quando ingressou no chamado Julinho, no começo dos anos 80, a escola já não estava no ápice. Ainda assim, fervilhava de alunos a ponto de exigir a realização de um exame de admissão para selecionar candidatos.
– Fiz todo o antigo 2º Grau no Julinho e passei para Engenharia Mecânica na Universidade Federal do Rio Grande do Sul – recorda Pegoraro.
Apesar da história pessoal de sucesso, o empresário de 44 anos evitou que suas filhas estudassem no mesmo local. Mariana, 13 anos, e Eduarda, seis, foram matriculadas no colégio particular Rosário.
– Quando se procura um colégio privado, observa-se uma linha pedagógica e disciplinar bem definida. Na rede pública, não se vê mais isso – complementa Pegoraro.
Na virada dos anos 60 para os 70, a instituição chegou a abrigar 9 mil alunos, conforme registra o livro Julinho: 100 Anos de História. Por lá, passaram nomes como Moacyr Scliar, Leonel Brizola e Paixão Côrtes – que fez do estabelecimento berço do movimento tradicionalista gaúcho. No Flores da Cunha, a situação não era diferente. A instituição teve como professora de teatro ninguém menos do que Olga Reverbel. O rigor pedagógico formava as professoras mais conceituadas de todo o Estado.
A era de ouro perdeu o brilho. Apenas na década passada, o Julinho viu esvair-se quase a metade do alunado. As 3.916 matrículas registradas em 2002 caíram para 2.050 em 2010 – uma retração de 47,6%. A Secretaria Estadual da Educação (SEC) não dispõe de dados anteriores a 2002, e os números de 2011 ainda não são oficiais. No Flores da Cunha, a derrocada é semelhante ao se levar em conta apenas o Ensino Médio: os 1.504 alunos em 2002 se resumiram a 855 no ano passado, o equivalente a uma retração de 43,1%.
Proximidade de casa pesa mais
Uma das explicações é que, antes, famílias de vários bairros e até de outras cidades faziam questão de matricular seus filhos nessas escolas – o que inchava o número de matrículas.
– Essas instituições deixaram de corresponder a alguns dos anseios da sociedade, na medida em que outros fatores, como a proximidade de casa ou do local de trabalho, passaram a pesar mais em um contexto em que há a oferta de muitas outras escolas públicas – avalia a professora da Faculdade de Educação da PUCRS, Helena Sporleder Côrtes.
Parte do fenômeno pode ainda ser explicada por mudanças mais abrangentes, como a redução populacional de 9% na faixa etária entre 15 e 19 anos e a consequente diminuição geral de matrículas no Ensino Médio – 11%.
O retrocesso verificado nas instituições que ajudaram a moldar décadas de educação no Estado, porém, chega a ser quase cinco vezes superior a essas médias.
Interior também registra diminuição nas matrículas
O encolhimento de escolas consideradas outrora centros de excelência da educação gaúcha não é exclusivo da Capital. Outros colégios de renome em grandes cidades do Interior também vem despertando menor interesse entre possíveis candidatos.
O Instituto Estadual de Educação Cristóvão de Mendoza, de Caxias do Sul, por exemplo, registrou uma retração nas matrículas de quase um terço apenas nos últimos cinco anos. Na mesma cidade, o Santa Catarina perdeu 20% dos alunos em igual período.
Para o especialista em economia da educação Gustavo Ioschpe, reduções como essas são observadas em várias regiões do Brasil. Ele avalia que nem todos os jovens planejam fazer Ensino Superior atualmente.
– O currículo no país é muito acadêmico, com o objetivo de formar pessoas para a universidade. Mas muitos não pensam em ir para a faculdade e querem uma educação básica de qualidade para entrar no mercado de trabalho – afirma.
A professora da Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Elizabeth Krahe avalia, ainda, que muitos estudantes não se sentem estimulados a cursar os três anos do Ensino Médio e optam pela facilidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA), o antigo supletivo, ou dão preferência a cursos técnicos.
– Em qualquer país europeu, vemos que existe uma faixa de pessoas com formação técnica de excelente qualidade e um bom padrão de vida. O bacharelismo é coisa brasileira – afirma Elizabeth.
sábado, 28 de maio de 2011
A ESCOLA VIROU UM DEPÓSITO DE CRIANÇAS
Professora do Rio Grande do Norte ganha fama ao enfrentar deputados e expor a situação precária da educação no País. Claudia Jordão - REVISTA ISTO É, N° Edição: 2168, 27.Mai.11
Oito minutos. Foi o tempo necessário para a professora potiguar Amanda Gurgel roubar a cena, dias atrás, numa audiência pública na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte. Com apenas 1,57 m de altura, mas postura de gigante, ela proferiu um discurso no qual dizia, com ideias bem amarradas e rara transparência, receber salário de R$ 930 por mês (“menos do que os deputados gastam em suas indumentárias”), que os professores vivem uma crise de identidade e estão doentes. A condição indigna dos docentes não é novidade, mas o vídeo com a sincera fala de Amanda correu o País com intensidade impressionante e colocou em foco esse profissional, sobre quem está depositado o futuro do Brasil. Duas semanas depois de o vídeo do discurso ser postado na rede, havia sido visto quase 1,6 milhão de vezes.
Amanda, 28 anos, começou a dar aula aos 21. Há três, foi diagnosticada com depressão, afastou-se da escola e retornou em funções fora da sala de aula. Hoje, dá expediente na biblioteca de um colégio estadual e no laboratório de informática de um municipal. Além dos R$ 930, seu salário do município, recebe R$ 1.217 pelo Estado. Amanda decidiu lecionar ainda adolescente, mesmo sabendo que a remuneração era baixa. “Só entendi de fato o que isso significava quando tive de me sustentar e comprar meu primeiro quilo de feijão”, conta. Órfã de pais desde menina, ela nasceu em Natal e foi criada pelos tios. Estudou em escolas públicas e privadas, no interior do Estado. Solteira, sem filhos, tem uma rotina puxada. Mora sozinha numa quitinete, acorda às 5 horas, pega três ônibus para ir trabalhar e volta para casa somente às 22 horas.
ISTOÉ – O que mudou na sua vida desde a divulgação do vídeo?
Amanda Gurgel – Minha rotina está temporariamente alterada. A repercussão do vídeo gerou um assédio nacional e esse é um momento que eu quero divulgar os problemas da educação no País e ser uma porta-voz de meus colegas. Então, estou me doando.
ISTOÉ – Pensa em se candidatar a algum cargo público?
Amanda – Olha, não me vejo agora fazendo outra coisa. Sei que o meu lugar é na classe trabalhadora, no chão, na escola, junto com os meus colegas. Sou filiada ao PSTU desde o ano passado, mas sempre fui militante, primeiro no movimento estudantil, depois pela causa da educação. Mas, nunca pensei em me candidatar a nada. É uma discussão futura.
ISTOÉ – Como gasta seu salário?
Amanda – Não tenho luxo, só gasto com o essencial, como alimentação, moradia, vestimentas e plano de saúde. Quase não tenho acesso a lazer. A última vez que fui ao cinema foi em 2010.
ISTOÉ – Por que se afastou da sala de aula?
Amanda – Houve um tempo em que eu trabalhava em três horários, estava na rede privada, acabei assumindo o município e tinha uma média de 600/700 alunos. Comecei a dar aula em 2002, tinha 21 anos, estava eufórica, topando tudo. O ápice do problema de saúde foi de 2007 para 2008, quando percebi que estava estafada. Estava em sala de aula com alunos pouquíssimos proficientes. Alunos de sexto ano que não sabiam ler palavras básicas como bola, pato, entendeu? Comecei a me desesperar diante da realidade, não sou alfabetizadora. O que vou fazer se nada do que estou preparada para oferecer eles estão preparados para receber? Sou professora de língua portuguesa e literatura portuguesa e brasileira de alunos dos ensinos fundamental II e médio.
ISTOÉ – Por que as crianças não aprendem?
Amanda – O aluno de 6 anos está em uma sala de aula superlotada e não há condição de alfabetizar ninguém dessa forma. Fala-se muito em democratização do ensino básico, mas se cada etapa do processo de aprendizado não é trabalhada de forma adequada, não há democracia. A escola virou um depósito de crianças, que é o que os políticos querem. Eles querem ter um lugar para deixar a criança enquanto os pais vão trabalhar e nada mais.
ISTOÉ – Foi o início da sua crise?
Amanda – Foi. Fiquei um tempo de licença e voltei em adaptação de função. Minha última aula como professora de português foi em 2008.
ISTOÉ – Quais funções você desempenha em cada escola?
Amanda – A resposta revela um sério problema de infraestrutura. Na escola do Estado, onde trabalho de manhã, estou na biblioteca. Na escola do município, passei por diversas funções. Passei pela coordenação e pela biblioteca e agora estou no laboratório de informática. Apesar de os computadores terem chegado há cinco anos na escola, só agora eles começaram a funcionar.
ISTOÉ – Por quê?
Amanda – Por várias questões. Primeiro, a instalação das máquinas foi muito demorada. Para isso, é necessário um técnico da secretaria porque a escola perde completamente a garantia daquelas máquinas se acontecer qualquer coisa errada. Depois de instaladas, foi um longo processo para a chegada de um técnico para fazer funcionar a internet e outro extenso período para a instalação do ar-condicionado na sala. Foram cinco anos que nós passamos com os computadores na caixa e com aquela sala fechada, apesar de toda a carência que se tem de espaço.
ISTOÉ – Qual o principal problema da educação no País?
Amanda – Se for para eleger um apenas, eu diria a falta de investimento. Como pode um País que deveria investir 5% do seu PIB em educação e investe 3%, paga esse salário irrisório aos professores e deixa a estrutura da escola chegar a um estágio de precarização que precisa ser interditada, como aconteceu numa escola no interior do Rio Grande do Norte, na cidade de Ceará Mirim?
ISTOÉ – Por que foi interditada?
Amanda – O corpo de bombeiros interditou a escola porque nada mais funcionava lá. O teto estava para desabar, a instalação elétrica estava precária, oferecendo risco à integridade física dos alunos e dos professores. Todos esses problemas estão relacionados à falta de investimento. Com um salário digno, o professor poderia ficar na escola, preparando as aulas, conhecendo os alunos, poderia evitar casos como o do atirador Wellington de Menezes. Como um professor vai ser capaz de observar algo se ele tem 600 alunos e não é capaz de, quando chega em casa, visualizar quem são todos? Não temos como mudar essa realidade se não tivermos um investimento imediato. Não estou falando de daqui a dez anos. Há a necessidade de se investir 10% do PIB do País em educação.
ISTOÉ – A que você credita a sua educação?
Amanda – É uma junção de coisas. Desde muito novinha, sempre fui metida. Comecei a ser alfabetizada e já corrigia as pessoas. Também acho que o funcionamento das escolas no interior é bem diferente do da capital. Nas cidades pequenas, onde estudei, funciona melhor. O fato de o professor ter acesso direto aos pais dos alunos coloca a criança e o adolescente na situação de “eu não posso sair da linha, senão o professor vai falar para a minha mãe”. Então, há mais disciplina. Minha educação de base foi de fato muito boa.
ISTOÉ – Se algum aluno disser a você que quer ser professor o que diria?
Amanda – Depende do dia. Acho que fiz certo, mas tenho meus momentos. Já cheguei a dizer ‘não quero mais’, mas em outros momentos, como hoje, estou me sentindo cheia de energia para estar na sala de aula e trabalhar com o aluno. Quando a gente é adolescente, tem uma estrutura familiar por trás. Sempre soube que professor ganhava mal, mas só entendi de fato o que isso significava quando tive de me sustentar e comprar meu primeiro quilo de feijão.
ESCOLA RECOLHE ARMAS E MUNIÇÃO DE ALUNOS
Direção de colégio de Passo Fundo relata furtos e atos de vandalismo - LEANDRO BECKER | PASSO FUNDO/CASA ZERO HORA, 28/05/2011
Facas, revólver de brinquedo e até cartuchos de fuzil recolhidos pela direção da Escola Municipal de Ensino Fundamental São Luiz Gonzaga, em Passo Fundo, desde o ano passado foram entregues ontem à Polícia Civil. A direção também fez queixa de crimes e vandalismo desenfreado no colégio.
Foram entregues um estilingue, um revólver de brinquedo, dois cartuchos de fuzil e dois projéteis de revólver calibre 38. Também foram apresentadas 12 facas, incluindo uma com 20 centímetros de lâmina e outra com 19 centímetros.
De acordo com a direção, o material foi encontrado em um terreno baldio ao lado da escola, dentro de um bueiro no pátio do colégio, em uma sala arrombada em setembro de 2010 e até mesmo atrás de quadros nas salas de aula. Os demais itens foram retirados de alunos e ex-alunos dentro e próximo à escola.
O colégio tem 1,1 mil estudantes e funciona em três turnos. Até mesmo placas de bronze expostas nos corredores já teriam sido furtadas na instituição. O diretor Luiz Ilon de Oliveira afirma que muitos professores e funcionários preferem não registrar os casos na polícia temendo represálias.
– Grades já foram arrebentadas, e a caixa de luz chegou a ser arrancada. Até câmeras de vigilância já tentaram levar – afirma.
Depois de ter segurança apenas em dias alternados, ele diz que, desde quarta-feira, há um segurança diariamente no colégio.
“Há alunos que se vingam por tirar nota ruim” - Luiz Ilon de Oliveira, diretor da escola. Com 31 anos de magistério, Luiz Ilon de Oliveira conversou ontem com ZH sobre a violência na escola:
ZH – Por que a escola decidiu apreender por contra própria o material?
Oliveira – Não é minha função desarmar ninguém, mas a situação exige uma atitude enérgica. Afinal, a Brigada Militar não pode estar 24 horas por dia na escola.
ZH – Como o senhor se sente?
Oliveira – A comunidade merece educação de qualidade, mas falta segurança. A sensação de impunidade vem para dentro da escola. Meu carro já foi riscado e arrombado duas vezes. Há casos de alunos que se vingam por tirar nota ruim. É difícil.
ZH – Até que ponto a droga exerce influência?
Oliveira – Não são todos que usam, mas um pequeno grupo de alunos, além de ex-alunos. O problema é que se deixarmos uma cadeira para o lado de fora e não houver guarda, alguém rouba, desmonta e vende o ferro para comprar droga. Tudo que dá eles se apossam.
ZH – O que a escola faz para mudar essa realidade?
Oliveira – Estamos buscando fazer palestras e ações diretas com alunos e pais sobre o vandalismo.
ZH – Como encontrar forças para combater essa situação?
Oliveira – Amo a minha profissão. O brilho nos olhos das crianças motiva, mas está difícil ser educador.
quinta-feira, 26 de maio de 2011
DESACATAR FUNCIONÁRIO PÚBLICO
DESACATO (art. 331 do Código Penal) - Wilson Paganelli - JUS NAVEGANDI, 06/2000. Síntese do trabalho para conhecimento dos educadores.
Sumário: I-Introdução; II- Conceito de Funcionário Público; III- Sujeito ativo e passivo; IV- Materialidade do delito; V- Elemento subjetivo; VI- Ação Penal.
I- INTRODUÇÃO
(...)Assim sendo, este trabalho tem o escopo de sintetizar o tema a operador do direito de que dele necessite, por meio de rápida e despretensiosa pesquisa sobre a figura do desacato, com partes compiladas de doutrinadores mestres no assunto.
(...)
Dispõe o artigo suso referido:
Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela. Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa.
Portanto, para que o delito se configure, há a necessidade de o agente "desacatar" funcionário público e, além do mais, que ele esteja no exercício de sua função ou haja o desacato em razão dela. E, indaga-se, seriam o Governador do Estado e o Ministro da Saúde considerados "funcionários públicos"?
II – FUNCIONÁRIO PÚBLICO – QUAL É O CONCEITO?
Como o tipo exige, no artigo 331 do CP, que o desacatado seja a funcionário público, há que se o definir.
Vejamos qual conceito nos vem do Vocabulário Jurídico, de Plácido e Silva, Ed. Forense, 3º ed., pág. 331:
"Já assim se diz, no sentido da lei brasileira, para a pessoa que está legalmente investida em cargo público. E, desse modo, toda pessoa que exerce cargo criado por lei, em número certo e denominação própria, remunerado pelos cofres públicos"
E prossegue:
"Não importa, assim, a ordem de funções ou de atribuições que possam distinguir o cargo. Importa, simplesmente, que seja cargo criado por lei, com especificação definida nesta, e cuja remuneração provenha dos cofres do Estado. A qualidade do funcionário público não assenta, pois, como já se fazia princípio doutrinário, no desempenho de função pública, mas no caráter de ocupar cargo permanente, definido em lei e remunerado pelo Estado. Os funcionários públicos estão sob regime especial, que se define e se estrutura pelos Estatutos dos Funcionários Públicos."
Busquemos, então, o que preleciona o sapientíssimo doutrinador Hely Lopes Meirelles, in Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revista dos Tribunais, 6º ed., pág. 370:
"Funcionários públicos são os servidores legalmente investidos em cargos públicos da Administração Direta e sujeitos às normas do Estatuto da entidade estatal a que pertencem. O que caracteriza o funcionário público e o distingue dos demais servidores é a titularidade de um cargo criado por lei, com denominação própria, em número certo e pago pelos cofres da entidade estatal em cuja estrutura se enquadra (cargo público). Pouco importa que o cargo seja de provimento efetivo ou em comissão: investido nele, o servidor é funcionário público, sob regime estatutário, portanto."
Contudo, é inócuo buscar o conceito no Direito Administrativo. E por quê? Acacianamente, comecemos pelo início...
No âmbito do Direito Administrativo, há teorias a respeito do que seja um funcionário público. E duas se destacam, segundo nos ensina Nélson Hungria:
I. a que restringe o conceito de funcionário público, englobando nele apenas aqueles que exercem poder de império, ou que a eles seja atribuída autoridade, ou, ainda, aos que se confia poder discricionário, que se configuraria por meio da faculdade de exame a casos concretos, para a execução de uma lei ou regulamento;
II. a que amplia o conceito, isto é, são considerados funcionário público aqueles que, profissionalmente, exerçam função pública, seja de império, de gestão ou técnica.
Dessarte, o conceito moderno, que prevalece, é aquele que liga funcionário público à noção ampla de função pública.
Abramos parênteses aqui, antes de prosseguirmos, para definir função pública. Deve entender-se, conforme consta no Vocabulário Jurídico (obra já citada, mesma página), a função que emana do poder público e outorgada para desempenho ou encargo de ordem pública, ou referente à administração pública.
Trata-se, pois, grosso modo, não só a que se refere à administração pública, como a decorrente de imposição de ordem legal, com objetivo de desempenhar um mister, que, mesmo não administrativo, mostre-se de interesse coletivo (múnus público). A condição do encargo, não a natureza do serviço, é que determina o caráter de público da função, segundo a obra citada.
Feita a digressão, retornemos ao assunto. Assim, o conceito de funcionário público deve estar intimamente ligado ao de função pública. Isso porque o conceito, na órbita penal, é bem diverso do definido no Direto Administrativo. Daí a inocuidade acima afirmada.
E como devemos, então, entender funcionário público no direito penal?
O nosso Código Penal adotou a noção ampliada — e não a restrita — do conceito de funcionário público discutido na esfera do Direito Administrativo. E foi mais longe. Não exige, para o caracterizar, nem sequer o exercício profissional ou permanente da função pública.
Verifiquemos o que está disposto no artigo 327 do mesmo Código:
Funcionário público
Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal.
§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.
Note-se, pois, que o caput do artigo já esclarece o que é considerado, para efeitos penais, funcionário público. No seu parágrafo primeiro determina quem se equipara a ele e, no parágrafo segundo, agrava a pena para quem ocupe, em síntese, algum cargo de comando.
Dessa forma, o artigo 327 nos mostra que não é a qualidade de funcionário que caracteriza o crime funcional, mas sim o fato de que é praticado por quem se encontra no exercício da função pública, pouco importando se permanente, temporária, remunerada, gratuita, efetiva, interina, ou se exercida profissionalmente ou não, ou ainda eventualmente (um depositário nomeado pelo juiz, por exemplo).
Concluímos, pois, que é funcionário público toda pessoa investida em cargo público, mediante nomeação e posse; a que serve em emprego público, fora dos quadros regulares e sem título de nomeação, e a que exerça função pública, seja lá qual for.
E para arrematar o alinhavado acima, chega-nos a lição do Mestre Celso Delmanto, em seu Código Penal comentado, no qual enumera quem seja funcionário público: Presidente da República, do Congresso, dos tribunais, senadores, deputados e vereadores, jurados, serventuários da justiça, pessoas contratadas, diaristas e extranumerárias. Não são funcionários públicos os tutores ou curadores dativos e os concessionários de serviços públicos.
Por isso, como o senhor Mário Covas e o senhor José Serra foram eleitos para os cargos de Governador e Senador, respectivamente, são eles considerados, para efeitos penais, funcionários públicos.
Ora, e a tutela? Tutela-se o quê?
Há um princípio que nos dita que aos agentes do poder público são garantidos o prestígio e a dignidade de sua função. Ofensas a essas pessoas que estão no exercício da atividade funcional ou em razão dela, obviamente, atingem também a administração. A tutela, assim, é exercida em relação à administração pública.
III - SUJEITO ATIVO E PASSIVO
É crime comum. Por isso, sujeito ativo é qualquer pessoa. E quando o crime é praticado por funcionário público contra funcionário público?
Há divergências.
Os que defendem a impossibilidade do crime fixam-se no fato de que o desacato se encontra no capítulo dos crimes praticados "por particulares" contra a Administração em geral, ou seja, o agente deve ser um "estranho". Se for funcionário público, não haverá desacato, e a infração é considerada autônoma — injúria, lesão, difamação, calúnia, ameaça etc. Ilustres e doutos doutrinadores, como Nélson Hungria e Vicente Sabino Júnior fundamentam tal posição.
Há acórdãos em que a inteligência ao artigo ora em foco gizam que, dentro do princípio da reserva legal, que informa o nosso sistema penal, não é extensível ao funcionário norma criada para punir o ilícito praticado por particular. Dessarte, a omissão do legislador não seria suprida pela aplicação analógica da norma incriminadora, em face da garantia constitucional da legalidade dos delitos e das penas.
Por outro lado, os que defendem a possibilidade de o crime ser praticado por funcionário público fundamentam tal posição no fato de que o funcionário, ao praticar o delito contra outro funcionário, despe-se dessa qualidade, equiparando-se ao particular. E de fato, a própria lógica nos aponta que, se o bem jurídico a ser tutelado é o prestígio da função pública, incompreensível como possa ocorrer lesão jurídica tão-somente quando a conduta é praticada por particular. Defende tal tese ilustres doutrinadores como Heleno C. Fragoso, Magalhães Noronha, Maggiore, dentre tantos outros.
Dessarte, há o pressuposto, segundo a lei, de que o sujeito ativo há de ser um estranho, contudo, a este se equipara o funcionário público que, ao praticar o delito, despe-se dessa qualidade. Se maltrata física ou moralmente outro funcionário in officio ou propter officium, torna-se irrelevante que seja de categoria idêntica à do ofendido. E até mesmo se o ofensor é superior hierárquico do ofendido. Manzini, por exemplo, opina pela inexistência do desacato.
Já no que tange ao sujeito passivo, como dissemos anteriormente, é ele fundamentalmente o Estado, embora possa assim considerar-se também o funcionário ofendido, segundo Heleno C. Fragoso e Magalhães Noronha.
O Estado tutela o prestígio de seus agentes e o respeito devido à dignidade de sua função, isso porque a ofensa que lhes é irrogada, seja na presença dele ou no exercício de sua atividade funcional, ou ainda, em razão dela, atinge a própria Administração Pública. Daí não haver, in casu, injúria, difamação ou desrespeito ao funcionário, pois são esses considerados crimes contra a pessoa. Aqui é específico. Há um interesse no normal funcionamento da Administração Pública, motivo pelo qual se afasta qualquer possibilidade de atentado contra ela.
IV - Materialidade do delito
Volvamos ao que dispõe o artigo 331:
Desacato
Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa.
Fica evidente que o objeto material desse delito se encontra em desacatar funcionário público.
Contudo, impende dizer que o legislador não definiu o que seja "desacato". Coube, pois, à doutrina fixar a conceituação do termo.
Desacatar, semanticamente, e grosso modo, é faltar ao respeito devido a alguém, desprezar, menoscabar, afrontar, vexar. Pressupõe-se, pois, que se alguém faltar com o devido respeito ao funcionário público, afrontá-lo, vexá-lo, estará incurso no artigo 331 do nosso Código Penal.
Não obstante, o conceito, v. g., "faltar ao respeito devido a..." é muito amplo. E mais: depende do contexto em que ocorre. O que pode ser insignificante em certas situações, não o será em outras.
Nélson Hungria, com bastante precisão, no volume IX/421, in Comentários, esclarece:
"A ofensa constitutiva do desacato é qualquer palavra ou ato que redunde em vexame, humilhação, desprestígio ou irreverência ao funcionário. É a grosseira falta de acatamento, podendo consistir em palavras injuriosas, difamatórias ou caluniosas, vias de fato, agressão física, ameaças, gestos obscenos, gritos agudos etc."
Deduz-se, pois, que a crítica ou mesmo a censura, ainda que veementes, não constitui desacato, desde, obviamente, que não se apresentem de forma injuriosa.
Integra a figura típica do delito a circunstância de que a ação seja praticada contra funcionário no "exercício da função ou em razão dela". Temos aqui o "nexo funcional", que é indispensável para que o delito se configure. Isso porque, evidentemente, a tutela penal relaciona-se com a função e não com a pessoa do funcionário. Por isso, deve o funcionário encontrar-se no exercício de sua função, ou seja, realizando, no momento do fato, qualquer ato de ofício ou correspondente às atribuições do cargo que desempenha. O nexo é ocasional.
Por outro lado, não exige o tipo que o funcionário esteja apenas no exercício da função, mas também que, ao ser praticado o ato, esteja ele "em razão dela", ou seja, o nexo aqui é causal. Basta, pois, que o motivo da conduta delituosa se relacione diretamente com o exercício da função. Conforme preleciona Manzini, "o nexo da causalidade deve ser provada e não pode presumir-se apenas pela qualidade do sujeito passivo ou diante da ignorância do motivo de fato."
Embora a lei não expresse literalmente, é constitutivo da figura que o desacato seja praticado na presença do funcionário ofendido. Assim orienta nossa doutrina. A assertiva se faz em razão da interpretação sistemática dos artigos 331 e 141, II, do CP. Se o delito for praticado, em razão de suas funções, na ausência do funcionário haverá crime qualificado contra a honra.
Portanto, deve o funcionário estar presente ao local onde a ofensa é praticada. Não se exige, segundo opinião predominante, que o ofendido veja o ofensor, nem que ele perceba o ato ofensivo. Basta que, presente, tome conhecimento do fato. E se a ofensa for irrogada por escrito? Haverá crime contra a honra.
Apesar de ser considerada com muita cautela, mas há a possibilidade da tentativa. Segundo doutrinadores, tal ocorreria quando alguém fosse impedido de agredir o funcionário.
V. Elemento subjetivo
O elemento subjetivo é o dolo, consubstanciado no "agir", uma vez que o agente tem por objetivo desrespeitar ou desprestigiar a função pública exercida pela vítima. E o dolo é específico. Consuma-se o delito no lugar e no momento em que ocorre a prática do ato ofensivo, ou no momento em que o agente profere as palavras ofensivas que configuram o desacato, na presença do ofendido.
Entretanto, a polêmica existente em torno do tema informa-se no que diz respeito ao "ânimo do agente". Há duas correntes distintas: uma — opta pela exigência de ânimo calmo para a configuração do delito; a outra — a inexigência de tal ânimo.
A primeira corrente fundamenta-se em Nélson Hungria, para quem o tipo exige dolo específico, consistente na intenção de ultrajar, no propósito de depreciar ou vexar a vítima. Entendem os que abraçam tal corrente que esse elemento subjetivo é incompatível com o estado de exaltação ou ira, o que exclui o delito.
De fato, não há, na prática, com raríssimas exceções, situações concretas em que o agente, ao cometer esse delito, não esteja exaltado. A premeditação, ou seja, o agente, calmamente, dirigir-se a um funcionário com a transparente intenção de o ultrajar, é a exceção. Na grande maioria das vezes, quando se tipifica o agente no artigo 331, ele viveu situações em que a exaltação, o nervosismo, a falta de educação, o desabafo, as palavras ditas impensadamente, quando não a embriaguez, é que prevalecem.
Juiz deve ser cauteloso no julgamento de tais ações penais, em razão de o contexto ter suma importância para a caracterização do delito. Isso porque, geralmente, quando o agente se encontra em situação de estresse emocional —apesar de proferir palavras ou gestos que, em princípio, poderiam caracterizar o desacato — a intenção de ultrajar, de vexar a vítima, no mais das vezes, está ausente. O que se tem, a bem da verdade, é o desabafo, é o "despejar" da ira do agente, num momento de irracionalidade, contra o funcionário. O ânimo do agente, exaltado, irado, leva-o a proferir palavras ou a fazer gestos que, intimamente, não condizem com a vontade eficaz do agente. Ou seja, a intenção real não é ofender a vítima, conscientemente. É o que se costuma traduzir, grotescamente, como "repente" , "um minuto de bobeira". E o tipo exige o dolo específico que, reiteramos, na maioria dos casos, não se faz presente.
Felizmente, por questão de Justiça, esse é o entendimento dominante em nossos tribunais.
Quanto à inexigência do ânimo calmo, quem defende essa corrente entende que posição contrária é perigosa para os interesses da Justiça, uma vez que não existe acusado que não alegue exaltação de ânimo na prática do desacato. O dolo seria genérico.
Tributado o devido respeito à opinião dos que defendem tal tese, o fato de eles próprios admitirem que não haveria acusado que não alegasse exaltação de ânimo, na prática, esse argumento sacramenta, de forma transparente, que qualquer acusado em estado de exaltação, de fato, não estaria cometendo o delito, justamente pelo ânimo do agente!
Ademais, como cada caso é um caso, cabe ao Juiz discernir, pelos fatos, se o agente estava ou não exaltado. Para tanto há a instrução e, nela, por exemplo, o depoimento de testemunhas que assistiram aos acontecimentos. Fácil, portanto, para o Magistrado se convencer a respeito do ânimo do agente. Contudo, é posição minoritária em nossa jurisprudência.
Outro ponto polêmico é a questão da embriaguez no crime de desacato.
Há corrente que defende a irrelevância da embriaguez na aferição do elemento subjetivo. Obviamente, para os defensores dessa corrente o dolo é genérico, já que a figura típica do artigo 331 do CP não faz referência a esse elemento subjetivo do injusto. Por isso, não há que se falar na existência de um dolo específico que se mostraria incompatível com a embriaguez do agente. Nos termos do artigo 28, II, do CP, a embriaguez voluntária ou culposa, seja pelo álcool, seja por substância de efeito semelhante, não exclui a imputabilidade, respondendo dolosamente o agente pelo fato.
Exclusão há na hipótese da embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, conforme dispõe o artigo 28, no seu parágrafo primeiro.
Sintetizando, a circunstância em foco não exclui o crime de desacato, independentemente da capacidade intelecto-volitiva do agente por ocasião do fato.
Todavia, tal posição é minoritária em nossa jurisprudência.
A corrente que defende a relevância da embriaguez fundamenta sua posição no argumento de que o crime exige dolo específico, consistente na intenção de ultrajar, no propósito de vexar ou depreciar a vítima, sabendo o agente que o ofendido é funcionário público e se acha no exercício de sua função, ou estando consciente de que a esta se vincula a ofensa. Logo, avulta-se a incompatibilidade entre o estado de embriaguez e a exigência de tal dolo do agente, o que exclui o crime. Os fundamentos encontram-se em Washington Barros Monteiro, Vicente Sabino Jr., além de ser orientação predominante no Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, conforme assertiva da Revista Justitia-Jurisprudência do Ministério Público de São Paulo, no seu volume I, páginas 39 a 41, ano de 1975.
Conseqüentemente, basta que o agente esteja embriagado para que não exista o delito, inexigindo análise de sua capacidade intelecto-volitiva na ocasião do fato.
VI. Ação Penal
A ação penal é pública incondicionada. Exclui-se, pois, qualquer possibilidade de retratação.
O delito de desacato, em qualquer de suas modalidades, é crime de pronta e rápida execução, instantâneo, em que o agente exaure, sem demora, os atos exigidos para sua consumação. Não admite, pois, retratação, mesmo porque, sendo delito de ação pública, independe da vontade do ofendido para eximir o acusado de punição ( cf. TARJ – AC – Rel. Jovino Machado Jordão – RT 454/459).
BIBLIOGRAFIA
De Plácido e Silva – Vocabulário Jurídico – volumes I e II – Ed. Forense;
Júnior, Romeu de Almeida Salles – Curso Completo de Direito Penal – Ed. Saraiva;
Franco, Alberto Silva e outros – Código Penal e sua interpretação jurisprudencial – Ed. Revista dos Tribunais;
Hungria, Nélson – Comentários ao Código Penal – Volume IX – Ed. Forense;
Meirelles, Hely Lopes - Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revista dos Tribunais;
Júnior, Vicente Sabino – Direito Penal – Vol. IV- Ed. Forense;
Noronha, E. Magalhães – Direito Penal – vol IV- Ed. Saraiva;
Faria, Bento de – Código Penal Brasileiro comentado – Vol. VII – Ed. Record Rio;
Revista Justitia-Jurisprudência – do Ministério Público de São Paulo – Vol. I.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Infelizmente, a pena é muito pequena, abrandada ainda mais pelas medidas alternativas que pode ser sacola econômica. A pena por desacata deveria ser mais rigorosa para que se fortaleça a autoridade, hoje muito desrespeitada nas escolas.
Sumário: I-Introdução; II- Conceito de Funcionário Público; III- Sujeito ativo e passivo; IV- Materialidade do delito; V- Elemento subjetivo; VI- Ação Penal.
I- INTRODUÇÃO
(...)Assim sendo, este trabalho tem o escopo de sintetizar o tema a operador do direito de que dele necessite, por meio de rápida e despretensiosa pesquisa sobre a figura do desacato, com partes compiladas de doutrinadores mestres no assunto.
(...)
Dispõe o artigo suso referido:
Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela. Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa.
Portanto, para que o delito se configure, há a necessidade de o agente "desacatar" funcionário público e, além do mais, que ele esteja no exercício de sua função ou haja o desacato em razão dela. E, indaga-se, seriam o Governador do Estado e o Ministro da Saúde considerados "funcionários públicos"?
II – FUNCIONÁRIO PÚBLICO – QUAL É O CONCEITO?
Como o tipo exige, no artigo 331 do CP, que o desacatado seja a funcionário público, há que se o definir.
Vejamos qual conceito nos vem do Vocabulário Jurídico, de Plácido e Silva, Ed. Forense, 3º ed., pág. 331:
"Já assim se diz, no sentido da lei brasileira, para a pessoa que está legalmente investida em cargo público. E, desse modo, toda pessoa que exerce cargo criado por lei, em número certo e denominação própria, remunerado pelos cofres públicos"
E prossegue:
"Não importa, assim, a ordem de funções ou de atribuições que possam distinguir o cargo. Importa, simplesmente, que seja cargo criado por lei, com especificação definida nesta, e cuja remuneração provenha dos cofres do Estado. A qualidade do funcionário público não assenta, pois, como já se fazia princípio doutrinário, no desempenho de função pública, mas no caráter de ocupar cargo permanente, definido em lei e remunerado pelo Estado. Os funcionários públicos estão sob regime especial, que se define e se estrutura pelos Estatutos dos Funcionários Públicos."
Busquemos, então, o que preleciona o sapientíssimo doutrinador Hely Lopes Meirelles, in Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revista dos Tribunais, 6º ed., pág. 370:
"Funcionários públicos são os servidores legalmente investidos em cargos públicos da Administração Direta e sujeitos às normas do Estatuto da entidade estatal a que pertencem. O que caracteriza o funcionário público e o distingue dos demais servidores é a titularidade de um cargo criado por lei, com denominação própria, em número certo e pago pelos cofres da entidade estatal em cuja estrutura se enquadra (cargo público). Pouco importa que o cargo seja de provimento efetivo ou em comissão: investido nele, o servidor é funcionário público, sob regime estatutário, portanto."
Contudo, é inócuo buscar o conceito no Direito Administrativo. E por quê? Acacianamente, comecemos pelo início...
No âmbito do Direito Administrativo, há teorias a respeito do que seja um funcionário público. E duas se destacam, segundo nos ensina Nélson Hungria:
I. a que restringe o conceito de funcionário público, englobando nele apenas aqueles que exercem poder de império, ou que a eles seja atribuída autoridade, ou, ainda, aos que se confia poder discricionário, que se configuraria por meio da faculdade de exame a casos concretos, para a execução de uma lei ou regulamento;
II. a que amplia o conceito, isto é, são considerados funcionário público aqueles que, profissionalmente, exerçam função pública, seja de império, de gestão ou técnica.
Dessarte, o conceito moderno, que prevalece, é aquele que liga funcionário público à noção ampla de função pública.
Abramos parênteses aqui, antes de prosseguirmos, para definir função pública. Deve entender-se, conforme consta no Vocabulário Jurídico (obra já citada, mesma página), a função que emana do poder público e outorgada para desempenho ou encargo de ordem pública, ou referente à administração pública.
Trata-se, pois, grosso modo, não só a que se refere à administração pública, como a decorrente de imposição de ordem legal, com objetivo de desempenhar um mister, que, mesmo não administrativo, mostre-se de interesse coletivo (múnus público). A condição do encargo, não a natureza do serviço, é que determina o caráter de público da função, segundo a obra citada.
Feita a digressão, retornemos ao assunto. Assim, o conceito de funcionário público deve estar intimamente ligado ao de função pública. Isso porque o conceito, na órbita penal, é bem diverso do definido no Direto Administrativo. Daí a inocuidade acima afirmada.
E como devemos, então, entender funcionário público no direito penal?
O nosso Código Penal adotou a noção ampliada — e não a restrita — do conceito de funcionário público discutido na esfera do Direito Administrativo. E foi mais longe. Não exige, para o caracterizar, nem sequer o exercício profissional ou permanente da função pública.
Verifiquemos o que está disposto no artigo 327 do mesmo Código:
Funcionário público
Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal.
§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.
Note-se, pois, que o caput do artigo já esclarece o que é considerado, para efeitos penais, funcionário público. No seu parágrafo primeiro determina quem se equipara a ele e, no parágrafo segundo, agrava a pena para quem ocupe, em síntese, algum cargo de comando.
Dessa forma, o artigo 327 nos mostra que não é a qualidade de funcionário que caracteriza o crime funcional, mas sim o fato de que é praticado por quem se encontra no exercício da função pública, pouco importando se permanente, temporária, remunerada, gratuita, efetiva, interina, ou se exercida profissionalmente ou não, ou ainda eventualmente (um depositário nomeado pelo juiz, por exemplo).
Concluímos, pois, que é funcionário público toda pessoa investida em cargo público, mediante nomeação e posse; a que serve em emprego público, fora dos quadros regulares e sem título de nomeação, e a que exerça função pública, seja lá qual for.
E para arrematar o alinhavado acima, chega-nos a lição do Mestre Celso Delmanto, em seu Código Penal comentado, no qual enumera quem seja funcionário público: Presidente da República, do Congresso, dos tribunais, senadores, deputados e vereadores, jurados, serventuários da justiça, pessoas contratadas, diaristas e extranumerárias. Não são funcionários públicos os tutores ou curadores dativos e os concessionários de serviços públicos.
Por isso, como o senhor Mário Covas e o senhor José Serra foram eleitos para os cargos de Governador e Senador, respectivamente, são eles considerados, para efeitos penais, funcionários públicos.
Ora, e a tutela? Tutela-se o quê?
Há um princípio que nos dita que aos agentes do poder público são garantidos o prestígio e a dignidade de sua função. Ofensas a essas pessoas que estão no exercício da atividade funcional ou em razão dela, obviamente, atingem também a administração. A tutela, assim, é exercida em relação à administração pública.
III - SUJEITO ATIVO E PASSIVO
É crime comum. Por isso, sujeito ativo é qualquer pessoa. E quando o crime é praticado por funcionário público contra funcionário público?
Há divergências.
Os que defendem a impossibilidade do crime fixam-se no fato de que o desacato se encontra no capítulo dos crimes praticados "por particulares" contra a Administração em geral, ou seja, o agente deve ser um "estranho". Se for funcionário público, não haverá desacato, e a infração é considerada autônoma — injúria, lesão, difamação, calúnia, ameaça etc. Ilustres e doutos doutrinadores, como Nélson Hungria e Vicente Sabino Júnior fundamentam tal posição.
Há acórdãos em que a inteligência ao artigo ora em foco gizam que, dentro do princípio da reserva legal, que informa o nosso sistema penal, não é extensível ao funcionário norma criada para punir o ilícito praticado por particular. Dessarte, a omissão do legislador não seria suprida pela aplicação analógica da norma incriminadora, em face da garantia constitucional da legalidade dos delitos e das penas.
Por outro lado, os que defendem a possibilidade de o crime ser praticado por funcionário público fundamentam tal posição no fato de que o funcionário, ao praticar o delito contra outro funcionário, despe-se dessa qualidade, equiparando-se ao particular. E de fato, a própria lógica nos aponta que, se o bem jurídico a ser tutelado é o prestígio da função pública, incompreensível como possa ocorrer lesão jurídica tão-somente quando a conduta é praticada por particular. Defende tal tese ilustres doutrinadores como Heleno C. Fragoso, Magalhães Noronha, Maggiore, dentre tantos outros.
Dessarte, há o pressuposto, segundo a lei, de que o sujeito ativo há de ser um estranho, contudo, a este se equipara o funcionário público que, ao praticar o delito, despe-se dessa qualidade. Se maltrata física ou moralmente outro funcionário in officio ou propter officium, torna-se irrelevante que seja de categoria idêntica à do ofendido. E até mesmo se o ofensor é superior hierárquico do ofendido. Manzini, por exemplo, opina pela inexistência do desacato.
Já no que tange ao sujeito passivo, como dissemos anteriormente, é ele fundamentalmente o Estado, embora possa assim considerar-se também o funcionário ofendido, segundo Heleno C. Fragoso e Magalhães Noronha.
O Estado tutela o prestígio de seus agentes e o respeito devido à dignidade de sua função, isso porque a ofensa que lhes é irrogada, seja na presença dele ou no exercício de sua atividade funcional, ou ainda, em razão dela, atinge a própria Administração Pública. Daí não haver, in casu, injúria, difamação ou desrespeito ao funcionário, pois são esses considerados crimes contra a pessoa. Aqui é específico. Há um interesse no normal funcionamento da Administração Pública, motivo pelo qual se afasta qualquer possibilidade de atentado contra ela.
IV - Materialidade do delito
Volvamos ao que dispõe o artigo 331:
Desacato
Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa.
Fica evidente que o objeto material desse delito se encontra em desacatar funcionário público.
Contudo, impende dizer que o legislador não definiu o que seja "desacato". Coube, pois, à doutrina fixar a conceituação do termo.
Desacatar, semanticamente, e grosso modo, é faltar ao respeito devido a alguém, desprezar, menoscabar, afrontar, vexar. Pressupõe-se, pois, que se alguém faltar com o devido respeito ao funcionário público, afrontá-lo, vexá-lo, estará incurso no artigo 331 do nosso Código Penal.
Não obstante, o conceito, v. g., "faltar ao respeito devido a..." é muito amplo. E mais: depende do contexto em que ocorre. O que pode ser insignificante em certas situações, não o será em outras.
Nélson Hungria, com bastante precisão, no volume IX/421, in Comentários, esclarece:
"A ofensa constitutiva do desacato é qualquer palavra ou ato que redunde em vexame, humilhação, desprestígio ou irreverência ao funcionário. É a grosseira falta de acatamento, podendo consistir em palavras injuriosas, difamatórias ou caluniosas, vias de fato, agressão física, ameaças, gestos obscenos, gritos agudos etc."
Deduz-se, pois, que a crítica ou mesmo a censura, ainda que veementes, não constitui desacato, desde, obviamente, que não se apresentem de forma injuriosa.
Integra a figura típica do delito a circunstância de que a ação seja praticada contra funcionário no "exercício da função ou em razão dela". Temos aqui o "nexo funcional", que é indispensável para que o delito se configure. Isso porque, evidentemente, a tutela penal relaciona-se com a função e não com a pessoa do funcionário. Por isso, deve o funcionário encontrar-se no exercício de sua função, ou seja, realizando, no momento do fato, qualquer ato de ofício ou correspondente às atribuições do cargo que desempenha. O nexo é ocasional.
Por outro lado, não exige o tipo que o funcionário esteja apenas no exercício da função, mas também que, ao ser praticado o ato, esteja ele "em razão dela", ou seja, o nexo aqui é causal. Basta, pois, que o motivo da conduta delituosa se relacione diretamente com o exercício da função. Conforme preleciona Manzini, "o nexo da causalidade deve ser provada e não pode presumir-se apenas pela qualidade do sujeito passivo ou diante da ignorância do motivo de fato."
Embora a lei não expresse literalmente, é constitutivo da figura que o desacato seja praticado na presença do funcionário ofendido. Assim orienta nossa doutrina. A assertiva se faz em razão da interpretação sistemática dos artigos 331 e 141, II, do CP. Se o delito for praticado, em razão de suas funções, na ausência do funcionário haverá crime qualificado contra a honra.
Portanto, deve o funcionário estar presente ao local onde a ofensa é praticada. Não se exige, segundo opinião predominante, que o ofendido veja o ofensor, nem que ele perceba o ato ofensivo. Basta que, presente, tome conhecimento do fato. E se a ofensa for irrogada por escrito? Haverá crime contra a honra.
Apesar de ser considerada com muita cautela, mas há a possibilidade da tentativa. Segundo doutrinadores, tal ocorreria quando alguém fosse impedido de agredir o funcionário.
V. Elemento subjetivo
O elemento subjetivo é o dolo, consubstanciado no "agir", uma vez que o agente tem por objetivo desrespeitar ou desprestigiar a função pública exercida pela vítima. E o dolo é específico. Consuma-se o delito no lugar e no momento em que ocorre a prática do ato ofensivo, ou no momento em que o agente profere as palavras ofensivas que configuram o desacato, na presença do ofendido.
Entretanto, a polêmica existente em torno do tema informa-se no que diz respeito ao "ânimo do agente". Há duas correntes distintas: uma — opta pela exigência de ânimo calmo para a configuração do delito; a outra — a inexigência de tal ânimo.
A primeira corrente fundamenta-se em Nélson Hungria, para quem o tipo exige dolo específico, consistente na intenção de ultrajar, no propósito de depreciar ou vexar a vítima. Entendem os que abraçam tal corrente que esse elemento subjetivo é incompatível com o estado de exaltação ou ira, o que exclui o delito.
De fato, não há, na prática, com raríssimas exceções, situações concretas em que o agente, ao cometer esse delito, não esteja exaltado. A premeditação, ou seja, o agente, calmamente, dirigir-se a um funcionário com a transparente intenção de o ultrajar, é a exceção. Na grande maioria das vezes, quando se tipifica o agente no artigo 331, ele viveu situações em que a exaltação, o nervosismo, a falta de educação, o desabafo, as palavras ditas impensadamente, quando não a embriaguez, é que prevalecem.
Juiz deve ser cauteloso no julgamento de tais ações penais, em razão de o contexto ter suma importância para a caracterização do delito. Isso porque, geralmente, quando o agente se encontra em situação de estresse emocional —apesar de proferir palavras ou gestos que, em princípio, poderiam caracterizar o desacato — a intenção de ultrajar, de vexar a vítima, no mais das vezes, está ausente. O que se tem, a bem da verdade, é o desabafo, é o "despejar" da ira do agente, num momento de irracionalidade, contra o funcionário. O ânimo do agente, exaltado, irado, leva-o a proferir palavras ou a fazer gestos que, intimamente, não condizem com a vontade eficaz do agente. Ou seja, a intenção real não é ofender a vítima, conscientemente. É o que se costuma traduzir, grotescamente, como "repente" , "um minuto de bobeira". E o tipo exige o dolo específico que, reiteramos, na maioria dos casos, não se faz presente.
Felizmente, por questão de Justiça, esse é o entendimento dominante em nossos tribunais.
Quanto à inexigência do ânimo calmo, quem defende essa corrente entende que posição contrária é perigosa para os interesses da Justiça, uma vez que não existe acusado que não alegue exaltação de ânimo na prática do desacato. O dolo seria genérico.
Tributado o devido respeito à opinião dos que defendem tal tese, o fato de eles próprios admitirem que não haveria acusado que não alegasse exaltação de ânimo, na prática, esse argumento sacramenta, de forma transparente, que qualquer acusado em estado de exaltação, de fato, não estaria cometendo o delito, justamente pelo ânimo do agente!
Ademais, como cada caso é um caso, cabe ao Juiz discernir, pelos fatos, se o agente estava ou não exaltado. Para tanto há a instrução e, nela, por exemplo, o depoimento de testemunhas que assistiram aos acontecimentos. Fácil, portanto, para o Magistrado se convencer a respeito do ânimo do agente. Contudo, é posição minoritária em nossa jurisprudência.
Outro ponto polêmico é a questão da embriaguez no crime de desacato.
Há corrente que defende a irrelevância da embriaguez na aferição do elemento subjetivo. Obviamente, para os defensores dessa corrente o dolo é genérico, já que a figura típica do artigo 331 do CP não faz referência a esse elemento subjetivo do injusto. Por isso, não há que se falar na existência de um dolo específico que se mostraria incompatível com a embriaguez do agente. Nos termos do artigo 28, II, do CP, a embriaguez voluntária ou culposa, seja pelo álcool, seja por substância de efeito semelhante, não exclui a imputabilidade, respondendo dolosamente o agente pelo fato.
Exclusão há na hipótese da embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, conforme dispõe o artigo 28, no seu parágrafo primeiro.
Sintetizando, a circunstância em foco não exclui o crime de desacato, independentemente da capacidade intelecto-volitiva do agente por ocasião do fato.
Todavia, tal posição é minoritária em nossa jurisprudência.
A corrente que defende a relevância da embriaguez fundamenta sua posição no argumento de que o crime exige dolo específico, consistente na intenção de ultrajar, no propósito de vexar ou depreciar a vítima, sabendo o agente que o ofendido é funcionário público e se acha no exercício de sua função, ou estando consciente de que a esta se vincula a ofensa. Logo, avulta-se a incompatibilidade entre o estado de embriaguez e a exigência de tal dolo do agente, o que exclui o crime. Os fundamentos encontram-se em Washington Barros Monteiro, Vicente Sabino Jr., além de ser orientação predominante no Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, conforme assertiva da Revista Justitia-Jurisprudência do Ministério Público de São Paulo, no seu volume I, páginas 39 a 41, ano de 1975.
Conseqüentemente, basta que o agente esteja embriagado para que não exista o delito, inexigindo análise de sua capacidade intelecto-volitiva na ocasião do fato.
VI. Ação Penal
A ação penal é pública incondicionada. Exclui-se, pois, qualquer possibilidade de retratação.
O delito de desacato, em qualquer de suas modalidades, é crime de pronta e rápida execução, instantâneo, em que o agente exaure, sem demora, os atos exigidos para sua consumação. Não admite, pois, retratação, mesmo porque, sendo delito de ação pública, independe da vontade do ofendido para eximir o acusado de punição ( cf. TARJ – AC – Rel. Jovino Machado Jordão – RT 454/459).
BIBLIOGRAFIA
De Plácido e Silva – Vocabulário Jurídico – volumes I e II – Ed. Forense;
Júnior, Romeu de Almeida Salles – Curso Completo de Direito Penal – Ed. Saraiva;
Franco, Alberto Silva e outros – Código Penal e sua interpretação jurisprudencial – Ed. Revista dos Tribunais;
Hungria, Nélson – Comentários ao Código Penal – Volume IX – Ed. Forense;
Meirelles, Hely Lopes - Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revista dos Tribunais;
Júnior, Vicente Sabino – Direito Penal – Vol. IV- Ed. Forense;
Noronha, E. Magalhães – Direito Penal – vol IV- Ed. Saraiva;
Faria, Bento de – Código Penal Brasileiro comentado – Vol. VII – Ed. Record Rio;
Revista Justitia-Jurisprudência – do Ministério Público de São Paulo – Vol. I.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Infelizmente, a pena é muito pequena, abrandada ainda mais pelas medidas alternativas que pode ser sacola econômica. A pena por desacata deveria ser mais rigorosa para que se fortaleça a autoridade, hoje muito desrespeitada nas escolas.
SALA DE AULA BRASILEIRA É A MAIS INDISCIPLINADA DO QUE A MÉDIA DE OUTROS PAÍSES
Sala de aula brasileira é mais indisciplinada do que a média. Pesquisa foi realizada entre estudantes de 15 anos - 25/5/2011 Redação, com BBC - CORREIO DO BRASIL.
As salas de aula brasileiras são mais indisciplinadas do que a média de outros países avaliados em um estudo do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes).
O estudo, feito com dados de 2009 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), aponta que, no Brasil, 67% dos alunos entrevistados disseram que seus professores “nunca ou quase nunca” têm de esperar um longo período até que a classe se acalme para dar prosseguimento à aula.
Entre os 66 países participantes da pesquisa, em média 72% dos alunos dizem que os professores “nunca ou quase nunca” têm de esperar que a classe se discipline.
Os países asiáticos são os mais bem colocados no estudo: no Japão, no Cazaquistão, em Xangai (China) e em Hong Kong, entre 93% e 89% dos alunos disseram que as classes costumam ser disciplinadas.
Finlândia, Grécia e Argentina são os países onde, segundo percepção dos alunos, os professores têm de esperar com mais frequência para que os alunos se acalmem.
O estudo foi feito com alunos na faixa dos 15 anos e dentificou que os distúrbios em sala de aula estão, em média, menores do que eram na pesquisa anterior, feita no ano 2000.
– A disciplina nas escolas não deteriorou – na verdade, melhorou na maioria dos países –, diz o texto da pesquisa.
– Em média, a porcentagem de estudantes que relataram que seus professores não têm de esperar muito tempo até que eles se acalmem aumentou em seis pontos percentuais.
Segundo o estudo, a bagunça em sala de aula tem efeito direto sobre o rendimento dos estudantes.
– Salas de aula e escolas com mais problemas de disciplina levam a menos aprendizado, já que os professores têm de gastar mais tempo criando um ambiente ordeiro antes que os ensinamentos possam começar –, afirma o relatório da OCDE.
– Estudantes que relatam que suas aulas são constantemente interrompidas têm performance pior do que estudantes que relatam que suas aulas têm menos interrupções.
A criação desse ambiente positivo em sala de aula tem a ver, segundo a OCDE, com uma “relação positiva entre alunos e professores”. Se os alunos sentem que são “levados a sério” por seus mestres, eles tendem a aprender mais e a ter uma conduta melhor, conclui o relatório.
No caso do Brasil, porém, a pesquisa mostra que os estudantes contam menos com seus professores do que há dez anos.
– Relações positivas entre alunos e professores não são limitadas a que os professores escutem (seus pupilos). Na Alemanha, por exemplo, a proporção de estudantes que relatou que os professores lhe dariam ajuda extra caso necessário cresceu de 59% em 2000 a 71% em 2009 –, afirma o relatório.
Já no Brasil essa proporção de estudantes caiu de 88% em 2000 para 78% em 2009.
MÃE DE ALUNA DENUNCIA PROFESSORA POR AGRESSÃO
Mãe de aluna denuncia professora por agressão em Passo Fundo. Polícia investiga o caso após menina contar que foi levantada pelo pescoço após pedir para ir ao banheiro - Acácio Silva / Correio do Povo 0 25/05/2011
A Delegacia de Proteção a Criança e ao Adolescente (DPCA) de Passo Fundo investiga uma denúncia contra uma professora por suposta agressão a uma aluna de sete anos. A violência teria ocorrido na terça-feira, durante o turno da tarde, na escola municipal Daniel Dipp, localizada na vila Hípica, periferia da cidade.
O caso foi registrado na Delegacia de Pronto Atendimento da Policia Civil pela mãe da vítima, a massoterapeuta Patrícia Fernandes Moreira. Segundo ela, a filha, estudante da segunda série, relatou ao chegar em casa que tinha sido agredida por uma professora, que está dando aulas provisoriamente para a turma.
A menina contou para a mãe que, antes do recreio, foi até a frente na sala de aula e pediu para a professora para ir ao banheiro. Neste instante, a professora teria levantado a criança pelo pescoço, deixando-a com os pés no ar. Depois disso, a colocou no chão, afirmando que poderia ir ao banheiro. Segundo o relato da vítima, a professora a teria acompanhado e ficado esperando na porta.
Além disso, na saída da escola, a professora foi com a estudante até a esquina, onde a teria ameaçado para não contar nada à mãe, ao pai ou à diretora da escola. A menina contou, ainda, que a professora grita e joga objetos nos alunos.
A secretária de Educação, professora Vera Vieira, disse que ainda não tinha conhecimento da denúncia. Ela prometeu entrar em contato com a direção da escola e tomar as medidas cabíveis.
Em abril, o professor de Ciências Naturais Valdecir Norberto Corteze, foi acusado de agredir uma estudante de 11 anos, da 5ª série da escola estadual Ana Luiza Ferrão Teixeira, em Passo Fundo. Um aluno filmou a suposta agressão, que acabou sendo publicada na internet. Corteze foi afastado das suas funções.
A Delegacia de Proteção a Criança e ao Adolescente (DPCA) de Passo Fundo investiga uma denúncia contra uma professora por suposta agressão a uma aluna de sete anos. A violência teria ocorrido na terça-feira, durante o turno da tarde, na escola municipal Daniel Dipp, localizada na vila Hípica, periferia da cidade.
O caso foi registrado na Delegacia de Pronto Atendimento da Policia Civil pela mãe da vítima, a massoterapeuta Patrícia Fernandes Moreira. Segundo ela, a filha, estudante da segunda série, relatou ao chegar em casa que tinha sido agredida por uma professora, que está dando aulas provisoriamente para a turma.
A menina contou para a mãe que, antes do recreio, foi até a frente na sala de aula e pediu para a professora para ir ao banheiro. Neste instante, a professora teria levantado a criança pelo pescoço, deixando-a com os pés no ar. Depois disso, a colocou no chão, afirmando que poderia ir ao banheiro. Segundo o relato da vítima, a professora a teria acompanhado e ficado esperando na porta.
Além disso, na saída da escola, a professora foi com a estudante até a esquina, onde a teria ameaçado para não contar nada à mãe, ao pai ou à diretora da escola. A menina contou, ainda, que a professora grita e joga objetos nos alunos.
A secretária de Educação, professora Vera Vieira, disse que ainda não tinha conhecimento da denúncia. Ela prometeu entrar em contato com a direção da escola e tomar as medidas cabíveis.
Em abril, o professor de Ciências Naturais Valdecir Norberto Corteze, foi acusado de agredir uma estudante de 11 anos, da 5ª série da escola estadual Ana Luiza Ferrão Teixeira, em Passo Fundo. Um aluno filmou a suposta agressão, que acabou sendo publicada na internet. Corteze foi afastado das suas funções.
quarta-feira, 25 de maio de 2011
O ASSASSINATO DA LÍNGUA PORTUGUESA
Livro distribuído pelo MEC que tolera erros gramaticais como "os livro" e "nós pega" causa estragos no aprendizado de meio milhão de brasileiros e atrapalha o desenvolvimento do País. Amauri Segalla e Bruna Cavalcanti - REVISTA ISTO É, N° Edição: 2167, 20.Mai.11
Imagine a seguinte cena: na sala de aula, o adolescente levanta o braço para perguntar à professora se ele pode falar “nós pega o peixe”. Ato contínuo, a mestre pede ao jovem para consultar o livro “Por uma Vida Melhor” e dar uma olhada na página 16. Sedento por conhecimento, o aluno acompanha com olhos curiosos enquanto a docente lê o trecho proposto. O garoto, enfim, sacia a dúvida: sim, ele pode falar “nós pega o peixe”. Está escrito ali, claro como a soma de dois mais dois em uma cartilha de matemática. Com nuances diferentes, a situação descrita acima provavelmente vai se repetir em milhares de escolas públicas de todo o País. Não é difícil calcular os efeitos nefastos no futuro dos 485 mil estudantes do ensino fundamental que devem receber a obra distribuída pelo Ministério da Educação por meio do Programa Nacional do Livro Didático. De autoria da professora Heloísa Campos e outros dois educadores, “Por uma Vida Melhor” defende a ideia de que erros gramaticais são aceitáveis na língua falada. Para Heloísa, frases como “os livro ilustrado mais interessante estão emprestado” (tal pérola aparece em destaque no material) não podem ser condenadas se forem expressas verbalmente. Mesmo que em uma sala de aula.
Autora desconhecida, sem grandes feitos na área da educação, Heloísa se viu no centro de uma polêmica que envolveu escritores, linguistas e professores. Por mais que alguma voz aqui e ali tenha defendido os argumentos de Heloísa, além dos eternos demagogos de plantão, a maioria esmagadora condenou seus métodos de ensino. Uma das mais importantes escritoras brasileiras, Nélida Piñon tem autoridade – como poucos, a propósito – para falar sobre a língua portuguesa. Eis seu veredicto: “O livro confirma a tese de que esteve sempre em curso no Brasil o projeto de manter uma legião de brasileiros como cidadãos de segunda classe”, diz a autora de “Vozes no Deserto”. Escritor que conseguiu a rara combinação de fazer sucesso junto ao público e, ao mesmo tempo, conquistar a crítica, Fernando Morais está indignado. “Esse livro é uma barbaridade”, diz o biógrafo do jornalista Assis Chateaubriand. “Trata-se de um desastre, o oposto do que é pregado por uma pessoa minimamente civilizada.” Linguista com décadas de serviços prestados à educação brasileira e ex-professor da Unifesp, Francisco da Silva Borba amplia a discussão. “O aluno tem que ser ensinado”, afirma. “Se ele tolerar infração às regras, então para que serve a escola?”
Sob diversos aspectos, “Por uma Vida Melhor” tem potencial para piorar a existência de meio milhão de brasileiros. Se realmente for levado a sério pelas escolas públicas, a obra vai condenar esses jovens a uma escuridão cultural sem precedente. Ao dificultar o aprendizado da norma correta, os professores da ignorância terão criado uma espécie de “apartheid linguístico”, para usar uma expressão do ex-ministro da Educação Cristovam Buarque. De um lado, os ricos e bem instruídos. De outro, os jovens reféns da falta de conhecimento gramatical. Se é evidente que o livro assassina a língua portuguesa, na medida em que diz que o aluno pode, na fala, escolher usar a concordância ou não, por que diabos ele teve o aval do MEC? Procurado, Fernando Haddad, o atual ministro da pasta, não quis se pronunciar (leia quadro). A autora Heloísa Campos pelo menos não se furtou ao dever de defender sua obra. “Falar ‘os livro’ do ponto de vista da linguagem popular não é um erro”, diz a professora. “A nossa abordagem é de acolher a fala que o aluno traz da sua comunidade. A cultura dele é tão válida quanto qualquer outra.”
Embora não faça referências diretas, Heloísa repete as máximas do livro “Preconceito Linguístico”, do professor e escritor Marcos Bagno, que faz certo sucesso entre educadores modernos por colocar questões políticas e ideológicas na discussão. Bagno afirma que a linguagem reproduz desigualdades sociais – como se isso fosse uma descoberta assombrosa. É claro que sim. A questão não é essa. Em vez de manter o jovem que não domina a língua imerso na triste ignorância – a pretexto de preservar suas raízes culturais –, por que não retirá-lo de lá? Falar corretamente não é o primeiro passo para, no avanço seguinte, escrever melhor? Escrever melhor não representa uma oportunidade de crescimento pessoal e profissional? Tente conseguir um emprego falando “nós vai” e você certamente terá suas chances reduzidas a zero. É simples assim.
Pode ser bonito, pode ser simpático, pode ser ousado defender o direito de as pessoas cometerem barbaridades gramaticais, mas na vida prática isso é uma tragédia. É claro que todos nós cometemos erros ao falar – intencionais ou não –, como é óbvio que, em certos ambientes, se expressar como um decano da linguística pode soar arrogante e desnecessário. Mas, na vida real, falar minimamente direito só traz vantagens e são justamente essas vantagens que autores como Heloísa Campos desprezam. “Uma coisa é compreender a evolução da língua, que é um organismo vivo, a outra é validar erros grosseiros”, diz Marcos Vilaça, presidente da Academia Brasileira de Letras. “É como ensinar tabuada errada. Quatro vezes três é sempre 12, na periferia ou no palácio.” Mesmo para aqueles que, em tese, defendem a abordagem de Heloísa, o livro é visto como uma obra menor. “Não há nenhuma novidade no que o livro diz”, afirma o professor de português Pasquale Cipro Neto. “Ele tem uma ou outra passagem meio ingênua, pueril, mas no todo cumpre o seu papel.”
Para um país que nos últimos anos vem registrando índices de crescimento assombrosos e tem a ambição de reduzir o abismo da desigualdade social, a educação é talvez a arma mais poderosa que existe. Nesse campo, conforme estudos internacionais demonstram, o Brasil está encalhado na rabeira global. Aqui pouco se lê, pouco se estuda, pouco valor se dá ao conhecimento. Não é hora de mudar? A língua, como já observaram pesquisadores importantes, é um elemento que traduz a identidade nacional. É um instrumento de unificação – e não de segregação entre os que sabem e os que não merecem saber. Ela é, acima de tudo, um princípio de cidadania. Diante da onda de protestos provocada pela notícia da distribuição de “Por uma Vida Melhor”, é possível que o livro encontre alguma resistência entre os professores. Na semana passada, a procuradora da República Janice Ascari, do Ministério Público Federal, afirmou que a Justiça provavelmente receberá uma avalanche de ações contra a publicação. Ela própria foi incisiva em seu blog. “Vocês estão desperdiçando dinheiro público com material que emburrece em vez de instruir”, escreveu Janice. “Essa conduta é inadmissível.” Se as ações vingarem, os jovens terão a chance de dizer, alto e bom som: “Nós pegamos o peixe.”
A polêmica sobre os livros didáticos distribuídos pelo MEC não foi a única a atormentar o ministro Fernando Haddad nos últimos tempos. O episódio da fraude no Enem em 2009, quando foram roubadas provas dentro da gráfica responsável pela confecção dos testes, foi mais uma de suas trapalhadas. No ano seguinte, constatou-se erro na impressão das provas – e de novo a responsabilidade recaiu sobre o Ministério da Educação. À época, os exames correram sério risco de serem cancelados, o que acabou não acontecendo. Os equívocos não param por aí. Neste ano, surgiu a denúncia de fraudes no Prouni, com estudantes beneficiados pelo programa, mas que não se enquadravam nos limites de renda. Ao mesmo tempo, veio à tona o episódio da sobra de vagas, principalmente no caso de bolsas parciais e no programa de educação a distância, o que demonstraria uma falha administrativa. Para aumentar o desgaste de Haddad, entidades internacionais de fomento não cansam de advertir que o grande gargalo ao desenvolvimento do Brasil continua a ser o baixo nível da educação
terça-feira, 24 de maio de 2011
AMANDA GURGEM: UMA VERDADE VIRTUAL
Silvio Teles - O GLOBO, 24/05/2011
Impressiona-me como uma verdade conhecida por todos pode repercutir assombrosamente por puro interesse publicitário-comercial. É o que ocorre com o fenômeno Amanda Gurgel, uma distinta professora do Rio Grande do Norte, nordestina forte e corajosa, que, revoltada com as agruras de lidar com a educação no Brasil, resolveu dizer na cara das autoridades aquilo que elas já estão cansadas de saber.
Digo que estão cansadas de saber porque, há muito, defendo a tese de que o estado de miséria que vivemos em termos de saúde, educação e segurança pública é situação deliberada pela classe política. Trata-se de um fenômeno cíclico sustentador da profissionalização da política: uma população não educada e desinformada, carente de saúde nas suas mais básicas necessidades e absolutamente entregue ao fenômeno do crime, que elege políticos mal intencionados, que, por sua vez, se encarregam de perpetuar a desestrutura social.
Com um eleitorado desses, qualquer falastrão, seja ele desses palhaços que apresentam programas policialescos, seja um cantador de forró de péssimo gosto, seja um comediante analfabeto, seja um jogador de futebol de carreira falida, para ficar apenas nos folclóricos, assume a missão de conduzir os destinos públicos. Com votos dessa qualidade, fica fácil para os políticos profissionais, capazes de multiplicar seu patrimônio assustadoramente em poucos meses, usarem seu poder, seu dinheiro, suas promessas e suas ameaças para se perpetuarem e manterem tudo "como antes na terra de Abrantes".
O que o discurso de Amanda Gurgel tem de corajoso e de verdadeiro, tem de conhecido. Explodiu nas redes sociais e as emissoras de televisão não perderam a oportunidade de captarem a audiência. A professora emblemática figurou nos principais programas de televisão não pela importância de seu discurso... Ela agiu como um chamariz para novos contratos publicitários, para mais pontos no Ibope. E só!
Não se trata de pessimismo desmotivado ou de relegar a revolta da professora ao descrédito. Assino embaixo de todo o discurso da educadora potiguar. Mas a pergunta é: o que há de novidade no discurso de Amanda Gurgel? O que, daquilo que foi brilhantemente esfregado na cara das autoridades, elas ou nós mesmos não sabíamos?
Eu, que estudei boa parte da minha vida em escola pública e perdi ano letivo por greve, conheço tal realidade faz tempo!
Posso estar errado, mas não acredito: Amanda Gurgel é um fenômeno que, em tempos de informação altamente perecível, se desfará sem que seu verdadeiro objetivo se cumpra. Porque antes de Gurgel muitos outros já denunciaram tal descaso, muitos já morreram em protestos, muitos já sofreram com a deliberada ausência de vontade política.
O pior é que, no fundo, todos nós sabemos o quão errado é o sistema que mantém tudo isso. Mas, na hora de agir para mudar, cada um pensa individualmente, não lembrando das mazelas denunciadas por Amanda Gurgel. Presos à ambição pessoal ou, pior, ao ciclo da dependência, cada um pensa em seu emprego, em receber sua promessa, em manter seu privilégio... Ou em agradecer o remédio, a consulta, o óculos, a cesta básica.
Na hora de gritar, comportamo-nos como uma turba, sem objetivo e sem comando, pensando com a boca, fazendo de Gurgel nossa voz, elevada ao Trending Topics do Twitter, a ponto de ela ocupar espaço nobre em rede nacional. Mas, na hora de agir efetivamente, comportamo-nos como umas raposas, pensando com o umbigo, afastando de nós a responsabilidade, ou apenas achando bonito o que disse Amanda Gurgel, mas sem um pingo de coragem para sacrificar absolutamente nada para fazer de seu discurso uma arma de verdade contra essa herança política maldita que, como parasita, faz da sociedade seu agente hospedeiro.
A solução - ou a salvação do Brasil, no dizer da professora - vem, sim, da educação.
É a consciência de "Amandas Gurgel", estampada a giz no quadro da sala de aula precária que todos os muitos professores têm de enfrentar, a única arma capaz de alterar essa situação, interrompendo o ciclo. O problema, a meu sentir, é fazer com que a denúncia que hoje todos encampam, virtualmente, seja assumida por cada um, na vida real. É fazer de Amanda Gurgel mais que uma verdade virtual.
Impressiona-me como uma verdade conhecida por todos pode repercutir assombrosamente por puro interesse publicitário-comercial. É o que ocorre com o fenômeno Amanda Gurgel, uma distinta professora do Rio Grande do Norte, nordestina forte e corajosa, que, revoltada com as agruras de lidar com a educação no Brasil, resolveu dizer na cara das autoridades aquilo que elas já estão cansadas de saber.
Digo que estão cansadas de saber porque, há muito, defendo a tese de que o estado de miséria que vivemos em termos de saúde, educação e segurança pública é situação deliberada pela classe política. Trata-se de um fenômeno cíclico sustentador da profissionalização da política: uma população não educada e desinformada, carente de saúde nas suas mais básicas necessidades e absolutamente entregue ao fenômeno do crime, que elege políticos mal intencionados, que, por sua vez, se encarregam de perpetuar a desestrutura social.
Com um eleitorado desses, qualquer falastrão, seja ele desses palhaços que apresentam programas policialescos, seja um cantador de forró de péssimo gosto, seja um comediante analfabeto, seja um jogador de futebol de carreira falida, para ficar apenas nos folclóricos, assume a missão de conduzir os destinos públicos. Com votos dessa qualidade, fica fácil para os políticos profissionais, capazes de multiplicar seu patrimônio assustadoramente em poucos meses, usarem seu poder, seu dinheiro, suas promessas e suas ameaças para se perpetuarem e manterem tudo "como antes na terra de Abrantes".
O que o discurso de Amanda Gurgel tem de corajoso e de verdadeiro, tem de conhecido. Explodiu nas redes sociais e as emissoras de televisão não perderam a oportunidade de captarem a audiência. A professora emblemática figurou nos principais programas de televisão não pela importância de seu discurso... Ela agiu como um chamariz para novos contratos publicitários, para mais pontos no Ibope. E só!
Não se trata de pessimismo desmotivado ou de relegar a revolta da professora ao descrédito. Assino embaixo de todo o discurso da educadora potiguar. Mas a pergunta é: o que há de novidade no discurso de Amanda Gurgel? O que, daquilo que foi brilhantemente esfregado na cara das autoridades, elas ou nós mesmos não sabíamos?
Eu, que estudei boa parte da minha vida em escola pública e perdi ano letivo por greve, conheço tal realidade faz tempo!
Posso estar errado, mas não acredito: Amanda Gurgel é um fenômeno que, em tempos de informação altamente perecível, se desfará sem que seu verdadeiro objetivo se cumpra. Porque antes de Gurgel muitos outros já denunciaram tal descaso, muitos já morreram em protestos, muitos já sofreram com a deliberada ausência de vontade política.
O pior é que, no fundo, todos nós sabemos o quão errado é o sistema que mantém tudo isso. Mas, na hora de agir para mudar, cada um pensa individualmente, não lembrando das mazelas denunciadas por Amanda Gurgel. Presos à ambição pessoal ou, pior, ao ciclo da dependência, cada um pensa em seu emprego, em receber sua promessa, em manter seu privilégio... Ou em agradecer o remédio, a consulta, o óculos, a cesta básica.
Na hora de gritar, comportamo-nos como uma turba, sem objetivo e sem comando, pensando com a boca, fazendo de Gurgel nossa voz, elevada ao Trending Topics do Twitter, a ponto de ela ocupar espaço nobre em rede nacional. Mas, na hora de agir efetivamente, comportamo-nos como umas raposas, pensando com o umbigo, afastando de nós a responsabilidade, ou apenas achando bonito o que disse Amanda Gurgel, mas sem um pingo de coragem para sacrificar absolutamente nada para fazer de seu discurso uma arma de verdade contra essa herança política maldita que, como parasita, faz da sociedade seu agente hospedeiro.
A solução - ou a salvação do Brasil, no dizer da professora - vem, sim, da educação.
É a consciência de "Amandas Gurgel", estampada a giz no quadro da sala de aula precária que todos os muitos professores têm de enfrentar, a única arma capaz de alterar essa situação, interrompendo o ciclo. O problema, a meu sentir, é fazer com que a denúncia que hoje todos encampam, virtualmente, seja assumida por cada um, na vida real. É fazer de Amanda Gurgel mais que uma verdade virtual.
segunda-feira, 23 de maio de 2011
A "ESPERTOCRACIA" EDUCACIONAL
Machado de Assis, mulato, gago e epilético, um dos mais ilustrados e respeitados cultores do idioma pátrio, conseguiu de modo exemplar unir o erudito ao popular. Em seus irretocáveis escritos, ensinava que a democracia deixa de ser uma coisa sagrada quando se transforma em "espertocracia" - "o governo de todos os feitios e de todas as formas". Já de Rui Barbosa, pequena estatura, advogado, diplomata, político e jornalista, cujo nome está inscrito nos anais da história do Direito internacional, pode-se extrair uma singela lição de seu celebrado patrimônio intelectual: "A musa da gramática não conhece entranhas". Pois bem, esses dois curtos arremates dos renomados mestres de nossa língua escrita e falada vêm a calhar neste momento em que a perplexidade assoma ante a barbaridade, patrocinada pelo Ministério da Educação (MEC), de uma "nova gramática", cuja autora assim ensina: "Os livro ilustrado mais interessante estão emprestado", como frase adequada à linguagem oral, está correta ao ser usada em certos contextos.
Para o grande Rui, a letra da gramática não entra em curvas e evita estratagemas. E o aforista Machado puxa a orelha dos "espertocratas", aqueles que bagunçam ao escrever tal como falam, usando todos os feitios e formas. E arremata de maneira cortante: "A primeira condição de quem escreve é não aborrecer". Aborrecimento é o que não falta quando vemos "sábios pareceristas", contratados pelo MEC, exibindo o argumento: seja na forma "nós pega o peixe" ou "nós pegamos o peixe", o pescado estará na rede. Se assim é, ambas estão corretas. Para dar mais voltas no quarteirão da polêmica, a pasta da Educação alega que não é o Ministério da Verdade. Donde se conclui que um doidivanas qualquer, desses que se encontram no feirão das ofertas gramaticais estapafúrdias, pode vir a propor um texto sobre a História do Brasil sem nexo, com figurantes trocados e português estropiado. Basta receber o imprimatur de outra figura extravagante que seja docente de Português para ser adotado nas escolas. Com esse arranjo, o pacote educacional tem condições de receber o endosso da instância mais alta da educação no País para circular nas salas de aula. Esse é o caminho percorrido pelo acervo didático que faz a cabeça da estudantada.
Analisemos as questões suscitadas pela obra Por uma Vida Melhor, a começar pela indagação filosófica que se pinça do título da série. Terá uma vida melhor o estudante que se obriga a aprender numa gramática alternativa, onde a "norma popular" se imbrica à norma culta? Ou, para usar a expressão da professora Heloisa Ramos, autora do livro, sofrem os alunos que escrevem errado "preconceito linguístico"? Primeiro, é oportuno lembrar que, mesmo concordando que a língua é um organismo vivo, evolutivo, não se pode confundir uma coisa com a outra, a forma oral e a norma escrita. Cada compartimento deve ser posto em seu devido lugar. Quem troca uma pela outra ou as junta na mesma gaveta gramatical o faz por alguma intenção, algo que ultrapassa as fronteiras linguísticas. E é nesse campo que surgem os atores, aqui cognominados de doidivanas. Mais parece um grupo que considera a língua instrumento para administrar preconceitos, elevar a cidadania e o estado de espírito dos menos instruídos. Como se pode aduzir, embute-se na questão um viés ideológico, coisa que se vem desenvolvendo no País na esteira de um populismo embalado com o celofane da demagogia.
Ora, os desprotegidos, os semianalfabetos, os analfabetos funcionais, enfim, as massas ignaras não serão elevadas aos andares mais altos da pirâmide se lhes for dada apenas a escada do pseudonivelamento das regras do idioma. Esta é, seguramente, um meio de ascensão social. Mas seus usuários precisam entender que a chave do elevador está guardada nos cofres normativos. Igualmente, as vestimentas, os modos e costumes, a teia de amigos, as referências profissionais são motores dessa escalada. Por que, então, os doidivanas da cultura e da educação investem com tanta força para elevar a linguagem popular ao patamar da norma culta? Não entendem que são objetos diferentes? Por que tanto esforço para defender uma feição que valida erros grosseiros? Não há outra resposta: ideologização. Imaginam o uso da língua como arma revolucionária. O sentimento que inspira os cultores da ignorância só pode ser o de que para melhorar a autoestima e ter uma vida melhor a população menos alfabetizada pode escrever como fala. Como se a gramática normativa devesse ser arquivada para dar lugar à gramática descritiva. Sob essa abordagem, sorver a sopa fazendo barulho, à moda dos nossos bisavós, também poderia ser recomendável...
As concessões demagógicas que se fazem em nome de uma "educação democrática" apenas reforçam a estrutura do atraso que abriga o ensino público básico do País, responsável pelo analfabetismo funcional que atinge um terço da população. Avolumam-se os contingentes de jovens de 9 a 14 anos que, além de não saberem interpretar um texto, se restringem ao exercício de copiar palavras sem entender o seu significado. Os copistas constituem os batalhões avançados da "revolução" empreendida pela educação brasileira. Pior é constatar que os "revolucionários" creem firmemente que a escalada social deve continuar a ser puxada pela carroça do século 17, fechando os olhos à "mobralização" da universidade. E assim, passada a primeira década do século 21, no auge das mudanças tecnológicas que cercam a Era da Informação, emerge um processo de embrutecimento do tecido social. Alicerçado pela argamassa de escândalos, desprezo às leis, violência desmesurada, promessas não cumpridas.
O grande Rui bem que profetizara: "A degeneração de um povo, de uma nação ou raça começa pelo desvirtuamento da própria língua".
GAUDÊNCIA TORQUATO, JORNALISTA, PROFESSOR TITULAR DA USP E CONSULTOR POLÍTICO E DE COMUNICAÇÃO. O Estado de S.Paulo - 22/05/2011
Para o grande Rui, a letra da gramática não entra em curvas e evita estratagemas. E o aforista Machado puxa a orelha dos "espertocratas", aqueles que bagunçam ao escrever tal como falam, usando todos os feitios e formas. E arremata de maneira cortante: "A primeira condição de quem escreve é não aborrecer". Aborrecimento é o que não falta quando vemos "sábios pareceristas", contratados pelo MEC, exibindo o argumento: seja na forma "nós pega o peixe" ou "nós pegamos o peixe", o pescado estará na rede. Se assim é, ambas estão corretas. Para dar mais voltas no quarteirão da polêmica, a pasta da Educação alega que não é o Ministério da Verdade. Donde se conclui que um doidivanas qualquer, desses que se encontram no feirão das ofertas gramaticais estapafúrdias, pode vir a propor um texto sobre a História do Brasil sem nexo, com figurantes trocados e português estropiado. Basta receber o imprimatur de outra figura extravagante que seja docente de Português para ser adotado nas escolas. Com esse arranjo, o pacote educacional tem condições de receber o endosso da instância mais alta da educação no País para circular nas salas de aula. Esse é o caminho percorrido pelo acervo didático que faz a cabeça da estudantada.
Analisemos as questões suscitadas pela obra Por uma Vida Melhor, a começar pela indagação filosófica que se pinça do título da série. Terá uma vida melhor o estudante que se obriga a aprender numa gramática alternativa, onde a "norma popular" se imbrica à norma culta? Ou, para usar a expressão da professora Heloisa Ramos, autora do livro, sofrem os alunos que escrevem errado "preconceito linguístico"? Primeiro, é oportuno lembrar que, mesmo concordando que a língua é um organismo vivo, evolutivo, não se pode confundir uma coisa com a outra, a forma oral e a norma escrita. Cada compartimento deve ser posto em seu devido lugar. Quem troca uma pela outra ou as junta na mesma gaveta gramatical o faz por alguma intenção, algo que ultrapassa as fronteiras linguísticas. E é nesse campo que surgem os atores, aqui cognominados de doidivanas. Mais parece um grupo que considera a língua instrumento para administrar preconceitos, elevar a cidadania e o estado de espírito dos menos instruídos. Como se pode aduzir, embute-se na questão um viés ideológico, coisa que se vem desenvolvendo no País na esteira de um populismo embalado com o celofane da demagogia.
Ora, os desprotegidos, os semianalfabetos, os analfabetos funcionais, enfim, as massas ignaras não serão elevadas aos andares mais altos da pirâmide se lhes for dada apenas a escada do pseudonivelamento das regras do idioma. Esta é, seguramente, um meio de ascensão social. Mas seus usuários precisam entender que a chave do elevador está guardada nos cofres normativos. Igualmente, as vestimentas, os modos e costumes, a teia de amigos, as referências profissionais são motores dessa escalada. Por que, então, os doidivanas da cultura e da educação investem com tanta força para elevar a linguagem popular ao patamar da norma culta? Não entendem que são objetos diferentes? Por que tanto esforço para defender uma feição que valida erros grosseiros? Não há outra resposta: ideologização. Imaginam o uso da língua como arma revolucionária. O sentimento que inspira os cultores da ignorância só pode ser o de que para melhorar a autoestima e ter uma vida melhor a população menos alfabetizada pode escrever como fala. Como se a gramática normativa devesse ser arquivada para dar lugar à gramática descritiva. Sob essa abordagem, sorver a sopa fazendo barulho, à moda dos nossos bisavós, também poderia ser recomendável...
As concessões demagógicas que se fazem em nome de uma "educação democrática" apenas reforçam a estrutura do atraso que abriga o ensino público básico do País, responsável pelo analfabetismo funcional que atinge um terço da população. Avolumam-se os contingentes de jovens de 9 a 14 anos que, além de não saberem interpretar um texto, se restringem ao exercício de copiar palavras sem entender o seu significado. Os copistas constituem os batalhões avançados da "revolução" empreendida pela educação brasileira. Pior é constatar que os "revolucionários" creem firmemente que a escalada social deve continuar a ser puxada pela carroça do século 17, fechando os olhos à "mobralização" da universidade. E assim, passada a primeira década do século 21, no auge das mudanças tecnológicas que cercam a Era da Informação, emerge um processo de embrutecimento do tecido social. Alicerçado pela argamassa de escândalos, desprezo às leis, violência desmesurada, promessas não cumpridas.
O grande Rui bem que profetizara: "A degeneração de um povo, de uma nação ou raça começa pelo desvirtuamento da própria língua".
GAUDÊNCIA TORQUATO, JORNALISTA, PROFESSOR TITULAR DA USP E CONSULTOR POLÍTICO E DE COMUNICAÇÃO. O Estado de S.Paulo - 22/05/2011
EDUCAÇÃO EM MARCHA À RÉ
- OPINIÃO, O Estado de S.Paulo - 22/05/2011
Além do atraso com que foi enviado ao Congresso, o Plano Nacional de Educação (PNE) para 2011-2020 não deverá ser aprovado tão cedo. Ele está em fase de audiências públicas e, em seguida, será examinado por uma comissão de especialistas escolhidos no mês passado.
As mais importantes das 20 metas do PNE propõem para os próximos dez anos a criação de 4,3 milhões de vagas em creches e pré-escolas, a erradicação do analfabetismo, a redução em 50% do analfabetismo funcional, a adoção do ensino em tempo integral em 50% das escolas públicas, o aumento em 33% do número de vagas no ensino superior e a equiparação do salário médio dos professores das escolas públicas com formação superior ao rendimento de profissionais de outros setores com escolaridade equivalente - o que implicará um aumento de 60% a 1,9 milhão de professores.
As metas são ambiciosas e os especialistas em educação e finanças discutem se a União, os Estados e os municípios terão recursos suficientes para atingi-las. Pelos cálculos do Ministério da Educação, a implantação do PNE deverá custar cerca de R$ 61 bilhões aos cofres públicos. Já os especialistas em investimentos educacionais falam em R$ 80 bilhões. O projeto determina que os governos federal, estaduais e municipais ampliem progressivamente o investimento público em educação até atingir 7% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2020. Esse porcentual estava previsto no PNE válido para o período 2001-2010, mas, segundo as entidades do setor educacional, a meta não foi cumprida. Atualmente, o País investe 5% do PIB em educação.
Os especialistas afirmam que, a exemplo do que ocorreu com o último Plano, o novo PNE não define com clareza a responsabilidade financeira de cada ente da Federação. Também não fecha as brechas que permitem aos Estados e municípios contabilizar na conta da educação itens que nada têm a ver com atividade de ensino.
Havendo poucos pontos objetivos a debater, as discussões em torno do PNE acabam sendo extravagantes. Entidades ligadas à educação, por exemplo, estão propondo que o investimento público no setor atinja no mínimo 10% do PIB no final da década - o que é irrealista. Em nome da "valorização do magistério público", sindicatos e associações corporativas pleiteiam que os salários dos professores do ensino básico sejam equiparados aos vencimentos dos professores do ensino superior. E, a título de subsidiar os debates, o Ministério da Educação acaba de enviar para a Câmara dos Deputados dois documentos - nenhum dos quais esclarece quais serão as fontes de recursos para o setor educacional nos próximos dez anos.
Em entrevista ao jornal Valor, o ministro Fernando Haddad acrescentou pouco ao óbvio, dizendo que o dinheiro dependerá do crescimento da economia e do aumento da arrecadação da União, dos Estados e dos municípios. Já os especialistas em educação e orçamento alegam que os dois documentos do MEC tornaram o debate ainda mais confuso, uma vez que trazem dados que não constam da versão original do PNE. Além disso, consultores da União Nacional dos Secretários Municipais da Educação questionam o valor escolhido pelo MEC para calcular a ampliação da oferta de vagas no ensino básico nos próximos dez anos. Segundo eles, as autoridades educacionais subestimaram o gasto efetivo por aluno na educação infantil e na educação de jovens e adultos, o que afetou a estimativa dos recursos que serão necessários com a inclusão de novos alunos.
A tramitação do PNE é mais uma evidência da incapacidade das autoridades educacionais de promover a melhora no ensino. Há um ano, o Conselho Nacional de Educação aprovou parecer detalhando o que considera ser indispensável para melhorar a qualidade do ensino. O documento define número médio de alunos por turma, piso salarial do magistério e quantidade de livros, dicionários, equipamentos eletrônicos e cadeiras por escola. Até hoje, porém, o MEC não decidiu se homologa ou rejeita a proposta. Simplesmente, não sabe o que fazer.
Além do atraso com que foi enviado ao Congresso, o Plano Nacional de Educação (PNE) para 2011-2020 não deverá ser aprovado tão cedo. Ele está em fase de audiências públicas e, em seguida, será examinado por uma comissão de especialistas escolhidos no mês passado.
As mais importantes das 20 metas do PNE propõem para os próximos dez anos a criação de 4,3 milhões de vagas em creches e pré-escolas, a erradicação do analfabetismo, a redução em 50% do analfabetismo funcional, a adoção do ensino em tempo integral em 50% das escolas públicas, o aumento em 33% do número de vagas no ensino superior e a equiparação do salário médio dos professores das escolas públicas com formação superior ao rendimento de profissionais de outros setores com escolaridade equivalente - o que implicará um aumento de 60% a 1,9 milhão de professores.
As metas são ambiciosas e os especialistas em educação e finanças discutem se a União, os Estados e os municípios terão recursos suficientes para atingi-las. Pelos cálculos do Ministério da Educação, a implantação do PNE deverá custar cerca de R$ 61 bilhões aos cofres públicos. Já os especialistas em investimentos educacionais falam em R$ 80 bilhões. O projeto determina que os governos federal, estaduais e municipais ampliem progressivamente o investimento público em educação até atingir 7% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2020. Esse porcentual estava previsto no PNE válido para o período 2001-2010, mas, segundo as entidades do setor educacional, a meta não foi cumprida. Atualmente, o País investe 5% do PIB em educação.
Os especialistas afirmam que, a exemplo do que ocorreu com o último Plano, o novo PNE não define com clareza a responsabilidade financeira de cada ente da Federação. Também não fecha as brechas que permitem aos Estados e municípios contabilizar na conta da educação itens que nada têm a ver com atividade de ensino.
Havendo poucos pontos objetivos a debater, as discussões em torno do PNE acabam sendo extravagantes. Entidades ligadas à educação, por exemplo, estão propondo que o investimento público no setor atinja no mínimo 10% do PIB no final da década - o que é irrealista. Em nome da "valorização do magistério público", sindicatos e associações corporativas pleiteiam que os salários dos professores do ensino básico sejam equiparados aos vencimentos dos professores do ensino superior. E, a título de subsidiar os debates, o Ministério da Educação acaba de enviar para a Câmara dos Deputados dois documentos - nenhum dos quais esclarece quais serão as fontes de recursos para o setor educacional nos próximos dez anos.
Em entrevista ao jornal Valor, o ministro Fernando Haddad acrescentou pouco ao óbvio, dizendo que o dinheiro dependerá do crescimento da economia e do aumento da arrecadação da União, dos Estados e dos municípios. Já os especialistas em educação e orçamento alegam que os dois documentos do MEC tornaram o debate ainda mais confuso, uma vez que trazem dados que não constam da versão original do PNE. Além disso, consultores da União Nacional dos Secretários Municipais da Educação questionam o valor escolhido pelo MEC para calcular a ampliação da oferta de vagas no ensino básico nos próximos dez anos. Segundo eles, as autoridades educacionais subestimaram o gasto efetivo por aluno na educação infantil e na educação de jovens e adultos, o que afetou a estimativa dos recursos que serão necessários com a inclusão de novos alunos.
A tramitação do PNE é mais uma evidência da incapacidade das autoridades educacionais de promover a melhora no ensino. Há um ano, o Conselho Nacional de Educação aprovou parecer detalhando o que considera ser indispensável para melhorar a qualidade do ensino. O documento define número médio de alunos por turma, piso salarial do magistério e quantidade de livros, dicionários, equipamentos eletrônicos e cadeiras por escola. Até hoje, porém, o MEC não decidiu se homologa ou rejeita a proposta. Simplesmente, não sabe o que fazer.
domingo, 22 de maio de 2011
EM CASA DE FERREIRO...
Algumas ideias, quando revivem, ressuscitam com força superior à original. Por exemplo: “O Brasil não é um país sério”. Atribuída ao general De Gaulle nos anos 1960 (na “guerra da lagosta” com a França), a frase reaparece agora como moldura de uma tola e absurda polêmica – o tal livro didático do Ministério da Educação que aceita e convalida dizer e escrever “nós pega o peixe” e “as criança não pesca peixe”, ou tudo o mais que siga esse ritmo.
Em nome da “dinâmica do idioma” e da “desenvoltura da linguagem”, a autora do livro e seus padrinhos na cúpula ministerial tacham de “preconceito linguístico” usar o verbo no plural, como se faz desde os anos 1500, quando “os clássicos” deram forma ao idioma.
Esse murro na concordância verbal e na sintaxe mostra a visão atual da educação e o sentido que se dá ao ensino. Não se trata de um achado pedagógico que dê dignidade aos iletrados como pessoas. Ao contrário, é um achincalhe que lhes nega o acesso à construção e tessitura do idioma.
Por acaso, educar e ensinar não é propiciar, a quem não sabe, os meios e as condições para vir a saber? Se assim não for, fechem-se as escolas.
Poucas coisas são mais enfadonhas e perniciosas que a “gramatiquice”, a mania de alguns “gramáticos” de entenderem a linguagem como cadáver a dissecar, como se as regras surgissem antes do idioma e do modo de expressar-se. (De fato, as “regras” só interpretam o que “os clássicos” escreveram.) Mais terríveis, porém, são os novíssimos intérpretes do idioma, que pregam a anarquia e falam de “preconceito linguístico”, confundindo alhos com bugalhos. Preconceituoso é discriminar ou criticar alguém por dizer “nós gosta de ler livro”. Mas será preconceituoso sugerir que escreva “nós gostamos de ler livros”??
Quando se perdem os pontos cardeais da linguagem, não se perde só o idioma. Extraviam-se a identidade e a identificação em si de cada um de nós.
Ironia maior nisto tudo é o título do tal livro didático, Por uma Vida Melhor, da coleção Viver e Aprender. Já pensaram se o Ministério da Educação mandasse escrever e publicar os livros universitários? Os estudantes de Medicina correriam o risco de aprender que, em ferimento com sangue, o emplastro quente de bosta seca de vaca é o tratamento adequado, como nas estâncias, antigamente.
O livreco ignora tanto do idioma, que confunde prosódia com formas de escrever. Por sorte, ignorou o linguajar gaúcho, que come o “s” do plural e é comum ouvir: “Os boi estão na frente dos carro”. Pronuncia-se levemente a sílaba átona, com o “s” inaudível. Mas isto é prosódia, forma de pronunciar, não concordância verbal.
(Escrevi “sílaba átona”, não “átoma”, que os autores do MEC podem tomar como feminino de “átomo” e crer que falo de Fukushima, onde o perigo é maior, pois contaminou todo os peixe e não sobrou nem uns. Que tal? Já posso escrever livro didático?)
O pedantismo sabichão, para destacar-se, abusa do exótico e inusitado. “Não somos o Ministério da Verdade”, exclamou aos jornais um assessor do ministro, falando em seu nome.
O ministro Fernando Haddad é educado e gentil. Anos atrás, comparei-o ao Dunga (correto mas inexperiente como treinador da Seleção) e ele me telefonou e se dispôs a dialogar. Mas continua noviço e tudo lhe soa como novidade. E, já que “haddad” significa “ferreiro” em árabe, nada melhor do que aplicar o velho adágio popular: em casa de ferreiro, espeto de pau.
FLAVIO TAVARES, JORNALISTA E ESCRITOR - ZERO HORA 22/05/2011
A EDUCAÇÃO É UM ESFORÇO COLETIVO
Entrevista - “A educação é um esforço coletivo” - Gustavo Ioschpe, especialista em educação - ÂNGELA RAVAZZOLO | EDITORA DE EDUCAÇÃO - zero hora 22/05/2011
O especialista em educação Gustavo Ioschpe atravessou o Brasil na última semana para conhecer e analisar bons e maus exemplos da educação brasileira. Ao lado do repórter André Luiz Azevedo, da Rede Globo, Ioschpe participou do projeto JN no Ar, Blitz da Educação.
As reportagens, veiculadas diariamente no Jornal Nacional, apresentaram escolas públicas com os melhores e os piores desempenhos no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de cinco cidades do país. A blitz começou no dia 16 de maio, em Novo Hamburgo, e seguiu para municípios das outras quatro regiões do país, terminando em Belém do Pará, na sexta-feira.
Confira abaixo as impressões de Ioschpe sobre as visitas e sobre a educação no país.
Zero Hora – Ao longo desta semana, o JN no Ar acompanhou uma série de bons e de maus exemplos em escolas das cinco regiões do país. Como explicar diferenças significativas de desempenho entre instituições de uma mesma cidade?
Gustavo Ioschpe – Tem muitos fatores, e em cada cidade são fatores diferentes, mas algumas coisas transparecem: comprometimento das escolas vitoriosas com o aprendizado dos alunos, utilização eficiente do tempo em sala de aula e do material didático, ter professores com boa formação, passar dever de casa e corrigir, fazer avaliação, monitorar, fazer um esforço para envolver a comunidade de pais.
Zero Hora – Nas reportagens, é possível notar que há iniciativas individuais importantes por trás dos bons exemplos.
Ioschpe – Com exceção da escola de Goiânia, que tem uma diretora muito batalhadora, não diria que é uma dependência de esforços individuais, é um esforço coletivo, a educação é um esforço intrinsecamente coletivo. Não é apenas um bom diretor, é preciso ter uma secretaria de Educação que faça a sua parte, professores e orientação pedagógica que façam também a sua parte. As escolas que dão certo são como uma orquestra que toca harmoniosamente. Mesmo que se tenha um grande maestro na orquestra, se os músicos forem ruins, não vai sair nada. As escolas que funcionam bem são aquelas em que cada um faz a sua parte, e faz bem. Uma das coisas que essa série de matérias comprovou é de que não há nada de excepcional que se precise fazer para se ter uma escola que funcione dentro de padrões normais. Não precisa de herói, de mártir, precisa que as pessoas sejam preparadas para exercer aquela função. E elas cumpram a função com comprometimento e vontade. Sempre que se vê casos muito ruins, tem alguma coisa estapafúrdia acontecendo.
Zero Hora – Muitas vezes, as escolas pertencem à mesma rede pública, na mesma cidade, e apresentam desempenho tão diferente. Por que não há um sistema que consiga identificar o problema e atuar de forma que a escola ruim fique como a outra, o bom exemplo?
Ioschpe – Porque não tem demanda. Não tem pressão. Quem sofre quando uma escola vai mal? O prefeito perde votos? Não. O secretário de Educação perde o cargo? Não. O diretor perde o cargo ou o salário? Não. O professor é punido, repreendido? Não. Só quem sofre são os alunos e os pais. E os pais estão felizes, estão dando graças a Deus que o filho tem acesso à escola, a maioria não sabe o que é Ideb, não sabe avaliar a qualidade da educação do filho.
Zero Hora – Existe alguma qualidade comum entre os professores que se mostraram entusiasmados e bastante envolvidos com o bom desempenho dos alunos e da escola?
Ioschpe – A primeira qualidade é o comprometimento, que infelizmente deveria ser uma condição sine qua non, mas é uma qualidade. Em segundo, eles tendem a ser professores bem-formados, sabem o que estão fazendo, dominam o conteúdo. E são professores que têm uma didática envolvente. Mas o primeiro passo é um comprometimento, um sentimento de responsabilidade, de se sentir responsável. O que a gente vê nos professores das escolas que dão errado é que eles terceirizam o problema. A tarefa da sociedade brasileira é fazer com que essas escolas assumam a responsabilidade.
Zero Hora – Em várias escolas, apareceram estudantes dispersos e indisciplinados. Há solução? Muitos já jogaram a toalha, inclusive colégios privados.
Ioschpe – A indisciplina vem depois de a escola jogar a toalha. É uma consequência e não uma causa.
Zero Hora – Nessa sua experiência in loco nas escolas, o que mais lhe assustou?
Ioschpe – É uma realidade que eu já conhecia. O mais forte, para mim, é um sentimento de muita indignação, de muita raiva, de ver quantas crianças têm tido seu potencial desperdiçado. Algumas coisas poderão ser recuperadas, mas muitas vão ser danificadas para sempre. Talvez tenham crianças com talento para ser um novo Moacyr Scliar, Guimarães Rosa, Eike Batista ou Adib Jatene, e elas não vão conseguir realizar esse potencial porque não receberam uma instrumentalização básica.
Zero Hora – Qual é hoje o maior desafio da educação brasileira?
Ioschpe – Antes de poder haver qualquer superação dos desafios educacionais, o grande desafio é fazer com que a sociedade entenda a dimensão do problema, se envolva e cobre a solução. Se a educação for deixada unicamente para os educadores, eles criaram tal carapaça, tal mecanismo de defesa, as coisas não vão mudar. A sociedade precisa entrar nesse jogo.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Esta afirmação do Ioschpe de que "a indisciplina vem depois de a escola jogar a toalha" está incompleta. A escola só jogou diante dos maus exemplos e omissões dos governantes, da falta de investimento público na educação, da impunidade que impede a punição e correção de posturas, da depreciação salarial dos educadores e da falência do poder de autoridade de pais e diretores.
O especialista em educação Gustavo Ioschpe atravessou o Brasil na última semana para conhecer e analisar bons e maus exemplos da educação brasileira. Ao lado do repórter André Luiz Azevedo, da Rede Globo, Ioschpe participou do projeto JN no Ar, Blitz da Educação.
As reportagens, veiculadas diariamente no Jornal Nacional, apresentaram escolas públicas com os melhores e os piores desempenhos no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de cinco cidades do país. A blitz começou no dia 16 de maio, em Novo Hamburgo, e seguiu para municípios das outras quatro regiões do país, terminando em Belém do Pará, na sexta-feira.
Confira abaixo as impressões de Ioschpe sobre as visitas e sobre a educação no país.
Zero Hora – Ao longo desta semana, o JN no Ar acompanhou uma série de bons e de maus exemplos em escolas das cinco regiões do país. Como explicar diferenças significativas de desempenho entre instituições de uma mesma cidade?
Gustavo Ioschpe – Tem muitos fatores, e em cada cidade são fatores diferentes, mas algumas coisas transparecem: comprometimento das escolas vitoriosas com o aprendizado dos alunos, utilização eficiente do tempo em sala de aula e do material didático, ter professores com boa formação, passar dever de casa e corrigir, fazer avaliação, monitorar, fazer um esforço para envolver a comunidade de pais.
Zero Hora – Nas reportagens, é possível notar que há iniciativas individuais importantes por trás dos bons exemplos.
Ioschpe – Com exceção da escola de Goiânia, que tem uma diretora muito batalhadora, não diria que é uma dependência de esforços individuais, é um esforço coletivo, a educação é um esforço intrinsecamente coletivo. Não é apenas um bom diretor, é preciso ter uma secretaria de Educação que faça a sua parte, professores e orientação pedagógica que façam também a sua parte. As escolas que dão certo são como uma orquestra que toca harmoniosamente. Mesmo que se tenha um grande maestro na orquestra, se os músicos forem ruins, não vai sair nada. As escolas que funcionam bem são aquelas em que cada um faz a sua parte, e faz bem. Uma das coisas que essa série de matérias comprovou é de que não há nada de excepcional que se precise fazer para se ter uma escola que funcione dentro de padrões normais. Não precisa de herói, de mártir, precisa que as pessoas sejam preparadas para exercer aquela função. E elas cumpram a função com comprometimento e vontade. Sempre que se vê casos muito ruins, tem alguma coisa estapafúrdia acontecendo.
Zero Hora – Muitas vezes, as escolas pertencem à mesma rede pública, na mesma cidade, e apresentam desempenho tão diferente. Por que não há um sistema que consiga identificar o problema e atuar de forma que a escola ruim fique como a outra, o bom exemplo?
Ioschpe – Porque não tem demanda. Não tem pressão. Quem sofre quando uma escola vai mal? O prefeito perde votos? Não. O secretário de Educação perde o cargo? Não. O diretor perde o cargo ou o salário? Não. O professor é punido, repreendido? Não. Só quem sofre são os alunos e os pais. E os pais estão felizes, estão dando graças a Deus que o filho tem acesso à escola, a maioria não sabe o que é Ideb, não sabe avaliar a qualidade da educação do filho.
Zero Hora – Existe alguma qualidade comum entre os professores que se mostraram entusiasmados e bastante envolvidos com o bom desempenho dos alunos e da escola?
Ioschpe – A primeira qualidade é o comprometimento, que infelizmente deveria ser uma condição sine qua non, mas é uma qualidade. Em segundo, eles tendem a ser professores bem-formados, sabem o que estão fazendo, dominam o conteúdo. E são professores que têm uma didática envolvente. Mas o primeiro passo é um comprometimento, um sentimento de responsabilidade, de se sentir responsável. O que a gente vê nos professores das escolas que dão errado é que eles terceirizam o problema. A tarefa da sociedade brasileira é fazer com que essas escolas assumam a responsabilidade.
Zero Hora – Em várias escolas, apareceram estudantes dispersos e indisciplinados. Há solução? Muitos já jogaram a toalha, inclusive colégios privados.
Ioschpe – A indisciplina vem depois de a escola jogar a toalha. É uma consequência e não uma causa.
Zero Hora – Nessa sua experiência in loco nas escolas, o que mais lhe assustou?
Ioschpe – É uma realidade que eu já conhecia. O mais forte, para mim, é um sentimento de muita indignação, de muita raiva, de ver quantas crianças têm tido seu potencial desperdiçado. Algumas coisas poderão ser recuperadas, mas muitas vão ser danificadas para sempre. Talvez tenham crianças com talento para ser um novo Moacyr Scliar, Guimarães Rosa, Eike Batista ou Adib Jatene, e elas não vão conseguir realizar esse potencial porque não receberam uma instrumentalização básica.
Zero Hora – Qual é hoje o maior desafio da educação brasileira?
Ioschpe – Antes de poder haver qualquer superação dos desafios educacionais, o grande desafio é fazer com que a sociedade entenda a dimensão do problema, se envolva e cobre a solução. Se a educação for deixada unicamente para os educadores, eles criaram tal carapaça, tal mecanismo de defesa, as coisas não vão mudar. A sociedade precisa entrar nesse jogo.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Esta afirmação do Ioschpe de que "a indisciplina vem depois de a escola jogar a toalha" está incompleta. A escola só jogou diante dos maus exemplos e omissões dos governantes, da falta de investimento público na educação, da impunidade que impede a punição e correção de posturas, da depreciação salarial dos educadores e da falência do poder de autoridade de pais e diretores.
sábado, 21 de maio de 2011
ARROMBAMENTOS EM SÉRIE DEIXAM COLÉGIO SEM LUZ E SEM AULAS
Colégio sem aulas após série de arrombamentos. No quinto ataque em 20 dias, ladrões cortaram fiação e levaram disjuntores - ZERO HORA 21/05/2011
Depois de cinco arrombamentos em 20 dias, a Escola Estadual Felipe de Oliveira, em Porto Alegre, teve as aulas suspensas ontem. Para piorar a situação, os cerca de 200 alunos da instituição não têm data definida para retornar às atividades no colégio do bairro Santa Cecília, que fica na mesma quadra do Ginásio da Brigada Militar, na Rua Felipe de Oliveira.
– Nossa escola está sofrendo. Neste último ataque, o dano foi maior, cortaram toda a fiação e levaram disjuntores do quadro de luz. Tive de suspender as aulas – declarou a diretora, Marilda Bastos.
A Polícia Civil interditou parte do pátio externo para a coleta de pistas que podem levar ao paradeiro dos ladrões. Na quarta-feira, a escola havia sofrido o último ataque.
– Sempre arrumamos tudo, mas então quebram tudo de novo. O dano é muito grande – lamentou a diretora.
Na tarde de ontem, a instituição ficou fechada. Cartazes na portaria informavam a pais e alunos o motivo do cancelamento das aulas. Conforme a diretora, em um dos ataques, os ladrões invadiram a sala de computadores e levaram cabos elétricos e monitores. No ataque mais recente, os criminosos tiveram acesso apenas à parte do pátio.
Conforme a Secretaria de Educação (SEC), um representante da Coordenadoria Regional da Secretaria de Obras, até segunda-feira, fará a análise da dimensão do estrago. Só depois disso a SEC divulgará as providências e a data da volta às aulas. A 1ª Coordenadoria Regional de Educação solicitou à Brigada Militar um reforço no patrulhamento da região.
– Estamos com duas equipes investigando o caso para tentarmos identificar os autores. Certamente são drogados, que andam pelas ruas pegando fios para vendê-los e comprar crack – informou o titular da 10ª Delegacia da Polícia Civil (bairro Bom Fim), delegado Abílio Pereira.
Depois de cinco arrombamentos em 20 dias, a Escola Estadual Felipe de Oliveira, em Porto Alegre, teve as aulas suspensas ontem. Para piorar a situação, os cerca de 200 alunos da instituição não têm data definida para retornar às atividades no colégio do bairro Santa Cecília, que fica na mesma quadra do Ginásio da Brigada Militar, na Rua Felipe de Oliveira.
– Nossa escola está sofrendo. Neste último ataque, o dano foi maior, cortaram toda a fiação e levaram disjuntores do quadro de luz. Tive de suspender as aulas – declarou a diretora, Marilda Bastos.
A Polícia Civil interditou parte do pátio externo para a coleta de pistas que podem levar ao paradeiro dos ladrões. Na quarta-feira, a escola havia sofrido o último ataque.
– Sempre arrumamos tudo, mas então quebram tudo de novo. O dano é muito grande – lamentou a diretora.
Na tarde de ontem, a instituição ficou fechada. Cartazes na portaria informavam a pais e alunos o motivo do cancelamento das aulas. Conforme a diretora, em um dos ataques, os ladrões invadiram a sala de computadores e levaram cabos elétricos e monitores. No ataque mais recente, os criminosos tiveram acesso apenas à parte do pátio.
Conforme a Secretaria de Educação (SEC), um representante da Coordenadoria Regional da Secretaria de Obras, até segunda-feira, fará a análise da dimensão do estrago. Só depois disso a SEC divulgará as providências e a data da volta às aulas. A 1ª Coordenadoria Regional de Educação solicitou à Brigada Militar um reforço no patrulhamento da região.
– Estamos com duas equipes investigando o caso para tentarmos identificar os autores. Certamente são drogados, que andam pelas ruas pegando fios para vendê-los e comprar crack – informou o titular da 10ª Delegacia da Polícia Civil (bairro Bom Fim), delegado Abílio Pereira.
AULA DE INDIGNAÇÃO
EDITORIAL ZERO HORA, 21/05/2011
Uma jovem professora potiguar transformou-se de um dia para o outro em símbolo da indignação dos docentes da rede pública no país, por conta de um pronunciamento contundente feito no dia 10 último, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte. Convidada para falar sobre a greve dos professores estaduais durante uma audiência do parlamento e na presença da secretária de Educação daquele Estado, a professora Amanda Gurgel de Freitas exibiu o seu contracheque de R$ 930 e afirmou que é impossível sobreviver com tão pouco. Disse, alto e bom som, que os educadores são submetidos a jornadas de trabalho extenuantes, não têm tempo nem recursos para se qualificar e ainda são responsabilizados pelos problemas da educação.
Seu grito de indignação ganhou amplitude na internet e nas redes sociais, ultrapassou as 500 mil visualizações no YouTube, entrou na lista dos trending topics do Twitter e escancarou uma mazela do ensino nacional: a desvalorização histórica e sistemática dos mestres, que inclusive afasta novos pretendentes à profissão.
Nada do que a professora Amanda disse é novidade – e isso talvez seja o elemento mais perturbador de seu pronunciamento. Ela apenas teve a coragem e a lucidez de expor com clareza, diante das autoridades de seu Estado, o drama vivido diariamente por profissionais que enfrentam dificuldades para exercer o seu ofício, são mal remunerados e acabam sendo responsabilizados pela precariedade do ensino público no país.
Infelizmente, por conta do descaso continuado dos governantes, o sistema de educação pública em nosso país entrou num círculo vicioso difícil de ser rompido. Estados e municípios pagam salários insuficientes, professores malpagos trabalham desmotivados, não conseguem se qualificar, utilizam subterfúgios para compensar o desapreço, tornam-se reféns de sindicatos e de interesses políticos e acabam aparecendo como vilões de um processo em que, inquestionavelmente, as vítimas maiores são os estudantes. Um ministro da Educação dos anos 90 resumiu ironicamente esta situação com uma frase que ficou célebre na época: “O aluno finge que estuda, o professor finge que ensina e nós fingimos que pagamos”. Mais de duas décadas depois, o grito indignado da professora potiguar comprova que nada mudou.
Na verdade, houve uma mudança: os indivíduos ganharam novos canais para se manifestar. Ao expor suas queixas e reivindicações para o auditório da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, a professora Amanda jamais imaginou que seu manifesto ganharia uma divulgação planetária e que sua fala com sotaque nordestino se transformaria em poucas horas no libelo de toda uma categoria profissional contra a negligência e a hipocrisia dos governantes.
Uma jovem professora potiguar transformou-se de um dia para o outro em símbolo da indignação dos docentes da rede pública no país, por conta de um pronunciamento contundente feito no dia 10 último, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte. Convidada para falar sobre a greve dos professores estaduais durante uma audiência do parlamento e na presença da secretária de Educação daquele Estado, a professora Amanda Gurgel de Freitas exibiu o seu contracheque de R$ 930 e afirmou que é impossível sobreviver com tão pouco. Disse, alto e bom som, que os educadores são submetidos a jornadas de trabalho extenuantes, não têm tempo nem recursos para se qualificar e ainda são responsabilizados pelos problemas da educação.
Seu grito de indignação ganhou amplitude na internet e nas redes sociais, ultrapassou as 500 mil visualizações no YouTube, entrou na lista dos trending topics do Twitter e escancarou uma mazela do ensino nacional: a desvalorização histórica e sistemática dos mestres, que inclusive afasta novos pretendentes à profissão.
Nada do que a professora Amanda disse é novidade – e isso talvez seja o elemento mais perturbador de seu pronunciamento. Ela apenas teve a coragem e a lucidez de expor com clareza, diante das autoridades de seu Estado, o drama vivido diariamente por profissionais que enfrentam dificuldades para exercer o seu ofício, são mal remunerados e acabam sendo responsabilizados pela precariedade do ensino público no país.
Infelizmente, por conta do descaso continuado dos governantes, o sistema de educação pública em nosso país entrou num círculo vicioso difícil de ser rompido. Estados e municípios pagam salários insuficientes, professores malpagos trabalham desmotivados, não conseguem se qualificar, utilizam subterfúgios para compensar o desapreço, tornam-se reféns de sindicatos e de interesses políticos e acabam aparecendo como vilões de um processo em que, inquestionavelmente, as vítimas maiores são os estudantes. Um ministro da Educação dos anos 90 resumiu ironicamente esta situação com uma frase que ficou célebre na época: “O aluno finge que estuda, o professor finge que ensina e nós fingimos que pagamos”. Mais de duas décadas depois, o grito indignado da professora potiguar comprova que nada mudou.
Na verdade, houve uma mudança: os indivíduos ganharam novos canais para se manifestar. Ao expor suas queixas e reivindicações para o auditório da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, a professora Amanda jamais imaginou que seu manifesto ganharia uma divulgação planetária e que sua fala com sotaque nordestino se transformaria em poucas horas no libelo de toda uma categoria profissional contra a negligência e a hipocrisia dos governantes.
O LIVRO DOS ERROS
Uma das coisas mais aberrantes com que nos defrontamos neste momento é a utilização de livros destinados à educação com erros crassos da língua portuguesa, ou melhor dizendo, a deseducação institucionalizada. E o MEC serve para quê? Não é sua obrigação defender o nosso idioma como dispõe o artigo 13 da nossa Constituição?
É sabido que a educação se dá através da consolidação do conhecimento. É, portanto, dever da escola ensinar certo, corrigindo quem fala errado, não por discriminação, mas justamente para auxiliar os estudantes no domínio da sua língua materna que os auxiliará no processo de mobilidade social.
A tentativa de alguns ditos especialistas em linguística de flexibilizar as regras da escrita é um tremendo equívoco. “Os pé”, “menas”, “nós fumo”, e tantas expressões oriundas de um aprendizado deficiente em famílias iletradas devem, na escola, ser corrigidas. Assim a instituição estará cumprindo sua função de preparar os estudantes para competir, em igualdade de condições, com aqueles de famílias mais cultas. Não é possível, de forma paternalista, sonegar-lhes o direito de aprender, deixando “passar” os erros cometidos. Até porque o alunato, em qualquer nível, tem aspirações e quer melhorar sua condição de vida. Assim, muitos, mesmo com sacrifício, trabalham de dia e frequentam a escola noturna.
Ademais, há um aspecto que não pode ser desconsiderado. Em qualquer concurso, a exigência em relação ao conhecimento da língua portuguesa costuma ser rigorosa e até mesmo eliminatória. Como alguém oriundo de um ensino deficiente desde as séries iniciais poderá ter êxito em suas pretensões? Nesse caso constata-se a verdadeira discriminação: a que limita de antemão a ascensão dos mais pobres transformando seus sonhos em mera ilusão.
*LÍCIA PERES, SOCIÓLOGA - ZERO HORA 21/05/2011
É sabido que a educação se dá através da consolidação do conhecimento. É, portanto, dever da escola ensinar certo, corrigindo quem fala errado, não por discriminação, mas justamente para auxiliar os estudantes no domínio da sua língua materna que os auxiliará no processo de mobilidade social.
A tentativa de alguns ditos especialistas em linguística de flexibilizar as regras da escrita é um tremendo equívoco. “Os pé”, “menas”, “nós fumo”, e tantas expressões oriundas de um aprendizado deficiente em famílias iletradas devem, na escola, ser corrigidas. Assim a instituição estará cumprindo sua função de preparar os estudantes para competir, em igualdade de condições, com aqueles de famílias mais cultas. Não é possível, de forma paternalista, sonegar-lhes o direito de aprender, deixando “passar” os erros cometidos. Até porque o alunato, em qualquer nível, tem aspirações e quer melhorar sua condição de vida. Assim, muitos, mesmo com sacrifício, trabalham de dia e frequentam a escola noturna.
Ademais, há um aspecto que não pode ser desconsiderado. Em qualquer concurso, a exigência em relação ao conhecimento da língua portuguesa costuma ser rigorosa e até mesmo eliminatória. Como alguém oriundo de um ensino deficiente desde as séries iniciais poderá ter êxito em suas pretensões? Nesse caso constata-se a verdadeira discriminação: a que limita de antemão a ascensão dos mais pobres transformando seus sonhos em mera ilusão.
*LÍCIA PERES, SOCIÓLOGA - ZERO HORA 21/05/2011
sexta-feira, 20 de maio de 2011
RETALIAÇÃO DO TRÁFICO MATA UM ESTUDANTE E FERE DOIS
Um estudante é morto e dois baleados quando voltavam da escola em BH - Estado de Minas - 20/05/2011
Três estudantes foram baleados sendo que um morreu no hospital, na noite dessa quinta-feira, no Bairro Conjunto Olímpia Bueno Franco, em Betim na Região Metropolitana de Belo Horizonte. De acordo com militares do 33º Batalhão da Polícia Militar, Luiz Gustavo Nascimento de Souza, de 18 anos, Wilgner Gustavo Aparecido Sobrinho, de 18 e uma adolescente de 17, voltavam da aula quando foram atingidos pelos disparos.
Luiz Gustavo foi alvejado por dois tiros, um no rosto e outro no tórax. Ele chegou a ser socorrido para o Hospital Regional de Betim, mas não resistiu aos ferimentos e morreu. Wilgner foi atingido na perna e na mão e está internado no mesmo hospital. Já a menina, com um ferimento na perna foi atendida na Unidade de Atendimento Integrado (UAI) Sete de Setembro.
Durante um rastreamento na região, os policiais localizou o suspeito do crime, um adolescente de 16 anos. Ele foi detido e confessou a autoria alegando que a motivação seria porque os jovens estavam atrapalhando o tráfico de drogas. A arma do crime não foi encontrada.
Três estudantes foram baleados sendo que um morreu no hospital, na noite dessa quinta-feira, no Bairro Conjunto Olímpia Bueno Franco, em Betim na Região Metropolitana de Belo Horizonte. De acordo com militares do 33º Batalhão da Polícia Militar, Luiz Gustavo Nascimento de Souza, de 18 anos, Wilgner Gustavo Aparecido Sobrinho, de 18 e uma adolescente de 17, voltavam da aula quando foram atingidos pelos disparos.
Luiz Gustavo foi alvejado por dois tiros, um no rosto e outro no tórax. Ele chegou a ser socorrido para o Hospital Regional de Betim, mas não resistiu aos ferimentos e morreu. Wilgner foi atingido na perna e na mão e está internado no mesmo hospital. Já a menina, com um ferimento na perna foi atendida na Unidade de Atendimento Integrado (UAI) Sete de Setembro.
Durante um rastreamento na região, os policiais localizou o suspeito do crime, um adolescente de 16 anos. Ele foi detido e confessou a autoria alegando que a motivação seria porque os jovens estavam atrapalhando o tráfico de drogas. A arma do crime não foi encontrada.
GIRUÁ/RS DÁ EXEMPLO EM EDUCAÇÃO
Giruá dá exemplo em educação. Investimentos em reformas, aquisição de materiais e, principalmente, nos professores transformaram o ensino do município - KAMILA ALMEIDA | GIRUÁ, ZERO HORA 20/05/2011
Os professores de Giruá têm brilho no olhar, mas não foi sempre assim. O levante em direção a uma educação de qualidade começou em 2009. De lá para cá, foram investidos R$ 26.737.862,00 na causa. Contudo, a compra de novos materiais e as reformas nas instituições foram o básico.
Oingrediente diferente que se vê nesse município da Região das Missões é a gana por tratar bem o professor. Em Giruá, acredita-se que mestre motivado, e com um tempo para refletir seus métodos, distribui dividendos à comunidade escolar. O passo mais recente dentro da transformação ocorreu na noite de ontem, com a assinatura do projeto escola modelo em parceria com o Ministério da Educação (MEC), durante o 18º Seminário de Educação do município. A obra deve começar na segunda-feira.
Meridiana Lauer, 34 anos, leciona na rede pública de Giruá desde 1997 e acompanhou todos os anos do evento. Mas foi quando atrações nacionais e internacionais começaram a ser convidadas que a motivação triplicou.
– Somos estimulados a oferecer projetos interessantes e muito do que aplicamos poderia servir de exemplo a outras instituições – conta.
Investir é a palavra chave. Mas nem sempre há dinheiro disponível. Por isso, duas iniciativas são rotina: um servidor do município passa dias atualizando o sistema do MEC em busca de projetos oferecidos, e em nenhuma ideia é descartada.
– Se vemos que há uma ideia boa não é porque ela vai ser muito cara que vamos desistir. Pensamos em uma maneira de torná-la possível, nem que tenha de ser adaptada – afirma a supervisora educacional Ana Cristina Czegelski Duarte, integrante do setor pedagógico da Secretaria de Educação e Cultura de Giruá.
Outro foco, é o atendimento especializado a diretores escolares. Todos os meses eles têm encontro com um professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) para um curso de gestão. Giruá foi contemplada pelo Plano de Ações Articuladas do MEC e conseguiu transformar a cidade em um polo que sedia os encontros e recebe profissionais de cidades maiores, como Santa Rosa e Santo Ângelo.
– Queremos que nossos diretores estejam cientes da sua função e de onde podem chegar com esse conhecimento – diz a secretária de Educação Fátima Ehlert.
Os professores de Giruá têm brilho no olhar, mas não foi sempre assim. O levante em direção a uma educação de qualidade começou em 2009. De lá para cá, foram investidos R$ 26.737.862,00 na causa. Contudo, a compra de novos materiais e as reformas nas instituições foram o básico.
Oingrediente diferente que se vê nesse município da Região das Missões é a gana por tratar bem o professor. Em Giruá, acredita-se que mestre motivado, e com um tempo para refletir seus métodos, distribui dividendos à comunidade escolar. O passo mais recente dentro da transformação ocorreu na noite de ontem, com a assinatura do projeto escola modelo em parceria com o Ministério da Educação (MEC), durante o 18º Seminário de Educação do município. A obra deve começar na segunda-feira.
Meridiana Lauer, 34 anos, leciona na rede pública de Giruá desde 1997 e acompanhou todos os anos do evento. Mas foi quando atrações nacionais e internacionais começaram a ser convidadas que a motivação triplicou.
– Somos estimulados a oferecer projetos interessantes e muito do que aplicamos poderia servir de exemplo a outras instituições – conta.
Investir é a palavra chave. Mas nem sempre há dinheiro disponível. Por isso, duas iniciativas são rotina: um servidor do município passa dias atualizando o sistema do MEC em busca de projetos oferecidos, e em nenhuma ideia é descartada.
– Se vemos que há uma ideia boa não é porque ela vai ser muito cara que vamos desistir. Pensamos em uma maneira de torná-la possível, nem que tenha de ser adaptada – afirma a supervisora educacional Ana Cristina Czegelski Duarte, integrante do setor pedagógico da Secretaria de Educação e Cultura de Giruá.
Outro foco, é o atendimento especializado a diretores escolares. Todos os meses eles têm encontro com um professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) para um curso de gestão. Giruá foi contemplada pelo Plano de Ações Articuladas do MEC e conseguiu transformar a cidade em um polo que sedia os encontros e recebe profissionais de cidades maiores, como Santa Rosa e Santo Ângelo.
– Queremos que nossos diretores estejam cientes da sua função e de onde podem chegar com esse conhecimento – diz a secretária de Educação Fátima Ehlert.
NEGLIGÊNCIA CHOCANTE
Escolas literalmente cercadas por traficantes e consumidores de drogas, postos de saúde ameaçados pela violência, parques e praças tomados por marginais. Esses cenários, que emergiram no noticiário nesta semana, mostram o quanto a segurança pública está negligenciada na Grande Porto Alegre. Tudo é inaceitável: crianças estudando ao lado de consumidores de crack, profissionais de saúde agredidos por pacientes e a população tendo que renunciar ao uso de equipamentos públicos porque estes foram tomados por marginais.
No caso das escolas, as autoridades reconhecem o problema, que se mantém pela inexistência de verbas e programas específicos para combatê-lo. Poucas das mais de 2,5 mil escolas do Estado têm segurança própria e, na Capital, uma minoria conta com PM residente. As consequências são as previsíveis: crianças e jovens que deveriam ver a escola como um parâmetro para se posicionarem frente à vida são confrontadas continuamente no local com a venda e o consumo de drogas, passando a ser encaradas como potenciais clientes. Na área de saúde pública, a violência também se constitui numa ameaça, com o agravante de que as agressões, muitas vezes, partem dos próprios pacientes ou de familiares.
Não é preciso muita reflexão para se concluir o que significa para crianças e adolescentes o convívio permanente com usuários e mesmo traficantes de drogas. A situação não é muito diferente em unidades e postos de saúde, onde agressões físicas contra profissionais da área médica têm sido rotineiras, a ponto de alguns deles ameaçarem deixar o trabalho, prejudicando principalmente os enfermos. Isso sem falar na depredação de praças e parques e na falta de conservação e limpeza desses locais, fazendo com que a população precise conviver com o descaso e com a sujeira.
Os contribuintes pagam seus impostos na expectativa de poderem contar com alternativas de prestação de serviços mais eficientes. O poder público deve respostas mais firmes nessas áreas, particularmente na de segurança pública.
EDITORIAL ZERO HORA 20/05/2011
No caso das escolas, as autoridades reconhecem o problema, que se mantém pela inexistência de verbas e programas específicos para combatê-lo. Poucas das mais de 2,5 mil escolas do Estado têm segurança própria e, na Capital, uma minoria conta com PM residente. As consequências são as previsíveis: crianças e jovens que deveriam ver a escola como um parâmetro para se posicionarem frente à vida são confrontadas continuamente no local com a venda e o consumo de drogas, passando a ser encaradas como potenciais clientes. Na área de saúde pública, a violência também se constitui numa ameaça, com o agravante de que as agressões, muitas vezes, partem dos próprios pacientes ou de familiares.
Não é preciso muita reflexão para se concluir o que significa para crianças e adolescentes o convívio permanente com usuários e mesmo traficantes de drogas. A situação não é muito diferente em unidades e postos de saúde, onde agressões físicas contra profissionais da área médica têm sido rotineiras, a ponto de alguns deles ameaçarem deixar o trabalho, prejudicando principalmente os enfermos. Isso sem falar na depredação de praças e parques e na falta de conservação e limpeza desses locais, fazendo com que a população precise conviver com o descaso e com a sujeira.
Os contribuintes pagam seus impostos na expectativa de poderem contar com alternativas de prestação de serviços mais eficientes. O poder público deve respostas mais firmes nessas áreas, particularmente na de segurança pública.
EDITORIAL ZERO HORA 20/05/2011
quinta-feira, 19 de maio de 2011
INDIGNAÇÃO - PROFESSORA DISCURSA MOSTRANDO SALÁRIO E PROPONDO AÇÃO COLETIVA
Discurso de professora vira hit na web e ganha apoio de secretária do RN. 'Não basta mobilização virtual', diz Amanda Gurgel, que leciona português. Ela resumiu a realidade do professor pelos números do seu salário: R$ 930. Do G1, em São Paulo - 19/05/2011
Amanda Gurgel professora de português da rede pública do Rio Grande do Norte, virou nos últimos dias uma "celebridade" na internet depois que o vídeo com seu discurso na Assembléia Legislativa daquele estado, feito em audiência pública na semana passada, foi postado na rede. No seu pronunciamento, Amanda resume a situação da vida de um professor de escola pública em três algarismos: nove, três zero. "São os números do meu salário: R$ 930", discursou a professora. A secretária da educação do estado, Betânia Ramalho, se disse solidária à posição da professora. "Que grito de indignação desperte a sociedade por um novo projeto de educação para o país", afirmou a secretária.
O vídeo se multiplicou na web e o nome de Amanda Gurgel surgiu entre os mais citados do Twitter. Em quatro dias, o vídeo já teve mais de 200 mil exibições. A repercussão surpreendeu a professora. Em entrevista ao programa "RN TV", da InterTV, afiliada da Rede Globo, Amanda disse que falou apenas o que vive diariamente em seu trabalho. "Falei de forma esportânea. É o que comentamos diariamente nas escolas. No intevalo é só o que a gente fala do cansaço, da rotina, diário, aula trabalho, ônibus para pegar", afirmou a docente, que já tem perfis fakes nos sites de rede social. "Não participo dessas redes por falta de tempo. Não faço parte do mundo da internet."
A professora espera que este sucesso na internet possa de alguma forma mobilizar a população a exigir melhores condições de trabalho para os professores. "Não basta uma mobilização apenas no espaço virtual. Se todas as pessoas estão se identificando com o que eu falei naquele vídeo elas precisam transformar este sentimento em uma ação coletiva."
No discurso para os deputados estaduais, a professora criticou a política educacional do governo. Ela fez um apelo aos deputados potiguares: "Parem de associar qualidade de educação com professor dentro de sala de aula. Porque não tem condição de ter qualidade em educação com professores tendo de multiplicar o que ganha trabalhando em três horários em sala de aula: R$ 930 de manhã, R$ 930 à tarde e R$ 930 à noite".
Estão me colocando dentro de uma sala de aula com um giz e um quadro para salvar o Brasil? Não posso, não tenho condições. Muito menos com o salário que recebo"
Amanda Gurgel, professora
Após mostrar o contra-cheque e exaltar seu salário, Amanda declarou: "Só quem está em sala de aula e pega três ônibus por dia para chegar em seu local de trabalho é que pode falar com propriedade sobre isso. Fora isso, qualquer colocação que seja feita aqui é apenas para mascarar uma verdade: em nenhum governo, em nenhum momento a educação foi uma prioridade".
Ela reclamou da forma em que os governos relevam a situação dos professores de escolas públicas e o discurso de que cabe à categoria trabalhar pela melhoria do ensino no país. "Estão me colocando dentro de uma sala de aula com um giz e um quadro para salvar o Brasil? Salas de aulas superlotadas com alunos entrando com carteira na cabeça porque não têm carteiras nas salas. Sou eu a redentora do país? Não posso, não tenho condições. Muito menos com o salário que recebo."
Secretária do RN se diz solidária
Em entrevista ao G1, a secretária de educação do Rio Grande do Norte afirmou que o pronunciamento emocionado de Amanda Gurgel revelou a realidade do professor brasileiro. Betânia Ramalho criticou a falta de uma política consolidada de educação no estado. "Foram dez secretários de educação em oito anos, é a face perversa de política descontinuada", disse a secretária, que é professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e está há quatro meses no cargo.
"Nós secretários de estado conversamos com Fernando Haddad (ministro da Educação) no mês passado falando dessas questões que afligem os estados. Precisamos saber como podemos fazer uma revolução naeducação pública. Estamos reestruturando a secretaria, investindo na parte pedagógica. Mas temos muitas escolas em situação precária. O problema é da educação pública nacional. Aqui temos escolas que funcionam muito bem e escolas que precisam avançar muito."
Sobre o salário de R$ 930 revelado pela professora Amanda, a secretária disse que é uma luta da categoria que se arrasta há muitos anos. "Podemos dizer que o salário dela está acima do piso nacional para 30 horas, que é de R$ 890. É preciso construir uma carreira docente que coloque professores no mesmo pé de igualdade dos demais profissionais. Mas isto é uma trajetória longa."
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